PERCEPÇÃO EM SAÚDE BUCAL DOS CUIDADORES DE IDOSOS INSTITUCIONALIZADOS

PERCEPTION IN ORAL HEALTH OF CAREGIVERS OF INSTITUTIONALIZED ELDERLY 

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8270904


Davi Oliveira Bizerril
Aline Tavares Lima Holanda2
Mônica Meneses Lima3
Moyses Matias Mateus4
Mirena Maria de Noronha Viana5
Eveline Lima Maia6
Edypo de Sousa Carlos7
Francisco Geornes Peixoto Saldanha8
Ana Elizângela do Monte Almeida9
Silvia de Vasconcelos Silva10
Sabrina Ferreira da Silva11


RESUMO 

Introdução: O cuidado prestado por um ser humano a outro, principalmente na terceira idade, é algo inato ao convívio em grupos sociais. A percepção dos cuidadores de idosos institucionalizados sobre a saúde bucal pode influenciar nos cuidados prestados aos grupos de terceira idade. Objetivo: Este estudo objetiva compreender a percepção de saúde bucal dos cuidadores. Metodologia: Estudo qualitativo, descritivo-interpretativo e transversal. Ocorreu no Lar Torres de Melo com cuidadores de idosos institucionalizados. A coleta de dados se deu por meio de formulário estruturado e de um roteiro de entrevista. Resultados: Participaram 26 cuidadores, em que a maioria dos cuidadores era do sexo feminino (n=18; 69,2%) com média de idade de 40 anos. Todos os participantes (100%) consideram a saúde bucal como prioridade de higiene pessoal diária dos pacientes, e apontaram ter instruções ou conhecimento prévio na higienização de próteses bucais. Constatou-se que os cuidadores percebem sua atividade como sendo de grande significado. Em relação à saúde bucal, os participantes relataram a importância da higiene oral em pacientes idosos, porém não souberam expor motivos. Conclusão: Nota-se que os cuidadores consideram importante a saúde bucal nos idosos, porém, não sabem explicar o motivo dessa relevância. Isso pode ser atribuído ao baixo grau de escolaridade dos cuidadores. Além disso, os cuidadores afirmam ter recebido informações específicas sobre cuidados bucais, instrução e conhecimento prévio, considerando-se capazes de orientar e auxiliar em práticas de higiene bucal e limpeza das próteses. 

PALAVRAS-CHAVE: Epidemiologia. Saúde bucal. Cuidadores. Saúde do idoso institucionalizado.

ABSTRACT  

 Introduction: The care given by one human being to another, especially in the third age, is something innate to the conviviality in social groups. The perception of caregivers of institutionalized elderly people on oral health can influence the care given to the elderly. Objective: This study aims to understand the caregiver’s perception of oral health. Methodology: Qualitative descriptive-interpretative and cross-sectional study. It took place at Lar Torres de Melo with caregivers of institutionalized elderly. The data collection was done through a structured form and an interview script. Results: Twenty-six caregivers participated, in which the majority were female (n=18; 69.2%) with a average age of 40 years. All participants (100%) considered oral health to be a priority for the patient’s daily personal hygiene, and pointed out that they had been instructed or had prior knowledge on the subject of oral prostheses hygiene. It was found that caregivers perceive their activity as being of great significance. Regarding oral health, the participants reported the importance of oral hygiene in elderly patients, but could not explain for what reason. Conclusion: Note that caregivers consider oral health to be important for the elderly, but they cannot explain the reason for this relevance. This can be attributed to the low level of education of caregivers. In addition, caregivers claim to have received specific information on oral care, instructions and to have prior knowledge regarding the subject, thus considering themselves able to guide and assist in oral hygiene practices and in the cleansing of the prostheses.

KEY WORDS:Epidemiology.Oral Health.Caregivers.Health of Institutionalized Elderly.

