OVERVIEW OF MATERNAL DEATHS IN PERNAMBUCO DURING THE TRIENNIUM 2019-2021 COMPARISON WITH BRAZILIAN DATA
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8370835
Paulo Henrique Alves Melo¹; Mariana Oliveira Tavares dos Santos ¹; Renata Amorim Santos Fernandes¹; Larissa Andrade Noia²; Alexsandra Martiniano dos Santos Silva¹; Anna Katharina Souza Lima¹; Maria Luísa Gonçalves Torres Inácio¹; Rairon Fernandes de Azevedo Cruz Amorim¹; Renan Ramos de Oliveira¹; Thaís Ketinly dos Santos Silva¹
1. RESUMO
O óbito materno, apesar de ser uma tragédia evitável, é uma realidade do Brasil que reflete a falha na atenção à saúde materna, além de configurar-se como indicador socioeconômico. Em contrapartida, o preenchimento errado de declarações de óbito e os sub registros de casos de morte materna, constituem um grande desafio para sua epidemiologia. Nesse sentido, o presente artigo busca traçar um perfil epidemiológico acerca dos óbitos maternos ocorridos em Pernambuco entre 2019 e 2021, e compará-lo aos dados nacionais. Trata-se de um estudo prospectivo, de corte transversal, cujas informações são oriundas do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). A partir dessa busca, nota-se um aumento significativo do número de óbitos em Pernambuco (42% no ano de 2020) e no Brasil (86% entre 2019 e 2021), refletindo o impacto da pandemia na atenção materna durante esse período. Isso revela a necessidade de estratégias de investigação de óbitos, a fim de garantir melhor cuidado à saúde da gestante.
Palavras-chave: Óbito materno. Epidemiologia. Pernambuco. Brasil.
Maternal death, despite being an avoidable tragedy, is a reality in Brazil that reflects the failure in maternal health care, in addition to being a socioeconomic indicator. On the other hand, the incorrect completion of death certificates and the under-registration of cases of maternal death constitute a major challenge for its epidemiology. In this sense, this article seeks to outline an epidemiological profile of maternal deaths that occurred in Pernambuco between 2019 and 2021, and compare it to national data. This is a prospective, cross-sectional study, whose information comes from the Department of Informatics of the Unified Health System (DATASUS). From this search, a significant increase in the number of deaths was noted in Pernambuco (42% in 2020) and in Brazil (86% between 2019 and 2021), reflecting the impact of the pandemic on maternal care during this period. This reveals the need for death investigation strategies in order to guarantee better health care for pregnant women.
Keywords: Maternal death. Epidemiology. Pernambuco. Brazil.
2. INTRODUÇÃO
O óbito materno é definido como a morte de uma mulher durante a gravidez, parto ou até 42 dias após o término da gestação, independente da duração ou localização da gravidez, cuja causa esteja relacionada ou tenha sido agravada por esta ou por seu manejo, conforme publicado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), na 10ª revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10)¹. Esse tipo de óbito se dá muitas vezes por falha na atenção à saúde das mulheres, sendo tragédia evitável em 92% dos casos e ocorre principalmente nos países em desenvolvimento².
A mortalidade materna corresponde a um indicador importante para analisar a saúde das mulheres, o desenvolvimento econômico e as desigualdades sociais em uma população³. A ocorrência indica falha nas diretrizes políticas, no sistema de saúde, nos profissionais e na sociedade de maneira geral², por isso, a investigação é fundamental, visando a definição epidemiológica do problema e a busca de medidas para combatê-lo.
No Brasil, país em desenvolvimento, os números sobre mortalidade materna são preocupantes, sendo causas mais significativas de óbitos a hipertensão, a hemorragia e infecções puerperais⁴. Os dados sobre mortalidade materna, como causa, idade, raça/cor, escolaridade após coleta e processamento alimentam o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), e junto com a informação sobre número de nascimentos admitidas no Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), permite definição de indicadores para o acompanhamento⁴.
Em relação a regulamentação da avaliação, em 1995 foram regulamentadas as atividades do Comitê Estadual de Estudos sobre a Mortalidade Materna através da Portaria Estadual 087/1995, que definiu a obrigatoriedade da notificação e investigação dos óbitos de Mulheres em Idade Fértil, que contempla as mortes maternas³. Além disso, a Portaria GM/MS nº1.172, de 15 de junho de 2004, definiu a vigilância epidemiológica da mortalidade materna como uma atribuição de municípios e estados³. Assim, foi preconizado que corresponde a atribuição do componente municipal do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde a “vigilância epidemiológica e o monitoramento da mortalidade infantil e materna”, e dos Estados, “de forma complementar à atuação dos municípios”³. Com isso, é função das secretarias de saúde designar uma equipe de vigilância de óbitos de referência do município e do estado³.
