PARALISIA PERIÓDICA HIPOCALÊMICA TIREOTÓXICA: RELATO DE CASO

THYROTOXIC HYPOKALEMIC PERIODIC PARALYSIS: A CASE REPORT

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8265716


¹Thâmalla Amaral Gonçalves
²Luísa Abero Vale
³Alice Lima Rosa Mendes
4Joana Elisabeth Sousa Martins Freitas
5Suely Moura Melo
6Diego Batista de Montalvão Cunha


RESUMO

O presente estudo objetivou descrever um caso de paralisia periódica hipocalêmica tireotóxica (PHTT) de um paciente com diagnóstico de hipertireoidismo. O paciente abandonou o tratamento e foi necessário discutir a importância do reconhecimento e tratamento adequado para evitar complicações em seu quadro de saúde. Foi realizada uma pesquisa aplicada, qualitativa, descritiva, retrospectiva e observacional de caso único. O projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética e Pesquisa e foi aprovado sob o CAAE 63457122.3.0000.5211. O participante do estudo, é um paciente que se apresentou com PPHT atendido em hospital privado de Teresina e os dados foram coletados através do prontuário eletrônico do mesmo. Detalhamento do caso: homem de 22 anos, pardo, com diagnóstico prévio de hipertireoidismo que abandonou o tratamento por 4 anos, acometido por PPHT que em seu primeiro atendimento não foi diagnosticado e retornou posteriormente com piora do quadro, apresentando tetraparesia flácida e arritmia grave que, após reconhecimento e manejo apropriados da equipe, apresentou melhora total do quadro e recebeu alta hospitalar com diagnóstico firmado e com tratamento adequado. Em seguida, realizou-se uma revisão da literatura quanto aos aspectos clínicos, fisiopatologia e diagnóstico, além da discussão acerca de diagnóstico diferencial e princípios do tratamento já publicados. Dado o exposto, diante da dificuldade e falta de conhecimento sobre essa complicação por profissionais de saúde, vê-se que o diagnóstico precoce e manejo adequado são imprescindíveis para prevenir desfechos desfavoráveis causados pela PPHT. A conduta adequada muda a evolução do paciente, evita condutas iatrogênicas, procedimentos desnecessários, internação prolongada e complicações potencialmente fatais.

Palavras-chave: Hipertireoidismo. Tireotoxicose. Hipocalemia.

ABSTRACT

The present study aimed to describe a case of thyrotoxic hypokalemic periodic paralysis (THPP) in a patient diagnosed with hyperthyroidism. The patient discontinued treatment, and it was necessary to discuss the importance of recognizing and providing appropriate treatment to avoid complications in their health condition. An applied, qualitative, descriptive, retrospective, and observational single-case research was conducted. The research project was submitted to the Ethics and Research Committee and was approved under the CAAE 63457122.3.0000.5211. The study participant is a patient who presented with THPP and was treated at a private hospital in Teresina. Data were collected from the participant’s electronic medical record. Case details: a 22-year-old mixed-race male with a prior diagnosis of hyperthyroidism who discontinued treatment for 4 years. He developed THPP, which was not diagnosed during his initial presentation. He returned later with worsening symptoms, including flaccid tetraparesis and severe arrhythmia. After appropriate recognition and management by the medical team, he showed complete improvement and was discharged from the hospital with a confirmed diagnosis and appropriate treatment. Subsequently, a literature review was conducted regarding clinical aspects, physiopathology, and diagnosis, along with a discussion of differential diagnosis and previously published treatment principles. Given the aforementioned, considering the difficulty and lack of awareness about this complication among healthcare professionals, it is evident that early diagnosis and proper management are essential to prevent adverse outcomes caused by THPP. Appropriate management alters the patient’s course, prevents iatrogenic interventions, unnecessary procedures, prolonged hospitalization, and potentially fatal complications.

Keywords: Hyperthyroidism. Thyrotoxicosis. Hypokalemia.

RESUMEN

El presente estudio tuvo como objetivo describir un caso de parálisis periódica hipocalémica tireotóxica (PHTT) en un paciente con diagnóstico de hipertiroidismo. El paciente interrumpió el tratamiento, y fue necesario discutir la importancia de reconocer y brindar el tratamiento adecuado para evitar complicaciones en su estado de salud. Se llevó a cabo una investigación de caso único aplicada, cualitativa, descriptiva, retrospectiva y observacional. El proyecto de investigación fue sometido al Comité de Ética e Investigación y fue aprobado bajo el CAAE 63457122.3.0000.5211. El participante del estudio es un paciente que presentó PHTT y fue tratado en un hospital privado en Teresina. Los datos se recopilaron del expediente médico electrónico del participante. Detalles del caso: un hombre de 22 años de edad, mestizo, con un diagnóstico previo de hipertiroidismo que interrumpió el tratamiento durante 4 años. Desarrolló PHTT, que no fue diagnosticada durante su presentación inicial. Regresó más tarde con síntomas empeorados, incluyendo tetraparesia flácida y arritmia grave. Después de un reconocimiento y manejo apropiados por parte del equipo médico, mostró una mejora completa y fue dado de alta del hospital con un diagnóstico confirmado y tratamiento adecuado. Posteriormente, se realizó una revisión de la literatura sobre aspectos clínicos, fisiopatología y diagnóstico, junto con una discusión sobre el diagnóstico diferencial y los principios de tratamiento previamente publicados. Dado lo mencionado anteriormente, considerando la dificultad y la falta de conciencia sobre esta complicación entre los profesionales de la salud, es evidente que el diagnóstico temprano y el manejo adecuado son esenciales para prevenir resultados adversos causados por PHTT. La gestión adecuada altera el curso del paciente, previene intervenciones iatrogénicas, procedimientos innecesarios, hospitalización prolongada y complicaciones potencialmente mortales.

