OS EFEITOS DO EXERCÍCIO AERÓBICO NA ESCLEROSE MÚLTIPLA: UMA REVISÃO INTEGRATIVA

THE EFFECTS OF AEROBIC EXERCISE ON MULTIPLE SCLEROSIS: AN INTEGRATIVE REVIEW

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202410241635


Kannanda Louyse de Oliveira Mariano1
Vitória Luiza Luz Di Piazza²
Luana Silva de Borba3
Hermann Heinrich Husch4


RESUMO

A esclerose múltipla (EM) é uma doença autoimune que acomete a bainha de mielina, uma substância que envolve as fibras nervosas responsáveis pela transmissão dos impulsos nervosos ao longo dos axônios do sistema nervoso central. A mielina é fundamental para a transmissão eficiente e rápida dos impulsos nervosos, quando ela sofre alguma alteração, o paciente poderá apresentar diversas disfunções. O presente estudo teve como objetivo revisar a literatura acerca dos efeitos do exercício aeróbico nos pacientes com diagnóstico de Esclerose Múltipla. Para o cumprimento desta revisão, foram utilizadas as bases de dados, Pubmed, BVS e PEDro, em que foram selecionados artigos de publicados em língua portuguesa, inglesa e espanhola no período de 2013 a 2023, com população de adultos acima de 18 anos de idade de ambos os sexos com esclerose múltipla. A elaboração do estudo contou com um total de 581 artigos encontrados, sendo selecionados 6 artigos, após passarem pelas etapas de seleção: exclusão das duplicatas, leitura dos títulos e leitura na íntegra dos artigos. De acordo com os estudos analisados, observou-se que a reabilitação de paciente com EM, através do treinamento aeróbico demonstrou grande relevância na qualidade de vida e função dos pacientes que possuem diagnóstico de esclerose múltipla.

Palavras-chaves: Fisioterapia; Exercício Terapêutico; Exercício Aeróbico; Esclerose Múltipla; Doença do Neurônio Motor.

ABSTRACT

Multiple sclerosis (MS) is an autoimmune disease that affects the myelin sheath, a substance that surrounds nerve fibers responsible for transmitting nerve impulses along the axons of the central nervous system. Myelin is essential for the efficient and rapid transmission of nerve impulses; when it undergoes any alteration, the patient may present several dysfunctions. The present study aimed to review the literature on the effects of aerobic exercise in patients diagnosed with Multiple Sclerosis. To carry out this review, the Pubmed, BVS and PEDro databases were used, in which articles published in Portuguese, English and Spanish between 2013 and 2023 were selected, with a population of adults over 18 years of age of both sexes with multiple sclerosis. The study included 581 articles found, of which six articles were selected after going through the selection stages: exclusion of duplicates, reading of titles and reading of the articles in full. According to the studies analyzed, it was observed that the rehabilitation of patients with MS, through aerobic training, demonstrated great relevance in the quality of life and function of patients diagnosed with multiple sclerosis.

Keywords: Physiotherapy; Therapeutic Exercise; Aerobic Exercise; Multiple Sclerosis; Motor Neuron Disease.

INTRODUÇÃO

A esclerose múltipla (EM) é uma doença neurológica, crônica e autoimune em que as células de defesa do organismo atacam o próprio sistema nervoso central, causando danos ao cérebro e à medula espinhal. Sua causa ainda é desconhecida e é comumente diagnosticada em jovens, sendo mais comum em mulheres entre 20 e 40 anos, principalmente em regiões da Europa e América (ABEM, 2023; 2. DIGHRIRI et al., 2023). A EM provoca alterações significativas na qualidade de vida dos pacientes e pode se manifestar por meio de diversos sintomas, como: fadiga intensa, depressão, fraqueza muscular, alterações na coordenação e equilíbrio dos movimentos, espasticidade, dores nas articulações e déficits cognitivos (RODRÍGUEZ MURÚA, FAREZ, QUINTANA, 2022). Cerca de 85 a 90% das pessoas com EM desenvolvem uma forma remitente-recorrente da doença, que se caracteriza por períodos de agravamento dos sintomas seguidos de remissão. À medida que a doença progride, a recuperação dos sintomas é incompleta e aproximadamente 50% dos pacientes eventualmente desenvolvem uma variação da doença chamada esclerose múltipla progressiva secundária, que é caracterizada pelo acúmulo progressivo e irreversível de déficits neurológicos. Uma minoria de pacientes com EM (10–15%) apresenta um curso clínico progressivo desde o início da doença, denominado EM progressiva primária (RODRÍGUEZ MURÚA, FAREZ, QUINTANA, 2022).