Em 2008, a Portaria GM/MS nº 1.119 de 5 de junho, regulamentou esta prática estabelecendo prazos e fluxos da investigação bem como prazos para agilizar a disponibilidade de informações pelo Sistema de Informação sobre Mortalidade⁵. Assim, é estabelecido que após o óbito, há prazo de 48 horas para preenchimento e envio da declaração de óbito (DO), para que sejam contabilizados e analisados pelo trabalho da vigilância⁵.
Apesar da regulamentação, há desafios no processo de identificação dos casos, com consequentemente comprometimento da atenção ao problema¹. Em países em desenvolvimento, como o Brasil, ainda existem muitas dificuldades no processo de identificação dos casos de morte materna, devido ao preenchimento inadequado das declarações de óbito e ao grande número de sub-registros desses óbitos³. Nesse sentido, o trabalho tem como objetivo caracterizar os óbitos maternos que ocorreram entre 2019 e 2021 em Pernambuco em comparação com os dados nacionais.
3. METODOLOGIA
O presente estudo foi prospectivo, de corte transversal, que utilizou dados referentes à mortalidade materna, do período de 2019 a 2021, contidos no Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), comparando dados de Pernambuco com os dados brasileiros.
Os dados sobre mortalidade disponíveis no DATASUS são resultados das informações geradas a partir de notificações no pelo Sistema de Informação de Mortalidade (SIM). De acordo com esses dados, foi possível realizar a diferenciação dos óbitos maternos quanto a quantidade em cada ano, quanto ao capítulo do CID-10 relacionado, considerando os quatro principais, e tipo de causa obstétrica (indireta, direta e não identificada). Além disso, foram analisados os dados quanto à faixa etária, raça/cor e escolaridade. Os dados foram avaliados em relação aos valores absolutos e valores proporcionais sobre cada especificidade nos três anos, organizados em tabelas, em uma planilha eletrônica com dupla conferência, para melhor comparação.
Além disso, foram utilizados dados do DATASUS provenientes do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), para o cálculo de mortalidade materna. Para esse cálculo, são avaliados a quantidade de óbitos maternos em determinada região em um período dividido pelo número de nascidos vivos no mesmo período, multiplicado por 100.000. Foram avaliadas as taxas de Pernambuco e do Brasil nos três anos de 2019-2021, agrupando os valores em tabelas na planilha elétrica com dupla conferência.
4. RESULTADOS
Os resultados sobre o perfil dos óbitos maternos em Pernambuco e do Brasil, de 2019 a 2021, são demonstrados nas tabelas abaixo. A quantidade de óbitos por ano é demonstrada nas tabelas 1 e 2, a avaliação conforme o capítulo do CID-10, considerando os 4 principais, é apresentada nas tabelas 3 e 4, e a diferenciação entre óbitos maternos de causa obstétrica direta, indireta e não identificada nas tabelas 5 e 6. Além disso, os dados conforme a faixa etária nas tabelas 7 e 8, conforme raça/cor nas tabelas 9 e 10, pela escolaridade nas tabelas 11 e 12, Por sim, é demonstrada a razão de mortalidade materna nos três anos em Pernambuco e no Brasil nas tabelas 13 e 14, respectivamente.