Palabras clave: Hipertiroidismo. Tirotocitosis. Hipocalemia.

1. INTRODUÇÃO

A paralisia hipocalêmica é um tipo de paralisia flácida aguda que associa fraqueza muscular e níveis baixos de potássio sérico, podendo ser de causas primárias ou secundárias. A causa primária é a paralisia periódica hipocalêmica familiar com herança autossômica dominante ou recessiva, já as causas secundárias incluem paralisia periódica tireotóxica, acidose tubular renal, hiperaldosteronismo primário e hipocalemia secundária a perdas gastrointestinais (SARDAR et al., 2019).

A paralisia periódica hipocalêmica tireotóxica (PPHT) é uma complicação incomum, grave e potencialmente fatal do hipertireoidismo. Essa patologia é caracterizada por fraqueza muscular flácida associada a tireotoxicose que produz hipocalemia (NAZIR; HAMEED; SHEHZAD, 2021). A principal causa é a Doença de Graves, mas, pode acontecer em qualquer tipo de tireotoxicose (ROH et al., 2019).

A patogênese da PPHT não é totalmente clara, mas sabe-se que a hipocalemia é desencadeada pelos hormônios tireoidianos que passam pela mitocôndria livremente e geram adenosina trifosfato (ATP) para a bomba de sódio potássio adenosina trifosfatase, ocasionando um influxo maciço de potássio para a célula muscular. Além disso, a atividade simpática gerada pelo tireotoxicose estimula a bomba de sódio potássio adenosina trifosfatase, contribuindo ainda mais com a hipocalemia (SONKAR; KUMAR; SINGH, 2018).

Apesar da paralisia periódica tireotóxica estar bem descrita como uma complicação possível do hipertireoidismo gerado por Doença de Graves, continua representando um desafio pelo risco potencial de vida e na maioria das vezes por se apresentar de maneira enganosa nos locais que realizam assistência emergencial (BILHA et al., 2020).

A questão norteadora que segue o estudo é, portanto, “qual a fisiopatologia, as manifestações clínicas e laboratoriais, o tratamento adequado e o seguimento em paciente com paralisia periódica tireotóxica hipocalêmica com diagnóstico anterior de hipertireoidismo?”. Como hipóteses, tem-se que a paralisia periódica tireotóxica hipocalêmica ocorre pela ação dos hormônios tireoidianos em associação a influência da insulina e do estado hiperadrenérgico que geram uma maior ativação da bomba de sódio-potássio-ATPase na membrana celular e resulta na mudança intracelular de potássio.

Sendo assim, este trabalho teve o objetivo de descrever o caso de um paciente portador da paralisia periódica hipocalêmica tireotóxica com diagnóstico de hipertireoidismo, após abandono do tratamento e discutir sobre a importância do reconhecimento e tratamento adequado dessa patologia para evitar complicações potencialmente fatais. Além disso, de maneira mais específica, teve o objetivo de identificar a fisiopatologia da paralisia periódica hipocalêmica tireotóxica, descrever manifestações clínicas e laboratoriais que auxiliam no reconhecimento da doença e discutir sobre o manejo e tratamento adequado da PPHT para evitar complicações potencialmente fatais.

2. METODOLOGIA

O estudo foi desenvolvido de acordo com a Resolução 466/2012 e 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde que define as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas, envolvendo dados humanos. O projeto foi iniciado após apreciação e liberação do CEP, sob o número do CAAE 63457122.3.0000.5211. Foi utilizado o Termo de Compromisso de Utilização de Dados (TCDU) para manter a confidencialidade dos dados coletados em prontuário, bem como a privacidade de seus conteúdos.

Tratou-se de uma pesquisa de natureza aplicada, com abordagem qualitativa e de caráter descritivo, observacional e retrospectivo a partir de caso único. O participante do estudo é um paciente que apresentou paralisia periódica hipocalêmica tireotóxica com diagnóstico anterior de hipertireoidismo, que havia abandonado o tratamento inicial. O estudo foi realizado em uma instituição privada que atende serviços de urgência e emergência em Teresina-PI.

Os dados utilizados nesse estudo foram coletados de prontuário eletrônico sob a tutela da instituição privada que atende serviços de urgência e emergência em Teresina-Pi. A partir do prontuário eletrônico, foram analisados os dados e organizada a anamnese baseando-se na queixa principal, história atual do paciente, incluindo dados como a idade, gênero, profissão, dados clínicos e do exame físico, resultados de exames laboratoriais, resultados de exames de imagem, achados eletrocardiográficos, antecedentes patológicos, diagnóstico principal, diagnóstico diferencial e conduta para tratamento do caso em questão. Além disso, foram analisadas as condições clínicas do paciente e as condutas após a realização do tratamento eleito.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Paciente de 22 anos, do sexo masculino, pardo, taxista, com antecedente pessoal de hipertireoidismo há 5 anos, procurou atendimento em setor de urgência no início de uma manhã, em agosto de 2017, na cidade de Teresina-PI. Na ocasião, relatou que há quatro anos não realizava o tratamento para o hipertireoidismo (propiltiuracil e propranolol) e negou uso de outras medicações. Na urgência, queixou-se de dor em ambas as pernas há 24 horas que piorou ao acordar, de caráter intermitente associado a dor lombar, relatando episódio semelhante há 1 semana. Ao exame: estável, em bom estado geral, eupneico. Pressão arterial (PA)= 130 x 80 mmHg. Frequência cardíaca (FC) = 88 bpm, pulso cheio. Membros sem dor a palpação e sem sinais de flogose. Foi prescrito analgesia e acompanhamento ambulatorial para investigação da dor.