INTRODUÇÃO 

O envelhecimento humano pode ser compreendido como um processo universal, dinâmico e irreversível, influenciado por fatores biológicos, sociais, psicológicos e ambientais. Comumente associado às regiões mais desenvolvidas, o envelhecimento populacional consiste em um fenômeno de amplitude mundial na atualidade1,2

No Brasil, o número de idosos é elevado em virtude da melhoria da qualidade de vida somada à diminuição das taxas de natalidade e mortalidade, além dos avanços na área da saúde. Estima-se que, a partir de 2025, o Brasil se torne o sexto país em indivíduos na faixa etária de 60 anos ou mais, representando aproximadamente 13% da população3-6. 

O perfil epidemiológico da população sofre transformações que evidenciam a prevalência de doenças crônico-degenerativas que podem comprometer a autonomia do idoso, exigindo a demanda de um cuidador para assistir o mesmo7,8. 

Com isso, esta população crescente necessita de cuidados especiais à saúde e, consequentemente, torna-se indispensável a presença de um acompanhante presente em suas atividades diárias. Os idosos vivenciam um processo de envelhecimento, tornando-os dependentes de terceiros, que, muitas vezes, não se apresentam adequadamente preparados para essa prática, podendo acarretar processos deletérios no cuidar desses idosos9,10

Diante dessa visão, o envelhecimento é entendido como parte integrante e fundamental no curso de vida de cada indivíduo. É nessa fase que emergem experiências e características próprias e peculiares, resultantes da trajetória de vida, na qual umas têm maior dimensão e complexidade que outras, integrando assim a formação do indivíduo idoso3,4.

Sabe-se que essa parte da população requer uma dedicação exclusiva em razão das condições sociais, mentais, físicas e afetivas nas quais se apresentam, muitas vezes, em situações de negligência social11.

            Esse estudo surgiu da necessidade de avaliar o conhecimento dos cuidadores de idosos institucionalizados, principalmente, em saúde bucal, já que são deficientes as pesquisas direcionadas para essa área. 

Diante do exposto,o presente estudo se propõe compreender a percepção em saúde bucal dos cuidadores de idosos em Instituição de Longa Permanência (ILP) na busca da melhoria da qualidade de vida dos idosos institucionalizados, visto que pouco se conhece sobre o perfil de cuidadores de idosos, suas necessidades, sua formação e seu conhecimento sobre saúde bucal do idoso. 

METODOLOGIA

         O estudo caracteriza-se por ser qualitativo, descritivo-interpretativo e transversal. Foi realizado na Instituição Lar Torres de Melo, localizada na Rua Júlio Pinto, 1832, bairro Jacarecanga, em Fortaleza, Ceará, Brasil. Em 1979, o Lar Torres de Melo se qualificou como ILP, especializada na assistência e tratamento de pessoas idosas em estado de dependência parcial, total e fase terminal, oferecendo serviços de qualidade e de acordo com os sentimentos éticos e as leis que orientam as políticas públicas para o segmento. É a única instituição filantrópica, de atendimento de alta complexidade nos diversos graus de dependência, que registra uma demanda incapaz de ser atendida, em virtude da escassez de recursos e limitações da capacidade física para ampliação do atendimento. São realizadas atividades laborativas, recreativas, expressivas, religiosas, ludoterápica, socializante e cognitiva com 220 idosos residentes atualmente na instituição e mais 50 do Projeto de Convivência12.

A ILP desenvolve, basicamente, suas ações em 4 áreas: Social, Saúde, Nutrição, Gestão, por uma equipe multiprofissional, além de profissionais auxiliares e de apoio administrativo, serviços gerais e de segurança, perfazendo uma equipe composta por 136 profissionais que se revezam por turnos12.

O público alvo da pesquisa foram os cuidadores de idosos contratados pelo Lar Torres de Melo. Somente um cuidador não autorizou a gravação da entrevista. Os critérios de inclusão foram: cuidadores de idosos presentes durante a coleta de dados e que estavam disponíveis a participar do estudo.  Quanto aos critérios de exclusão, incluem cuidadores em período de férias e licença maternidade ou de saúde. 

