OSTEONECROSE DA MANDÍBULA EM PACIENTES ONCOLÓGICOS INDUZIDA POR USO DE MEDICAMENTOS: REVISÃO DE LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202503211140


Eric Filipe Trindade Cândido Santos1
Fernanda Vieira da Silva2
Luan Silva dos Santos3
Micaella Ordalia Marçal de Freitas4
Ana Luiza Andrade de Oliveira5
Lucimara Candia Mamani6
Eurico Gunther Santos Furquim De Camargo7
Joicy Aparecida Silva Manrique8
Rafaela Donizete de Oliveira9
Luiza Campos Corradini10


RESUMO

A osteonecrose da mandíbula relacionada ao uso de medicamentos (MRONJ) é uma condição caracterizada pela necrose óssea persistente por mais de oito semanas, frequentemente associada ao uso de fármacos antirreabsortivos, como bifosfonatos e denosumabe, em pacientes submetidos a tratamentos para osteoporose, doença de Paget ou câncer metastático. Clinicamente, manifesta-se pela presença de uma ferida óssea exposta que não cicatriza, podendo ser acompanhada de dor, inflamação e infecção secundária. Este estudo tem como objetivo revisar os principais protocolos para o manejo inicial da MRONJ em pacientes oncológicos. Trata-se de uma revisão de literatura baseada em artigos científicos indexados nas bases PubMed, SciELO e LILACS, considerando publicações dos últimos cinco anos. Foram incluídos estudos que abordam diagnóstico, prevenção e tratamento da MRONJ, excluindo revisões não sistemáticas e relatos de casos isolados. A MRONJ é uma condição complexa, cuja etiologia, tratamento e medidas preventivas ainda não estão completamente esclarecidos. Segundo a literatura, o risco de desenvolvimento da osteonecrose é significativamente maior quando os bifosfonatos são administrados por via intravenosa, em comparação com a via oral. Dessa forma, pacientes em tratamento com bifosfonatos e denosumabe devem ser monitorados regularmente para identificação precoce de sinais clínicos da doença. Atualmente, não há um tratamento definitivo para a MRONJ, sendo recomendada uma abordagem paliativa, baseada no uso de antibióticos, analgésicos e cuidados locais. A principal estratégia terapêutica envolve a prevenção, o controle da infecção, a minimização da progressão da necrose óssea e o alívio da dor, visando preservar a qualidade de vida dos pacientes e otimizar o manejo clínico da condição.

Palavras-chaves: Drogas antirreabsortivas, bifosfonatos, denosumabe, antiangiogênica, osteonecrose e câncer. 

ABSTRACT  

Medication-related osteonecrosis of the jaw (MRONJ) is a condition characterized by persistent bone necrosis lasting more than eight weeks, often associated with the use of antiresorptive drugs, such as bisphosphonates and denosumab, in patients undergoing treatment for osteoporosis, Paget’s disease or metastatic cancer. Clinically, it manifests as the presence of an exposed bone wound that does not heal, which may be accompanied by pain, inflammation and secondary infection. This study aims to review the main protocols for the initial management of MRONJ in cancer patients. This is a literature review based on scientific articles indexed in the PubMed, SciELO and LILACS databases, considering publications from the last five years. Studies that address the diagnosis, prevention and treatment of MRONJ were included, excluding non-systematic reviews and isolated case reports. MRONJ is a complex condition, whose etiology, treatment and preventive measures are not yet fully understood. According to the literature, the risk of developing osteonecrosis is significantly higher when bisphosphonates are administered intravenously, compared to orally. Therefore, patients undergoing treatment with bisphosphonates and denosumab should be regularly monitored for early identification of clinical signs of the disease. Currently, there is no definitive treatment for MRONJ, and a palliative approach based on the use of antibiotics, analgesics and local care is recommended. The main therapeutic strategy involves prevention, infection control, minimization of the progression of bone necrosis and pain relief, aiming to preserve the quality of life of patients and optimize the clinical management of the condition.

Keywords: Antiresorptive drugs, bisphosphonates, denosumab, antiangiogenic, osteonecrosis and cancer.

OBJETIVO 

Este estudo tem como objetivo realizar uma revisão de literatura abrangente sobre a associação entre o uso de medicamentos, especialmente os agentes antirreabsortivos e antiangiogênicos, e a ocorrência de osteonecrose da mandíbula em pacientes oncológicos. Serão analisados os principais fatores de risco envolvidos no desenvolvimento da condição, bem como estratégias para sua prevenção e abordagem terapêutica. Além disso, busca-se discutir as implicações clínicas dessa associação, fornecendo subsídios para a tomada de decisão no contexto odontológico e contribuindo para o aprimoramento das condutas multidisciplinares no manejo desses pacientes.

