LOWER LIMB PARALYSIS AS THE MAIN SYMPTOM OF CANCER IN INFANTS: A CASE REPORT
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202410211248
Ana Luiza Camargo Pinto1
Bianca Rocha de Aguiar1
Luiz Antonio de Almeida e Silva2
Dania Lemos Dionízio2
Resumo
INTRODUÇÃO: O câncer na faixa etária pediátrica é uma grande preocupação de saúde pública. O diagnóstico precoce representa um desafio, por apresentar-se com um quadro clínico pouco específico. É crucial que os profissionais da saúde reconheçam as variadas manifestações da doença, aumentando as chances do diagnóstico precoce. RELATO: Trata-se de paciente, 7 meses, com quadro de perda de força e de sensibilidade, hiporreflexia e hipotonia progressiva ascendente em membros inferiores (MMII), bilateral. O paciente foi encaminhado ao serviço terciário, onde foram realizados exames mais específicos, e posteriormente, estabelecido o diagnóstico de neoplasia de sistema nervoso central. A criança foi a óbito três meses após o diagnóstico, devido a rápida evolução da neoplasia. DISCUSSÃO: Na faixa etária pediátrica, é fundamental realizar o diagnóstico precoce para identificar a doença em seus estágios iniciais. Essa abordagem é uma das principais intervenções que pode impactar positivamente o prognóstico do câncer em crianças, contribuindo para a redução da morbimortalidade. Os tumores do SNC, enfrentam desafios significativos em seu diagnóstico, pois a apresentação clínica varia de acordo com a localização, o tipo histológico, a taxa de crescimento e a idade da criança. CONCLUSÃO: O pediatra e os demais profissionais de saúde devem considerar a possibilidade de malignidade sempre que houver suspeita ou indício de neoplasia, pois um diagnóstico precoce pode influenciar positivamente a cura, além de melhorar a morbidade e a qualidade de vida desses pacientes.
Palavras-chave: neoplasias, diagnóstico precoce, sistema nervoso central, criança, câncer
Abstract
INTRODUCTION: Cancer in the pediatric age group is a major public health concern. Early diagnosis represents a challenge, as it presents a non-specific clinical picture. It is crucial that healthcare professionals recognize the varied manifestations of the disease, increasing the chances of early diagnosis. REPORT: This is a patient, 7 months old, with loss of strength and sensitivity, hyporeflexia and progressive ascending hypotonia in the lower limbs (LL), bilateral. The patient was referred to the tertiary service, where more specific tests were carried out, and the diagnosis of central nervous system neoplasia was subsequently established. The child died three months after diagnosis, due to the rapid evolution of the neoplasm. DISCUSSION: In the pediatric age group, it is essential to carry out early diagnosis to identify the disease in its early stages. This approach is one of the main interventions that can positively impact the prognosis of cancer in children, contributing to the reduction of morbidity and mortality. CNS tumors face significant challenges in their diagnosis, as the clinical presentation varies according to the location, histological type, growth rate and the child’s age. CONCLUSION: Pediatricians and other health professionals should consider the possibility of malignancy whenever there is suspicion or evidence of neoplasia, as an early diagnosis can positively influence the cure, in addition to improving the morbidity and quality of life of these patients.
Keywords: neoplasms, early diagnosis, central nervous system, child, câncer
1 INTRODUÇÃO
O câncer na faixa etária pediátrica é uma grande preocupação da saúde pública. Ele representa a segunda causa de mortalidade na faixa etária de 1 a 19 anos e corresponde a aproximadamente de 2 a 3% de todos os tumores malignos diagnosticados no Brasil. (HADAS, T. C. et al, 2014) (FRIESTINO, J. K. O.; CORRÊA, C. R. S.; MOREIRA, D. C., 2017)
As neoplasias infantojuvenis diferem em diversos aspectos daquelas que acometem os adultos, incluindo os locais primários, as origens histológicas e o comportamento clínico. Em pacientes pediátricos, elas tendem, em geral, a apresentar períodos de latência mais curtos, crescem na maioria das vezes mais rapidamente, tendem a ser invasivas, mas com uma melhor resposta à quimioterapia. Os tipos mais predominantes incluem: leucemias (28%), tumores do sistema nervoso central (26%) e linfomas (8%). (SILVA, D. B., 2021) (LEITE, C. Q. et al, 2023) O diagnóstico precoce do câncer pediátrico pode ser complexo e representa um desafio, por apresentar-se com um quadro clínico caracterizado por sinais e sintomas pouco específicos, sendo muitas vezes comuns à outras doenças da infância. Desta forma, no Brasil, muitos pacientes são encaminhados aos centros especializados, com a doença já em estádio avançado. (FERMO, V. C. et al., 2014)
Dentro deste contexto, é crucial que os profissionais da saúde, munidos de conhecimento técnico e científico, estejam atentos e reconheçam as variadas manifestações da doença e suas principais formas de apresentação, aumentando com isso, as chances do diagnóstico precoce.(FERMO, V. C. et al., 2014)
Este artigo tem como objetivo relatar o caso clínico de uma lactente de 7 meses em que a primeira manifestação clínica apresentada, foi uma paralisia inespecífica de membros inferiores, o que dificultou o raciocínio clínico até o diagnóstico definitivo da neoplasia.