Tabela 1 – Óbitos maternos por Capítulo CID-10 segundo Ano do Óbito- PE – 2019 a 2021 | |||||
Capítulo | 2019 | 2020 | 2021 | Total | % |
Cap I | 2 | 0 | 0 | 2 | 0,86 |
Cap XV | 62 | 91 | 77 | 230 | 99,14 |
Total | 64 | 91 | 77 | 232 | 100,00 |
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
Tabela 2 – Óbitos maternos por Capítulo CID-10 segundo Ano do Óbito – BRASIL 2019-2021 | |||||
Capítulo | 2019 | 2020 | 2021 | Total | % |
Cap I | 13 | 0 | 0 | 13 | 0,20 |
Cap II | 1 | 0 | 0 | 1 | 0,02 |
Cap V | 1 | 0 | 0 | 1 | 0,02 |
Cap XV | 1561 | 1965 | 2946 | 6472 | 99,77 |
Total | 1576 | 1965 | 2946 | 6487 | 100,00 |
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
Tabela 3 – Óbitos maternos por Tipo causa obstétrica e Ano do Óbito – PE – 2019 a 2021 | |||||
Tipo causa obstétrica | 2019 | 2020 | 2021 | Total | % |
Morte materna obstétrica direta | 48 | 61 | 40 | 149 | 64,2 |
Morte materna obstétrica indireta | 14 | 27 | 36 | 77 | 33,2 |
Morte materna obstétrica não especificada | 2 | 3 | 1 | 6 | 2,6 |
Total | 64 | 91 | 77 | 232 | 100,0 |
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
Tabela 4 – Óbitos maternos por Tipo causa obstétrica e Ano do Óbito – BRASIL – 2019 a 2021 | |||||
Tipo causa obstétrica | 2019 | 2020 | 2021 | Total | % |
Morte materna obstétrica direta | 1034 | 1041 | 1023 | 3098 | 47,77 |
Morte materna obstétrica indireta | 479 | 843 | 1863 | 3185 | 49,11 |
Morte materna obstétrica não especificada | 62 | 81 | 59 | 202 | 3,11 |
Total | 1575 | 1965 | 2945 | 6485 | 100,00 |
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
Tabela 5 – Óbitos maternos por Faixa Etária segundo Ano do Óbito – PE – 2019 a 2021 | |||||
2019 | 2020 | 2021 | Total | % | |
10 a 14 anos | 1 | – | – | 1 | 0,43 |
15 a 19 anos | 4 | 9 | 2 | 15 | 6,47 |
20 a 29 anos | 18 | 30 | 21 | 69 | 29,74 |
30 a 39 anos | 31 | 37 | 39 | 107 | 46,12 |
40 a 49 anos | 10 | 15 | 15 | 40 | 17,24 |
Total | 64 | 91 | 77 | 232 | 100,00 |
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
Tabela 6 – Óbitos maternos por Faixa Etária segundo Ano do Óbito BRASIL – 2019 a 2021 | |||||
2019 | 2020 | 2021 | Total | % | |
10 a 14 anos | 14 | 7 | 10 | 31 | 0,48 |
15 a 19 anos | 182 | 148 | 216 | 546 | 8,42 |
20 a 29 anos | 582 | 709 | 1067 | 2358 | 36,35 |
30 a 39 anos | 653 | 922 | 1399 | 2974 | 45,85 |
40 a 49 anos | 144 | 178 | 249 | 571 | 8,80 |
50 a 59 anos | 1 | 1 | 5 | 7 | 0,11 |
Total | 1576 | 1965 | 2946 | 6487 | 100,00 |
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
Tabela 7 – Óbitos maternos por Cor/raça segundo Ano do Óbito – PE – 2019 a 2021 | |||||
2019 | 2020 | 2021 | Total | % | |
Branca | 11 | 16 | 19 | 46 | 20,26 |
Preta | 1 | 4 | 12 | 17 | 7,49 |
Parda | 50 | 67 | 44 | 161 | 70,93 |
Indígena | 1 | 1 | – | 2 | 0,88 |
Amarela | – | – | 1 | 1 | 0,44 |
Ignorado | 1 | 3 | 1 | 5 | 2,20 |
Total | 64 | 91 | 77 | 227 | 100,00 |
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
Tabela 8 – Óbitos maternos por Cor/raça segundo Ano do Óbito – BRASIL – 2019 a 2021 | |||||
2019 | 2020 | 2021 | Total | % | |
Branca | 475 | 589 | 1029 | 2093 | 32,26 |
Preta | 184 | 229 | 347 | 760 | 11,72 |
Parda | 855 | 1055 | 1468 | 3378 | 52,07 |
Indígena | 25 | 29 | 42 | 96 | 1,48 |
Amarela | 1 | 10 | 7 | 18 | 0,28 |
Ignorado | 36 | 53 | 53 | 142 | 2,19 |
Total | 1576 | 1965 | 2946 | 6487 | 100,00 |
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
Tabela 9 – Óbitos maternos por Ano do Óbito e Escolaridade – PE – 2019 a 2021 | |||||
2019 | 2020 | 2021 | Total | % | |
0 anos | 0 | 2 | 1 | 3 | 1,29 |
