PANORAMA DOS ÓBITOS DE MULHERES EM IDADE FÉRTIL EM PERNAMBUCO ANTES E DURANTE A PANDEMIA PELO COVID-19: UM ESTUDO TRANSVERSAL DAS CAUSAS, COR E FAIXA ETÁRIA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202408251901


Anna Katharina Souza Lima1; Moana Divina Da Silva Santiago1; Antônio Henrique Montesano1; Ana Maria Montesano2; Amanda Katharinne Souza Lima3; Maysa Aiany Dias de Sousa Alves4; Adricia Cristine de Souza Alves5; Emília Virgínia Santos de Azevedo Moreira5; Adene Kaline de Souza6


Resumo

O estudo examina os óbitos de mulheres em idade fértil (MIF) em Pernambuco de 2018 a 2021, com foco nos óbitos por COVID-19. A mortalidade proporcional por CID-10, raça/cor e faixa etária foi calculada usando dados do DATASUS/TABNET pela vigilância epidemiológica do estado, que é administrada pela Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco (SES-PE). No biênio 2020-2021, houve um aumento de 31,55% no número de óbitos de MIF em comparação com o biênio anterior; as mortes por doenças infecciosas e parasitárias cresceram em 308,42%, refletindo os efeitos da pandemia de COVID-19. A pesquisa revelou que 71,25% dos óbitos eram mulheres autodeclaradas pardas ou pretas e 52,10% eram mulheres de 40 a 49 anos. O estudo questiona a assistência à saúde das mulheres acometidas pela COVID-19, especialmente no período inicial da vacinação.

Palavras-chave: Vigilância em Saúde. Mulheres em Idade Fértil. Mortalidade feminina. COVID-19.

1.    INTRODUÇÃO

VIGILÂNCIA EM SAÚDE

Conforme a Constituição Federal de 1988, a saúde é um direito de todos e dever do Estado, garantida através de políticas sociais e econômicas que objetivam reduzir o risco de doença e de agravos e através do acesso universal e igualitário às ações e serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde.

As ações de vigilância em saúde competem ao Sistema Único de Saúde (SUS), dessa forma, diante da necessidade de definir princípios, diretrizes e estratégias a serem observados nas três esferas de gestão do SUS no que se refere à vigilância em saúde, foi instituído, através da resolução n° 583/2018, a Política Nacional de Vigilância em Saúde (PNVS).

A vigilância em saúde é um processo contínuo e sistemático de coleta, consolidação, análise de dados e disseminação de informações sobre eventos relacionados à saúde. Tem por objetivo o planejamento e a implementação de medidas de saúde pública, incluindo a regulação, intervenção e atuação em condicionantes e determinantes da saúde para a proteção e promoção da saúde da população, prevenção e controle de riscos, agravos e doenças.

Nesse contexto, a PNVS articula todos os processos e práticas relacionados à vigilância epidemiológica, vigilância em saúde ambiental, vigilância em saúde do trabalhador e vigilância sanitária junto com as políticas de saúde no âmbito do SUS, associado a construção de protocolos, linhas de cuidado e matricialmente da saúde. Além de definir estratégias e dispositivos de organização e fluxos da rede de atenção.

Em Pernambuco, a esfera estadual responsável pelo gerenciamento e coordenação das ações de Vigilância em Saúde é a Secretaria-Executiva de Vigilância em Saúde (SEVS), a qual faz parte da Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco (SES-PE). A SEVS é formada por seis diretorias-gerais: Informações Epidemiológica e Vigilância das Arboviroses; Vigilância de Doenças Negligenciadas e Sexualmente Transmissíveis; Promoção e Vigilância de Riscos e Danos à Saúde; Superintendência de Imunizações e Vigilância das Doenças

Imunopreveníveis; Vigilância Sanitária; e Laboratório Central de Saúde Pública. (Figura 1)

Figura 1: Organograma Secretaria-Executiva de Vigilância em Saúde (SEVS).

VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA

A Vigilância Epidemiológica envolve ações que proporcionam o conhecimento e a detecção de mudanças nos fatores determinantes e condicionantes da saúde, objetivando a recomendação e a adoção de medidas preventivas e de controle de doenças e agravos à saúde.

É através da vigilância epidemiológica que conseguimos um alerta precoce e uma resposta imediata às situações relacionadas à saúde. Dessa forma, sua função é a coleta e processamento de dados, a análise e interpretação dos dados processados, a divulgação das informações, a investigação epidemiológica de casos e surtos e a análise dos resultados obtidos. Fornecendo, então, dados para subsídio de orientações técnicas permanentes, as quais auxiliam na tomada de decisão pelos órgãos competentes sobre políticas públicas relacionadas à saúde.

Um dos papéis da Vigilância epidemiológica, por exemplo, é a regulamentação das doenças que devem ser notificadas, as quais incluem frequentemente doenças preveníveis, como a poliomielite, e doenças transmissíveis, como a tuberculose. Além disso, envolve a vigilância dos óbitos, como a vigilância do óbito materno, o qual deve ser sempre notificado, e a vigilância do óbito fetal e infantil.

Na esfera estadual, a Vigilância Epidemiológica faz parte da Diretoria Geral de Informações Epidemiológicas e Vigilância das Arboviroses do SEVS. Essa diretoria é subdividida em quatro gerências: Informações Epidemiológicas; Vigilância de Eventos Vitais; Serviço de Verificação de Óbitos; e Arboviroses.

Cada gerência possui seus setores de coordenação responsáveis por regulamentar e coordenar as ações voltadas à saúde a nível estadual. (Figura 2).

Figura 2: Organograma vigilância epidemiológica

No estado de Pernambuco, a vigilância epidemiológica conta com uma plataforma online, o Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde de Pernambuco (CIEVS/PE). O CIEVS/PE faz parte da Rede Nacional de Monitoramento e Respostas às Emergências em Saúde Pública, e tem como função detectar, monitorar e coordenar respostas às emergências em saúde do estado de Pernambuco. Desta forma, o CIEVS/PE atua em eventos que podem ameaçar a saúde da população, como as doenças de notificação compulsória imediata, surtos ou epidemias, agravos decorrentes de desastres ou acidentes de qualquer natureza (ex, enchentes), eventos de massa (ex, o carnaval), e os óbitos materno e infantil. A plataforma funciona em tempo integral, nela, através da seção “notifique aqui”, profissionais de saúde podem notificar de forma imediata, doenças de notificação compulsória.

Dentro da Vigilância Epidemiológica, as informações sobre mortalidade permitem uma análise pormenorizada das causas de morte e sua evolução temporal, contribuindo para a compreensão do processo saúde-doença em diversos locais e épocas e permitindo a criação de estratégias de intervenção assistencial. Nesse contexto, uma característica importante é a classificação das Mortes Evitáveis, as quais envolvem as causas de mortes prematuras e desnecessárias, funcionando como um indicador de qualidade da atenção à saúde e permitindo avaliar a adequada assistência médica preventiva ou curativa e a possibilidade de intervenções para evitar novas mortes semelhantes. No Brasil, foi construída uma lista de causas de morte evitáveis, no contexto do SUS, pela Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde por necessidade de uma ferramenta para monitorar o desempenho da atenção à saúde e da prevenção (primária, secundária e terciária), sendo dividida em menores de 5 anos e entre 5 e 75 anos. As causas de morte evitáveis são subdivididas em 3 tópicos: 1º) Causas evitáveis, as quais envolve as causas reduzíveis por ações de imunoprevenção; as causas redutíveis por ações adequadas de promoção à saúde, prevenção, controle e atenção às doenças de causas infecciosas; as causas reduzíveis por ações adequadas de promoção à saúde, prevenção, controle e atenção às doenças não transmissíveis; as causas reduzíveis por ações adequadas de prevenção, controle e atenção às causas de morte materna; e as causas reduzíveis por ações intersetoriais adequadas de promoção à saúde, prevenção e atenção às causas externas; 2º) Causas mal definidas; e 3º) Demais causas (não claramente evitáveis).