As fases da análise das entrevistas foram as seguintes: pré-análise; exploração do material transcrito e tratamento e interpretação dos resultados. O referido estudo seguiu a análise temática em leituras exaustivas das entrevistas transcritas. Durante a exploração dos resultados, os núcleos de sentido foram estabelecidos. Foram realizados recortes das falas dos entrevistados e discutidos sobre a luz da literatura pertinente.

O estudo foi desenvolvido por meio de aplicação de formulário estruturado e o roteiro de entrevista nos meses de julho e agosto de 2016. Após a aplicação do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), foi desenvolvida a primeira fase da pesquisa, de cunho quantitativo, que consistiu na aplicação de um formulário estruturado aos cuidadores de idosos. O formulário abordou variáveis dentro dos perfis de avaliação das características socioeconômicas, verificação de dados pessoais e conhecimento em saúde bucal de cuidadores de idosos. As variáveis de estudo incluíram dados gerais: idade, sexo, estado civil, escolaridade, renda familiar; tempo de trabalho, jornada de trabalho, regime de contrato, conhecimento sobre saúde bucal; práticas de higiene oral aplicadas aos idosos: realização de escovação dentária; rotina de hábitos de higiene bucal dos idosos: método de higienização e sua importância; e percepção dos cuidadores quanto à saúde bucal do idoso. 

Em uma segunda fase, foi aplicado um roteiro de entrevista que consistiu em duas perguntas norteadoras abordando os seguintes questionamentos: satisfação do trabalho com idosos e conhecimentos sobre a saúde bucal dos idosos, incluindo orientações de higiene bucal. A entrevista foi gravada com gravador de voz digital no setor de trabalho dos entrevistados.  

A análise dos resultados para a caracterização dos entrevistados foi processada no programa Statistical Package for Social Science (SPSS), versão 24.0. Na análise estatística descritiva focou-se em distribuição absoluta, cálculo de proporções, medidas de tendência central e dispersão. Foi considerado o nível de significância de 5% e intervalo de confiança de 95%.

Foram analisadas as descrições das entrevistas fornecidas pelos participantes segundo a análise. Tal método apresenta-se como conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando obter por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens indicadores, quantitativos ou qualitativos, que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção e/ou recepção sobre outra realidade diferente às mensagens.

A análise de conteúdo é constituída por diferentes técnicas. Para esta pesquisa optou-se pela análise documental por meio categorial e temática. A análise documental é “uma operação ou um conjunto de operações visando representar um conteúdo de um documento sob uma forma diferente da original, a fim de facilitar num estado ulterior, a sua consulta e referenciação (Bardin, 2000, p. 45)”. A análise categorial trata do desmembramento do discurso em categorias, em que os critérios de escolha e de delimitação orientam-se pela dimensão da investigação dos temas relacionados ao objeto de pesquisa, identificados nos discursos dos participantes pesquisados.

As entrevistas foram transcritas, desmembradas e categorizadas segundo temáticas. Estas mensagens foram analisadas de acordo com os objetivos do estudo, com base nas informações obtidas do instrumento aplicado junto aos participantes da pesquisa, e discutidos à luz da literatura revisada e da análise de conteúdo. 

Em conformidade com a Resolução 466/2012 do Conselho de Ética em Pesquisa/Ministério da Saúde, que dispõe sobre diretrizes e normas reguladoras de pesquisas envolvendo seres humanos, esse estudo adotou os quatro princípios básicos da bioética: autonomia, justiça, beneficência e não maleficência. Foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Fortaleza e recebeu a aprovação sob o parecer nº 027.346/2016. 

Foi conferido aos sujeitos da pesquisa o direito da autonomia em decidir pela participação ou não na pesquisa. O sigilo da identidade do participante e seus dados foram garantidos a partir do momento da assinatura do termo de consentimento. O procedimento utilizado foi a aplicação de um formulário sobre conhecimentos de saúde bucal no idoso e não trouxe nenhum desconforto para o participante. Além do formulário, os participantes responderam a uma entrevista, após consentimento, contendo dois questionamentos sobre saúde bucal do idoso. O tipo de procedimento de preenchimento do formulário e a entrevista não apresentaram risco a nenhum dos envolvidos. Os benefícios esperados com o estudo são no sentido de colaborar com a comunidade acadêmica e técnico-científica odontológica, além de servir para planejamento e programação de ações e serviços de saúde bucal aos idosos institucionalizados. 