2 RELATO DE CASO:
Criança, 7 meses, sexo feminino, previamente hígida, sem histórico pessoal ou familiar importante. Foi admitida em hospital de atenção secundária do Distrito Federal com relato de febre baixa, um episódio de vômito, prostração, além de perda de força e de sensibilidade, hiporreflexia e hipotonia progressiva ascendente em membros inferiores (MMII) bilateral, com quatro dias de evolução. Tinha relato de queda de aproximadamente um metro de altura, uma semana antes, que evoluiu sem complicações e sem sinais de alarme na ocasião.
A lactente foi internada para investigação e vigilância clínica e neurológica. Evoluiu com melhora da febre e dos demais sintomas, persistindo a paralisia e hipotonia dos MMII. Apresentava, ao exame neurológico, hipotonia, força grau 0 e sensibilidade ausente em membros inferiores bilateralmente, com reflexo patelar e cutâneo plantar ausentes, simetricamente.
A criança foi avaliada pela neurocirurgia, onde foram afastadas quaisquer sequelas do trauma.
Da mesma forma, foi vista também pela neuropediatria, que aventou hipóteses diagnósticas de Guillain-Barré (polineuropatia inflamatória aguda) ou Mielite transversa aguda pós-infecciosa. Ainda no serviço secundário, não foi possível a realização de tomografia computadorizada (TC) de neuroeixo, devido à indisponibilidade do exame no momento. Além disso, foram realizadas três tentativas de punção lombar, sem sucesso. A equipe médica responsável pela paciente decidiu por iniciar tratamento com imunoglobulina e aciclovir, com a finalidade de interromper possível ascensão dos sintomas neurológicos, após análise das hipóteses diagnósticas aventadas pela neuropediatria.
Durante o exame físico realizado na internação, identificou-se uma nodulação, de aproximadamente três centímetros, em região de flanco a direita, próxima a coluna lombar, indolor e sem sinais flogísticos locais. A ultrassonografia da região descreveu o achado como sugestivo de hematoma.
Devido à persistência dos sintomas, sem melhora clínica com o tratamento proposto e diante da impossibilidade da realização de novos exames complementares na unidade, a paciente foi transferida para um serviço de atenção terciária, específico em atendimento infantil, para manter seguimento com equipe especializada e para prosseguir com a realização de exames complementares mais específicos diante do quadro clínico apresentado.
Criança foi admitida no serviço terciário 10 dias após sua internação inicial, apresentando uma síndrome de déficit motor e sensitivo, em topografia de 2° neurônio motor, de etiologia a esclarecer. A eletroneuromiografia demonstrou comprometimento pré-ganglionar, com sinais de denervação. A ressonância magnética (RM) de neuroeixo, identificou uma volumosa lesão sólida e expansiva, heterogênea, apresentando componentes intraraquiano, intra-abdominal e paravertebral, de etiologia indeterminada.
A TC de abdome demonstrou uma lesão expansiva, em flanco direito, com infiltração em musculatura paravertebral direita, de T11 a L1, invasão do canal raquiano de L1 a L4, com envolvimento de partes moles contralateral de L3 a L5, infiltração do músculo psoas e iliopsoas com extensão até a raiz da coxa (Figuras 1 e 2). A ultrassonografia de rins e vias urinárias evidenciou elevação e rotação do rim direito causada pela lesão, sem acometimento de parênquima renal.
Foi realizada uma biópsia da lesão, que confirmou diagnóstico de neoplasia maligna de pequenas células hipercromáticas, com imunohistoquímica indicativa de tumor teratóide rabdóide.
