REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202408282052
COSTA, Lucas Henrique Silva
Co-autoria de:
CAMPOS, Fabrício Alves de Oliveira
FARIA, Tomás Carvalho de
CHIRGO, David Sampaio;
RESUMO
A pancreatite crônica paraduodenal, também conhecida como pancreatite de sulco ou ainda Groove pancreatitis, é uma condição rara e de difícil diagnóstico que acomete o sulco paraduodenal, localizado entre o duodeno e a cabeça do pâncreas. Embora a patogênese exata desta doença não esteja completamente compreendida, evidências sugerem uma interação entre fatores genéticos e ambientais, como o consumo excessivo de álcool. O diagnóstico é frequentemente desafiador devido à semelhança com outras doenças pancreáticas, sendo crucial a utilização de exames de imagem avançados e a análise cuidadosa da história clínica. O tratamento ainda não está bem estabelecido, variando desde abordagens conservadoras até intervenções cirúrgicas como a duodenopancreatectomia. O presente trabalho abordou o caso clínico de um paciente de 44 anos, com quadro clínico-laboratorial inespecífico, com tomografia computadorizada apresentando espessamento de região de sulco, confirmado por ressonância magnética.
Palavras chave: Pancreatite de sulco, Pancreatite Crônica Paraduodenal, Diagnóstico, Tratamento, Sulco Paraduodenal,
ABSTRACT
Paraduodenal chronic pancreatitis, also known as groove pancreatitis, is a rare and challenging condition that affects the paraduodenal groove, a region located between the duodenum and the head of the pancreas. Although the exact pathogenesis of this disease is not fully understood, evidence suggests an interaction between genetic and environmental factors, such as excessive alcohol consumption. Diagnosis is often difficult due to the similarity with other pancreatic diseases, making the use of advanced imaging studies and careful clinical history analysis crucial. The treatment is not yet well established, ranging from conservative approaches to surgical interventions such as duodenopancreatectomy. This case report discusses a 44-year-old patient with a nonspecific clinical-laboratory presentation, where a computed tomography scan revealed thickening of the groove region, which was confirmed by magnetic resonance imaging.
Keywords: Groove pancreatitis, Chronic Paraduodenal Pancreatitis, Diagnosis, Treatment, Paraduodenal Groove
RESUMEN
La pancreatitis crónica paraduodenal, también conocida como pancreatitis de surco o groove pancreatitis, es una condición rara y de difícil diagnóstico que afecta el surco paraduodenal, una región ubicada entre el duodeno y la cabeza del páncreas. Aunque la patogénesis exacta de esta enfermedad no está completamente comprendida, la evidencia sugiere una interacción entre factores genéticos y ambientales, como el consumo excesivo de alcohol. El diagnóstico es frecuentemente complicado debido a la similitud con otras enfermedades pancreáticas, lo que hace crucial el uso de estudios avanzados de imagen y un análisis cuidadoso de la historia clínica. El tratamiento aún no está bien establecido, variando desde enfoques conservadores hasta intervenciones quirúrgicas como la duodenopancreatectomía. Este trabajo aborda el caso clínico de un paciente de 44 años con una presentación clínico-laboratorial inespecífica, donde la tomografía computarizada mostró engrosamiento de la región del surco, confirmado por resonancia magnética.
Palabras clave: Pancreatitis del surco, Pancreatitis paraduodenal crónica, Diagnóstico, Tratamiento, Surco Paraduodenal
INTRODUÇÃO
A pancreatite crônica paraduodenal (PCP), também denominada pancreatite de sulco, distrofia cística de pâncreas heterotópico, ou mioadenomatose, é uma entidade clínica rara e subdiagnosticada, inicialmente descrita por Potet e Duclert em 1970. Anatomicamente, o sulco pancreatoduodenal está delimitado lateralmente pela segunda porção do duodeno, medialmente pela cabeça do pâncreas, anteriormente pela primeira porção do duodeno ou antro gástrico, e posteriormente pela terceira porção do duodeno ou veia cava inferior. A doença se manifesta em duas formas: a pura, que afeta exclusivamente o sulco pancreatoduodenal, e a segmentar, que envolve também a cabeça do pâncreas, podendo simular neoplasias periampulares devido à compressão de estruturas adjacentes.