Existem cerca de 2,9 milhões de pessoas com EM no mundo (MS International Federation, 2023).  No Brasil existe uma prevalência estimada de esclerose múltipla em 15 casos a cada 100 mil habitantes. Segundo o censo atual do país, aproximadamente 30 a 35 mil brasileiros convivem com a esclerose múltipla (Academia Brasileira de Neurologia, 2023). Conforme um estudo epidemiológico, a prevalência da esclerose múltipla no Rio Grande do Sul é de 2,95 a 3,31 a cada 100.000 habitantes (MARQUES et al., 2021). Estima-se que cerca de 300 pessoas por dia são diagnosticadas com EM no mundo (MS International Federation, 2023). Embora não haja cura para a EM, existem tratamentos que visam acelerar a recuperação durante as crises, controlar os sintomas e prevenir complicações decorrentes da evolução da doença. Entre os principais tratamentos estão a terapia medicamentosa com imunossupressores e imunomoduladores, terapias complementares, como a fisioterapia, terapia ocupacional, psicologia e urologia (SILVA & SILVA, 2014; Associação Brasileira de Esclerose Múltipla, 2023).

O sintoma mais incapacitante da EM é a fadiga, podendo prejudicar o paciente de realizar suas atividades de vida diária, trabalho e relação com a sociedade (WARUTKAR et al., 2022). A Fisioterapia pode atuar nos principais sintomas da EM, como desequilíbrio postural, alteração no padrão de marcha e imobilidade (WARUTKAR et al., 2022; HEINE et al., 2017). A reabilitação deve considerar o estágio da doença, o comprometimento físico e neurológico do paciente. Durante o período de remissão, é importante avaliar o grau de incapacidade e estipular as metas de tratamento, recuperando a funcionalidade afetada pela condição. A reabilitação precoce é segura e deve ser considerada (WARUTKAR et al., 2022). O programa de reabilitação, tem eficácia no tratamento e prevenção de descondicionamento físico, déficits de mobilidade, riscos secundários à saúde e na progressão da doença (HEINE et al., 2017). Diante disso, o presente estudo teve como objetivo revisar a literatura acerca dos efeitos do exercício aeróbico na reabilitação do paciente com Esclerose Múltipla.

METODOLOGIA 

O presente estudo trata-se de uma revisão integrativa de literatura que apresenta como vantagem a maneira ordenada e abrangente de análise do conhecimento científico já produzido. Esse método de pesquisa proporciona a síntese do conhecimento e a incorporação de múltiplos resultados de estudos com diferentes formas de pesquisa para compreensão completa do tema abordado (MENDES, SILVEIRA, GALVÃO, 2008; SOUZA, SILVA, CARVALHO, 2010).

Ao elaborar a pesquisa, seis passos foram seguidos para esta revisão integrativa da literatura, sendo eles: I – a definição do tema ou questão da pesquisa; II – estabelecimento de critérios de inclusão e exclusão de busca na literatura; III – definição das informações a serem extraídas dos estudos selecionados; IV – avaliação dos estudos incluídos; V – interpretação dos resultados; VI – apresentação da síntese dos dados. Os critérios de inclusão para a seleção dos estudos foram artigos publicados nos anos de 2013 a 2023, escritos em língua inglesa, portuguesa e espanhola. Assim como, responder à questão de pesquisa: “Qual os efeitos dos exercícios aeróbicos na reabilitação do paciente com esclerose múltipla”, os estudos também deveriam abordar pesquisas sobre: pacientes adultos (com mais de 18 anos) de ambos os sexos, com diagnóstico de esclerose múltipla. Os critérios de exclusão consistiram em artigos com abordagem de outras doenças neurológicas, exercícios resistidos, impacto cognitivo como única avaliação ou estudos sem relação com questão de pesquisa, publicações anteriores a 2013, textos duplicados e/ou incompletos, estudos com menores de 18 anos e estudos sem acesso gratuito. Demais estudos como artigos de revisões, estudos coorte, dissertações de mestrado e tese de doutorado, outros idiomas também foram excluídos.

As buscas foram realizadas nas bases de dados PubMed, BVS e PEDro, utilizando os termos physiotherapy, therapeutic exercise, aerobic, aerobic exercise, multiple sclerosis, motor neurone disease. Os operadores booleanos “AND” e “OR” foram empregados nas buscas pelos registros que alcançavam os termos selecionados. Após a conclusão da coleta dos dados, os artigos foram selecionados da seguinte forma: identificação de todos os artigos encontrados nas bases de dados, sendo excluído as duplicatas e, logo após, foram excluídos aqueles artigos que não corresponderam com o tema proposto e com critérios de inclusão. Por fim, a leitura na íntegra dos estudos selecionados foi realizada para elaboração dos resultados, discussão e argumentação descritiva desta revisão.