MÉTODO

Para a elaboração desta revisão de literatura, foi conduzida uma busca sistemática de artigos científicos publicados entre os anos de 2019 e 2024, utilizando as bases de dados PubMed (National Library of Medicine), Web of Science, SciELO (Scientific Electronic Library Online) e Google Acadêmico. O objetivo dessa busca foi reunir evidências científicas atualizadas sobre a relação entre o uso de medicamentos, como agentes antirreabsortivos e antiangiogênicos, e a ocorrência de osteonecrose da mandíbula em pacientes oncológicos. Foram empregados os seguintes descritores em inglês, combinados por meio dos operadores booleanos AND e OR, a fim de refinar os resultados e garantir a inclusão de estudos relevantes: Osteonecrosis of the jaw, Denosumab, Cancer, Antiresorptives e Bone metastasis. A seleção inicial dos artigos foi realizada por meio da leitura dos títulos e resumos, buscando identificar aqueles que abordavam aspectos clínicos e radiográficos da osteonecrose da mandíbula, além de estratégias de prevenção e manejo terapêutico. Os critérios de inclusão envolveram estudos originais, revisões sistemáticas e diretrizes clínicas que apresentassem embasamento científico sólido e que estivessem disponíveis em inglês, português ou espanhol. Foram excluídos artigos com dados incompletos, relatos de caso isolados sem fundamentação ampla, trabalhos que não apresentassem metodologia clara e publicações que não contemplassem informações pertinentes ao objetivo deste estudo.

INTRODUÇÃO 

A osteonecrose da mandíbula relacionada ao uso de medicamentos (BRONJ – Bisphosphonate-Related Osteonecrosis of the Jaw) é uma condição severa e de difícil manejo clínico, caracterizada pela necrose óssea persistente na região maxilofacial. Inicialmente associada exclusivamente ao uso de bisfosfonatos (BPs), essa complicação ganhou maior relevância com a introdução de outras terapias antirreabsortivas, como o denosumabe e antiangiogênicas, levando à ampliação do termo para osteonecrose relacionada a drogas antirresortivas da mandíbula (BRONJ). A crescente prevalência dessa condição, especialmente em pacientes oncológicos submetidos a doses elevadas dessas medicações, destaca a necessidade de uma compreensão aprofundada de seus mecanismos fisiopatológicos, fatores de risco e abordagens terapêuticas. Os bisfosfonatos são amplamente utilizados no tratamento de doenças que afetam a remodelação óssea, como osteoporose, doença de Paget e metástases ósseas. Eles atuam inibindo a atividade dos osteoclastos, reduzindo a reabsorção óssea e proporcionando maior estabilidade esquelética. No entanto, seu uso prolongado e em altas concentrações têm sido associados a efeitos adversos significativos, sendo a osteonecrose da mandíbula um dos mais graves. O diagnóstico da BRONJ requer a presença de três critérios clínicos: histórico de uso de bisfosfonatos, exposição óssea necrótica na região maxilofacial por mais de oito semanas e ausência de radioterapia prévia na cabeça e pescoço. A incidência da BRONJ varia de acordo com a via de administração e a dose do medicamento, sendo significativamente maior em regimes oncológicos, nos quais os bisfosfonatos são administrados em doses elevadas e com maior frequência. As manifestações clínicas da BRONJ variam de assintomáticas a quadros severos, envolvendo dor intensa, infecções recorrentes, fístulas orais e até fraturas patológicas da mandíbula. Fatores de risco adicionais incluem procedimentos odontológicos invasivos, como exodontias, trauma local e higiene bucal deficiente, além de condições sistêmicas que comprometem a cicatrização óssea. Além dos bisfosfonatos, o denosumabe, um inibidor do ligante do receptor ativador do fator nuclear kappa B (RANKL), também está implicado no desenvolvimento da osteonecrose da mandíbula, apesar de apresentar vantagens como maior tolerabilidade e administração subcutânea. Os mecanismos fisiopatológicos da BRONJ ainda não são completamente elucidados, mas estudos indicam que a remodelação óssea comprometida, a inibição da angiogênese, a supressão da resposta imune e a colonização microbiana desempenham papéis centrais na progressão da doença. A cavidade oral apresenta características únicas que contribuem para sua suscetibilidade, incluindo um suprimento sanguíneo distinto e uma microbiota diversificada. Evidências metagenômicas sugerem que alterações na diversidade bacteriana, especialmente a presença de Actinomyces, podem influenciar significativamente a evolução da osteonecrose. Diante da complexidade dessa condição e da ausência de um tratamento definitivo, torna-se essencial aprofundar o conhecimento sobre os fatores que predispõem ao desenvolvimento da BRONJ, bem como explorar estratégias preventivas e terapêuticas mais eficazes. Assim, este estudo tem como objetivo revisar a literatura científica disponível sobre a relação entre medicamentos antirreabsortivos e osteonecrose da mandíbula, destacando os principais fatores de risco, abordagens preventivas e opções terapêuticas para o manejo dessa condição.