VIGILÂNCIA DO ÓBITO DA MULHER EM IDADE FÉRTIL

A portaria nº 1.119 (jul/2008) é responsável por regulamentar a vigilância de óbitos maternos e de mulheres em idade fértil (MIF). Tem por objetivo reduzir a mortalidade materna e de MIF, através da identificação dos principais fatores de risco associados e da criação de estratégias de prevenção de novas ocorrências. Nesse contexto, o preenchimento da Declaração de Óbito (DO), o qual atesta a morte de um indivíduo, é o instrumento oficial do Ministério da Saúde (MS) em todo o território nacional e contribui para o registro e transmissão de informações sobre o óbito, sendo obrigatório seu preenchimento pelos médicos. Para fins de investigação, é considerado MIF aquelas com idade entre 10 e 49 anos.

O MS através da portaria nº 1.119 (jul/2008) estabelece prazos para a realização da investigação do óbito. Após o óbito, o profissional de saúde ou serviço de saúde tem 48 horas para preenchimento e envio do DO.

Tratando-se de óbito de MIF com quaisquer das linhas da DO com um CID relacionado a complicações da gravidez, parto e puerpério, o serviço também deve realizar a notificação compulsória através do CIEVS-PE. Através desta plataforma de notificação online, todos os níveis de vigilância epidemiológica do Estado serão notificados. Desta forma, o óbito de MIF será discutido na vigilância epidemiológica municipal de ocorrência do óbito e, se necessário, poderá ser discutido com o auxílio da Gerência Regional de Saúde (GERES). Se não houver fechamento do caso, o óbito será discutido com a equipe de vigilância epidemiológica do Estado.

Para investigação, a equipe de vigilância epidemiológica dispõe de várias fontes para coleta de informações, por exemplo, entrevista domiciliar, registros ambulatoriais, prontuários hospitalares, SVO, IML e entrevistas com profissionais de saúde.

Paralelo a isso, a Secretaria Estadual de Saúde tem 30 dias, após ocorrência do óbito, para disponibilizar o registro via sistema de informação sobre mortalidade (SIM) para o MS. A equipe de vigilância epidemiológica deve, dentro de 120 dias, realizar a investigação que julgar necessária, buscando fazer um levantamento de informações para melhor caracterizar o óbito, enviar o material ao comitê de morte materna, elaborar a ficha-síntese, e enviá-la ao gestor do SIM.

Com o recebimento da ficha-síntese, o gestor do SIM deve alimentar o módulo de investigação de óbitos maternos no prazo de 7 dias, bem como atualizar o SIM com os dados da ficha síntese, realizando as alterações necessárias, inclusive com alterações de causa de óbito no prazo de 30 dias, tornando o registro alterado disponível ao MS (Figura 3).

Figura 3: Fluxo de informação para investigação de óbito de MIF.

2. OBJETIVO

2.1. Objetivo Geral

Caracterizar os óbitos de Mulheres em Idade Fértil que ocorreram entre 2018 e 2021 em Pernambuco, bem como os óbitos por COVID-19 nesta população no período indicado.

2.2. Objetivos Específicos

  • Analisar a mortalidade proporcional de MIF por causas listadas na CID-10 no período de 2018 a 2021 em Pernambuco;
  • Analisar a mortalidade proporcional de MIF por faixa etária no período de 2018 a 2021 em Pernambuco;
  • Analisar a mortalidade proporcional de MIF por raça/cor no período de 2018 a2021 em Pernambuco;
  • Analisar as principais causas de morte evitável de MIF no período de 2018 a 2021 em Pernambuco;
  • Analisar a proporção de óbitos MIF por COVID-19 antes e durante a pandemia em Pernambuco;
  • Analisar a mortalidade proporcional de MIF com COVID-19 por faixa etária no período de 2018 a 2021 em Pernambuco;
  • Analisar a mortalidade proporcional de MIF com COVID-19 por raça/cor no período de 2018 a 2021;

