Panorâmica histórica e problemática da filosofia latino–americana

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12601168


Neuzimar Santana Campos e Silva[1]


Resumo: O presente ensaio, constitui-se numa investigação a partir do campo teórico da História da Filosofia Latino-Americana. Tendo por objetivo contextualizar a história das ideias filosóficas latino-americanas e seus principais problemas. O método de abordagem consistiu em pesquisa bibliográfica e documental a partir de um vocabulário inspirado nas categorias: colonização, opressão, ética, história e filosofia política. A temática justifica-se, do ponto de vista curricular, pelo fato desse tópico estar presente em poucos cursos de filosofia no Brasil. Ademais, esse assunto é relevante, tendo-se em vista a necessidade de se fortalecer uma identidade própria, além do direito à autonomia de pensamento que perpassa a trajetória histórica da própria filosofia desde suas origens. O principal resultado obtido foi: a percepção de que a colonização da América Latina não implicou somente na conquista de suas terras e de seus habitantes, mas no silenciar de um logos originário e, consequentemente, da filosofia latino-americana em sua totalidade.

Palavras-chave: História da filosofia latino-americana;  Filosofia latino-america; Colonização.

ResumEN: Esa investigación científica, hecha en el Curso de Filosofía de la Universidad Católica Don Bosco, es una investigación en el campo de la Historia del Pensamiento Latinoamericano, sobre el origen de la Filosofía de la Liberación según Enrique Domingos Dussel. Los objetivos fueron: a) analizar el sentido de la Filosofía de la Liberación; b) contextualizar la historia del pensamiento filosófico latinoamericana y su principales temas; c) definir la Filosofía de la Liberación e investigar el currículo de su nombre más relevante; d) investigar el origen de la Filosofía de la Liberación de acuerdo con el filósofo argentino Henrique Domingos Dussel. El método de abordaje consistió en pesquisa en libros y documentos basado en las categorías: colonización, opresión, ética, historia y filosofía política. La temática es importante porque el asunto está ausente del currículo de muchos cursos de filosofía brasileños y hay que desarollar una identidad propia. La principal conclusion fue: la colonización de América Latina no fue solamente la conquista de sus tierras y su pueblo, pero el silenciar de sus palabras.

PALABRAS-CLAVE: Historia de la filosofía latinoamericana; Filosofia latinoamericana; Colonización.

ABSTRACT: This paper, developed at the Catholic University Dom Bosco, is a research about the American philosophy and its beginning by the philosopher Enrique Domingos Dussel. Its objectives is: a) analyzing the Dussel’s conception about the Liberation’s Philosophy; b) contextualizing the History of American Philosophy and its themes; c) defining the Liberation’s Philosophy and its beginner; d) investigating the start of Liberation’s Philosophy by the Henrique Dussel. The method consisted in bibliographical and documental researching from the categories: colonization, oppression, ethic, history and political philosophy. The thematic is very important because many courses don’t study this subject in Brazil. The results were: the perception that Latin America colonization only didn’t imply in the conquest of her lands and her people, but in the silence of their words.

KEYWORDS: History of American philosophy; Liberation’s philosophy; Scholasticism.

Introdução

O presente ensaio aborda as correntes filosóficas e propõe um modelo de periodização desenvolvido por Ricardo Vélez Rodríguez e Constança Marcondes César para a História da Filosofia Latino-americana. Os autores desenvolvem o raciocínio de que o pensamento latino-americano mantinha características de originalidade desde o século XVI, período colonial.

O professor Ricardo Vélez Rodríguez, em sua palestra proferida em 07 de março de 1996, com o título: A Filosofia em Ibero-América, apresenta três problemas abordados pela filosofia contemporânea na América Latina, a saber: o primeiro relativo ao método de estudo, em seguida a do arquétipo da totalidade e o da integração (RODRÍGUEZ, 1996, p.19).

Assim sendo, frente ao primeiro problema, Vélez apresenta três tendências sustentadas pelos filósofos latino-americanos na qual um grupo de pensadores nega a originalidade filosófica desse continente e outro grupo que defende a ideia de uma originalidade total da filosofia em terra de índios e uma parcela de pensadores, que defendem uma originalidade filosófica relativa.

Em seguida, apresenta o segundo problema em que busca mostrar as duas vias que têm enveredado os pensadores da América Latina, que encara a cultura ibero-americana como totalidade arquetípica em uma realidade hermenêutica e a via que defende uma atitude crítica frente à abordagem totalizante.

A respeito do terceiro problema, Rodríguez (1996, p. 19), expõe quatro concepções da integração proposta pelos pensadores latino-americanos. Nesse sentido, a pergunta subjacente à sua conferência é a seguinte: é possível uma filosofia genuinamente latino-americana?

Vários são os pensadores que buscaram responder tal interpelação. Nesse sentido, é válido frisar que subjaz uma dicotomia de opiniões frente a tal interrogativa.

O primeiro filósofo apresentado por Rodríguez a negar a originalidade de uma filosofia genuinamente latino-americana é o brasileiro Clóvis Bevilacqua, que sustenta que os brasileiros limitam-se somente em copiar o pensamento europeu sem possuir uma escola própria de filosofia (Rodríguez, 1996, p.20).

Opinião semelhante é a do filósofo colombiano Fernando González Ochoa (1895-1964), que acredita ser impossível falar de uma filosofia puramente latino-americana, uma vez que “quem é colônia por dentro concebe a liberdade como câmbio de dono” (Rodríguez, 1996, p.20).

Contrário à posição de Bevilacqua e de Ochoa é a reflexão do brasileiro Ricardo Gomes, que sustenta ser possível a elaboração de uma filosofia altamente latino-americana e original partindo sempre da própria realidade de América Latina e esquecendo a filosofia europeia. Gomes frisa que: “[…] do ponto de vista de um pensar brasileiro, Noel Rosa (compositor brasileiro) tem mais a nos ensinar do que o senhor Immanuel Kant, uma vez que a filosofia, como samba não se aprende no colégio” (GOMES, 1980, p. 107).

Augusto Salazar Bondy (1925-1974), filósofo peruano, acreditava que a América Latina, sendo um continente subdesenvolvido, somente possuiria uma filosofia própria, quando superasse as causas do atraso do seu desenvolvimento pleno.

O filósofo mexicano José de Vasconcelos, acredita que o povo latino-americano não pode roubar a sua própria filosofia utilizando-se do legado cultural ocidental.

Já o filósofo peruano José Carlos Mariátegui (1894-1930), acredita não haver um pensamento filosófico hispano-americano. Entretanto não nega a possibilidade do surgimento de tal pensamento puramente hispano-americano.

Para o pensador peruano Francisco Miró Quesada (1918), é indiscutível a construção de uma filosofia genuinamente latino-americana. Ele acredita que existem duas vias de construção, a saber: daqueles filósofos que pensam desde a América Latina, os problemas universais da filosofia, e os filósofos que pensam desde a luz da filosofia universal, os problemas do homem latino-americano.

Segundo Miró Quesada, o pensar desde a filosofia universal os problemas do homem da América Latina tem se realizado pela terceira geração de pensadores latino-americanos do século XX, uma vez que a primeira geração foi a dos “patriarcas” ou “fundadores”, que discursaram pela primeira vez acerca da filosofia americana. Dentre os “patriarcas” destacaram-se: J. B. Alberd, A. Korn, J. E. Rodó, Farias Brito e José de Vasconcelos, dentre muitos outros.

Assim sendo, a segunda geração foi a dos “consolidadores” ou “forjadores” que buscaram formular a problemática da originalidade de tal filosofia.

Rodríguez apresenta como sendo pensadores forjadores: F. Romero, C. Astrada, N. de Aquin, J. de Figueiredo, A. Amoroso Lima, J. C Mariátegui, S. Ramos, dentre outros.

Dito isso é justamente a terceira geração de pensadores latino-americanos, que realiza o ideal perfazendo os dois trajetos apresentados. Essa geração caracteriza-se por ser “técnica”, tendo os seus membros nascidos na segunda década do século XX. Eles assumem e continuam o projeto das gerações antecessoras, tendo como vantagem a sistematização da filosofia como disciplina, o que favorece para a construção de uma filosofia autêntica (Rodríguez, 1996, p.23).