RESULTADOS 

As buscas desta revisão resultaram em 581 artigos encontrados. A seleção dos estudos ocorreu em três etapas distintas: I – utilização nas bases de dados dos termos selecionados, gerando um total de 581 artigos encontrados, conforme Fluxograma na Figura 1; II – foram lidos os títulos dos artigos sendo excluídas as duplicatas, artigos que não foram obtidos o acesso gratuito e artigos não relacionados ao tema (Tabela 1); III – lido artigos na íntegra e selecionados artigos com maior especificidade e compatibilidade com tema abordado. Restaram um total de 13 artigos que compreenderam os critérios de inclusão para a realização do trabalho. Os estudos selecionados estão descritos na Tabela 2 desta revisão.

Figura 1 – Fluxograma de resultados das buscas e seleção de estudos

Tabela 1 – Resultados da seleção dos estudos

TermosBase de dados
Artigos encontrados
Duplicatas excluídas
Artigos excluídos

Artigos incluídos
Physiotherapy OR Therapeutic exercise OR aerobic exercise AND multiple sclerosis OR motor neurone disease)
PubMed

343

0

342

1
Physiotherapy OR Therapeutic exercise ORaerobic exercise AND multiple sclerosis
BVS

140

4

139

1
Multiple Sclerosis AND Aerobic
PEDro

98

4

94

4
Total:58185756

A Tabela 2 apresenta a descrição dos artigos selecionados após critérios de inclusão e exclusão, apresentando os 6 artigos selecionados que se enquadraram nos critérios conforme determinado. Neste quadro será representada a síntese dos artigos conforme periódico, ano, autores, o título do periódico, objetivos, tipo de estudo, resultados e conclusão.