Ainda no mesmo dia, paciente retornou com piora do quadro e foi encaminhado para a semi-intensiva para monitorização e vigilância. Na admissão da semi-intensiva, paciente relatou fraqueza em membros inferiores (MMII) há uma semana, de caráter progressivo que, ao acordar, evoluiu com tetraparesia flácida, síncope tônica sem pródromos precedida de dor torácica, palpitações taquicárdicas e tontura. Negava perda ponderal e astenia. Negava viroses e infecções recentes. Negava alergias, etilismo e tabagismo. Ao exame: PA 160 x 80 mmHg, FC 78 bpm, Saturação O2 96% em ar ambiente, regular estado geral, acianótico, anictérico, eupneico, afebril. Escala de coma de Glasglow 15, pupilas isocoróricas e fotorreagentes, déficit de força em membros superiores e MMII. Ausculta cardíaca: ritmo cardíaco regular, bulhas hiperfonéticas. Ausculta pulmonar: Murmúrio vesicular presente, sem ruídos adventícios. Abdome: plano, flácido, indolor a palpação, sem sinais localizatórios, sem visceromegalias.

Resultado do primeiro eletrocardiograma (ECG): arritmia sinusal com FC 44 bpm, e o segundo: arritmia sinusal com FC 88 bpm. Tomografia (TC) de crânio com resultado dentro dos parâmetros normais. Ao realizar punção venosa para coleta de exames, apresentou síncope associada a parada sinusal. Foi então realizado atropina e o paciente cursou com melhora e foi encaminhado para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI.)

Nos resultados dos exames laboratoriais iniciais revelou-se T4 Livre alto, TSH suprimido, anticorpo anti TSH (TRAB) positivo, hipocalemia grave e hipomagnesemia, como mostrados na Tabela 1. Resultado: T4 livre 2,7 (VR:0,70 a 1,70 ng/Dl); TSH 0,01 (VR: 0,40 a 5,00 uIU/Ml); TRAB 8,93 (VR: Até 1,75UI/L); Na 139 (VR: 136 a 145 mmol/L); K 2,1 (VR: 3,5 a 5,1 mmol/L); Mg 1,7 (VR: 1,6 a 2,3 mg/Dl); CPK 202 (VR: 55 a 170 U/L). Demais exames sem alterações.

Tabela 1. Evolução laboratorial do paciente

Legenda: DIH – dia de internação hospitalar; TSH – hormônio tireoestimulante; T4 L – Tiroxina livre; TRAB – Anticorpos anti-receptor de TSH.
Fonte: Prontuário do paciente.

Após ser avaliado pelo eletrofisiologista, o ECG (Figura 1) foi laudado como: ritmo sinusal e períodos de bloqueio sinoatrial de segundo grau, intervalo QT prolongado (510 ms) com supra de ST precordiais direitas (questionou-se Síndrome de Brugada). O médico orientou manter potássio > 4,5 mmol/L e Magnésio > 1,8 mg/Dl, além de evitar bradicardia pelo risco de Torsades de Pointes. Para isso, realizar atropina ou associar dopamina e se seguir sem melhora, realizar marcapasso provisório. US da tireoide mostrou tireoide com dimensões aumentadas, textura difusamente heterogênea, às custas de múltiplas áreas hipoecoicas e, ao estudo doppler, fluxo difusamente aumentado, achados sugestivos de tireoidite.

Figura 1. Eletrocardiograma realizado na admissão da UTI

Fonte: Próprio autor,2023.

Diante da avaliação do paciente e dos exames laboratoriais, elencou-se como hipótese diagnóstica a paralisia periódica hipocalêmica tireotóxica e iniciou-se reposição de potássio e correção de outros distúrbios hidroeletrolíticos. Foi prescrito Tapazol 30 mg em dose única pela manhã e foram solicitadas culturas. Após seis horas da reposição o paciente apresentou hipercalemia e magnésio dentro dos parâmetros após correção: Na 137 (VR: 136 a 145 mmol/L); K 6,7 (VR: 3,5 a 5,1 mmol/L); Cl 114 (VR: 114 mEq/L); fósforo 4,1 (VR: 2,5 a 4,5 mg/Dl); Mg 2,1 (VR: 1,6 a 2,3 mg/Dl).