3. METODOLOGIA

A mortalidade proporcional por capítulo CID-10 em MIF foi calculada através de dados disponíveis no DATASUS/TABNET, na seção estatísticas vitais, mortalidade desde 1996 pela CID-10 e dados preliminares de 2021. Os dados de mortalidade geral em Pernambuco foram selecionados e os seguintes filtros foram aplicados: capítulo CID-10 (linha), ano do óbito (coluna), óbitos por residência (conteúdo), entre o período 2018 a 2021, faixa etária entre 10 a 49 anos e sexo feminino. A partir da tabela gerada pelo DATASUS, filtramos os 4 capítulos com maior número de óbitos em MIF durante o período. Para o cálculo da mortalidade proporcional, usamos a seguinte fórmula: número de óbitos em MIF por capítulo da CID-10 no período selecionado / número total de óbitos em MIF no período selecionado * 100.

A mortalidade proporcional por raça/cor em MIF foi calculada através de dados disponíveis no DATASUS/TABNET, na seção estatísticas vitais, mortalidade desde 1996 pela CID-10 e dados preliminares de 2021. Os dados de mortalidade geral em Pernambuco foram selecionados e os seguintes filtros foram aplicados: raça/cor (linha), ano do óbito (coluna), óbitos por residência (conteúdo), entre o período 2018 a 2021, faixa etária entre 10 a 49 anos e sexo feminino. Para o cálculo da mortalidade proporcional, usamos a seguinte fórmula: número de óbitos em MIF por raça/cor no período selecionado / número total de óbitos em MIF no período selecionado * 100.

A mortalidade proporcional por faixa etária em MIF foi calculada através de dados disponíveis no DATASUS/TABNET, na seção estatísticas vitais, mortalidade desde 1996 pela CID-10 e dados preliminares de 2021. Os dados de mortalidade geral em Pernambuco foram selecionados e os seguintes filtros foram aplicados: faixa etária (linha), ano do óbito (coluna), óbitos por residência (conteúdo), entre o período 2018 a 2021, faixa etária entre 10 a 49 anos e sexo feminino. Para o cálculo da mortalidade proporcional, usamos a seguinte fórmula: número de óbitos em MIF por faixa etária no período selecionado / número total de óbitos em MIF no período selecionado * 100.

Os óbitos por COVID-19 em MIF foram calculados através de dados disponíveis no DATASUS/TABNET, na seção estatísticas vitais, mortalidade desde 1996 pela CID-10 e dados preliminares de 2021. Os dados de mortalidade geral em Pernambuco foram selecionados e os seguintes filtros foram aplicados: categoria CID-10 – B34 doenças por vírus de localização não especificada (linha), ano do óbito (coluna), óbitos por residência (conteúdo), entre o período 2018 a 2021, faixa etária entre 10 a 49 anos, sexo feminino e capítulo CID-10 I. algumas doenças infecciosas e parasitárias.

A mortalidade proporcional por raça/cor por COVID-19 em MIF foi calculada através de dados disponíveis no DATASUS/TABNET, na seção estatísticas vitais, mortalidade desde 1996 pela CID-10 e dados preliminares de 2021. Os dados de mortalidade geral em Pernambuco foram selecionados e os seguintes filtros foram aplicados: raça/cor (linha), ano do óbito (coluna), óbitos por residência (conteúdo), entre o período 2018 a 2021, faixa etária entre 10 a 49 anos, sexo feminino e categoria CID-10 – B34 doenças por vírus de localização não especificada. Para o cálculo da mortalidade proporcional, usamos a seguinte fórmula: número de óbitos em MIF por B34 doenças por vírus de localização não especificada por raça/cor no período selecionado / número total de óbitos em MIF no período selecionado * 100.

A mortalidade proporcional por faixa etária por COVID-19 em MIF foi calculada através de dados disponíveis no DATASUS/TABNET, na seção estatísticas vitais, mortalidade desde 1996 pela CID-10 e dados preliminares de 2021. Os dados de mortalidade geral em Pernambuco foram selecionados e os seguintes filtros foram aplicados: faixa etária (linha), ano do óbito (coluna), óbitos por residência (conteúdo), entre o período 2018 a 2021, faixa etária entre 10 a 49 anos, sexo feminino e categoria CID-10 – B34 doenças por vírus de localização não especificada. Para o cálculo da mortalidade proporcional, usamos a seguinte fórmula: número de óbitos em MIF por B34 doenças por vírus de localização não especificada por faixa etária “X” no período selecionado / número total de óbitos em MIF no período selecionado * 100.