Assim sendo, fazem parte da terceira geração de filósofos latino-americanos: Miró Quesada, R. Frondizi, V. Fatone, C. Casio, J.A. Vásquez, E. Pucciorelli, A. Vasallo, Miguel Reale, O. N. Derisi, Leopoldo Zea, José Gaos, Antonio Paim, C.B.Gutiérrez e Alexandre Correia. Dentre esses pensadores, ainda poder-se-ia incluir Enrique Dussel (Rodríguez, 1996, p.23).

Dando continuidade à apresentação, Leopoldo Zea (1974) afirma ser possível falar de uma filosofia latino-americana como uma filosofia “sem mais”, ou autêntica filosofia.  Tal filósofo acredita que pelo fato do homem latino-americano ser também homem estão dotados da capacidade para pensarem filosoficamente, sistematicamente. Fundamentados nos filósofos europeus, o homem da América Latina partiu para a discussão da problemática que o preocupava: a liberdade. À luz dos pensadores europeus, os latino-americanos foram percebendo a necessidade de se libertar do colonialismo e concomitante do neocolonialismo.

Nesse sentido, foi justamente na busca da negação da servidão, que os pensadores latino-americanos foram percebendo lampejos daquilo que poderia ser chamado de uma autêntica filosofia da história do latino-americano, forma essa que prevalece no continente em questão. Zea chamou tal forma de “filosofia sem mais”, pois responde à pergunta fundamental do ser humano pelo próprio sentido do seu ser.

Leopoldo Zea, resumidamente, apresenta a sua concepção a respeito da filosofia latino-americana:

resumindo, poderíamos dizer que a nossa filosofia, inegável filosofia, partiu e parte da consciência de servidão e da dependência imposta pelos interesses de outros homens […]. É o mesmo homem que, sem deixar de sê-lo, toma consciência da sua servidão para transformá-la em liberdade, sem deixar por isso de ser o mesmo homem concreto que aspira a ser livre. Tudo isso decorre de uma filosofia da história expressa nessa história da filosofia latino-americana. Filosofia da história que, ao tomar consciência da servidão e da dependência, transforma-se numa filosofia sem mais, que projeta pôr fim à servidão e à dependência impostas ao longo dessa história. Filosofia da libertação, que é, enfim, a preocupação de toda filosofia, mas que nessa nossa América apresenta-se como preocupação central” (ZEA, 1986, p.127).

Ainda nesse sentido, Enrique Dussel (1977), frisa ser possível uma filosofia latino-americana como uma filosofia da libertação. Para Dussel, é preciso construir um novo discurso filosófico, que tenha como ponto de partida os “dominados da terra”, aqueles que estão na periferia, fora do sistema (Rodríguez, 1996, p.25).

Torna-se necessário ressaltar que a construção desse novo discurso que parte do oprimido, que é da periferia, utiliza-se de uma linguagem do centro, provindas das filosofias hegeliana, heideggeriana, husserliana e marxista.

Enfim, o ápice da filosofia da libertação de Enrique Dussel é justamente a libertação das classes oprimidas do sistema imperialista vigente.

1. escolástica

Um dos primeiros períodos da Filosofia na América Latina foi a Escolástica.[2] Interessante anotar que tal corrente filosófica implantada na América Latina fora de matriz espanhola e portuguesa, como atesta Constança Marcondes Cesar (1988, p. 09) em sua obra Filosofia na América Latina. Foi justamente até meados do século XVIII que os países latino-americanos, sentiram o peso do pensar escolasticamente.

Segundo a filósofa Cesar (1988, p. 09), os países latinos – americanos que bem assimilaram o pensamento filosófico foram: Peru, Uruguai, Argentina, México e Brasil. Dentre esses países, o Peru foi o maior no processo de incorporação da filosofia escolástica.

Neste sentido, a filosofia medieval que chegou a nosso continente, era ensinada e divulgada por meio dos grandes colégios confessionais do meado do século XVII e os jesuítas, muito contribuíram para a implantação e divulgação da escolástica em terra de índios. Cesar (1988), ainda nos informa, que as universidades também estavam surgindo e concomitante era mais um dos lugares em que se divulgava a filosofia escolástica.

A Universidade Nacional Maior de São Marcos – Lima criada em 12 de junho de 1551[3], a Universidade Nacional de Cuzco no Peru e muitas outras foram grandes centros do ensino da escolástica medieval. Frente a tal afirmação, se faz necessário perguntar: quais eram os filósofos que se ensinava nos séculos XVI, XVII, XVIII na América Latina?  Sabemos que Compunham o quadro dos pensadores trabalhados nos grandes colégios dos jesuítas: Santo Agostinho (354-430), Tomás de Aquino (1225-1274), Duns Scotus (1265-1308), Santo Anselmo (1033/1034-1109), etc. Logo, podemos concluir que o período da escolástica coincide com a fase da catequização do homem latino-americano.

Assim sendo, a divulgação desenfreada das ideias dos filósofos acima referidos, não permitiram com que ideias genuinamente latinas – americanas se consolidassem, no mundo escolástico imposto aos indígenas. Constança Marcondes Cesar (1988) esclareceu que em tal fase da história da filosofia na América Latina, a contribuição do homem latino-americano ao cenário filosófico da época é pouquíssima.

Segundo o filósofo peruano, Augusto Salazar Bondy[4], no século XVI, os principais divulgadores da filosofia escolástica em solo latino, era os espanhóis: Frei Rafael de Seguro, Frei Ivan de Lourenzanço, dentre outros. Eram emissores da corrente tomista que teve uma maior aceitação por parte dos filhos da corte. Interessante informar, que a Filosofia não era ensinada para os nativos, mas sim para os filhos dos nobres, para eles, os colégios, as universidades, as solenidades. Tais religiosos ensinavam a classe dominadora a filosofar. Aos nativos cabia o papel de somente obedecer, porém a base de “fogo e ferro”.

Já no Brasil, a Escolástica vigorou até 1773, os colégios dos religiosos eram também os grandes centros da divulgação do pensamento escolástico. Cesar (1988, p.11), afirma que os colégios: da Bahia (fundado em 1556), do Rio de Janeiro (1567), de Nossa Senhora da Luz, no Maranhão (1652); de Santo Alexandre no Pará; de Santo Inácio, em São Paulo (1554); de São Miguel, em Santos; de Nossa Senhora do Terço, em Paranaguá (São Paulo); de Nossa Senhora do Ó, em Recife (1678), foram os maiores centros da divulgação do pensamento escolástico em solo brasileiro.

Ainda no Brasil, diferente do Peru, houve uma produção filosófica elaborada pelo então Pe. Manuel de Nóbrega que denunciava os maus tratos sofridos pelos índios, que por aqui já existiam desde antes da implantação da escolástica. O Pe. Antônio Vieira, também saiu na defesa dos excluídos do período colonial.

2. ilustração

Seguindo o itinerário da História da Filosofia na América Latina, construído pela filósofa brasileira Cesar (1988), o segundo período da filosofia que a pesquisadora apresenta é a Ilustração.

É sabido que na modernidade, Immanuel Kant (1724-1804) foi um dos grandes promotores do iluminismo. Tal afirmação procede do seu opúsculo, “Resposta à Pergunta: o que é o iluminismo?” Ou, na língua germânica: Aufklärung[5].

Essa proposta libertadora kantiana chegou também em terras latino – americana. E, a partir dessa proposta de “pensar por si só”[6], que os filósofos na América Latina especificamente no Peru, iniciaram o processo de rompimento com a escolástica. Sabe-se do potencial polêmico da ilustração contra as filosofias anteriores. Estes embates também se transferiram em grande parte para a América Latina. Segundo Cesar (1988, p.12), até mesmo entre os defensores do pensar escolástico da época, com o advento da ilustração em terra peruana, causou uma enorme crise entre os lideres escolásticos. Prova de tal reviravolta foi a publicação da obra dos padres jesuítas: José de Aguilar (1635-1705) e Nicolás de Olea (1635-1705) ambos grandes conhecedores de Giordano Bruno, Galileu Galilei e Campanella.