No dia seguinte, paciente evoluiu com resolução completa da tetraparesia e hemodinâmica estável, com ritmo sinusal e FC dentro dos padrões da normalidade (tendendo a taquicardia). Foi solicitado parecer da endocrinologia que manteve o Tapazol, iniciou Propranolol 120 mg/dia e realização do controle do potássio. Resultado dos dias seguintes evoluindo com K 5,3 (VR: 3,5 a 5,1 mmol/L), Mg 2,4 (VR: 1,6 a 2,3 mg/Dl) e resolução de todos os sintomas. Recebeu então alta da UTI e, após três dias de internação em enfermaria para controle do potássio, recebeu alta com nível sérico de potássio controlado em 4,3 (VR: 3,5 a 5,1 mmol/L), com melhora de todos os sintomas, prescrição de Tapazol 30 mg/dia, Propranolol 40 mg de 12/12 horas e KCL 15 ml 1x/dia e acompanhamento ambulatorial pós-alta. Evolução da internação hospitalar descrita na Figura 2.

Figura 2. Evolução durante período de internação

Legenda: HPP – História patológica pregressa; ECG – eletrocardiograma; TSH – hormônio tireoestimulante; T4 L – Tiroxina livre; TRAB – Anticorpos anti-receptor de TSH; KCL – Cloreto de potássio.
Fonte: Próprio autor, 2023.

O paciente manteve seguimento no ambulatório de endocrinologia, realizando consulta após três meses da alta hospitalar e em uso regular das medicações, queixando-se de cansaço. Ao exame apresentava-se bradicárdico (FC: 52 bpm), porém sem alterações nos demais sistemas. Exames laboratoriais apresentaram TSH 0,05 (VR: 0,40 a 5,00 uIU/Ml); T4 L 0,82 (VR: 0,70 a 1,70 ng/Dl) e K 4,3 (VR: 3,5 a 5,1 mmol/L). Devido a normalização do T4 L e bradicardia, foi suspenso o Propranolol, ajustada a dose de Tapazol para 10 mg/dia e encaminhado o paciente para realização de dose ablativa de iodo. Em consulta posterior, após realização do tratamento definitivo, os exames revelaram TSH alto, T4 livre dentro dos padrões de normalidade, anti-TPO positivo e TRAb positivo: TSH 44 (VR: 0,40 a 5,00 uIU/Ml); T4 L 0,89 (VR: 0,70 a 1,70 ng/Dl); Anti TPO 980 (VR: < 15 U/ml); TRAb 2,0 (VR: Até 1,75UI/L); e K 4,9 (VR: 3,5 a 5,1 mmol/L). Paciente relatou que evoluiu bem e sem novos episódios de paralisia flácida e foi instituído tratamento com levotiroxina, por desenvolvimento de hipotireoidismo após iodoablação.

Através da descrição das manifestações clínicas e evolução laboratorial descrita na Tabela 1, tem-se a confirmação da hipótese diagnóstica de paralisia periódica hipocalêmica tireotóxica. A PPHT é uma doença de manifestação neuromuscular rara, caracterizada por episódios autolimitados e recorrentes, de paralisia do tipo flácida associado a graus variáveis de hipocalemia (VIEIRA BORGES1 et al., 2015). Essa doença faz parte do grupo das paralisias periódicas primárias, que têm em comum o aparecimento de crises de paralisia do tipo flácida e a possibilidade de causar morbidade e alteração da qualidade de vida (STATLAND et al., 2018).

A paralisia periódica hipocalêmica tireotóxica é uma complicação rara do hipertireoidismo, sendo a Doença de Graves a etiologia mais frequente dos pacientes com PPHT (MESEEHA et al., 2017). A presença do estado de tireotoxicose não é obrigatória para que ocorra paralisia periódica hipocalêmica, existindo portanto outros subtipos que desencadeiam essa manifestação (POLAMAUNG et al., 2020).

O paciente do caso, embora já tivesse diagnóstico prévio de hipertireoidismo, não estava realizando o tratamento e apesar de nem sempre os casos de PPHT necessitarem do estado de tireotoxicose para acontecer, o paciente em questão manifestou-se com o estado de tireotoxicose: hipertensão arterial sistólica, palpitações, arritmias e achados na US compatíveis.

A Doença de Graves é a principal etiologia da tireotoxicose, mas também pode estar associada a outras causas de hipertireoidismo como nódulos tireoidianos funcionais, bócio multinodular tóxico e tireotoxicose factícia (BAUTISTA-MEDINA et al., 2020). No caso em questão, a etiologia da tireotoxicose é a Doença de Graves, pois o paciente possuía diagnóstico anterior de hipertireoidismo associado aos achados clínicos, TSH supresso, T4 Livre aumentado, TRAb positivo e Anti-TPO positivo, ou seja, hipertireoidismo de origem autoimune. Segundo VIEIRA BORGES1 et al. (2015), apesar da Doença de Graves ser a mais relatada ao associar elevados níveis de hormônios tireoidianos e hipopotassemia, outras etiologias já foram relatadas, como o adenoma tóxico, tireoidite linfocítica, efeito Jodbasedow e tireotoxicose exógena.

Na maior parte dos casos, o paciente não tem diagnóstico anterior de hipertireoidismo. A manifestação clínica é silenciosa (descrição de sinais evidentes em 55% dos casos) e, caso a equipe médica não solicite os testes de função tireoidiana, o diagnóstico pode passar despercebido. Desta forma, o paciente pode ser submetido a desnecessários exames de imagem neurológicos para investigação, além da hospitalização que pode ser prolongada (FALHAMMAR; THORÉN; CALISSENDORFF, 2013).