As informações sobre causas evitáveis de óbito em MIF foram coletadas através de dados disponíveis no DATASUS/TABNET, na seção estatísticas vitais, mortalidade desde 1996 pela CID-10 e dados preliminares de 2021. Os dados de óbitos por causas evitáveis entre 5 e 74 anos em Pernambuco foram selecionados e os seguintes filtros foram aplicados: causas evitáveis (linha), ano do óbito (coluna), óbitos por residência (conteúdo), entre o período de 2018 a 2021, faixa etária entre 10 a 49 anos e sexo feminino.

As informações sobre as principais causas de óbito por capítulo da CID-10 por faixa etária em MIF foram coletadas através de dados disponíveis no DATASUS/TABNET, na seção estatísticas vitais, mortalidade desde 1996 pela CID-10 e dados preliminares de 2021. Os dados foram selecionados e os seguintes filtros foram aplicados: capítulo da CID-10 (linha), faixa etária (coluna), óbitos por residência (conteúdo), entre o período de 2018 a 2021, faixa etária entre 10 e 49 anos e sexo feminino.

4. RESULTADOS

Fonte: DataSUS/TabNet

Tabela 2: Mortalidade proporcional (MP) de óbitos em MIF por raça/cor em Pernambuco, 2018 – 2021

Fonte: DataSUS/TabNet

Tabela 3: Mortalidade proporcional (MP) de óbitos em MIF por faixa etária em Pernambuco, 2018 -2021

Fonte: DataSUS/TabNet

Tabela 4: Óbitos de MIF por COVID-19 em Pernambuco, 2018 – 2021

Fonte: DataSUS/TabNet

Tabela 5: Mortalidade proporcional (MP) de óbitos MIF por COVID-19 por raça/cor em Pernambuco, 2018 – 2021

Fonte: DataSUS/TabNet

Tabela 6: Mortalidade proporcional (MP) de óbitos MIF por COVID-19 por faixa etária em Pernambuco, 2018 – 2021

Fonte: DataSUS/TabNet

Tabela 7: Mortalidade proporcional (MP) e classificação dos óbitos em MIF, de acordo com a Lista Brasileira de Causas evitáveis, em Pernambuco, 2018 – 2021

Fonte: DataSUS/TabNet

Tabela 8: Mortalidade proporcional (MP) de óbitos evitáveis em MIF em Pernambuco, 2018 – 2021

Causas evitáveis2018201920202021TotalMP (%)
1.1. Reduzíveis pelas ações de imunoprevenção3424130,15
.. Tuberculose miliar210250,06
.. Tuberculose do sistema nervoso111144,04
.. Hepatite aguda B021030,03
1.2. Reduz ações prom prev contr atenç doenç infec3293413303581.35815,15
.. Doenças pelo vírus da imunodeficiência humana1221131031144525,04
.. Infecções respirat incl pneumonia e influenza707459762793,11
.. Outras infecções274033501501,67
1.3. Reduz ações prom prev contr atenç doe ñ trans1.2361.2501.2811.2855.05256,35
.. Neoplasia maligna da mama1881751862007498,35
.. Doenças cerebrovasculares1751961491586787,56
.. Doenças isquêmicas do coração1891701311075976,66
1.4. Reduz ações prev contr atenção causas matern967399893573,98
.. Complicações gravidez parto e puerpério967399893573,98
1.5. Reduz ações prom prev atenç causas externas5115155815782.18524,37
.. Agressões2021681871977548,41
.. Acidentes de transporte1241301401034975,54
.. Eventos cuja intenção é indeterminada78801001283864,31
TOTAL2.1752.1832.2932.3148.965100,00