Somente o pesquisador teve acesso aos dados de cada participante. Não é de interesse a pesquisa divulgar os dados individuais dos participantes e sim os resultados gerais, esperados nos objetivos da pesquisa. Em nenhum momento da pesquisa os participantes foram identificados. 

RESULTADOS 

Caracterização dos Entrevistados

Participaram 26 cuidadores em que dezoito (69,2%) eram do sexo feminino e oito (30,8%) eram do sexo masculino, com uma média de idade de 40 anos. A idade mínima foi de 23 e a máxima de 60 anos.

Em relação ao nível de escolaridade, três (11,5%) tinham o ensino fundamental incompleto, quatro (15,4%) possui o ensino fundamental completo e dezenove (73,1%) o ensino médio completo. Enquanto a renda familiar, a média foi de aproximadamente 2 salários mínimos, segundo o reajuste anual do Governo federal16. A maioria dos cuidadores possui um bom tempo de experiência no cuidado com idosos institucionalizados, apresentando uma média de aproximadamente sete anos e cinco meses de prestação deste tipo de serviço.

Do total de entrevistados, (n=19; 73,1%) afirmam ter realizado curso profissionalizante de cuidador de idosos. Sete cuidadores (26,9%) relataram não possuir certificação de cuidador de idoso, apresentam curso técnico em enfermagem, mas atuam na instituição desempenhando as atividades de cuidador.

Em relação à percepção do cuidador quanto à atividade desempenhada, a maior parte dos entrevistados, vinte e três (88,5%) responderam possuir um grande significado, enquanto três (11,5%) afirmam que qualquer um pode desempenhar essa função.

Quando perguntados se eram realizadas atividades voltadas para a higiene bucal, vinte e um cuidadores ( 80,8%) relataram realizar, em contrapartida cinco (19,2%) optou não realizar.

A grande maioria dos entrevistados, vinte e dois participantes (84,6%) relata que já haviam recebido informações específicas sobre cuidados bucais e apenas quatro (15,4%) afirmam que não obtiveram essas informações. A razão de parte dos cuidadores não receberem essas orientações foi atribuída ao fato dos cuidadores da noite e da saída não terem contato com os estudantes de odontologia e professores cirurgiões dentistas que realizam atividades voltadas para a saúde bucal do idoso, pois as ações educativas acontecem no período diurno.

Quanto aos cuidados de higiene oral em pacientes usuários de prótese foi avaliado que vinte e três (88,5%) dos entrevistados afirmam possuir instrução ou conhecimento prévio para ajudar na higienização da prótese, porém apenas quatorze ( 53,8%) relatam auxiliar na higienização das próteses dos idosos.

Em relação ao material utilizado para higienização das próteses, doze dos cuidadores (57,1%) utilizam escova e dentifrício, enquanto cinco (23,8%) utilizam bicarbonato de sódio.

           Todos os entrevistados (n=26; 100%) consideram importante o cirurgião dentista como parte da equipe multiprofissional no cuidado aos idosos  além de considerarem  a saúde bucal como prioridade na higiene pessoal diária dos pacientes, apesar de que cinco (19,2%) não realizam atividades voltadas para a higiene bucal e doze (46,2%) não realizam higienização da prótese dos pacientes idosos.

Categorias 

Percepção dos cuidados quanto à saúde bucal dos idosos 

As respostas indicaram que todos os cuidadores têm a ideia de que a higiene bucal dos idosos dependentes e não dependentes é importante no cuidado ao idoso, porém a maioria não sabe relatar o motivo de tal importância, como aponta os trechos abaixo.

É muito importante.” (Cuidador 15)
Acho muito importante. Uma boca saudável é um corpo saudável.” (Cuidador 17)
Depois do banho é o conteúdo mais importante. Não só deles, como o nosso.” (Cuidador 10).