Tabela 2 – Características dos estudos selecionados

AutorObjetivoTipo de estudoResultadosConclusão
Heine et al., 2017 Estimar o efeito imediato e de acompanhamento de 1 ano do treinamento aeróbico de 16 semanas, em comparação com intervenção de controle, na fadiga e participação social em pacientes ambulatoriais com fadiga grave relaciona à EM.Ensaio Clínico Controlado e RandomizadoOs pacientes do grupo intervenção, obtiveram diferença média significativa desde o início até 4 meses, em pontos a favor do treinamento aeróbico, na fadiga. No entanto, não foi sustentada durante o acompanhamento nos 6 e 12 meses. Nenhum efeito significativo foi encontrado na participação social. Não foram encontradas melhorias significativas em relação ao VO2 pico e/ou limiar anaeróbio.A terapia por treino aeróbico teve eficácia comprovada no tratamento e prevenção do descondicionamento físico, problemas de mobilidade e potencialmente na progressão da doença de EM. Apesar do pequeno efeito positivo pós- intervenção e da ausência de danos associados, o treinamento aeróbico não leva a melhorias clinicamente relevantes na fadiga e na participação social relacionada à EM. Porém, isso não implica que o treinamento aeróbico não deva ser utilizado na prática clínica.
Briken et al., 2014Investigar o potencial do exercício padronizado como intervenção terapêutica para EM progressiva, em um ensaio piloto randomizado- controlado.Ensaio Clínico Piloto Controlado e RandomizadoMelhora significativa foi observada na aptidão aeróbia. O exercício melhorou a capacidade de deambulação, sintomas depressivos, fadiga e vários domínios da função cognitiva.O treinamento aeróbio é viável e pode ser benéfico para pacientes com EM progressiva.
Heinrich et al., 2021Verificar se o treinamento aeróbico de membro superior pode melhorar o desempenho da marcha e, portanto, vir a se tornar uma opção terapêutica em pacientes com EM progressiva já moderadamente incapacitados.Ensaio Clínico Piloto Controlado e RandomizadoDados de 39 pacientes foram analisados. Os pacientes do GI apresentaram forte adesão ao programa, com média de 67 sessões de treinamento. A carga máxima de trabalho (P.max) aumentou no grupo de treinamento, enquanto outros indicadores de aptidão física não. A distância percorrida no TC6 melhorou tanto no grupo de treinamento quanto no controle. Outras medidas como mobilidade não mostraram efeito entre grupos. O funcionamento cognitivo permaneceu inalterado.Embora a carga máxima de trabalho tenha melhorado, 3 meses de treinamento de ergometria de membro superior de alta frequência e baixa a moderada intensidade não mostraram melhora da capacidade de marcha ou funcionamento cognitivo na EM progressiva em comparação com um GC.
Feys et al., 2019Investigar os efeitos multidimensionais do treinamento de corrida em amostra remotamente supervisionado de pessoas com EM com incapacidade leve.Ensaio Clínico Controlado e RandomizadoEfeitos de interação a favor do grupo EXP foram encontrados para VO2máx, teste de sentar e levantar, MSWS-12, Teste de Recordação Espacial, FSMC, MSIS-29 e volume do globo pálido.VO2máx melhorou em 1,5 mL/kg/min, MSWS-12 em 4,FSMC em 11 e MSIS-29 em 14pontos. O Teste de Recordação Espacial melhorou em maisde 10%.O treinamento de corrida localizado melhorou a capacidade aeróbia, a mobilidade funcional, a memória visuoespacial, a fadiga, a qualidade de vida e o volume do globo pálido em pessoas com EM.
Riksfjord et al., 2017Avaliar a eficiência ventilatória e a capacidade aeróbia em pessoas com EM e se a caminhada em esteira ou o treinamento de força progressivo tem efeito sobre esses parâmetros nessa população.Ensaio Clínico Controlado e RandomizadoA eficiência ventilatória mostrou- se dentro da normalidade na amostra estudada. Após 8 semanas, não surgiram diferenças significativas entre os grupos em relação ao VE/VCO2, eficiência do consumo de oxigênio ou pico de VO2 em mL/kg/min em caminhada em esteira e treinamento de força progressiva,respectivamente.Em pessoas com esclerose múltipla com leve a moderada incapacidade, 8 semanas de caminhada em esteira de baixa a moderada intensidade ou treinamento de força progressivo não tiveram qualquer efeito sobre a eficiência ventilatória ou capacidade aeróbica. Embora a capacidade aeróbia tenha sido inferior aos valores de referência, a eficiência ventilatória não foi reduzida.
Kasser et al., 2020Entender os efeitos agudos de uma única sessão de exercício em pessoas com EM.Ensaio Clínico Controlado Não houveram diferenças significativas entre os períodos de mensuração para os tempos do teste Timed 25-Foot Walk ou Brief Balance Evaluation Systems Test. Melhoras significativas na média do raio de oscilação e na velocidade de oscilação ao ficar em pé sobre espuma e na porcentagem de variabilidade do tempo de passada de apoio foram encontradas imediatamente após o exercício em comparação comimediatamente após o repouso.Indivíduos com EM podem se envolver com segurança em sessões únicas de exercício aeróbico sem efeitos prejudiciais de curto prazo na função e podem realmente receber algum benefício de curto prazo em relação à oscilação postural em pé e à variabilidade da marcha.

Fonte: Autores. LEGENDAS: EM, Esclerose Múltipla; VO² máx., Consumo máximo de Oxigênio; VO²pico, Consumo de Oxigênio de Pico; do inglês P.Máx, Carga Máxima de Trabalho; EXP, Grupo Experimental; do inglês MSWS-12, Escala de Caminhada para Esclerose Múltipla-12; do inglês FSMC, Escala de Fadiga para Função Motora e Cognitiva; do inglês MSIS-29, Escala de Impacto da Esclerose Múltipla-29; VE/VCO 22, Taxa de Ventilação/Dióxido de Carbono.

DISCUSSÃO

No presente estudo, podemos observar que o exercício físico, especialmente o treinamento aeróbico, pode ser benéfico para pacientes com esclerose múltipla, principalmente para seu tratamento e manutenção (KASSER et al., 2020). Os exercícios aeróbicos podem variar desde caminhadas e corridas em solo ou esteiras (FEYS et al., 2019; RIKSFJORD et al., 2017), exercícios de levantar e sentar ou bicicletas ergométricas (HEINE et al., 2017; BRIKEN et al., 2014; HEINRICH et al., 2021; KASSER et al., 2020). O estudo de Heine e colaboradores (2017) analisaram oitenta e nove pacientes com esclerose múltipla em dois centros ambulatoriais na Holanda por 16 semanas, através de um ensaio clínico randomizado e controlado. Em 43 pacientes que receberam treinamento aeróbico utilizando um cicloergômetro eletrônico três vezes por semana, durante 30 minutos, com seis ciclos intervalados compostos por 3 minutos a 40%, 1 minuto a 60% e 1 minuto a 80% da potência pico, foi possível verificar, através de uma escala de fadiga percebida (Checklist Individual Strength), diferenças significativas na melhora da fadiga em comparação com as medidas de teste do grupo controle (HEINE et al., 2017). 