Em sua obra “A filosofia na América Latina” (1988, p.13), Cesarafirma que o ápice da ilustração no Peru se deu no século XVIII. As divulgações das obras iluministas, tanto francesa, quanto alemã e inglesa contribuíram para a configuração do iluminismo no Peru.

Assim sendo, a revolta contra a escolástica no Peru, teve eximia contribuição de professores leigos que divulgavam nas antigas escolas – nos moldes da escolástica – obras do físico Newton, de Copérnico, de Descartes, de Voltarie, de Diderot, e muitos outros pensadores, que pudessem contribuir para a expulsão da escolástica.

Um acontecimento que bem nos elucida a insatisfação dos pensadores peruanos com a escolástica, foi à expulsão dos jesuítas do Peru em 1767. Com tal atitude, o Peru abandona a “Suma teológica”,A Cidade de Deus”, “Proslógion”, dentre outras, e passam a ler Kant, Locke, Newton, Diderot, Rousseau, Lavousier e textos que ridicularizavam a antiga escolástica. Nessa linha, é possível dizer que houve inúmeros embates pela filosofia latino-americana.

Além do Peru, Cuzco, Arequipa e Lima, aderiram às ideias da ilustração, postura que mais tarde contribuiu para a consolidação de uma filosofia genuinamente latino – americana.

Nesse sentido, assim como o “Manifesto do Partido Comunista” de Marx e Engels, está para os comunistas e socialistas, a obra “Mercúrio Peruano” está para todos aqueles que não se intimidam em questionar a tradição. E essa tradição era a própria escolástica.

O anúncio do pensar por si mesmo de Kant, despertou nos peruanos interesse pelo autogoverno. Ou seja, a busca racional pela autonomia, expressa na proposição sair da minoridade kantiana teve desdobramentos revolucionários e republicanos na América Latina. Não foi coincidência o fato de que nas mesmas universidades onde surgia a filosofia latino-americana também se constituiu núcleos revolucionários que lutaram pela independência da Espanha, caso concreto de San Antonio Abad de Cusco, entre outras.

A professora Constança Marcondes Cesar (1988), apresenta como sendo os maiores defensores da ilustração em solo peruano os seguintes nomes: Hipólito Unanue (1755-1833), jornalista, cientista, escritor político e intelectual, o mesmo era uma exímio conhecedor da filosofia de René Descartes e Newton. Outros nomes que aparecem na lista da referida educadora são os de José Baquijanoy Carillo (1751-1818), e Pablo de Olavide (1725-1803), ambos pesquisadores dos iluministas Voltaire e Diderot. Os ditos “arautos” do iluminismo no Peru, todos tiveram uma certa ligação com a Sociedad de Amantes del País.

Já no século XIX, além do iluminismo – que revolucionou alguns países latino-americanos – o cartesianismo, sensualismo e outras correntes filosóficas próprias do século se encontravam no Peru do século XIX.

Assim sendo, a novidade da ilustração na América Latina foi tamanha que no Uruguai a partir de 1840 os estudantes membros da “Associação de Maio”, estudavam os principais nomes da ilustração. A Universidade de Montevidéu – criada em 1849 – fora o palco da divulgação das ideias iluministas.

Na Argentina, a escolástica configurou-se de uma forma tal, contribuindo para o surgimento do cartesianismo tardio. Mariano Ignácio Velazco, Coyetano Rodrigues são autores que divulgavam incansavelmente o cartesianismo em solo argentino.

Neste sentido, com veia cartesiana instalada na Argentina, o racionalismo por necessidade lógica, deságua no iluminismo argentino. Os argentinos influenciados por Desttut de Tracy (1754-1836), Cabanis e Condillac (1715-1780), elaboraram a ideologia argentina, na qual os maiores expositores da dita ideologia foram: Juan Crisóstemo Lafinur, Juan Manoel Fernandez de Aguero e Diego alcorta.[7]

Segundo Cesar (1988), no Brasil a ilustração vai do final do século XVIII (1773) ao primeiro quartel do século XIX (1822) que representa o fim do colonialismo, ou seja, já se fazia 14 anos da chegada da família real ao Brasil. Em solo brasileiro, os mais notáveis divulgadores e defensores da ilustração foram, o Pe.Francisco Luís Leal, Tomás Antônio Gonzaga, Mathias Aires e Feliciano Souza Numes.[8]

Os movimentos tidos como libertários, por exemplo: a “Inconfidência Mineira”, e até mesmo a busca pela “Independência do Brasil” tiveram estreita relação com a ilustração em terras brasileiras. A mesma autora nos diz em sua obra: “Filosofia na América Latina”, que os vários movimentos que buscavam a libertação do julgo do colonialismo, e propagavam as ideias de independência eram nutridos pelo pensamento iluminista.

3. ecletismo

Durante o iluminismo ocorreu a busca incessante pelo exercício da razão, na qual a Ilustração é um dos maiores paradigmas. No período em que predomina o ecletismo a filosofia depara-se com uma sociedade em processo de evolução, no campo filosófico, político, científico e tecnológico na América Latina do século XIX. Por outro lado, há que se considerar que esse desenvolvimento industrial ocorreu apenas no Brasil, Argentina e México como bem formulou o historiador da América Latina Pierre Chaunu (1979).

Segundo Cesar (1988) vários movimentos filosóficos estavam em alta no Peru. Dentre esses movimentos, sobressaíram-se: o romantismo, o ecletismo e o sensualismo[9]. No campo político percebe-se grandes embates entre monarquistas, conservadores, republicanos e liberais. Cesar (1988) ao fazer referência a Augusto Salazar Bondy, afirma que em meio a esse “fogo cruzado” no campo da política, algumas personalidades destacam-se. Entre os liberais que mais gozavam de prestigio estavam: Benito Lasso (1783-1862), Francisco de Paula González Virgil (1792-1875), Pedro Gálvez (1822-1878), José Gálvez (1819-1866) e Sebastián Lorente (1813-1884). Dentre os conservadores a autora apresenta José Ignácio Moreno, José Maria de Pando (1787-1840) e Bartolomé Herrera (1800-1864).

O embate ideológico-político-filosófico no Peru no “segundo e terceiro terços do século XIX” abrange também o universo do saber. De um lado conservadores, que se digladiam contra o empirismo de Hume, mas que estão intimamente ligados com o liberalismo peruano. Para Cesar (1988), o liberalismo no Peru, sofreu forte influência do filósofo francês Èttiene Bonnot de Condillac, progenitor de umas das correntes filosóficas presentes no Peru conhecida por sensualismo. Importante frisar, que o liberalismo corrente no Peru do século XIX, sofreu grande influência ainda dos ideólogos franceses: Antoine-Louis-Claude Desttut de Tracy (1754-1836) e do fundador do utilitarismo Adam Smith (1723-1790).

Dito isso, com advento de 1840, a corrente filosófica conhecida por empirismo juntamente com o sensualismo – até então predominante na sociedade peruana – é substituída por uma nova corrente filosófica denominada por ecletismo. Cesar (1988) afirma que o ecletismo no Peru se inspirou no filósofo francês Victor Cousin (1792-1867), que também foi historiador e membro da Academia Francesa de Letras.

No Uruguai de 1840, o pensamento que estava maximizado é a filosofia argentina defendida e propagada pela Associação de Maio e a filosofia francesa representada pelo pai da filosofia moderna, René Descartes (1596-1650). Já na segunda metade do século XIX (entre1870-1880) segundo Cesar (1988), o krausismo[10] e o ecletismo, buscam refutar o evolucionismo.

Cesar (1988) afirma que, entre 1870 e 1900, os pensadores Luis José de La Peña e Placido Ellauri, ambos professores universitários, difundiram entre seus estudantes o espiritualismo racionalista de Cousin. A Igreja Católica – defensora do espiritualismo católico – logo reagiu e mais uma vez ocorreram embates ideológicos, porém, desta vez, de um lado, os pensadores de matriz espiritualista racionalista e de outro, a Igreja Católica Apostólica Romana. Ambos os grupos lutando pela hegemonia do pensamento.