REVISÃO DE LITERATURA

Conceito e definição da osteonecrose da mandíbula relacionada a medicamentos (BRONJ).

A osteonecrose mandibular relacionada a medicamentos (BRONJ) é uma condição incomum, porém grave, sendo caracterizada pela exposição do osso que não cicatriza em pacientes sem histórico de exposição à radiação na cabeça e pescoço e com histórico ou uso contínuo de agentes antirreabsortivos ou antiangiogênico (Pardo-Zamora et al., 2021). 

A cavidade oral tem uma série de características únicas que a tornam um ambiente distinto. A mandíbula é rica em cálcio, que pode absorver uma quantidade maior de BPs do que os ossos longos. Além disso, os ossos longos são produzidos por ossificação endocondral, enquanto as mandíbulas se desenvolvem principalmente através da ossificação intramembranosa. Demonstrou-se que as mandíbulas humanas contêm mais colágeno do que ossos longos. Essas características anatômicas garantem que os ossos da mandíbula sejam únicos, com uma propensão a sofrer osteonecrose. A estreita relação entre os dentes e o osso da mandíbula fornece uma rota para microorganismos e outros agentes inflamatórios entrarem no osso, uma situação não encontrada em nenhum outro local anatômico (LINA HE et al., 2020).

A classe e a administração dos BPs afetam os resultados terapêuticos e os riscos relacionados, especialmente no contexto do BRONJ. As BPs são classificadas em duas categorias: BPs não contendo nitrogênio (BPs não-N) e N-BPs. Não-N-BPs, como o etidronato, são considerados BPs de primeira geração, enquanto N-BPs são BPs de segunda geração. Este grupo inclui, por exemplo, alendronato e ácido zoledrônico. O novo grupo de BPs tem aplicações clínicas e efeitos colaterais distintos e uma alta afinidade pelo tecido ósseo. Inibe a atividade da farnesil pirofosfato sintase (FPPS), causando apoptose osteoclástica. O ácido zoledrônico é a BPs mais potente e foi o agente farmacêutico inaugural a ser aprovado para uso em todos os tumores sólidos com metástases ósseas, incluindo câncer de mama, câncer de próstata, mieloma múltiplo e câncer de pulmão. Em contraste, o etidronato tem menor afinidade e acumulação, levando a um estímulo inflamatório reduzido (UHLIG S et al., 2024).

A supressão da remodelação óssea induzida pelos bisfosfonatos (BPs) é amplamente reconhecida como um dos principais fatores responsáveis pelo desenvolvimento da osteonecrose associada a bisfosfonatos (BRONJ). O impacto dessas drogas na remodelação óssea, aliado às diferenças nos mecanismos de desenvolvimento entre os ossos da mandíbula e os ossos longos, pode justificar a maior prevalência da BRONJ na mandíbula. Enquanto a maxila e a mandíbula se formam predominantemente por ossificação intramembranosa, os ossos longos se desenvolvem por ossificação endocondral. Essa distinção no processo de formação resulta em diferenças anatômicas relevantes, como variações na densidade óssea e no equilíbrio entre os espaços corticais e medulares. Além disso, a composição bioquímica da mandíbula também difere dos ossos longos, apresentando um maior teor de colágeno e menores níveis de hidroxilisina. Esses fatores podem estar relacionados a uma taxa mais elevada de remodelação óssea mandibular, tornando essa região mais suscetível aos efeitos dos bisfosfonatos (UHLIG S et al., 2024).