No relato em questão, há divergência com a literatura pois o paciente possuía diagnóstico prévio de hipertireoidismo, mencionado no atendimento da emergência, bem como a menção ao abandono do tratamento, trazendo a PPHT como forte suspeita. No entanto, como há várias possibilidades de diagnósticos diferenciais, para a avaliação foi solicitada Tomografia Computadorizada de crânio na admissão da semi-intensiva, para excluir qualquer alteração neurológica.

As manifestações que facilitam a suspeita e o diagnóstico de PPHT são os sinais clínicos de hipertireoidismo, porém na maior parte dos casos relatados na literatura os achados variam de sutis a indetectáveis. Apenas cerca de 17% apresentam sinais evidentes e um terço tem história familiar ou pessoal de hipertireoidismo, como no caso do paciente descrito, que relatava história pregressa hipertireoidismo sem tratamento, ajudando na suspeita diagnóstica. Os sinais em geral são pele úmida, febre, bócio e taquicardia com pulsos amplos (HAKAMI; AHMAD; AL JOHANI, 2016).

Considerando a epidemiologia da paralisia periódica hipocalêmica tireotóxica, que acomete principalmente pacientes do sexo masculino, mesmo com a incidência maior de hipertireoidismo em mulheres, chegando a proporção homem/mulher de 17:1 até 70:1 (VIJAYAKUMAR; ASHWATH; THIMMAPPA, 2014). A faixa etária de início de apresentação da complicação varia dos 20 a 40 anos (CUI; ZHANG, 2022). O paciente do caso encaixa-se nas estimativas da literatura, sendo do sexo masculino e idade de manifestação aos 22 anos.

A maioria dos estudos sobre essa complicação demonstra que grande parte dos pacientes envolvidos são de origem asiática, mas tem crescido a quantidade de relatos que mostraram acometimento da TTPH por pacientes de outras origens, como hispânica, polonesa, africana. O paciente do caso é pardo, não apresenta origem asiática, que é a origem da maioria dos acometidos, o que chama atenção para casos em outras descendências. Desse modo, é necessário deixar os profissionais da saúde em alerta para maior suspeita dessa doença em pessoas de origem ocidental que se apresentam com paralisia do tipo aguda (VALADÃO et al., 2021).

O mecanismo da PPHT é justificado pela ocorrência de hipocalemia causada pelo influxo maciço de potássio para as células musculares. Essa grande entrada de potássio acontece devido ao hormônio tireoidiano biologicamente ativo que ao entrar livremente na mitocôndria gera grande quantidade ATP que vai abastecer a bomba de sódio potássio adenosina trifosfato. O aumento da atividade dessa bomba gera um grande influxo de potássio para dentro da célula muscular (SONKAR; KUMAR; SINGH, 2018).

Estudos mostram que pacientes acometidos por PPHT apresentam alterações genéticas nos genes que codificam os canais de cálcio. Alguns relatados são CACNA1s (Gene da subunidade S do canal de cálcio controlado por voltagem) relacionados com a Paralisia Periódica Tireotóxica 1 (THPP1), KCN18 (gene da subfamília J membro 18 do canal de potássio controlado por voltagem) relacionado a Paralisia Periódica Tireotóxica 2 (THPP2) e alteração no HOLPP2 (Canal de sódio controlado por voltagem por alteração no gene CACNA1s), sendo que a alteração mais prevalente na população caucasiana e brasileira é alteração no KCN18 (BAUTISTA-MEDINA et al., 2020).

Segundo VIEIRA BORGES1 et al. (2015), a PPTH tem como fatores desencadeantes a ingestão excessiva de carboidratos, exposição ao frio ou calor, situações de estresse, período menstrual, abuso de álcool, uso de algumas medicações específicas como broncodilatadores, infecção em curso e em alguns casos o fator desencadeante não é encontrado. No entanto, no relato descrito, não foi referido nenhum dos fatores desencadeantes citados anteriormente, mas o paciente fez referência à descontinuação da medicação para hipertireoidismo há 4 anos o que levou a um estado de tireotoxicose, comprovado pelos exames laboratoriais.

Segundo LIN; HUANG (2012), a explicação para que a ingestão excessiva de carboidratos seja um fator desencadeante, é que existe aumento dos níveis de insulina, deslocando potássio na célula. Isso se deve tanto a atividade intrínseca como a inserção na membrana da célula de bomba de sódio-potássio-ATPase. O fato de a PPHT acometer na maior parte dos casos o homem, justifica-se pela relação dos andrógenos no aumento da atividade da bomba através do receptor androgênico e do estado hiperadrenérgico. No entanto, precisa-se de mais trabalhos nessa área.

O exercício age como fator desencadeante, provavelmente pela liberação de potássio do músculo esquelético, enquanto no repouso ocorre influxo de potássio. Porém, independentemente de qualquer fator desencadeante que o paciente possa trazer consigo, percebe-se que pacientes com PPHT têm uma predisposição implícita para a ativação da bomba de sódio-potássio-ATPase (VIJAYAKUMAR; ASHWATH; THIMMAPPA, 2014). No paciente em questão, entende-se então que além da ação do próprio hormônio tireoidiano, desencadeado pelo abandono do tratamento, há uma predisposição subjacente de ativar a bomba de sódio-potássio-ATPase, que leva a hipocalemia.