Os cuidadores demonstraram em suas falas o pouco conhecimento em relação à importância da higiene oral. Isso foi atribuído ao baixo grau de escolaridade representado pelas respostas simples, curtas e sucintas durante a entrevista.

Além disso, outro fator relevante relatado pelos cuidadores é que a higiene oral não é possível de ser realizada adequadamente, devido ao grande número de idosos para poucas equipes de cuidadores, resultando em uma deficiente saúde bucal, segundo relatos abaixo.

Não é tão boa, como tem muitos idosos e poucos funcionários, não conseguimos ter o cuidado adequado, pela quantidade de equipe não tem como ser bem feita. ” (Cuidador 25)

Não tem higiene bucal. Quando é no particular eu fazia, usava pasta, escovava duas vezes ao dia e usava Listerine® todo dia e também usava a espátula com gaze ou só a gaze e usava. Só que acho que deveria fazer aqui né. Embora não tenha dente, fizesse na gengiva e a gente trabalha em equipe. Uma equipe fazia, era pra ser feito assim (…). Como é muito idoso tem pouco cuidador e se a doutora arranjasse um patrocínio dos produtos, por que o Davi vem muito e vem como voluntário pra ajudar (…). ” (Cuidador 16) 
Não é muito boa. Deveria ter dentista aqui no Lar Torres de Melo, apesar do que a gente faz a higiene bucal, mas mesmo assim, precisa de um dentista do Lar para ser bem melhor. ” (Cuidador 11). 

Para alguns cuidadores, como nos trechos coletados abaixo, a higiene oral nos idosos se apresenta deficiente devido à falta de aceitação dos idosos quanto a realização da higiene. 

Aqui é precária. Eles não deixam a gente fazer a higiene bucal, poucos são os que aceitam. As que são lucidas deixam, as que não são lúcidas não deixam. ” (Cuidador 13)
Para falar a verdade aqui não é muito completo, não temos muito tempo para realizar a escovação. E, às vezes, a gente tenta e eles não deixam. A gente limpa com o dedo, limpa o céu da boca, limpa aqueles que tem dentes, tiro a prótese, lavo e boto novamente, pois muitos deles não tem mais dentes.” (Cuidador 18) 

Capacidade de orientação e educação em saúde bucal 

Com relação à capacidade de realizar e orientar práticas de higiene oral nos idosos institucionalizados percebe-se na fala dos cuidadores que todos eles se sentem capacitados a realizar e orientar as atividades voltadas para a higiene oral dos pacientes idosos. Alguns atribuem essa capacitação ao curso profissionalizante de cuidador de idosos em que são instruídos acerca da saúde bucal.

Porém, verificou-se que nem todos os cuidadores realizaram o curso, os quais atribuem sua capacidade de realizar e orientar práticas de higiene oral nos idosos às visitas realizadas por estudantes de odontologia durante o estágio curricular da Universidade de Fortaleza (UNIFOR) e às palestras ministradas pelos professores orientadores.

Eu acho, porque eu já aprendi também né. Aprendi através dos outros, que vem ministrar palestras e explicam, então peguei aquele pouquinho que eles ensinaram e aprendi para passar para aqueles que estão chegando. ” (Cuidador 18)

Sim, devido ao curso que fiz de cuidadores de idosos e também dos profissionais que auxiliam e ajudam a gente que são da UNIFOR e da Fametro e isso a gente pega prática no dia a dia.” (Cuidador 07)

DISCUSSÃO 

O predomínio de mulheres cuidadoras apontado no estudo reforça o papel social da mulher, historicamente determinado, ou seja, atuando nas tarefas de cuidar da família e do lar, uma vez que prestar cuidado é secularmente uma atribuição feminina14. A partir da literatura, observa-se comum e constante o predomínio do sexo feminino em desempenhar papéis de cuidado ao idoso. Isto pode ser atribuído ao fato de que a sociedade, por meio de sua cultura, impõe à mulher o papel de cuidar15. O sexo feminino é presente e sólido no ato de cuidar de idosos institucionalizados por ser um processo construído historicamente permeabilizado pela cultura e contexto socioeconômico.