1 a 3 anos | 10 | 9 | 6 | 25 | 10,78 |
4 a 7 anos | 22 | 25 | 19 | 66 | 28,45 |
8 a 11 anos | 19 | 30 | 31 | 80 | 34,48 |
12 anos e mais | 5 | 12 | 12 | 29 | 12,50 |
Ignorado | 8 | 13 | 8 | 29 | 12,50 |
Total | 64 | 91 | 77 | 232 | 100,00 |
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
Tabela 10 – Óbitos maternos por Ano do Óbito e Escolaridade – BRASIL – 2019 a 2021 | |||||
2019 | 2020 | 2021 | Total | % | |
0 anos | 34 | 32 | 42 | 108 | 1,66 |
1 a 3 anos | 119 | 117 | 162 | 398 | 6,14 |
4 a 7 anos | 357 | 384 | 455 | 1196 | 18,44 |
8 a 11 anos | 670 | 880 | 1417 | 2967 | 45,74 |
12 anos e mais | 203 | 262 | 512 | 977 | 15,06 |
Ignorado | 193 | 290 | 358 | 841 | 12,96 |
Total | 1576 | 1965 | 2946 | 6487 | 100,00 |
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
Tabela 11 – Óbitos maternos por Ano do Óbito e Óbito investigado – PE – 2019 a 2021 | |||||
2019 | 2020 | 2021 | Total | % | |
Óbito investigado, com ficha síntese informada | 62 | 86 | 71 | 219 | 94,40 |
Óbito investigado, sem ficha síntese informada | 1 | 4 | 5 | 10 | 4,31 |
Óbito não investigado | 1 | 1 | 1 | 3 | 1,29 |
Total | 64 | 91 | 77 | 232 | 100,00 |
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
Tabela 12 – Óbitos maternos por Ano do Óbito e Óbito investigado – BRASIL – 2019 a 2021 | |||||
2019 | 2020 | 2021 | Total | % | |
Óbito investigado, com ficha síntese informada | 1447 | 1805 | 2624 | 5876 | 90,58 |
Óbito investigado, sem ficha síntese informada | 30 | 50 | 85 | 165 | 2,54 |
Óbito não investigado | 99 | 110 | 237 | 446 | 6,88 |
Total | 1576 | 1965 | 2946 | 6487 | 100,00 |
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
Tabela 13 – Razão de Mortalidade Materna – PE – 2019 a 2021 | ||||
2019 | 2020 | 2021 | ||
Total óbitos | 64 | 91 | 77 | |
Nascidos Vivos | 133359 | 128481 | 126111 | |
Resultado | 47,99 | 70,83 | 61,06 | |
Fonte: MS/SVS/DASIS – Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos – SINASC | ||||
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
Tabela 14 – Razão de Mortalidade Materna – BRASIL – 2019 a 2021 | ||||
2019 | 2020 | 2021 | ||
Total óbitos | 1576 | 1965 | 2946 | |
Nascidos Vivos | 2849146 | 2730145 | 2672046 | |
Resultado | 55,31 | 71,97 | 110,25 | |
Fonte: MS/SVS/DASIS – Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos – SINASC | ||||
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM |
5. DISCUSSÃO
Foram avaliados os dados sobre mortalidade materna, entre 2019 e 2021, de Pernambuco e os dados brasileiros, na busca de detecção do cenário atual, bem como avaliação do impacto da pandemia. O número de óbitos maternos em Pernambuco teve variação significativa, sendo avaliado aumento de 42% nos casos de 2019 a 2020, com posterior diminuição no número de óbitos registrados em 2021, mas ainda superior ao número de 2019. É importante destacar que os dados de 2021 são preliminares, ainda incompletos, o que pode justificar a diminuição em relação a 2020. O aumento do número de mortes nesse período também foi observado, de forma mais intensa, na avaliação de dados brasileiros, com aumento de cerca de 86% entre 2019 e 2021.
Esse aumento reflete a influência da pandemia na atenção materna no Brasil. O epidemiologista Jesem Orellana, do Instituto Leônidas & Maria Deane aponta como causas a deterioração do acesso oportuno aos serviços de saúde e da qualidade dos serviços prestados às gestantes e puérperas, bem como atraso na inclusão de entre os grupos prioritários à vacinação, e lenta vacinação contra a Covid-19 no restante da população geral⁶.