Como consequência da assertiva acima, em 1875 percebe-se uma crise do espiritualismo racionalista, até então de matriz cousiniana[11], substituída pela filosofia de Paul Janet e o Krausismo aparece em obra do então filósofo Prudêncio Vásquez y Veja.

4. positivismo

Após o período do ecletismo que teve uma duração de aproximadamente trinta e cinco anos (entre 1840-1875), na América Latina, especialmente no Peru, inicia-se um novo período filosófico conhecido por Positivismo[12]. O nascente Estado nacional na América Latina necessitava ser ordenado. Na ótica burguesa, essa ordenação social, precisava associar-se a uma filosofia de caráter científico, útil ao conservadorismo criollo[13] e que continua a subserviência ao logos europeu, comum na fase anterior da escolástica.

Cesar (1988) nos apresenta Ángel Floro Costa, como sendo um grande divulgador do positivismo em países latino-americanos, especificamente no Uruguai.

Com o advento do positivismo, novos autores foram sendo introduzidos no espaço intelectos (espaço intelectual) da América Latina. Entre esses novos pensadores, destacamos o pai do evolucionismo, Charles Darwin (1809-1882), Herbert Spencer (1820-1903) – exímio admirador dos escritos de Darwin. Podemos perceber que o cientificismo naturalista está em alta no período denominado por positivismo na América Latina. Cesar (1988), ainda nos informa que o positivismo no Uruguai também influenciou o modo de pensar no âmbito da educação, da política, da literatura e concomitante, a forma de pensar na religião.

O positivismo na América Latina, sobretudo no Uruguai, foi superado a partir do ano de 1895. Na Argentina (séc.XIX), os tradicionalistas reagem ao racionalismo cartesiano que há muito tempo vinha reinando em terras argentinas. Influenciados por diversos autores entre os quais destacamos: De Bonald, Lammmeneais, de Maïstre, Donoso Cortez, dentre outros, nasce na Argentina uma terceira Escolástica.[14] Cesar (1988) sustenta que o espaço para a divulgação dessa terceira escolástica na Argentina é justamente o Ateneu de Córdoba e a Academia da Prata. Compõem esses meios de comunicação os jornais e revistas, como sendo meios para a divulgação da nova corrente filosófica na Argentina.

Em meio à reação dos tradicionalistas argentinos ao cartesianismo, como havíamos dito acima, transcorre paralelamente a tal reação ao movimento eclético sob influência dos cousinianos e do filósofo Jouffroy. Cesar (1988) atesta que o mais importante filósofo desse período foi Juan Bautista Alberdi (1810-1884) influenciado pela filosofia de Cousin, de Jouffroy, de Chateaubriand e de Vico, reflete acerca do sentido da filosofia e apresenta uma proposta de uma filosofia americana. Ainda, na mesma perspectiva de pensamento de Juan Alberdi, encontramos Vicente Fidel López (1815-1903) e Juan Maria Gutiérrez (1809-1878).

O Krausismo também ganhou espaço na Argentina com Luís Cáceres (1828-1874). Em Córdoba, Telasco Castellanos (1815-1903) foi o divulgador do dito movimento filosófico. É importante salientar, que Cesar (1988) apresenta uma quantia significativa de filósofos que contribuíram para o desenvolvimento filosófico de cada período na América Latina até aqui destacados.

Dentre a diversidade de autores, encontramos vários “sub-movimentos filosóficos” que fizeram presente ao longo da sistematização de cada filosofia nos diversos países latino-americanos.

Cesar (1988, p. 19) acredita que o movimento filosófico, que mais enfatizou a laicização do filosofar e o ‘racionalismo imanentista’ argentino foi o positivismo.

Neste sentido, ao comando de Comte, Darwin, Stuart Mill, Haeckel, Benthan e Spencer, o positivismo se configura na Argentina. Nota-se uma significativa adesão ao evolucionismo darwiniano, tendo como o representante mor, Florentino Ameghino (1854-1911). O positivismo de inspiração comtiana na Argentina do século XIX atinge principalmente a educação, a ética, a filosofia social, mediante a Escola Normal do Paraná.[15] Tendo como o autor referencial, Alfredo Ferreira (1863-1938). É justamente esse autor, que fundará com a ajuda de Máximo Victória (1870-1934) e Víctor Mercadante (1870-1934), o Comitê Positivista. Compõem o grupo dos positivistas argentino, Pedro Scalabrini (1848-1916), Leopoldo Herrera (1864-1937), Alejandro Carbó (1862-1930), Ramón Rosa, Juan José Millán e Bernardo Márquez Miranda.

Ainda segundo Constança Marcondes Cesar (1988), o cientificismo se fez presente na América Latina do século XIX, principalmente na Argentina. A autora destaca como grandes propagadores do cientificismo argentino: Carlos Octávio Bunge (1875-1918), Rodolfo Jenet (1872-1938), Cristofredo Jacob, Anibal Anastasi, Antônio Herrero e Francisco Fernández. Ambos produziram obras no campo da filosofia da ciência e da lógica olhando para o biologismo, evolucionismo e psicologismo.

Ainda se tratando do positivismo na Argentina, Cesar (1988) argumenta que o auge do processo de difusão de tal pensamento foi a partir de 1895, com a fundação da Faculdade de Filosofia e Letras da Universidade de Buenos Aires. E é nessa universidade que Horácio Piñero, Bunge, e demais defensores do positivismo argentino, trabalharam contribuindo significativamente para a maximização do positivismo.

O positivismo no México sofreu uma inculturação distinta frente aos demais países latino-americanos, pois buscou adequar o positivismo às características culturais desse país. Cesar (1988) referindo-se a Gaos, afirma que a proposição positivista ordem, progresso e amor, no México, mudou para ordem, progresso e liberdade.[16]  Segundo Cesar (1988), o positivismo perdurou naquele país durante toda a segunda metade do século XIX.

Já no Brasil, o ecletismo aflora a partir da segunda metade do século XIX. Essa filosofia tornou-se obrigatória, principalmente no Colégio Pedro II e nas demais instituições de ensino público. Assim, como nos demais países da América Latina tiveram os seus respectivos representantes de uma determinada corrente filosófica, no Brasil, o autor que mais difundiu o ecletismo foi Gonçalves de Magalhães, autor da obra Fatos do Espírito Humano (1858).[17]

No final do século XIX, o ecletismo passa a sofrer duras críticas dos pensadores da Escola de Recife, cujos maiores membros foram o sergipano Tobias Barreto e Sílvio Romero. Os referidos brasileiros saem em defesa de uma filosofia de caráter cientificista, ou seja, uma filosofia positivista.  Desde a leitura de Cesar (1988) foi através da Escola de Recife, que a filosofia alemã foi progressivamente ganhando espaço no Brasil. Prova da assertiva dita acima foi a busca pelos seguintes pensadores germânicos: Schopenhauer, Hatmann, Darwin, Haeckel, Ihering.

Assim, o positivismo foi implantando-se em terras brasileiras. E um dos centros de propagação do positivismo no Brasil foi a Escola Militar, a partir de 1873. Tendo como docente anunciador do positivismo, André C. de N. Lobato e G. S. de Capanema. Entretanto, um dos maiores positivistas foi Pereira Barreto, que em 1865, já havia publicado textos de inspiração comtiana. Ele ainda fundou um grupo de intelectuais conhecido por “Grupo de Bruxelas”, referência a cidade onde Barreto converteu-se ao positivismo.

Em 1874, com a publicação da obra de Pereira Barreto, “As Três Filosofias”, o positivismo no Brasil, ganhou prestígio e repercussão na vida social e política do Brasil. Os intelectuais brasileiros de meados do século XIX, aderiram sem titubeios ao positivismo de Augusto Comte. É válido ressaltar, que com o advento do positivismo no Brasil, concomitantemente prepara-se o republicanismo. Uma vez instaurada a República, consequentemente configura-se o positivismo como sendo a filosofia da Federação.