O quadro clínico inicial de fraqueza muscular progressiva em membros inferiores, evolução para tetraparesia (fraqueza muscular dos quatro membros) e ausência de acometimento em outros sistemas, do paciente relatado, vai de encontro ao que a maioria da população, acometida por essa complicação, refere: quadro de fraqueza nas partes proximais das extremidades superiores e inferiores, ocorrendo raramente em região ocular, bulbar, intestino, bexiga e músculos da respiração (KHADKA et al., 2019).

Segundo CUI; ZHANG (2022), a fraqueza muscular ocorre predominantemente em membros inferiores, quando se compara aos membros superiores. De acordo com (KAEWKRASAESIN et al., 2019 ; FALHAMMAR; THORÉN; CALISSENDORFF 2013), verifica-se o início dos sintomas da paralisia em geral no período de descanso, a noite ou no início da manhã, acontecendo em 84% dos casos entre 01 e 06 da manhã, assim como o paciente em questão, que ao acordar sentiu déficit de força intenso.

Além do quadro clínico de fraqueza muscular, o paciente apresentou palpitações, dor torácica e tontura em consequência da arritmia que foi demonstrada através do eletrocardiograma que apresentou ritmo sinusal e períodos de bloqueio sinoatrial de segundo grau, intervalo QT prolongado (510 ms) com supra de ST em derivações precordiais direitas. De acordo com IRYANINGRUM et al. (2022), os achados de hipocalemia típicos no ECG são presença de onda U, alargamento do intervalo QRS, prolongamento do intervalo QT, taquicardia sinusal, taquiarritmias, bloqueio ou parada atrioventricular. Destes achados, o paciente do caso apresentou bloqueio atrioventricular (2º grau) e aumento do intervalo QT (510 ms), além de evoluir com parada sinusal.

Ainda de acordo com IRYANINGRUM et al. (2022), a tríade dos achados típicos da PPHT no ECG são taquicardia sinusal, intervalo QT – U prolongado e intervalo PR paradoxalmente alargado. No presente caso, o paciente apresentava apenas intervalo PR alargado (bloqueio atrioventricular), porém não apresentou taquicardia e presença de onda U, sugerindo uma apresentação atípica de PPHT no ECG. Segundo ME et al. (2020) em casos mais graves, o paciente pode evoluir para apresentações mais extremas como taquicardia ventricular e fibrilação ventricular ou assistolia. Portanto, condizente com o caso descrito, o eletrofisiologista recomendou manter os níveis de potássio acima de 4,5 mmol/L, pelo receio de evoluir para Torsades de Pointes, que é um subtipo de taquicardia ventricular, contribuindo ainda mais com a hipótese de PPHT e da necessidade de reconhecimento precoce, para evitar complicações fatais.

No caso descrito, foi alertada sobre a necessidade de manter imediatamente os níveis de potássio dentro dos padrões da normalidade pelo risco do paciente evoluir para taquicardia ventricular, apesar da raridade. No estudo de GHALYOUN et al. (2019), foi apresentado o caso de um paciente com paralisia periódica tireotóxica complicada com TV, descrevendo a raridade do caso, pois a TV não é comumente associada ao hipertireoidismo na literatura. Na maioria dos casos, arritmias cardíacas estão mais associadas a tireotoxicose e doença cardíaca preexistente.

A causa da formação do Torsades de Pointes ou da TV pode ser a hipocalemia, que leva a fibrilação e morte se não houver tratamento imediato. Nessa situação, ocorre aumento do potencial de membrana em repouso, duração do potencial de ação e do período refratário, elevando o risco de arritmias cardíacas (GHALYOUN et al., 2019). As alterações eletrocardiográficas ocorrem pelo distúrbio no equilíbrio iônico na PPHT em consequência do aumento, incompatível, da excitabilidade dos cardiomiócitos por meio da hiperpolarização do potencial da membrana em repouso (VALADÃO et al., 2021).

Além desses achados eletrocardiográficos, o paciente manifestou supra de elevação do segmento ST em derivações precordiais direita. Por esse motivo, o eletrofisiologista questionou uma possível Síndrome de Brugada. Essa síndrome é um distúrbio hereditário na eletrofisiologia cardíaca que aumenta o risco de síncope e morte súbita. O ECG típico da síndrome de Brugada pode ser desmacarado ou adquirido por fatores como estado febril, agentes vagotônicos, agonistas α-adrenérgicos, bloqueadores β-adrenérgicos, antidepressivos tricíclicos ou tetracíclicos, combinação de glicose e insulina, hipercalemia, hipercalcemia e por toxicidade de álcool, cocaína e um outro fator, que o paciente do caso tem, que é a hipocalemia (ANTZELEVITCH; FISH, 2006).

O paciente em questão não comunicou sobre história familiar de hipertireoidismo ou episódios semelhantes com a família. Por esse motivo, o diagnóstico diferencial com paralisia periódica hipocalêmica familiar é afastado, pois essa forma de acometimento é uma desordem de origem autossômica dominante, não estando relacionada aos níveis de hormônios tireoidianos e se manifestando, em geral, antes do indivíduo chegar aos 20 anos (ME et al., 2020).

Outrossim, um diagnóstico diferencial que pode ser afastado no caso é o de Miastenia Gravis, pois essa tem como manifestação inicial na maioria dos casos o envolvimento dos músculos oculares extrínsecos (ptose palpebral), evoluindo posteriormente para acometimento de músculos bulbares e de membros, diferente do paciente em questão, que apresentou inicialmente acometimento em membros. Além disso, a miastenia tem uma proporção de acometimento de mulher: homem de 3:1 na faixa etária abaixo dos 40 anos, contribuindo assim para afastar tal hipótese (JAYAM TROUTH et al., 2012).