RELATO DE CASO
Paciente W.S, 44 anos, tabagista (20 anos. maço) e etilista crônico, apresenta quadro de dor abdominal associada a vômitos. Atendido em serviço de pronto atendimento, foi realizada analgesia e Ressonância Nuclear Magnética de abdome, que evidenciou cisto para pélvico à esquerda. Evolui com melhora geral e alta, porém com manutenção de cólica e perda do apetite. Retorna ao pronto atendimento após 9 dias, em ouro serviço, com piora da dor localizada em hipogástrio, vômitos pós alimentares e calafrios associados. A revisão laboratorial apresentou Hb 19,9 (PELA HB SERIA INTERESSANTE INCLUIR O HEMATÓCRITO); GL 7280 sem desvio; plaquetas: 191000; amilase: 49; TGP 39; TGO 16; BT 1,40; BI 1,07; BD 0,33; FA: 114; PCR: negativo; tomografia computadorizada (TC) de abdome: apêndice cecal não visualizado, com ausência de linfadenomegalias. Administrados analgésicos seguidos de alta, porém mantendo dor e náuseas e perda de apetite.
Deu entrada no pronto atendimento de um terceiro serviço, no dia seguinte, com queixa de dor em região epigástrica e hipogástrica que pioram após alimentação e melhoram após vômito, empachamento pós prandial, náuseas e vômitos e inapetência. Novas informações incluem perda ponderal de 15 kg em 2 meses e surgimento das queixas desde colecistectomia por videolaparoscopia (CVL), três anos antes. Realizada endoscopia digestiva alta, evidenciando gastrite com atrofia, sem obstrução do duodeno. A tomografia computadorizada contrastada de abdome evidenciou espessamento heterogêneo em região de sulco pancreatoduodenal, questionando pancreatite de groove. Hipótese corroborada após realização de ressonância nuclear magnética (RNM) de abdome superior e Colangio RNM, conforme na figura 1.
Figura 1: Em destaque vermelho – cabeça do pâncreas apresentando discreto aumento volumétrico na região do sulco pancreatoduodenal. Em asterisco amarelo: imagem hipointensa levemente heterogênea, indicando um processo inflamatório.
Diante da hipótese levantada, foi inicialmente sugerida uma abordagem cirúrgica, com a realização da duodenopancreatectomia (cirurgia de Whipple). Contudo, após discussão entre a equipe médica, paciente e familiares, optou-se pela tentativa do tratamento conservador, que inclui a cessação do etilismo e tabagismo, essencial para o controle da doença e prevenção de novas crises. além da otimização da analgesia, com introdução de pregabalina.
O paciente apresentou melhora progressiva dos sintomas, sem necessidade de intervenção cirúrgica. Apesar disso, ele mantém acompanhamento ambulatorial regular, com controle adequado da dor e estabilização do quadro clínico.
Após cerca de um mês, não houve novos episódios agudos e o paciente demonstrou recuperação gradual do estado nutricional, com ganho ponderal e melhora no apetite.
DISCUSSÃO
A pancreatite de groove é classificada em uma forma pura e, outra forma, segmentar. A forma pura corresponde a lesões contidas no sulco paraduodenal, respeitando os duetos pancreáticos e o restante do parênquima pancreático. A forma segmentar envolve o sulco, a cabeça do pâncreas, provocando estenose do dueto pancreático e dilatação ductal a montante da estenose. A patogênese dessa entidade não é muito clara, possivelmente com uma participação genética baseada em suscetibilidade a patógenos ambientais, tais como álcool. Admite-se, timidamente, que o mecanismo principal seria a interrupção, ou o embaraço, do fluxo pancreático no canal de Santorini, na altura da papila menor. Características importantes referem-se à hiperplasia das glândulas de Brunner, estenose duodenal e à preservação do dueto colédoco. A PCP evoca semelhança com a pancreatite crônica de outras etiologias, mas com uma mais importante presença de náusea e vômito, sobretudo pós-prandiais, e perda de peso. O emagrecimento é principalmente decorrente da estenose duodenal e de problemas de esvaziamento gástrico. Dor abdominal pós prandial é comum. Icterícia é raramente observada.