A paciente evoluiu com paraplegia de membros inferiores, paresia de membros superiores, paralisia facial à direita, bexiga neurogênica, disfagia, hipertensão secundária à compressão renal e hidrocefalia. Evoluiu com piora clínica 45 dias depois, com franca progressão da neoplasia, sendo admitida em cuidados paliativos. O óbito ocorreu em enfermaria de oncologia pediátrica após três meses do diagnóstico.
3 DISCUSSÃO:
O câncer, em nível molecular, resulta de uma combinação de alterações hereditárias e adquiridas no genoma, que causam distúrbios no crescimento celular, falhas na diferenciação ou redução da apoptose. Muitos tumores pediátricos exibem características histológicas parecidas aos tecidos fetais em diferentes estágios de desenvolvimento, sendo considerados embrionários e apresentando grande diversidade morfológica. (SILVA, D. B., 2021)
Na faixa etária pediátrica, a prevenção primária do câncer é rara, pois os fatores ambientais têm pouca ou nenhuma influência. Não há medidas efetivas de prevenção primária para evitar o câncer nessa faixa etária. Por isso, atuar na prevenção secundária, especialmente no diagnóstico precoce, é crucial para identificar a doença em seus estágios iniciais. (SILVA, D. B., 2021) O diagnóstico precoce visa identificar a doença o mais cedo possível, com base nos sintomas e sinais clínicos apresentados. Dessa forma, constitui-se atualmente, numa das principais formas de intervenção que pode influenciar positivamente no prognóstico do câncer em crianças e adolescentes, reduzindo a morbidade e a mortalidade. O atraso no diagnóstico e, consequentemente, na iniciação do tratamento adequado, pode levar a inúmeras consequências desfavoráveis (INSTITUTO RONALD MCDONALD, 2020).
Diversos fatores podem influenciar o tempo entre o início dos primeiros sinais e sintomas e o diagnóstico do câncer em crianças e adolescentes, como o tipo de tumor, sua localização e a idade do paciente. Esse intervalo é conhecido como “lag time“. Diferentes tipos de câncer infantil apresentam variações no tempo de diagnóstico: o nefroblastoma e a leucemia costumam ser diagnosticados mais cedo, enquanto tumores do sistema nervoso central (SNC) e tumores ósseos são geralmente diagnosticados tardiamente. (REIS, P. K. R.; COSTENARO, R. G. S, 2017)
Os tumores do SNC, que representam o segundo grupo mais prevalente (17-25%), enfrentam desafios significativos em seu diagnóstico. (REIS, P. K. R.; COSTENARO, R. G. S, 2017) Em crianças mais novas, a dificuldade em descrever sintomas e a presença de sintomas inespecíficos podem confundir o quadro clínico e contribuir para o atraso do diagnóstico. A apresentação clínica desses tumores varia de acordo com a localização, o tipo histológico, a taxa de crescimento e a idade da criança. (RODRIGUES, K. E.; CAMARGO, B.,2003) A investigação inicial de um paciente com suspeita clínica de tumor do SNC, envolve exames de neuroimagem, como TC e/ou RM. Esses exames são essenciais para identificar a lesão e para o planejamento do tratamento. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2017)
A figura 1, traz um fluxograma de atendimento da criança com sinais de alerta para esse tipo de tumor, o qual faz parte do protocolo de diagnóstico precoce do câncer pediátrico, e auxilia o raciocínio clínico e a conduta mais adequada.
Figura 3: Fluxograma dos sinais de alerta para tumores do sistema nervoso central e retinoblastoma.
Fonte: Protocolo de diagnóstico precoce do câncer pediátrico, 2017
O tumor teratóide rabdóide atípico (TTRA), do caso clínico descrito, é uma neoplasia embrionária do sistema nervoso central (SNC), classificada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como tumor embrionário de grau IV, correspondendo a 1-2% dos casos de tumores malignos do sistema nervoso central. Ocorre mais comumente na infância e principalmente nos menores de três anos, sendo cerca de 20% dos tumores do SNC nessa faixa etária. Se trata de um tumor raro e agressivo, com diagnóstico difícil e com tempo de sobrevida muito curto, principalmente nas faixas etárias inferiores a três anos, não havendo protocolos específicos para o seu tratamento. (SANTOS, M. E. et al., 2022)
4 CONCLUSÃO:
Pode-se observar que o diagnóstico do câncer em pediatria constitui um grande desafio para os profissionais de saúde, devido principalmente às suas várias formas de apresentação clínica, que muitas vezes se assemelham a outras patologias, dificultando o diagnóstico final.