O fato de a hipocalemia ser o achado mais marcante da PPHT e os achados de tireotóxicose serem sutis, a possibilidade de etiologias, que são gatilhos para hipocalemia, acaba vindo em questão. Dentre essas etiologias, tem-se aquelas consequentes ao aumento do deslocamento de potássio: intoxicação por bário, césio e cloroquina, aumento da produção de células hematopoiéticas, hipotermia, PPHT, paralisia periódica familiar e outros; hipocalemia por aumento de perdas gastrointestinais: vômitos, uso de laxantes, drenagem por sonda, outros; perdas urinárias: uso de diuréticos, hiperaldosteronismo, lesão tubular renal, uso de Anfotericina B e cisplatina e outros; causas raras: diminuição da ingestão de potássio, realização de plasmaférese, diálise. Entende-se então a infinidade de possibilidades que apresentam-se em comum a hipocalemia e dificultam o reconhecimento precoce e tratamento adequado (PATEL; LADAK, 2021).

Em razão da insegurança diagnóstica e devido aos sintomas da PPHT serem similares ao de diversas outras doenças, intervenções desnecessárias acabam sendo realizadas. A exemplo disso, tem-se a realização de procedimentos invasivos como a punção lombar, considerando hipóteses infecciosas e para afastar outras possíveis causas. No entanto na PPT, não é comum febre, rebaixamento do nível de consciência, fraqueza insidiosa e rigidez de nuca. Portanto, se existe a suspeita precoce de PPHT, são evitados procedimentos desnecessários e invasivos ao paciente e o diagnóstico é feito apenas com clínica e exames laboratoriais (ME et al., 2020).

Durante a investigação diagnóstica do paciente do caso, foi solicitado ultrassom de tireoide para facilitar no diagnóstico, apesar desse exame de imagem não estar indicado de maneira rotineira para avaliação de hipertireoidismo. Este pode ser útil no diagnóstico etiológico, pois a dopplerfluxometria da tireoide pode tanto auxiliar na diferenciação dos subtipos tireotóxicose por amiodarona como também diferenciar Doença de Graves de tireoidites. A US em geral é utilizada quando não se dispõe do exame mais indicado, que é a captação de iodo pela tireoide. Este exame permite diferenciar as causas de tireotóxicose que estão associadas ao aumento da captação, como Doença de Graves, bócio multinodular tóxico e adenoma tóxicos das causas de baixa captação, como tireoidite indolor, tireoidite subaguda, tireotóxicose iatrogênica, ingestão factícia de hormônios tireoidianos, metástases de carcinoma folicular da tireoide e outros (LUIZA MAIA et al., 2013).

Ao somar quadro clínico sugestivo com os baixos níveis de potássio, T3 e T4 séricos elevados e supressão do TSH, a hipótese de paralisia periódica hipocalêmica tireotóxica torna-se significativa. Aliado a isso, a remissão dos sintomas com a reposição de potássio e retorno do estado eutireoideo tornam a hipótese fortemente sugestiva (MESEEHA et al., 2017). Achados como hipofosfatemia leve e hipomagnesemia também são observados na PPHT (TELLA; KOMMALAPATI, 2015). O paciente em questão se apresentou com quadro clínico sugestivo associado a TSH suprimido e T4 Livre elevado e remissão total dos sintomas, após conduta de reposição de potássio e tratamento do hipertireodismo. No entanto, não foi encontrado hipofosfatemia e hipomagnesia nos exames laboratoriais.

A gravidade da paralisia periódica hipocalêmica tireotóxica, principalmente em relação a alterações na dinâmica cardíaca causando arritmias, se correlaciona diretamente com a gravidade da hipocalemia. Essa relação direta, no entanto, não existe com a gravidade clínica e bioquímica da tireotóxicose, ou seja, mesmo que o paciente não apresente sintomas exuberantes e bioquímica muito alterada, o quadro clínico pode ser grave e fatal (HAKAMI; AHMAD; AL JOHANI, 2016).

Apesar do paciente do caso já se apresentar na admissão com diagnóstico anterior de hipertireoidismo, não há muitas informações anteriores, portanto, a etiologia da doença teve que ser identificada. De acordo com BAHN et al. (2011), manifestação de TSH suprimido, T4 ou T3 aumentados e US mostrando aumento difuso da tireoide com fluxo difusamente aumentado, já são sugestivos de Doença de Graves, porém se o paciente apresentar oftalmopatia o diagnóstico já poderia ser fechado. Como o paciente não apresentou essa manifestação, deve ser seguida a investigação com a positividade na dosagem do anticorpo antirreceptor de TSH (TRAb). O paciente em questão apresentou TRAb positivo, como apresentado na Tabela 1 e a etiologia da tireotóxicose por Doença de Graves foi confirmada.

Reconhecida a paralisia periódica hipocalêmica tireotóxica, prontamente o seu tratamento deve ser iniciado com a reposição de potássio e essa deve ser administrada lentamente para evitar arritmias ventriculares e paralisia dos músculos respiratórios (SOW et al., 2020). O cuidado de se administrar lentamente essa reposição deve-se ao risco de hipercalemia de rebote, que pode acontecer em cerca de 40% dos pacientes. Além disso, quando se compara a reposição de potássio venosa com a oral, a recuperação é considerada mais rápida por via intravenosa (VIJAYAKUMAR; ASHWATH; THIMMAPPA, 2014). No caso em questão, após a reposição inicial de potássio, seus níveis passaram de 2,1 mmol/L para 6,7 mmol/L em apenas 6 horas, manifestando hipercalemia de rebote, porém sem complicações na sintomatologia. Por isso, foi recomendado durante toda a internação o controle de potássio.