Em relação às causas, os óbitos maternos são codificados dentro do capítulo XV do CID, que compreende as complicações durante a gravidez, parto e puerpério, sendo o CID predominante em Pernambuco e no Brasil. Neste capítulo estão contidas condições como abortamento, complicações do trabalho de parto, síndrome hipertensivas, complicações do puerpério, sendo afecções de mortalidade materna direta, decorrentes de alterações da gestação, parto e puerpério, e indiretas, afecções não causadas mas agravadas por esse ciclo.
Ao analisar o quantitativo de mortes maternas diretas e indiretas, é encontrado que o aumento da mortalidade materna no período de 2019 a 2021 se dá de forma mais significativa por mortes maternas indiretas, conforme exposto nas tabelas 3 e 4. Em 2019, 75% das mortes maternas de Pernambuco foram avaliadas como diretas, 22% indiretas e cerca de 3% não especificadas, relação que se altera em 2021 após aumento no número de casos, sendo 52% mortes maternas diretas, 47% indiretas e 1% não especificadas. Panorama semelhante acontece após análise do cenário brasileiro, em que as mortes indiretas representavam 30% das mortes maternas em 2019 e 63% em 2021. Esse fato também é relacionado ao analisado quanto à pandemia, pela deterioração do aos serviços de saúde e da qualidade dos serviços prestados às gestantes e puérperas, bem como pelas mortes maternas por Covid-19, que se configura como morte materna indireta⁶.
Com relação ao perfil epidemiológico das mulheres que tiveram morte materna, a faixa etária manteve padrão semelhante entre os dados de Pernambuco e do Brasil, conforme as Tabelas 5 e 6. Nos três anos a faixa etária mais acometida foi dos 30 a 39 anos, representando mais de 45% das mortes em Pernambuco e no Brasil. Esse fato possivelmente está relacionado ao fato de ser a faixa etária com maior incidência de gestações. Contudo, é importante destacar a presença de mortes maternas na população adolescente, representando cerca de 7% do total de óbitos nos três anos em Pernambuco e 9% no Brasil. Esse fato demonstra além da falha em relação à atenção às pacientes no ciclo gravídico puerperal, por vezes com maiores riscos pela faixa etária, e precariedade também na atenção ao planejamento familiar das pacientes, sendo avaliada a necessidade de atenção especial, com orientação e divulgação de métodos contraceptivos⁷.
Em relação aos óbitos maternos por cor/raça em Pernambuco, contidos na tabela 7, é possível perceber que 78,48% dos óbitos ocorreram nas mulheres pretas e pardas, sendo mais predominante nas mulheres pardas, com 70,99%. Em relação a mesma variável no Brasil, é possível perceber uma tendência similar, com as mulheres pretas e pardas correspondendo a mais da metade dos casos de mortalidade materna (61,79%).
Com relação aos perfis das mulheres negras que são alvo de mortalidade materna, Benevides identificou entre as vulnerabilidades: o fato de que a maioria das negras encontra-se abaixo da linha da pobreza e possui uma taxa de analfabetismo duas vezes maior que as mulheres brancas; a evidência de que a maioria das mulheres negras que sofreram mortalidade materna, na maioria, estavam constituídas como chefes de família com filhos e sem cônjuges (de modo que as crianças nascidas de mães negras falecidas apresentam maior risco de orfandade)⁸.
Vasconcellos afirma que a produção de informações em saúde com o marcador cor/raça é imprescindível para o reconhecimento de vulnerabilidades que afetam de forma específica a população negra, sendo a constatação da recorrente ausência de equidade constitui o primeiro passo para a elaboração de estratégias e ações pontuais e exclusivas9.
Ao avaliar os óbitos maternos quanto à escolaridade, é observado padrão semelhante tanto em relação à evolução temporal quanto a comparação entre Pernambuco e os dados do Brasil. Entre 2019 e 2021, os óbitos maternos ocorreram em maioria em mulheres que tinham entre 8 e 11 anos de estudo, que corresponde ao ensino médio incompleto a completo, sendo 34% dos óbitos de Pernambuco e 46% dos brasileiros. Em segundo lugar estão os óbitos de mulheres com 4 a 7 anos de escolaridade, sendo 28% dos óbitos nos 3 anos em Pernambuco e 18% dos brasileiros. Apesar dessa semelhança, fato que chama atenção é que em Pernambuco tem maior quantidade de óbito de pacientes com 0 a 3 anos de escolaridade, representando 12% dos óbitos nos 3 anos, contra menos que 8% dos Brasileiros. Esse fato é concordante com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) 2019 que apontam taxa de analfabetismo brasileira de 6,6%, mas a região nordeste superando essa marca, com 13,9% de analfabetos¹⁰. Assim, é fundamental essa análise no quesito de que a baixa escolaridade é afirmada como determinante em saúde, sendo a relacionada às condições de atenção que a população tem acesso.