No Rio de Janeiro, o positivismo ganhava cada vez mais espaço tanto no mundo acadêmico quanto nas praças públicas via jornais e revistas da época. Essa difusão exacerbada do positivismo por meio dos periódicos contribuiu para a fundação da “Sociedade Positivista do Rio de Janeiro em 1876”. Já em 1881, a referida sociedade transformou-se em Igreja Positivista do Brasil, tendo como expoente do positivismo religioso Miguel Lemos e Teixeira Mendes. Esse grupo buscava atuar na vida política do país e contribuía para a instauração da República e lutavam pela abolição da escravatura. Em São Paulo, o positivismo vigorou até a primeira metade do século XX. No Rio Grande do Sul, a filosofia positivista foi propagada por Júlio de Castilho, Borges de Medeiros, Pinheiro Machado e Getúlio Vargas.[18]

Cesar (1988) aborda também um positivismo ilustrado, esse seria de caráter pedagógico e tem como expositores: A. Salles, Pereira Barreto, Pedro Lessa, e Ivan Lins. Já no campo da filosofia da ciência no início do século destaca-se o nome de Licínio Cardoso como defensor de um monismo evolucionista.

Nesse sentido, no âmbito da literatura e da crítica literária, Martins Jr. e Clóvis Bevilacqua discutem a literatura e a poesia científica.

Assim sendo, reagindo ao ecletismo e ao positivismo no Brasil, o grupo dos tradicionais desenvolveu-se, no século XIX. Tal grupo de reacionários dividiam-se em dois subgrupos. De um lado o grupo dos tradicionais de cunho religioso, que resistem à filosofia oficial e representado na pessoa de Frei Firmino de Centelhas e do seu amigo D. Romualdo Seixas. No campo de cunho político, encontra-se como um grande reacionário ao positivismo, José de Gama e Castro.

É interessante anotar que Cesar (1988) frisa que a filosofia de Kant, consequentemente suas obras chegaram ao Brasil a partir da independência, e que os primeiros a estudá-la foram Pe. Diogo Antônio Feijó e Martim Francisco Andrade.

É interessante citar que a partir dos estudos de Cesar, iniciou-se um debate entre a filosofia kantiana verso o pensamento de Krause. No dizer do filósofo brasileiro Miguel Reale (CESAR, 1988, p.23-24) afirma que:

[…] os que se dedicam ao estudo da Filosofia latino-americana devem ter conhecimento de um grande movimento cultural, maior na América Latina do que na própria Alemanha, a que se chamou o ‘Krausismo’ espanhol. Krause era um dos discípulos de Kant […] pois bem, foi Krause, de todos os seguidores de Kant, aquele que paradoxalmente maior influência logrou no plano cultural espanhol e sul-americano, […] Krause, que iria ter representante de grande significação, sobretudo no México e no Chile.

Para Miguel Reale, a vinda da filosofia kantiana para o Brasil, influenciou significativamente a Escola de Recife, consequentemente os seus maiores representantes: Tobias Barreto e Sílvio Romero, e discípulos menores do filósofo de Königsberg, dentre o qual, Ludwig Noiré (CESAR, 1988, p. 24).

5. tendências contemporâneas

Cesar (1988) classifica o período filosófico decorrido na América Latina como de Tendências contemporâneas. A autora assegura que no final do século XIX e início do século XX, ocorreu no Peru, uma reação espiritualista contra o positivismo. Tal reação se deu com eximia participação do filósofo espiritualista Alejandro Octavio Deústua (1849-1945).

Alejandro Deústua interessa–se pela psicologia de Wundt e busca retomar o Krausismo e dedicando-se a leitura de Bergson. Para Deústua, a filosofia tem por missão discutir a dialética liberdade – ordem. O conceito de liberdade segundo Cesar (1988, p.25) está para “a capacidade de operar, atividade criadora do sujeito e por ordem, a permanência”.

As ideias pedagógicas de Deústua se contrapunham as ideias vigentes no Peru do início do século XX. Deústua buscava com a sua reflexão humanista contrapor a tecnocracia e o cientificismo, fruto do positivismo instaurado no dito país.

Alejandro Deústua influenciou toda uma geração com as suas obras. Dentre elas, destacamos: Estética Geral (1932), Estética Aplicada (1932-1935), Os Sistemas da Moral (1938-1940), as ideias de ordem e liberdade na história do pensamento humano (1917-1921). Essas obras foram suficientes para influenciar toda uma geração de escritores e historiadores peruanos. Desde o ponto de vista de Cesar (1988), Francisco García Calderón (1883-1953) representa o grupo dos influenciados pelo pensamento de Alejandro. Além de Calderón, encontra-se Victor Andrés Belaunde, esse divulga o pensamento spinoziano, kantiano, pascaliano e agostiniano; Oscar Miró Quesada refletindo a respeito da filosofia da ciência, Alejandro Meguiña, Ezequiel Burga, Clemente Palma, Guillermo Salinas Cossío e por último Juan Francisco Elguere no campo da estética.[19]

Dando continuidade à nossa exposição e segundo Cesar (1988), com o filósofo Mariano Ibérico Rodriguez e o psiquiatra Honório Delgado, a filosofia no Peru entra no período contemporâneo. Esse período foi influenciado basicamente por Bergson, Klages e a filosofia alemã.

Rodriguez divulga na Universidad Nacional Mayor de San Marcos de Lima, a metafísica de matriz neoplatônica.  As suas obras: O Novo Absoluto (1926), A Unidade Dividida (1932), O Sentimento da Vida Cósmica (1939), atestam esse caráter metafísico de vertente neoplatônica em seu trabalho.

Já o psiquiatra Honório Delgado, divulgador do pensamento de Blondel, Husserl, Scheler, Jaspers, juntamente com Ibérico colaboraram significativamente para a passagem do pensamento francês, até então vigente no Peru do final do século XIX para o pensamento alemão. À adesão a filosofia alemã no Peru tornou-se evidente com a difusão das ideias da escola de fenomenologia, essa de Scheler, Husserl, Heidegger; do historicismo e existencialismo de Hartmam. Ainda de acordo com Cesar (1988) ocorre paralelamente a esse período no Peru, a presença da filosofia da ciência inglesa, porém com pouca repercussão.

Assim sendo, a Universidade de San Marcos de Lima, expressa essa nova orientação filosófica. E, juntamente com esse mundo do saber, os filósofos: Enrique Barboza, Manuel Argüelles, Júlio Chiriboroga, Walter Peñaloza, Carlos Cueto Fernandini, Nelly Festini, Gustavo Saco, Luiz Felipe Alarco, Francisco Miró Quesada, José Russo Delgado. Esses docentes da Universidade de São Marcos abordam também diversos campos da filosofia, entre eles: filosofia da ciência, epistemologia, teoria do conhecimento, logística, estética, educação, e filosofia da psicologia.

Cesar (1988) assegura que o centro do pensamento católico no Peru, foi justamente a Universidade Católica do Peru. Inclusive o neotomismo que aí se difundia foi uma busca de aproximação do pensamento do filósofo alemão Martin Heidegger. Considera que os pensadores: Victor Andrés Belaunde, Pe. Luis Lituma, Mario Alzamara Valdez, Alberto Wagner de Reyna, Jorge del Busto, Anibal Ismodos, Gabriel Martínez del Solar, Antonio Pinilla e E. Torres Llobosa buscavam aproximar o neotomismo do pensamento heideggariano. Atenção maior deve-se prestar a Alberto Wagner de Reyna, autor das seguintes obras: A ontologia fundamental de Heidegger (1939), A filosofia na América Ibérica (1949).[20] Já é possível concluir, que a as tendências contemporâneas na América Latina estão para a filosofia alemã, assim como “A Crítica da Razão Pura” está para Kant.

Uma vez instalada a filosofia alemã no Peru, muitos são os pensadores peruanos que deram início a uma hermenêutica acerca da própria realidade peruana nos seus diversos campos. Inspirados no marxismo, alguns intelectuais buscaram realizar estudos políticos e sociais ampliando assim o horizonte de compreensão da realidade peruana. A partir dos estudos de Cesar (1988), José Carlos Mariágui (1895-1935), Antenor Orrego, Hugo Pesce e Guardia Mayorgam, passam a compor o quadro daqueles que se empenharam em ler a realidade peruana com os óculos do marxismo.