Com relação ao uso de betabloqueadores, foi utilizado no paciente propranolol, porque o uso de betabloqueadores não seletivos mostram redução na frequência e gravidade, reduzindo sintomas neuromusculares por redução do deslocamento intracelular de potássio (MESEEHA et al., 2017). A dose utilizada de propranolol pode ir de 10 a 40 mg, de três a quatro vezes ao dia, e esta droga é a mais utilizada nesse contexto (ME et al., 2020).

A ação do propranolol na PPHT esgota a estimulação hiperadrenérgica da bomba de sódio-potássio-ATPase, que é um dos mecanismos mais bem relacionados a fisiopatologia da crise. Encontra-se inclusive casos relatados revertidos com a monoterapia com propranolol, utilizando altas doses (3 a 4 mg/kg), sem utilizar a reposição de potássio no tratamento e sem manifestação de hipercalemia de rebote. No entanto, a posologia de 20 a 40 mg da medicação, três a quatro vezes ao dia, é considerada eficaz (HAKAMI; AHMAD; AL JOHANI, 2016).

No tratamento do hipertireoidismo, foi utilizado na internação o Tapazol, que tem como princípio ativo o tiamazol. Essa medicação é considerada uma droga antitireoidiana (DAT), que possibilita o tratamento sem necessidade de intervenção cirúrgica ou exposição radioativa. Ela age inibindo a síntese dos hormônios tireoidianos. No acompanhamento ambulatorial posterior à internação, paciente evoluiu com T4 Livre dentro dos parâmetros da normalidade. Dando seguimento ao manejo do paciente, recomendou-se tratamento definitivo com dose ablativa de iodo (LUIZA MAIA et al., 2013).

A realização do tratamento definitivo é considerada quando há recidiva do hipertireoidismo após tratamento com as DAT, como no caso em questão, e também se há contraindicação ao uso de DAT e/ou cirurgia. É um tratamento simples, rápido e seguro e tem resposta satisfatória com desenvolvimento de hipotireoidismo ou eutireoidismo em 80 a 90% dos casos (LUIZA MAIA et al., 2013). Sendo assim, o paciente do caso apresentou resposta satisfatória ao tratamento definitivo por desenvolver hipotireoidismo, demonstrado pelos exames laboratoriais e sem mais recorrência de PPHT, quando foi iniciado o uso de levotiroxina.

6. CONCLUSÃO

O caso e as publicações levantadas ressaltaram a importância do diagnóstico precoce da paralisia periódica hipocalêmica tireotóxica, considerando-a como uma complicação incomum e grave do hipertireoidismo. Esta é uma condição reversível, mas de difícil reconhecimento e diagnóstico precoce, por apresentar sintomas pouco evidentes de tireotóxicose e por ser comumente relatado apenas na população asiática. Apesar do aumento de casos na população ocidental, o desconhecimento da doença em questão por profissionais da saúde ainda é muito frequente.

No entanto, o reconhecimento precoce e manejo adequado, no contexto da emergência, são imprescindíveis para prevenir desfechos desfavoráveis e potencialmente fatais causados pela hipocalemia grave, bem como pelo manejo inadequado. No caso descrito, no primeiro atendimento o paciente não foi diagnosticado e retornou posteriormente com piora do quadro, apresentando tetraparesia e arritmia grave que, após reconhecimento e manejo apropriado da equipe, apresentou melhora total do quadro e recebeu alta hospitalar com diagnóstico firmado e com tratamento adequado, evitando assim nova recorrência da patologia identificada.

Portanto, é fundamental compreender a doença, reconhecendo sua fisiopatologia pela ação dos hormônios tireoidianos em associação à influência da insulina e do estado hiperadrenérgico que geram uma maior ativação da bomba de sódio-potássio-ATPase, na membrana celular bem como e presença de diversos outros fatores desencadeantes. Ao mesmo tempo, é importante saber que a doença se manifesta como paralisia muscular flácida proximal e simétrica e achados de tireotoxicose sutis ou ausentes, além de alterações eletrocardiográficas, tais como arritmias cardíacas e exames laboratoriais mostrando hipocalemia e testes de função tireoidiana alterados.

O manejo adequado se dá através de suplementação de potássio de maneira cuidadosa e monitorada, para evitar hipercalemia de rebote, uso de betabloqueadores e definição de tratamento etiológico com medicamentos antireodianos, tireoidectomia cirúrgica ou terapia com radioiodo, evitando novas crises. Reconhece-se que o simples manejo e reconhecimento da doença muda de maneira significativa a evolução do paciente, evitando condutas iatrogênicas, procedimentos desnecessários, internação prolongada ou complicações potencialmente fatais.

REFERÊNCIAS

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¹Thâmalla Amaral Gonçalves
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²Luísa Abero Vale
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³Alice Lima Rosa Mendes
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4Joana Elisabeth Sousa Martins Freitas
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5Suely Moura Melo
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6Diego Batista de Montalvão Cunha
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