Fonte: DataSUS/TabNet

Tabela 9: Principais causas de óbito em MIF por faixa etária em Pernambuco, 2018 – 2021

Fonte: DataSUS/TabNet

5. DISCUSSÃO

O perfil epidemiológico das MIF residentes em Pernambuco durante o período em estudo (2018 – 2021) mostra um aumento de 31,55% (n=1.926) no número de óbitos de MIF entre o biênio de 2018 – 2019 e o biênio de 2020 – 2021, período anterior e durante a pandemia do COVID-19, respectivamente. Entre 2018 e 2019, as principais causas desses óbitos é semelhante ao encontrado em outros estudos a nível nacional (Brasil, 2021; Purificação, 2020), ou seja, as 4 principais causas por capítulo da CID 10 foram em 1º lugar, neoplasias; em 2º lugar, doenças do aparelho circulatório; em 3º lugar, causas externas de morbidade e mortalidade; e em 4º lugar, algumas doenças infecciosas e parasitárias (Tabela 1). No entanto, no biênio 2020 – 2021, o capítulo da CID 10 que trata de algumas doenças infecciosas e parasitárias passa a ocupar o 1º lugar (n=1.793) em causa de óbito nesse grupo populacional. Tal mudança epidemiológica, provavelmente, está relacionada ao período de pandemia iniciado em 2020, já que o COVID-19 encontra-se representado na CID-10 pelo código B34.2 (infecção pelo coronavírus de localização não especificada), o qual está contido no capítulo I da CID 10. A coleta de dados pelo DataSUS/TabNET não permitiu a visualização da codificação B34.2, gerando apenas o código B34 (doenças por vírus, de localização não especificada), o qual envolve também o COVID-19, o que pode ter limitado a análise de dados. Para fins de análise, foi considerado óbitos COVID-19, os que foram codificados como B34. Além disso, houve um aumento de 308,42% (n=1.354) no número de óbitos associados a doenças infecciosas e parasitárias nas MIF entre o biênio 2018 – 2019 e o biênio 2020 – 2021, ultrapassando os óbitos por neoplasia durante a pandemia, fato esses associados aos óbitos por COVID-19.

Ao analisar os óbitos de MIF por raça/cor, observamos que a maior parte desses óbitos ocorre em mulheres autodeclaradas pardas/pretas, com a mortalidade proporcional (MP) de 71,25% (n= 10.071 óbitos), seguida das autodeclaradas brancas (MP=26,62%; n= 3.763) (Tabela 2). Em todas as raças/cores foram observados crescimento no número de óbitos entre 2018 e 2021, entretanto entre o Biênio 2018-2019 e 2020-2021 o número de óbitos nas MIF pardas/pretas cresceu aproximadamente 27,54%, enquanto nas MIF autodeclaradas brancas houve um crescimento aproximado de 41,84%.