O diagnóstico da pancreatite Groove é desafiador devido à sua semelhança com tumores pancreáticos. As técnicas de imagem modernas ajudam, mas a sobreposição de características radiológicas e endoscópicas dificultam a diferenciação entre PCP e adenocarcinoma pancreático.
Na ressonância magnética, a pancreatite de sulco (GP) aparece como uma massa em forma de folha entre a cabeça do pâncreas e o duodeno, hipointensa em relação ao parênquima pancreático nas imagens ponderadas em T1. Em T2, dependendo do estágio da doença, a massa pode ser hipo, iso ou levemente hiperintensa. As variações de sinal em T2 ajudam a inferir o grau de atividade da doença, com sinais hiperintensos nas fases iniciais devido ao edema e sinais iso-hipointensos nas fases avançadas devido à fibrose.
Em alguns casos, apenas a ressecção cirúrgica permite um diagnóstico preciso. Complicações adicionais incluem casos de PCP com adenocarcinoma. Quando há alta suspeita de PCP um tratamento conservador é considerado. Outras condições, como pancreatite autoimune e tumores císticos, também devem ser consideradas no diagnóstico diferencial.
O tratamento conservador para a pancreatite de sulco na fase aguda inclui repouso, analgesia, nutrição parenteral e abstinência de álcool e tabaco. Após 1 a 2 meses de intervenção, a maioria dos pacientes apresenta melhora nos sintomas e na nutrição. No entanto, aqueles com alterações anatômicas predisponentes ou que não mantêm abstinência podem ter recorrências. Em casos refratários, especialmente com estenose duodenal e piora nutricional, a cirurgia é considerada. A duodenopancreatectomia (procedimento de Whipple) é o tratamento de escolha. Em alguns casos, a drenagem endoscópica do ducto pancreático menor pode ser eficaz, seja como tratamento definitivo ou temporário antes da cirurgia.
Esse relato de caso, descreve a forma pura da doença e comprova a dificuldade em confirmar o diagnóstico de pancreatite crônica paraduodenal (PCP). A história clínica do paciente foi de extrema importância para a exclusão de outras patologias. Foram solicitados diversos exames laboratoriais e de imagem para que a equipe médica chegasse a um diagnóstico. A patogênese dessa entidade não é muito clara, possivelmente com uma participação genética baseada em suscetibilidade a patógenos ambientais, tais como o álcool. O tratamento ainda não é muito bem esclarecido na literatura. Foi sugerido duodenopancreatectomia, no entanto, o paciente está realizando tratamento conservador e ambulatorial à base de analgésicos e Pregabalina, um anticonvulsivante que atua diretamente no sistema nervoso central. A dor abdominal e os demais sintomas permaneceram por cerca de um mês. Entretanto, após esse período, o paciente não descreveu novos episódios agudos. Atualmente, o paciente continua em acompanhamento, demonstrando excelente recuperação.
CONCLUSÃO
A pancreatite crônica paraduodenal (PCP) é uma condição rara e desafiadora, frequentemente confundida com neoplasias pancreáticas devido às suas manifestações clínicas e radiológicas. O diagnóstico preciso muitas vezes requer uma combinação de história clínica detalhada e exames de imagem. O manejo terapêutico inicial é conservador baseado em analgesia e cessação de etilismo e tabagismo. Porém, em casos refratários ou com complicações significativas, a duodenopancreatectomia pode ser necessária. O presente caso destaca a importância do diagnóstico precoce e da abordagem multidisciplinar para o manejo adequado desta condição.
REFERÊNCIAS
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¹Universidade José do Rosário Vellano (UNIFENAS – BH)