Por isso, é essencial que o profissional contextualize os achados clínicos e a história do paciente, bem como a idade, sexo, a presença dos sintomas, entre outros dados que possam auxiliar na condução correta do caso, para que o diagnóstico seja realizado de maneira rápida e eficaz. (INSTITUTO RONALD MCDONALD, 2020)
O pediatra e outros profissionais devem considerar a possibilidade de malignidade, sempre que houver uma suspeita, não somente pela gravidade da doença, mas também porque um diagnóstico precoce e um início rápido do tratamento, podem influenciar positivamente na cura ou mesmo na melhora da morbidade e qualidade de vida desses pacientes. Para isso, é fundamental que o acesso aos serviços especializados seja garantido e facilitado. (INSTITUTO RONALD MCDONALD, 2020) (MICHALOWSKI, M. B. et al., 2011)
No caso clínico apresentado, apesar da apresentação clínica incomum, o tempo entre o início dos sintomas, o encaminhamento ao centro de referência e o diagnóstico, foi adequado.
Infelizmente, o tipo de neoplasia da paciente era agressivo e sem possibilidade de tratamento curativo. No entanto, a importância do diagnóstico precoce contribuiu significativamente para melhorar a qualidade de vida da criança e proporcionar um melhor acolhimento à família.
REFERÊNCIAS
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HADAS, T. C. et al. Câncer pediátrico: perfil epidemiológico dos pacientes atendidos no serviço de oncologia pediátrica do Hospital de Clínicas da UFPR. Revista Médica da UFPR, v. 1, n. 4, p. 141-149, out./dez. 2014.
INSTITUTO RONALD MCDONALD. O diagnóstico precoce do câncer infantojuvenil e a atenção básica: estratégias e desafios para aumentar as chances de cura. 3. ed. Brasília: Fiocruz, 2020. Portal de boas práticas em saúde da mulher, da criança e do adolescente. Disponível em: <https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/biblioteca/o-diagnostico-precocedo-cancer-infantojuvenil-e-a-atencao-basica-estrategias-e-desafios-para-aumentar-as-chancesde-cura/>. Acesso em: 15 out. 2024.
LEITE, C. Q. et al. Oncologia pediátrica: princípios e práticas clínicas. Curitiba: Editora CRV, 2023.
MICHALOWSKI, M. B. et al. Diagnóstico precoce em oncologia pediátrica: uma urgência médica. Boletim Científico de Pediatria, Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul, v. 1, n. 1, p. 13-18, 2012.
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Protocolo de diagnóstico precoce do câncer pediátrico. Brasília, 2017. Disponível em: <https://www.inca.gov.br/publicacoes/livros/protocolo-de-diagnosticoprecoce-do-cancer-pediatrico>. Acesso em 15 out. 2024.
REIS, P. K. R.; COSTENARO, R. G. S. Fatores relacionados ao diagnóstico tardio das neoplasias na infância e adolescência. Disciplinarum Scientia. Série: Ciências da Saúde, Santa Maria, v. 18, n. 1, p. 111-121, 2017.
RODRIGUES, K. E.; CAMARGO, B. Diagnóstico precoce do câncer infantil: responsabilidade de todos. Revista da Associação Médica Brasileira, São Paulo, v. 49, n. 1, p. 29-34, jan./fev. 2003.
SANTOS, M. E. et al. Relato de caso: Tumor teratoide rabdoide atípico em criança de 2 anos. Studies in Health Sciences, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 1575-1583, jul./set. 2022.
SILVA, D. B. Epidemiologia e diagnóstico precoce do câncer infantojuvenil. Documento Científico. Sociedade Catarinense de Pediatria, set. 2021.
1 Graduada em Medicina pelo Universidade Evangélica de Goiás (Unievangélica). Av. Universitária, s/n – Cidade
Universitária, Anápolis – GO. CEP: 75083-515. E-mail: analuizacamargo07@gmail.com
1 Graduada em Medicina pela Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS). SMHN Conjunto A Bloco 01 Edifício Fepecs – Asa Norte, Brasília – DF. CEP: 70710-907. E-mail: brdeaguiar@gmail.com
2 Especialista em emergência pediátrica pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). E-mail: luizevilci@gmail.com
2 Mestranda em Ensino de Ciências e Saúde. Universidade do Grande Rio (UNIGRANRIO/UNICEPLAC). SIGA Área Especial para Indústria Lote 2/3, Sce St. Leste Industrial – Gama, Brasília – DF, 72445-020. E-mail: danialemoshrt@gmail.com