A faixa etária mais acometida foi entre 40 e 49 anos de idade com percentual de óbito de 52,10% entre os óbitos de MIF. Em segundo lugar vem a faixa etária entre 30 e 39 anos, com 26,63% dos óbitos, em terceiro lugar entre 20 e 29 anos, com 14% dos óbitos, em quarto lugar entre 15 a 19 anos, com 4,97% dos óbitos, e em quinto lugar entre 10 e 14 anos, com 2,29% (Tabela 3). Ou seja, os óbitos de MIF ocorrem, em sua maioria, nas faixas etárias mais avançadas, o que é esperado em contingente populacional. A análise segundo os capítulos da CID-10 mostra que a maior proporção de óbitos nas faixas etárias de 10 – 14 anos, 15 – 19 anos e 20 29 anos, em todo o período analisado (2018 – 2021), são devidos às causas externas (Tabela 8), entretanto, o que chama a atenção é o aumento da proporção de óbitos por doenças infecciosas e parasitárias, passando a ocupar a 2ª causa de óbitos nessas faixas etárias em 2021. Nas faixas etárias de 30 – 39 anos e 40 – 49 anos a principal causa de óbito no biênio 2018 – 2019 é por neoplasias, porém no biênio 2020 – 2021 observamos uma mudança no perfil de óbitos com maior proporção de óbitos por doenças infecciosas e parasitárias na faixa etária de 30 – 39 anos já em 2020 e com aumento aproximado de 89,83% de óbitos por essa causa em 2021, aparecendo em primeiro lugar em proporção de óbitos. Já na faixa etária de de 40 49 anos, as doenças infecciosas e parasitárias aparecem em segundo lugar em 2020, ainda com predomínio de óbitos por neoplasias, porém, em 2021 ocorre uma predominância de óbitos por doenças infecciosas e parasitárias também nessa faixa etária. Como é entre as faixas etárias de 30 – 39 anos e 40 – 49 anos que ocorre a maior proporção de óbitos, esse aumento no número de óbitos por doenças infecciosas, principalmente por COVID-19, explica o porquê esse capítulo da CID-10 passou a ser predominante como causa de óbito nas MIF no biênio 2020-2021. (Tabela 1) Essas informações levantam o questionamento sobre a assistência à saúde das mulheres acometidas pelo COVID-19, porém, como a vacinação contra o COVID-19 iniciou apenas no início de 2021, não é possível avaliar o impacto da vacinação, dessa forma, é preciso fazer uma avaliação continuada sobre esses dados epidemiológicos para uma futura análise do impacto da vacinação na sociedade.

No contexto de análise dos óbitos de MIF, é preciso lembrar que a maior parte dos óbitos de mulheres entre 10 – 49 anos é considerado evitável, como observado na Tabela 7. Ou seja, são óbitos que não deveriam ocorrer, pois suas causas são passíveis de prevenção ou tratamento. No entanto, a proporção de óbitos de MIF ainda é grande, correspondendo a 4,98% de todos os óbitos que ocorreram no período de 2018 a 2021 (n=283.485 óbitos), além de uma proporção de óbitos evitáveis de 63,42% (n=8.965) de MIF nesse mesmo período. O que mais chama a atenção é que a principal causa de morte evitável, entre 2018 – 2021, foi a agressão (8,41%), que se encontra no grupo dos óbitos passíveis de redução por ações intersetoriais adequadas de promoção à saúde, prevenção e atenção às causas externas. Tal dado mostra o impacto da violência contra a mulher no estado de Pernambuco e, apesar de a Secretaria de Defesa Social do estado de Pernambuco em 2020 mostrar uma tendência à queda nos casos de violência contra a mulher, não observamos, em termos absolutos, diminuição significativa no número de óbitos de MIF de 2018 para 2021.

A neoplasia maligna de mama é a primeira causa de morte por câncer na população feminina, inclusive em Pernambuco, segundo o INCA (2022), e é a segunda causa de óbito evitável entre as MIF, representando 8,35% dos óbitos evitáveis entre 2018 e 2021. Estudos mostram uma tendência ascendente na taxa de mortalidade por câncer de mama ao longo das últimas décadas em todas as regiões do Brasil (INCA, 2022), o que corrobora com o aumento de 6,38% de óbitos por câncer de mama em MIF entre 2018 e 2021. Nesse contexto, percebemos que apesar de campanhas governamentais, como o outubro Rosa, ainda há falhas na prevenção, controle e atenção às doenças não transmissíveis.

O óbito por COVID-19 representou 16,74% (n=1345) dos óbitos de MIF durante a pandemia (2020 – 2021) em Pernambuco (Tabela 4). Em relação à faixa etária mais acometida pelo COVID-19, os dados coletados mostraram uma relação decrescente, onde as mulheres entre 40 a 49 anos representavam 60,48% (n= 814) do total de óbitos de MIF por COVID-19 em PE no período analisado (Tabela 6). Paralelo a isso, mulheres entre 10 e 29 anos correspondem a 11,81% (n= 159) do total de óbitos de MIF por COVID.