A renda dos cuidadores apontou que a média da renda familiar é de aproximadamente 2 salários mínimos. A partir do Decreto nº 8.618, de 29 de dezembro de 2015 considera-se que o salário mínimo atual vigente no Brasil, é de R$ 880,0016. Hoffmann17 (2000) aponta que o salário mínimo está diretamente associado aos níveis de desigualdade e pobreza. Acredita-se que o faturamento dos cuidadores é insuficiente para manutenção da família, afetando seu bem estar social e consequentemente reduzindo seu desempenho profissional. Além disso, isso contribui para sua insatisfação no ambiente de trabalho, o qual muitas vezes impõe inúmeras competências atreladas a uma pequena remuneração. 

A escolaridade é predominantemente baixa, corroborando com outros estudos com cuidadores7,18,19. O grau de escolaridade é de extrema importância, uma vez que a falta deste pode interfere, direta ou indiretamente, na prestação de cuidados ao idoso. Há uma diminuição na qualidade do serviço oferecido, pois o cuidador necessita seguir dietas, prescrições e manusear medicamentos15. O cuidador é um promotor de saúde, e deve educar o idoso a ter uma melhor qualidade de vida com práticas saudáveis.

Além disso, pode apresentar-se como dificuldade no processo da educação em saúde. Quando o conhecimento do cuidador é deficiente, torna-se necessária maior atenção dos profissionais aos cuidadores, a fim de ensiná-los a prevenir possíveis erros durante as atividades de cuidado20. Rocha Júnior et al21 (2011) relata que, o nível de instrução do cuidador, tem influência de forma significativa no processo do cuidado prestado ao idoso. Destaca-se ainda para o fato de que além do treinamento para cuidar do outro, o cuidador necessita de suporte para manter a própria saúde e poder cuidar de si mesmo.

Observou-se que grande parte dos entrevistados apresentava apenas ensino médio completo. Em razão dessa deficiência educacional, durante as entrevistas, notou-se que a maioria dos cuidadores apresentava dificuldade na interpretação das perguntas abordadas no formulário. É notório que os cuidadores que apresentam um menor grau de escolaridade mostram-se deficientes em relação às suas atividades cognitivas, como comunicação, expressão, percepção e raciocínio. O menor desenvolvimento intelectual pode acarretar em prejuízos no ato de cuidado ao idoso, como na interpretação errônea de bulas de medicamentos, resultando em uma incorreta administração.  

Segundo Rocha e Miranda22 (2013), com a idade percebe-se que a cavidade bucal apresenta mudanças recorrentes do envelhecimento. Nesse contexto, observou-se que as percepções dos cuidadores são de grande importância na compreensão das mudanças que ocorrem no sistema estomatognático do ser humano no ato de envelhecer. As alterações bucais derivadas do envelhecimento incluem a diminuição da capacidade gustatória, decorrente de uma diminuição no número de papilas gustativas, cerca de 80% a menos do que na idade adulta, mucosas mais frágeis e sensíveis, gengivas retraídas, coloração escurecida dos dentes, perda de vários elementos dentários (edentulismo) e doenças periodontais, além de cáries23. 

Além disso, os dentes podem apresentar-se desgastados devido ao uso de agentes abrasivos e erosivos ao longo da vida e adquirem coloração mais escurecida. O periodonto tende a ficar mais frágil, sofrendo reabsorções, com consequente migração apical da gengiva, expondo as raízes dentais. A diminuição do fluxo salivar, denominada de xerostomia, também é característica do processo de envelhecimento que, por sua vez, pode ser acentuada pelo uso de medicamentos. Ainda pode ser relatado desconforto pelo uso de próteses totais ou parciais e dentes fraturados22,23.