Uma vez dito a assertiva acima, Salazar Bondy,[21] ao fazer uma revisão filosófica, da própria filosofia em seu país, afirma que o Peru sofreu uma estreita relação entre Filosofia e Psicologia, Filosofia e História, Filosofia e Direito. Assim sendo, o referido filósofo peruano, acredita que frente a tal realidade constatada, faz-se necessário a construção de um pensamento original da própria América Latina, até mesmo do próprio Peru. Neste sentido, uma vez passado por essa tomada de consciência, e percebido a necessidade da elaboração de um pensamento original, foi fundada a “Sociedade Peruana de Filosofia” a partir de 1941.[22] Essa contribuiu para as publicações de coleções filosóficas, seminários, ciclos de palestras, e arquivos da própria “Sociedade Peruana de Filosofia”.[23]

No Uruguai (século XX), o positivismo repercute na educação, na filosofia do Direito, e na política desse país. Ao mesmo tempo, nota-se um desinteresse por essa corrente filosófica, que no Uruguai assume um caráter um simplificador, doutrinário e polêmico. Frente a essa falta de prestigio do positivismo uruguaio, logo tal corrente é superada pelo neoidealismo, o neoespiritualismo da filosofia da experiência. Para Cesar (1988) é o neoespiritualismo, que configura, inaugura, a filosofia contemporânea no Uruguai. Afirma que os mestres da dita corrente são os docentes: José Enrique Rodó, esse da Faculdade de Letras, e Carlos Vaz Ferreira, da Filosofia.

A renovação filosófica da qual o Uruguai sofreu, ocorreu também na filosofia da matéria (materialismo científico e dialético), da própria filosofia da ideia (idealismo gnosiológico e metafísica racionalista), da Filosofia da Cultura (filosofia dos valores,fenomenologia, historicismo, existencialismo, pensamento cristão).[24]

Assim sendo, segundo Ardao (1956), o marco da renovação filosófica no Uruguai foi a organização e implantação do ensino superior de Filosofia na Faculdade de Humanidades e Ciências, em 1946. Com o nome de filosofia da experiência, pensamento esse que está para a os moldes do pensar empirista. Ardao designa tal corrente a devoção à ciência.[25] Para essa corrente, a experiência é vista gnoseologicamente construindo o ponto de partida do conhecimento e da própria especulação filosófica.

A filosofia da experiência tem por alicerce o positivismo que herda dessa corrente filosófica o cientificismo, evolucionismo, o agnosticismo, e o empirismo, se faz presente na base da filosofia da experiência ainda o espiritualismo, essa com forte influência de Bergson, que imprimiu uma característica toda própria nela mesma a respeito da liberdade, e uma preocupação com o metafísico, uma resistência para com o verbalismo, intelectualismo e uma busca pela afirmação da experiência concreta exaltando à ação e à vida.

Cesar (1988) apresenta como os introdutores da filosofia da experiência, Carlos Vaz Ferreira, José Henrique Rodó e José Pedro de Massera. Diz Cesar (1988), que Massera exerceu grande influência na Universidade, propagando o pensamento de Bergson e James. Cesar, ainda apresenta como sendo recente representante da filosofia da experiência, Aristides Delle Piane, Emílio Zum Felde (1877-1951), Antonio M. Grompone, Luis E. Gil Salguero e Carlos Benvenuto. É válido anotar que Emílio Zum Felde (1877-1951) foi presidente da Sociedade de Estudos Filosóficos, fundada no ano de 1939, em Montevidéu. O mesmo também traduziu a obra de James.

A filosofia da experiência no Uruguai foi importante para os pensadores do Ateneu de Montevidéu, expressando tal importância por meio da revista “Ensayos” (1936-1939), que se transformou em porta-voz do grupo. Foram colaboradores da revista “Ensayos”, o biólogo Clemente Estable e Raul Monas e Júlio Paladino, ambos filósofos. Já em 1938, a revista Ensayos, dedicou uma edição especial ao introdutor da filosofia da experiência, Carlos Vaz Ferreira.[26]

Ainda falando da filosofia da experiência no Uruguai, Cesar (1988) afirma que o pensador José Enrique Rodó (1871-1917), construiu uma antropologia filosófica, uma metafísica e concomitante uma Filosofia da Cultura. Assim sendo, filosofia de Rodó está grafada nas obras: Ariel (1900), Liberalismo e Jacobinismo (1906), Motivos de Proteu (1909), O Mirante de Próspero (1913) e nas obras publicadas após a sua morte, como: O Caminho dos povos, em Valença (1918); O que virá, em Barcelona (1920); Os Últimos Motivos de Proteu (1932).[27]

Cesar (1988) frisa que José Enrique Rodó, injetou como antídoto contra o positivismo, o naturalismo e o idealismo francês, esse último sob a inspiração de Renan, Taine, Guyau, entretanto manteve-se fiel aos elementos próprios do positivismo como o cientificismo, racionalismo, realismo e o evolucionismo. Teceu uma dura crítica ao positivismo no tangente a sua característica cética e utilitarista.

A superação do positivismo no Uruguai dá-se com a publicação da obra “Rumos Novos” (1910), na qual se afirma um idealismo axiológico, enfatizando os valores de verdade, justiça e beleza. Nessa mesma obra, ainda propõe-se um racionalismo, porém não cartesiano, com forte influência do filósofo francês, Henri Bergson (1589-1941). Para Constança Marcondes Cesar (1988), tal razão caracteriza a filosofia latino-americana.

Rodó com seu agnosticismo filosófico abre mão das religiões institucionalizadas, entretanto afirma o sentido religioso da vida, uma certa preocupação com o escondido, com o mistério e com um forte panteísmo evolucionista.[28]

Cesar (1988) sustenta que Carlos Vaz Ferreira (1872-1952) é a referência mor da filosofia uruguaia do século XX. Ferreira, foi educador e filósofo, trabalhou em todos os níveis do ensino público difundindo as suas ideias mediante a docência e vários textos publicados. Assim sendo, Carlos Vaz, trabalhou com a Lógica, Teoria do Conhecimento, Ética, Filosofia da Religião, Estética, Filosofia Jurídica, Social e Educação. Em suas obras, o mesmo autor abarcou todas essas matérias filosóficas, a saber: Curso expositivo de psicologia elementar (1899), Os Problemas da Liberdade (1907), Conhecimento e Ação (1908), Lógica Viva (1910), Estudos Pedagógicos (1921-1922), Sobre os problemas Sociais (1922), Sobre o Feminismo (1933). Esse filósofo uruguaio publicou diversos artigos em revistas, contribuindo para a propagação da filosofia uruguaia. Cesar (1988) acredita que existem vários textos inéditos de conferências de Carlos Vaz Ferreira, que ainda não foram publicados. Dentre as obras de Ferreira acima mencionadas, sobressai: “Os Problemas da Liberdade”, publicado em 1907.

Carlos Vaz foi iniciado na filosofia pelo positivismo. Com o passar dos anos foi elaborando duras críticas a essa mesma corrente juntamente com a metafísica clássica. Ele propõe uma filosofia que possua um filosofar a partir da lógica viva, discutindo o tema da linguagem e pensamento. O eixo vital do seu pensamento é a razão vital, que problematiza e divide a liberdade/determinismo, fazendo assim da sua obra “Os Problemas da Liberdade” uma das maiores de sua produção. O tema da moral é uma das preocupações elementares do pensamento de Vaz. O seu agnosticismo religioso respeita profundamente o ser desconhecido e elabora uma dialética acerca da existência e imortalidade dos seres absolutos.

Além do educador e filósofo uruguaio, Carlos Vaz Ferreira, exímio apóstolo da filosofia do Uruguai, José Pedro Massera (1866-1942), também adere ao racionalismo idealista da filosofia produzida no Uruguai. Massera, que foi jurista, legislador, professor e escritor, produziu uma fina crítica ao positivismo, porém afirmou com toda clareza o espírito científico e adotou em sua reflexão uma axiologia da subjetividade de cunho relativista. [29]

Outro filósofo no Uruguai que criticou o cientificismo positivista e seu modo de ler a realidade foi Aristides Delle Piane (1881-1950). Ele sofreu grande influência de Bergson, James, Renovier, o mesmo apresentou a solidariedade que existia entre a ciência e a filosofia.