DIAGNÓSTICO 

Idealmente, tanto a definição quanto o processo diagnóstico de uma determinada doença estão intimamente ligados. Assim, uma definição rigorosa de doença (ou seja, definição de caso) só pode levar a um diagnóstico definitivo quando é composta de sinais e sintomas específicos da doença (por exemplo, modelo de reconhecimento de padrões). Este não é o caso do MRONJ ou, que é conhecido por apresentar vários sinais e sintomas clínicos não específicos, embora alguns sejam mais frequentes do que outros (ou seja, exposição óssea e fístulas ósseas de sondagem), quanto a outras doenças orais, como a síndrome de Sjogren. (Alberto Bedogni, et al., 2023).

Os gatilhos comuns para BRONJ incluem procedimentos odontológicos, infecções periodontais ou periapicais, trauma ou o uso de aparelhos protéticos mal ajustados.Esses fatores facilitam a invasão e infecção bacteriana, que são particularmente ameaçadoras no contexto da saúde óssea comprometida causada por BPs. Vários estudos indicaram que pacientes com infecções periapicais e periodontais podem estar em maior risco de desenvolver BRONJ, independentemente de terem ou não sido submetidos à extração dentária. Acredita-se que isso se deva ao número alterado e à função dos osteoclastos causados pela presença de infecção.

Fatores de risco clínicos da BRONJ

Os fatores de risco clínicos para o desenvolvimento de BRONJ abrangem uma série de características relacionadas ao paciente e ao tratamento. Entre os fatores de risco odontológicos, a extração dentária foi considerada o risco mais proeminente, seguida pela doença periodontal. Condições infecciosas ou inflamatórias orais preexistentes, incluindo infecções periapicais, também elevam o risco de BRONJ. Ao modificar a função e a quantidade dos osteoclastos, essas infecções agravam o risco da doença, mesmo na ausência de extração dentária. (Mol. Ciência. 2024)

Além disso, a dose absorvida de medicamentos antirreabsortivos constitui um fator de risco crucial. Períodos prolongados de tratamento aumentam significativamente a probabilidade de desenvolver BRONJ. Notavelmente, os pacientes que recebem tratamentos mensais para doença osteolítica metastática correm o maior risco, especialmente após extração dentária e cirurgia dentoalveolar. Além disso, o uso de bifosfonatos contendo nitrogênio (N-BPs), administrados por via intravenosa, está associado a uma maior incidência da doença. J. (Mol. Ciência. 2024)

Os fatores de risco para MRONJ incluem não apenas medicamentos e intervenções odontológicas, mas também fatores demográficos, sistêmicos e genéticos. A maior prevalência é em mulheres no período peri ou pós-menopausa ou onde há uma diminuição nos níveis de estrogênio, levando a alterações na homeostase óssea, embora isso também possa ser um reflexo da doença subjacente para a qual os agentes farmacológicos (osteoporose, câncer de mama) foram prescritos. Pacientes com câncer, anemia e diabetes têm maior risco de MRONJ. (Int. J. Environ. Res. Saúde Pública 2021).

Os fatores acima mencionados levam a uma maior suscetibilidade à BRONJ em pacientes com câncer, que normalmente requerem administração mais potente e mais frequente de terapia com BP por períodos prolongados. Além disso, o tratamento concomitante com corticosteroides, agentes antineoplásicos e metotrexato (imunossupressor) também demonstrou aumentar o risco de BRONJ. No entanto, mais pesquisas são necessárias para elucidar a fisiopatologia subjacente. 

Protocolos de Tratamento

Várias estratégias de tratamento foram desenvolvidas para BRONJ. Elas dependem do estágio e da gravidade da doença. Abordagens conservadoras são recomendadas para BRONJ em estágio inicial (estágio 1). Isso inclui pacientes que são assintomáticos e não mostram sinais de infecção. Apenas osso exposto e necrótico ou fístulas penetrando o osso devem ser considerados para esses tratamentos. Essas abordagens incluem enxaguatórios bucais antibacterianos, educação do paciente e monitoramento de rotina. Um possível protocolo de tratamento de feridas usa enxaguatórios bucais contendo agentes antimicrobianos, como clorexidina 0,12% e peróxido de hidrogênio. J. (Mol. Ciência. 2024).

Pacientes com BRONJ estágio 2 sofrem de osso exposto ou fístulas que penetram no osso e podem desenvolver infecções, caracterizadas por dor, vermelhidão e secreção purulenta. O tratamento para o estágio 2 envolve antibióticos sistêmicos intensificados, controle da dor e possivelmente o desbridamento do osso necrótico. Foi demonstrado que antibióticos sistêmicos por si só são insuficientes para prevenir a colonização bacteriana e curar lesões de BRONJ. Pesquisas indicam que a terapia antibiótica pré-operatória prolongada pode melhorar consideravelmente os resultados da cura. O tratamento antibiótico pós-operatório deve ser continuado até que os sinais de inflamação ou infecção local tenham diminuído, com visitas de acompanhamento realizadas para monitorar e ajustar a terapia conforme necessário. J. (Mol. Ciência. 2024).