Os cuidadores relatam que é feita a higienização da cavidade bucal dos idosos, principalmente daqueles acamados que são idosos dependentes ou semi-dependentes. Nessa perspectiva, é importante ressaltar que alguns idosos podem sentir dificuldades em manter boas condições de higiene bucal e até mesmo de suas próteses, necessitando, nesses casos, do auxílio do cuidador para realizá-la. Assim, é indispensável a participação dos cuidadores no processo de higiene de próteses, bem como do processo de higienização bucal, pois se configura um cuidado diário necessário para a manutenção da saúde bucal do idoso. Todavia, os entrevistados também relatam que muitos idosos realizam sua própria higiene bucal, não necessitando do auxílio dos cuidadores por serem idosos independentes24,25.

A qualificação para o trabalho com o idoso é uma condição essencial para que a atividade seja apropriada às necessidades dessa população, muitas vezes, negligenciada24. No entanto, entre os entrevistados, notou-se que parte dos cuidadores não realizou curso profissionalizante de cuidador de idosos, sugerindo-se que, no caso desses profissionais, as habilidades do manejo e trato com idosos foram adquiridas, em grande parte, no trabalho diário.

Os participantes relataram ter tido acesso a informações sobre saúde oral principalmente junto ao cirurgião-dentista, destacando a importância do profissional da Odontologia na conscientização e no despertar de práticas diárias que resultem em saúde. O interesse de ter acesso à informação em saúde bucal foi apresentado pela maioria dos participantes, principalmente por meio de estratégias como palestras e vivências práticas na instituição. 

Segundo Pucca Júnior26 (2000) salienta que a saúde bucal é parte integrante da saúde geral dos indivíduos e tem sido depreciada ao esquecimento quando se discutem as condições de saúde da população idosa. Observa-se que a perda total dos dentes é aceita pela sociedade e pelos cirurgiões dentistas como algo normal e natural com o avançar da idade, levando a uma falsa concepção do processo de envelhecimento. Evidencia-se que esse processo, por si só, não traz doenças, estas podem ou não ocorrer.

Diante do exposto,observa-se a importância da avaliação do conhecimento dos cuidadores de idosos em saúde para a otimização da sua prática, bem como para a obtenção de um cuidado mais integral aos pacientes senis. A relevância apontada pelos cuidadores acerca da presença do cirurgião-dentista na ILP fica clara nas falas dos entrevistados que ressaltam a valorização que a presença do cirurgião-dentista tem no cuidado aos usuários, relatando, ainda, a necessidade de uma maior assistência em saúde bucal no dia a dia do serviço e que sua ausência pode causar prejuízos a saúde13.

CONCLUSÃO 

 Todos os cuidadores participantes apontaram a importância da higiene bucal e a presença do cirurgião-dentista na ILP. Contudo, a percepção dessa importância é tida como senso comum entre eles, pois os cuidadores destacam a significância das práticas de limpeza na cavidade oral, porém não sabem interpretar os motivos dessa relevância. Esse fato pode ter sido influenciado pelo baixo nível escolar dos cuidadores. 

Identificar o perfil dos cuidadores e conhecer suas necessidades educativas em saúde é indispensável para firmar as intervenções que prezem pela saúde da população idosa. Com o objetivo de consolidar as linhas de cuidado, uma tática fundamental seria considerar o responsável pelo ato de cuidar e incluí-lo em planejamentos e ações de saúde.

Os cuidadores necessitam ser treinados, mas, previamente, torna-se preciso estruturar quais perspectivas do conhecimento devem ser supridas e os tipos de obstáculos a serem removidos. Portanto, os resultados obtidos no presente estudo podem colaborar para a formação de reflexões em volta de ações educacionais, humanísticas e éticas para completar falhas de conhecimento e valorizar as aptidões do cuidador, assim como no processo de intercâmbio de saberes e de práticas entre cuidadores e profissionais de saúde.

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1Universidade de Fortaleza
2Universidade de Fortaleza
3Universidade de Fortaleza
4Universidade Maurício de Nassau
5Universidade Estadual do Ceará
6Hospital Universitário Walter Cantídio
7Universidade Estadual do Ceará
8Universidade Estadual do Ceará
9Universidade Estadual do Ceará
10Secretaria de Saúde Municipal de Fortaleza
11Secretaria de Saúde Municipal de Caucaia