Cesar (1988) revela que Antonio Grompone, diretor do Instituto de Formação de Professores do Ensino Secundário do Uruguai desde 1949, professor, e jornalista, elaborou uma filosofia em que a gnosiologia aparece intimamente ligada com à vida e à ação. Nessa, simbiose, Grompone legitima a metafísica. O mesmo educador e filósofo estudou o fenômeno das revoluções, afirmando que ao acontecer uma revolução significa que está acontecendo ao mesmo tempo uma mudança de mentalidade de uma época.

Continuando o itinerário nas terras uruguaias, encontra-se um movimento filosófico bastante conhecido no Uruguai contemporâneo. Tal corrente filosófica é apresentada por Filosofia da Cultura. Esse movimento corresponde a uma renovação filosófica que aconteceu no final da década de 1920 e no início da década de 1930, no Uruguai sob forte influência do filósofo espanhol Ortega y Gasset e da “Revista de Occidente”. O auge dessa corrente aconteceu entre 1930 e 1936, consolidando-se na década de 1940. Nesse período, as obras de Husserl, Scheler, Hartmann e Heidegger foram difundidas no Uruguai.

A Filosofia da Cultura reflete sobre o fazer humano e concomitante a respeito de problemáticas axiológicas. Dentre os progenitores e representantes da Filosofia da Cultura, Cesar (1988) destaca: Alberto Zum Felde, Juan Llambías de Azevedo, Roberto Fabregat Cúneo e Alejandro Àrias. A partir da pesquisadora em questão, estes últimos refletem a respeito do caráter da América Latina, fazendo profissões de fé de cunho existencialista.

Dentre os co-fundadores da Filosofia da Cultura, destaca-se Juan Llambías como o principal tradutor e interprete da filosofia alemã após o neokantismo. O trabalho de Llambías atua no campo da filosofia do Direito, tendo como momento mais expressivo anos de 1948 a 1969. Juan Llambías utiliza o método fenomenológico, apresentando uma proposta apriorística e objetiva dos valores, com grande influência de Scheler, Hartmann e Kierkegaard.

Com o advento do século XIX especificamente em 1900, o positivismo é dissolvido do Uruguai e desenvolve-se a filosofia neoespiritualista. Em paralelo com a dita corrente filosófica, surge também o materialismo cientificista. Esse se apresentou subdivido em diferentes fases, sendo a primeira de “vulgarização das novas ideias, através do jornal da Associação de Propaganda Liberal, El Libre pensamiento”.[30] Esse primeiro momento tem como manifestações das questões religiosas, literária e sociais. O ponto de encontro para as discussões era o café “Polo Bamba”, onde se encontravam os escritores, jornalistas, poetas, de inspiração marxista anarquista e nietzschiana.

 A segunda fase do materialismo cientificista está subdivido por duas orientações do materialismo. De um lado, a científica, que tem como representante Carlos Reyeles, Pedro Figari e Santín Carlos Rossi. Do outro lado, tem-se o materialismo dialético marxista, ligado especificamente à ação política, e campanha socialista do Rio do Prata. São tidos como grandes  representantes  dessa subcorrente filosófica: Álvaro Armando Vasseur, Juan B.Justo, Emílio Frugoni, Pedro Ceruti Crosa, Guillermo Ritter e Jesus Betancour Díaz.[31]

Segundo Cesar (1988) surge uma corrente filosófica paralela ao materialismo que está em Voga no Uruguai, conhecida como sendo a Filosofia da Ideia, que se opõe ao positivismo, empirismo, naturalismo e ao materialismo tanto cientificista quanto ao dialético. Tal Filosofia corresponde a corrente espiritualista, racionalista e idealista, que se expressa contrária ao dito materialismo.[32]

De acordo com Ardao (1956), Fernando Beltrano e Emílio Oribe são os pensadores de maior repercussão da Filosofia da Idéia.

Já em Bueno Aires, segundo Cesar (1988) foi fundado o primeiro Centro de Estudos de Filosofia Medieval da América Latina. Interessante anotar, que os filósofos cristãos, esforçaram-se por estabelecerem um diálogo com a Filosofia contemporânea, através do pensador jesuíta Teilhard de Chardin, Karl Marx e a escola fenomenológica. Esses filósofos cristãos buscaram atuar nos seguintes campos: estética, política, direito, teoria do conhecimento, e filosofia da religião.

Assim sendo, com a fundação da Faculdade de Filosofia e Letras de Mendonza, em 1939 e a realização do Primeiro Congresso Nacional de Filosofia, em 1948, foram acontecimentos marcantes e que bem caracterizam o período filosófico na América Latina conhecido por Contemporânea. Na mesma Faculdade referida, se destaca o filósofo Enrique Dussel (1934), progenitor de uma Ética, Antropologia e Humanismo, que configura a sua Filosofia.

No México, a conhecida “Geração do Ateneu”, Antônio Caso (1883-1946), José Vasconcelos (1882), Afonso Reyes (1889), são tidos como os apóstolos do existencialismo e progenitores de uma Filosofia Mexicana sistemática e original. Segundo Cesar (1988), entre os anos de 1910 e 1930, a Revolução Mexicana proporcionou a descoberta do México pelos próprios mexicanos. As ideias mais interessantes de tal período desenvolveram-se no Ateneu da juventude, do qual participaram diversos pensadores mexicanos.

Já na década de Cinquenta, a Filosofia do Mexicano mostra-se ligada intimamente com a discussão acerca da Filosofia Americana. Tal tema apareceu no Terceiro Congresso Internacional de Filosofia, ocorrido no México e nas publicações do filósofo mexicano Leopoldo Zea. Dentre essas publicações destacam-se: “Ensaios sobre a Filosofia da História” (1948), “Em torno de uma Filosofia Americana” (1945) e a de José Gaos, “Pensamento de língua Espanhola” (1945).

Agora no Brasil do início do século XX, o positivismo que deu grande ênfase e valorização nas ciências, ensinado na Academia Militar por André C.de N. Lobato dentre muitos outros, adquire o caráter de ideologia do Estado Republicano, e concomitante é vinculado como positivismo religioso, por Miguel Lemos e Teixeira Mendes; como filosofia da ciência com grande apoio ao monismo evolucionista, por Licínio Cardoso; como filosofia da educação, por Pereira Barreto. Como uma filosofia política aparece os nomes de: Alberto Salles, Júlio de Castilho, Borges de Medeiros, Pinheiro Machado e G. Vargas. Cesar (1988) apresenta a Escola de Recife como sendo representante da corrente teórica em questão e principalmente através das obras Farias Brito e Jackson de Figueiredo.

Segundo Cesar (1988) é com a visita de Albert Einstein (1879-1955) ao Brasil, em 1925, que se consolida a reação contra o positivismo configurado em terras brasileiras, tendo nos professores: Oto de Alencar e Amoroso Costa a sua vanguarda. Cesar (1988) afirma que tal reação contra a filosofia positivista pode ser considerada como sendo o ponto de partida da grande maioria das demais correntes filosóficas existentes no país.