O estágio 3 da BRONJ está associado a complicações graves, como osso exposto e necrótico; fístula invasiva que se estende além da área do osso alveolar, resultando em fraturas patológicas; fístula extraoral; comunicação antral oral ou nasal oral; ou osteólise. Nestes casos avançados, procedimentos cirúrgicos agressivos, como desbridamento extenso ou ressecção, podem ser necessários. J. (Mol. Ciência. 2024).

Os benefícios da terapia anti-resorvante superam em muito o risco de aparecimento de MRONJ. No entanto, quando o MRONJ é diagnosticado, os BMAs são frequentemente descontinuados até que a resolução da doença seja alcançada em muitos casos (Hayashida et al., 2020; Morishita et al., 2022). O termo “Féria de Drogas Terapêuticas” é usado para definir a retirada de BMAs e AAs logo após a ocorrência de MRONJ, com o objetivo de promover/acelerar a resolução da doença. Conceitualmente, é muito diferente do “feriado profilático de medicamentos”, que visa prevenir MRONJ em pacientes em risco, antes que os procedimentos cirúrgicos orais ocorram. É controverso se o feriado terapêutico de medicamentos em combinação com tratamentos médicos e/ou cirúrgicos pode promover ou acelerar a resolução da doença MRONJ. (Bedogni et al., 2024)

Além das abordagens terapêuticas mencionadas, novas estratégias têm sido exploradas para melhorar os resultados no tratamento da BRONJ. Terapias adjuvantes, como o uso de laser de baixa intensidade, fatores de crescimento e plasma rico em plaquetas, têm demonstrado potencial na regeneração óssea e na redução da inflamação. Além disso, protocolos minimamente invasivos vêm sendo desenvolvidos para reduzir o impacto das intervenções cirúrgicas nos pacientes com BRONJ avançada. A individualização do tratamento, considerando fatores sistêmicos e a resposta biológica do paciente, pode otimizar os resultados clínicos e prevenir recorrências da doença.

CONCLUSÃO

Relação entre Tipo de Medicamento, Via de Administração e Risco de MRONJ

O risco de desenvolvimento da MRONJ varia conforme o tipo de medicamento, a dose utilizada e a via de administração. Estudos demonstram que o uso intravenoso de bisfosfonatos em pacientes oncológicos apresenta um risco significativamente maior quando comparado ao uso oral desses medicamentos para osteoporose.

• Pacientes oncológicos submetidos à terapia com bisfosfonatos intravenosos apresentam uma prevalência de MRONJ entre 1% e 9%, devido à alta potência e biodisponibilidade dos fármacos nessa via.

• Em pacientes com osteoporose tratados com bisfosfonatos orais, a prevalência é consideravelmente menor, estimada em 0,21% após pelo menos quatro anos de exposição contínua.

Essas diferenças podem ser explicadas pela maior concentração óssea e persistência dos bisfosfonatos administrados intravenosamente, que apresentam meias-vidas extremamente longas no tecido ósseo, ultrapassando 10 anos em alguns casos. Já o denosumabe, apesar de apresentar uma meia-vida mais curta (cerca de 26 dias), também apresenta risco aumentado para MRONJ, especialmente quando utilizado para controle de metástases ósseas em oncologia.

 Fatores de Risco e Mecanismos Envolvidos na MRONJ

A patogênese da MRONJ ainda não é completamente elucidada, mas envolve múltiplos fatores, incluindo:

• Redução da remodelação óssea: A supressão osteoclástica impede a substituição do tecido ósseo danificado, resultando em necrose progressiva.

• Inflamação crônica e infecção secundária: A microbiota oral exerce um papel fundamental no desenvolvimento da MRONJ, com estudos metagenômicos evidenciando uma alteração no perfil bacteriano nesses pacientes, incluindo alta colonização por Actinomyces spp., frequentemente encontrados nas lesões necróticas.

• Inibição da angiogênese: Medicamentos antiangiogênicos bloqueiam a formação de novos vasos sanguíneos, reduzindo a capacidade de cicatrização óssea.