Com a estratificação dos óbitos por raça/cor, percebe-se que o grupo pardos/pretos corresponde a 63,52% (n= 855) do número de óbitos por COVID-19 em MIF, enquanto apenas 34,4% (n= 463) destes óbitos correspondem a mulheres brancas. (Tabela 5)

A divergência entre os óbitos de MIF por COVID-19 entre pretas e pardas (63,52%) versus brancas (34,4%), pode ser explicada em parte pela maior proporção de brasileiros autodeclarados pretos e pardos (54,9%) versus brancos (44,2%) (IBGE, 2016). No entanto, este parece não ser o único fator, visto que os números de óbitos por cor se afastam da proporção de cor da população brasileira. Em um estudo realizado por van der Schaar e colaboradores (2020) foi observado uma maior mortalidade por COVID-19 em populações pretas e pardas. O mesmo padrão foi observado em Pernambuco, no subgrupo de MIF, onde mulheres pretas e pardas compõem cerca de dois terços dos óbitos por COVID-19. Desta forma, nós especulamos que este fato está relacionado às diferenças no acesso ao serviço de saúde dentre os grupos étnicos.

6. CONCLUSÃO

Diante dos resultados encontrados, que demonstram uma mudança no perfil de óbitos de MIF entre os biênios 2018-2019 e 2020-2021, percebesse que a pandemia gerada pelo COVID-19 contribuiu significativamente para o aumento no número de óbitos de MIF durante esse período. Além disso, são os pardos/pretos os mais afetados, mostrando que provavelmente há diferenças no acesso aos serviços de saúde. Dessa forma, é preciso mais investimentos na saúde pública para que toda a população seja assistida de forma equânime e para que haja uma redução na desigualdade de acesso à saúde.

Os resultados também demonstram que a distribuição por causa de morte é diferente de acordo com a faixa etária de MIF, ou seja, é necessário que o planejamento das ações em saúde seja realizado de forma diferenciada de acordo com cada grupo etário. Entre 10 e 29 anos são necessárias ações voltadas para a prevenção de acidentes, como quedas, afogamentos e envenenamentos, segurança no trânsito e educação sobre violência, além de medidas que estimulem o acesso e a adoção de um estilo de vida mais saudável, a fim de atuar na redução do risco de neoplasias e doenças cardiovasculares nas faixas etárias mais avançadas. Além disso, o investimento em medidas preventivas e em rastreio precoce, bem como assistências e tratamento oportuno de doenças e agravos evitáveis, são essenciais para a redução do número de óbitos de MIF.

A maior parte dos óbitos de MIF ocorrem por causas consideradas evitáveis, como o câncer de mama, agressões e doenças cerebrovasculares. Tal fato demonstra que ainda há muitas falhas nas ações de prevenção e promoção da saúde, as quais podem estar relacionadas a déficits financeiros e a organização e gestão da saúde no estado de Pernambuco. Dessa forma, ainda são muitos os desafios para alcançar um modelo de saúde integral e longitudinal digno para as MIF.

REFERÊNCIAS

Brasil. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria nº1.119, de 5 de julho de 2008. Brasília, 2008. Portaria nº 1.119, de 5 de junho de 2008

Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 588, de julho de 2018.
Brasília, 2018.

Baqui P, Bica I, Marra V, Ercole A, van der Schaar M. Ethnic and regional variations in hospital mortality from COVID-19 in Brazil: a cross-sectional observational study. Lancet Glob Heal 2020; :6–8

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Mortalidade proporcional por grupos de causas em mulheres no Brasil em 2010 e 2019. Boletim Epidemiológico, volume 52, Nº 29, ago. 2021.

Purificação, Juliana Karla. Mortalidade de Mulheres em Idade Fértil em uma região de saúde de Pernambuco, Brasil, 2012 a 2017. Recife- PE, 2020.

INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA. Atlas da mortalidade.
Rio de Janeiro: INCA, 2022. Base de dados.


1Médico pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
2Acadêmica de Biblioteconomia e Ciência da Informação pela Universidade Estadual de São Paulo (USP)
3Acadêmica de Medicina pela Universidade Estadual de Pernambuco (UPE)
4Médica pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap)
5Acadêmica de Medicina pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap)
6Acadêmica de Medicina pela Universidade Brasil