Uma vez superado o positivismo no Brasil do século XX, outra corrente filosófica que vai progressivamente se maximizando em tal país é o neotomismo[33]. Sob grande influência do pensamento de Bergson, do neokantismo e da fenomenologia, a orientação filosófica em construção no Brasil vai se inclinando para uma restauração da metafísica. Interessante informar, que o neotomismo no Brasil está caracterizado por uma forte epistemologia realista e concomitante uma metafísica espiritualista e teísta. Nesse sentido os pensadores católicos, inspirados no neotomismo de Maritain, buscam inovar a vida cultural do nosso país. É justamente a partir desse anseio da superação dos resquícios do positivismo no Brasil, que nasce a Universidade Católica do Rio de Janeiro e revista “A Ordem”. Tanto a Católica do Rio de Janeiro, quanto à revista, foram grandes meios de divulgação da nova corrente filosófica no país do século XX. Dentre os muitos filósofos que destacaram-se no determinado século está: Alceu Amoroso Lima, este um exímio defensor dos direitos do ser humano. Integram-se ainda a esse movimento filosófico humanista os nomes de: Geraldo Pinheiro Machado e Ubiratan de Macedo. Cesar (1988) frisa que o belga Leonardo Van Acker, que viveu no Brasil até 1986 é tido também como um dos instauradores do neotomismo nesta federação. Ainda sobre Von Acker, Cesar afirmou que tal filósofo buscou criar um pensamento tomista aberto as demais correntes filosóficas contemporâneas.

Em 1950, segundo Cesar (1988) surge neste país o personalismo do francês Emmanuel Mounier (1905-1950). Tal filosofia influenciou sistematicamente a Ação Católica, divulgando e ensinando sua obra nas Universidades Católicas do Brasil. Ainda hoje o personalismo é estudado por Antonio Joaquim Severino, antigo vice-reitor da Universidade Católica de São Paulo.

Nesse sentido, Cesar (1988) acredita que, além do neotomismo, o culturalismo, o existencialismo e a fenomenologia, contribuíram significativamente para a superação da tradição positivista.

Para Cesar (1988), o culturalismo apresenta-se com um forte interesse por compreender plenamente o sentido o e significado de cultura e a busca incessantemente para caracterizar o pensamento brasileiro. Assim sendo, a valorização da metafísica e concomitante da Filosofia do Direito são ontologias regionais de grande interesse dessa corrente filosófica no Brasil, representado na figura do filósofo paulista Miguel Reale (1911-2006). Cesar (1988)  firma pertencer a essa corrente: Tércio Sampaio Ferraz, Nelson Saldanha, Irineu Strenger e Luís Washington Vita, este in memória.

A professora Cesar (1988) afirma que o culturalismo apresenta-se com as seguintes características: “[…] vê a cultura como um processo autônomo de criação de valores; faz críticas do mundo contemporâneo; busca o nível metafísico como ponto de partida para a análise dos problemas; e por fim, compreende a crise da ciência como uma crise de valores […]”.[34]

Nota-se que tal corrente filosófica em questão, mostra-se plenamente crítica frente ao seu mundo contemporâneo marcado pelo hedonismo, individualismo e niilismo.

Enfim, a Filosofia da Ideia, o Neotomismo e o Culturalismo, foram correntes filosóficas de grande valor para a superação dos moldes do pensar positivamente a realidade dada no seu modo de ser do poder perceber na qual estamos inseridos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste ensaio histórico-filosófico da filosofia foi desenvolvido o esquema para análise da filosofia latino-americana entre a originalidade e a falta de originalidade, sua origem desde o século XVI, com base na reflexão original sobre a humanidade dos ameríndios que renovou a escolástica na América Latina. A análise foi de cunho histórico e recorreu à cronologia de Constança Marcondes Cesar chegando a uma corrente genuinamente latino-americana, o culturalismo, fruto da escola de recife.

Ao tratar da panorâmica histórica da filosofia Latino-Americana, ficou evidente que a elaboração da filosofia da América Latina foi marcada pela presença de diversas filosofias advindas, negadas e adaptadas do continente europeu. Importante frisar, que momento algum buscou-se, negar a história da filosofia deste continente, que desde a historiografia consultada foi alvejada por uma desumana descriminação etnocêntrica e violação do logos daqueles que aqui já habitavam.

Referências bibliográficas

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[2] Desde a obra do Giovanni Reale – Dario Antiseri, a escolástica foi “a filosofia e a teologia que eram ensinadas nas escolas medievais […]”. p.478. Podemos ainda confrontar o termo escolástica a partir do glossário elaborado pela filósofa Canstança Marcondes Cesar (1988) em que afirma da seguinte maneira: “a palavra escolástica deriva do latim  schola e serve para designar a corrente filosófica medieval que domina o pensamento europeu dos séculos XI a XV. O filósofo de maior relevo associado a essa corrente é São Tomás. O termo escolástica refere-se, pois á filosofia do século XVI em diante,passa por  uma renovação e hoje a neo-escolástica busca retornar á tradição e dialogar com a filosofia e a ciência contemporânea”.Cf. CESAR, 1988, p.77.

[3] Cf. Cesar, 1988, p. 5.

[4] Cf. CESAR, 1988, p. 9.

[5] Do alemão, esclarecimento.

[6] Cf. KANT, Immanuel. Resposta à Pergunta o que é o Iluminismo, 1974.

[7] Cf. CESAR,1988, p.14.

[8] Cf. CESAR, 1988, p.15.

[9] Cf. CESAR, 1988, p.16.

[10] Cf. Krausismo– doutrina inspirada em K.Krause (1781-1832), discípulo de Kant, que alcançou grande repercussão no pensamento espanhol e latino-americano, especialmente no âmbito da Filosofia do Direito. CESAR,1988, p.79.

[11] De Victor Cousin, filósofo francês espiritualista.

[12]Cf. Filosofia da escola de Augusto Comte, pensador francês do século XIX, o qual propunha uma concepção evolutiva da razão humana. Segundo o filósofo francês, a humanidade na sua evolução, teria passado por três etapas. Na primeira, estádio teológico, o homem explicaria os fenômenos recorrendo á ação dos deuses no mundo; na segunda, estádio metafísico, explicaria os fenômenos segundo causas metafísicas; na terceira, estádio científico, etapa definitiva na evolução, o homem explicaria os fenômenos por outros fenômenos, ou seja, dando explicações científicas  aos fenômenos. Para Comte, as únicas ciências válidas são as físico-matemáticas.[…] Nosso autor propunha um Estado forte, onde saber e poder fossem termos correlatos. Teve como divisa: “O amor por princípio, a ordem por base, o progresso por finalidade”. A escola positivista teve enorme importância no Brasil e na América Latina, além da repercussão que alcançou na Europa. Cf.CESAR, 1988,  p.82.

[13] Nativo, autóctone.

[14] Cf. CESAR,1988, p.18-19.

[15] Cf.CESAR, 1988, p.19.

[16] Cf. CESAR, 1988, p.20.

[17] Cf. CESAR, 1988, p.21.

[18] Cf. CESAR, 1988, p.22.

[19] Cf. CESAR, 1988, p.26.

[20] Cf.CESAR, 1988, p.27.

[21] Cf. Confira a nota de rodapé n°1 do nosso trabalho.

[22] Cf. FILOSOFIA CIÊNCIA E VIDA, A filosofia na América Latina: uma leitura do seu desenvolvimento,ed.escala: São Paulo,n.33, p.18-27, 2009.

[23] Cf. CESAR, 1988,  p.27.

[24] Cf. CESAR,  1988,  p.28.

[25] Cf. ARDAO, 1956, p.28.

[26]Cf. CESAR, 1988, p.28.

[27] Cf.CESAR,  1988, p.29.

[28] Cf. CESAR, 1988, p.30.

[29] Cf. CESAR, 1988, p.31.

[30] Cf.CESAR, 1988, p.33.

[31] Cf.CESAR, 1988, p.34.

[32] Cf. CESAR, 1988,  p.36.

[33] Entende-se por Neotomismo a partir do glossário de Cesar (1988): “corrente filosófica inspirada no pensamento de S.Tomás visando reativá-lo. Seus principais representantes,na filosofia contemporânea são: Maritain, Gilson, De Raeymaecker, Van Steenberghen”.Cf. CESAR,1988,p.81.

[34] Cf. CESAR,1988, p.62.


[1] Licenciado em Filosofia na Universidade Católica Dom Bosco – UCDB. Bacharel em Teologia no Instituto Teológico Franciscano – ITF. Graduando em Psicologia na Universidade Federal de Rondonópolis – UFR. Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGEdu) do Instituto de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal de Rondonópolis/Universidade Federal de Mato Grosso.
E-mail: neudeleverger@gmail.com https://orcid.org/0000-0003-2977-6315.