Segundo a Portaria nº 1.119 de 2008, todo óbito materno deve ser notificado e inserido no sistema de informações em até 30 dias⁵. O prazo para investigação é de até 120 dias, com a conclusão do processo de investigação e preenchimento da ficha-síntese pela Vigilância de Óbitos (GT) e da Secretaria Municipal de Saúde, sendo a investigação classificada como oportuna quando este prazo é respeitado⁵. Assim, é possível observar que em Pernambuco durante 2019-2021, 94,4% dos óbitos maternos foram investigados e tiveram seus processos concluídos em tempo hábil. Entretanto, é necessário salientar que apesar deste ótimo percentual de investigação oportunas, ainda existem óbitos do estado que não foram investigados, correspondendo a 1,29%. O estado de Pernambuco compactuou metas de investigação de óbitos, sendo uma delas a de todos os óbitos maternos declarados devem ser investigados em tempo oportuno, porém como apresentado acima, não foi possível atingir esta meta. Em relação ao Brasil, 90,58% dos óbitos foram com investigação oportuna, contudo, aproximadamente 6,8% dos óbitos maternos não foram investigados.
Por fim, a razão de mortalidade materna de Pernambuco se manteve próxima a média brasileira em 2019 e 2020, contudo em 2021 os valores do Brasil foram significativamente superiores. Esse fato corrobora com o impacto da pandemia no Brasil, com situações críticas em diversos estados⁶, além disso, pode haver como possibilidade atraso na divulgação dos dados de mortalidade em Pernambuco.
6. CONCLUSÃO
Diante dos dados apresentados, é possível observar o impacto que a pandemia de Covid-19 exerceu sobre a mortalidade materna neste período, aumentando o número de mortes maternas. A prevalência da população preta e parda no número de mortes maternas revela a necessidade de elaboração de estratégias para estas populações específicas, a fim de sanar as iniquidades presentes que contribuem para o óbito materno nestas populações.
A alta prevalência de mortes obstétricas diretas em Pernambuco demonstra a fragilidade na assistência dessas gestantes, já que são mortes evitáveis e com soluções de cuidados bem conhecidas. Essa alta prevalência também demonstra a necessidade de estratégias de melhoria do cuidado, como por exemplo melhorar o acesso à assistência de saúde e a qualidade destes serviços. Além disso, em relação à investigação dos óbitos, Pernambuco, apesar do percentual de óbitos investigados acima da média brasileira, ainda não alcançou a meta de 95%. Pernambuco, assim como o Brasil, tem que superar diversos desafios para a garantia de uma assistência materna de qualidade, que é prevista pela constituição.
7. REFERÊNCIAS
- Viana, RC; Novaes, MRCG; Calderon, IMP. Mortalidade Materna – uma abordagem atualizada. Com. Ciências Saúde – 22 Sup 1:S141-S152, 2011. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/artigos/mortalidade_materna.pdf
- Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação em Saúde. Guia de vigilância epidemiológica do óbito materno, 2009.
- Dias, JMG; Oliveira, APS; Cipolotti, R; Monteiro BKSM; Pereira, RO; Mortalidade materna. Disponível em: http://www.rmmg.org/artigo/detalhes/1771
- Brasil. Ministério da Saúde; 2022.[citado em 15 outubro de 2022]. Disponível em: <http://www.Saude.gov.>
- Brasil. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria nº1.119, de 5 de julho de 2008. Brasília, 2008. Portaria nº 1.119, de 5 de junho de 2008.
- Fiocruz Amazônia. Estudo aponta 70% de excesso de mortes maternas no Brasil na pandemia. Acesso em 01 de Novembro de 2022. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/noticia/estudo-aponta-70-de-excesso-de-mortes-maternas-no-brasil-na-pandemia.
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¹Discente de medicina da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
²Discente de Medicina da Universidade de Pernambuco (UPE)