• Traumas locais: Procedimentos odontológicos invasivos, como exodontias e implantes, representam um importante fator predisponente, pois a exposição óssea em pacientes sob terapia com bisfosfonatos ou denosumabe pode desencadear um quadro irreversível de necrose.

Prevenção e Manejo Clínico da MRONJ

Devido à falta de um tratamento definitivo, a prevenção é a principal estratégia para minimizar o risco de MRONJ. Recomenda-se que todos os pacientes iniciando terapia com BPs ou denosumabe sejam avaliados por um cirurgião-dentista antes do início do tratamento. Algumas diretrizes importantes incluem:

• Evitar procedimentos odontológicos invasivos durante o uso de bisfosfonatos intravenosos.

• Realizar exodontias e tratamentos periodontais antes do início da terapia antirreabsortiva.

• Acompanhar rigorosamente a saúde bucal de pacientes em tratamento prolongado, prevenindo infecções e trauma local.

• Considerar a suspensão temporária do medicamento (drug holiday) antes de procedimentos invasivos em pacientes de baixo risco, conforme recomendação médica.

A MRONJ representa uma complicação grave, especialmente em pacientes oncológicos submetidos a terapia intravenosa com bisfosfonatos ou denosumabe. Seu desenvolvimento está diretamente relacionado à redução da remodelação óssea, infecção secundária e inibição da angiogênese, tornando a prevenção e o manejo odontológico fundamentais para reduzir o impacto dessa condição. Apesar do crescente número de estudos sobre sua etiopatogenia, ainda não existe um consenso absoluto sobre o tratamento ideal, reforçando a necessidade de pesquisas adicionais para melhor compreensão dos mecanismos envolvidos e o desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas.

REFERÊNCIAS:

  1. ANASTASILAKIS, A. D. et al. Osteonecrosis of the Jaw and Antiresorptive Agents in Benign and Malignant Diseases: A Critical Review Organized by the ECTS. The Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism, v. 107, n. 5, p. 1441–1460, 18 dez. 2021.
  2. BALACHANDRAN, K. et al. Identification of Potential Biomarkers and Small Molecule Drugs for Bisphosphonate-Related Osteonecrosis of the Jaw (BRONJ): An Integrated Bioinformatics Study Using Big Data. International Journal of Molecular Sciences, v. 24, n. 10, p. 8635–8635, 11 maio 2023.
  3. BEDOGNI, A. et al. Italian position paper (SIPMO-SICMF) on medication-related osteonecrosis of the jaw (MRONJ). Oral Diseases, 5 fev. 2024.
  4. FU, P.-A. et al. Long-term use of denosumab and its association with skeletal-related events and osteonecrosis of the jaw. Scientific Reports, v. 13, n. 1, 24 maio 2023.
  5. HE, L. et al. Pathogenesis and multidisciplinary management of medication-related osteonecrosis of the jaw. International Journal of Oral Science, v. 12, n. 1, p. 30, 21 out. 2020.
  6. KIM, H. Y. Review and Update of the Risk Factors and Prevention of Antiresorptive-Related Osteonecrosis of the Jaw. Endocrinology and Metabolism, 21 out. 2021.
  7. LAPUTKOVÁ, G.; TALIAN, I.; SCHWARTZOVÁ, V. Medication-Related Osteonecrosis of the Jaw: A Systematic Review and a Bioinformatic Analysis. International Journal of Molecular Sciences, v. 24, n. 23, p. 16745, 25 nov. 2023.
  8. LORENZO-POUSO, A. I. et al. Medication-Related Osteonecrosis of the Jaw: A Critical Narrative Review. Journal of Clinical Medicine, v. 10, n. 19, p. 4367, 1 jan. 2021.
  9. MUSTAKIM, K. R. et al. Significance of medication discontinuation on bisphosphonate-related jaw osteonecrosis in a rat model. Scientific Reports, v. 12, n. 1, 12 dez. 2022.
  10. PARK, K.-M. et al. Preventive effect of teriparatide on medication-related osteonecrosis of the jaw in rats. Scientific Reports, v. 13, n. 1, 19 set. 2023.
  11. SAPIR JELIN-UHLIG et al. Bisphosphonate-Related Osteonecrosis of the Jaw and Oral Microbiome: Clinical Risk Factors, Pathophysiology and Treatment Options. International Journal of Molecular Sciences, v. 25, n. 15, p. 8053–8053, 24 jul. 2024.
  12. SOUTOME, S. et al. Relationship between tooth extraction and development of medication-related osteonecrosis of the jaw in cancer patients. Scientific Reports, v. 11, n. 1, 26 ago. 2021.