Tais resultados corroboram com o estudo de Feys e colaboradores (2019) que avaliaram 35 pacientes com EM em um programa de treinamento de corrida durante 12 semanas com objetivo de correr 5 km. Através das avaliações com um cicloergômetro eletrônico, análise contínua de trocas gasosas pulmonares, monitorização da frequência cardíaca, consumo de oxigênio, volume expiratório e razão de troca respiratória, juntamente com a escala de fadiga percebida, concluiu-se que, em comparação com o grupo controle, a capacidade aeróbica, a fadiga, a capacidade de caminhada percebida e a qualidade de vida relacionada à função física melhoraram (FEYS et al., 2019).

Em contrapartida, o estudo de Riksfjord e colaboradores (2017) não encontrou efeito sobre a eficiência ventilatória ou capacidade aeróbica de 24 pacientes com esclerose múltipla, expostos a um treinamento de 8 semanas, sendo randomizados para caminhada em esteira de baixa a moderada intensidade. No entanto, ao final do estudo, um participante relatou ser capaz de esquiar novamente, enquanto outro participante relatou aumento de 30 minutos de resistência a mais na caminhada de 100 metros máximos, comparados aos últimos dois anos. Tais melhorias são de grande importância clínica, uma vez que a melhora nos níveis de atividade física é importante em relação a outros perfis de risco no paciente com esclerose múltipla (RIKSFJORD et al., 2017).

Já no estudo de Briken e colaboradores (2014) foi possível avaliar, através de um ensaio clínico controlado e randomizado, 42 pacientes com esclerose múltipla que realizaram entre 8 e 10 semanas de treinamento, 2 a 3 sessões por semana, de ergometria de membro superior, remo e bicicleta ergométrica. Usando o aumento do consumo máximo de oxigênio (VO2) como medida de avaliação do condicionamento físico, e testes de caminhada de seis minutos (TC6) para avaliar a capacidade de locomoção. Os autores forneceram evidências de efeitos benéficos do treinamento físico padronizado na aptidão aeróbica e na capacidade de caminhar (BRIKEN et al., 2014).

Um estudo recente conduzido na Alemanha avaliou 53 pacientes com EM progressiva com um índice de incapacidade moderada, que realizaram um treinamento de ergometria de membro superior de alta frequência, e baixa a moderada intensidade por 3 meses. Usando como desfecho primário o teste de caminhada de 6 minutos (TC6) e como desfechos secundários o teste de levantar e sentar, caminhada em tandem e Time up and Go (TUG). Além disso, a escala de caminhada MS18 foi utilizada como medida de avaliação da capacidade de deambulação relatada pelo paciente. Embora os autores não tenham encontrado efeitos significativos na melhora da qualidade da marcha, foi possível observar alguns sinais promissores em relação ao aumento dos índices de condicionamento físico no grupo de treinamento (HEINRICH et al., 2021).

Indivíduos com esclerose múltipla podem se envolver com segurança em sessões únicas de exercício aeróbico sem efeitos prejudiciais de curto prazo na função e podem realmente receber algum benefício de curto prazo em relação à oscilação postural em pé e à variabilidade da marcha (KASSER et al., 2020). Foi o que concluiu Kasser e colaboradores (2020), em um estudo controlado com dez pacientes com esclerose múltipla que foram expostos a um treinamento de 15 minutos de pedalada reclinada e 15 minutos de repouso, usando como medida de avaliação testes de equilíbrio e controle postural, e os testes Brief Balance Evaluation Systems Test e Timed 25-Foot Walk para avaliar a marcha funcional. O equilíbrio e a marcha também foram avaliados através de sensores de movimento inercial sem fio posicionados nos punhos, pés, cintura e tórax dos participantes. Embora os autores não tenham encontrado evidências sólidas de melhora da marcha, equilíbrio e mobilidade, foi possível afirmar com o estudo que de fato é seguro pacientes com esclerose múltipla realizarem exercícios aeróbicos, principalmente para retardar a progressão da doença e melhorar a qualidade de vida e funcionalidade desta população (KASSER et al., 2020).

CONCLUSÃO

Com base nos estudos analisados na presente revisão, demonstrou-se que o treinamento aeróbico desempenha um papel importante na melhora da qualidade de vida e da funcionalidade de pacientes com esclerose múltipla. A revisão dos estudos mostrou que o exercício aeróbico regular, como caminhada, corrida, ciclismo e treinamento em cicloergômetro, pode proporcionar benefícios significativos às pessoas com diagnóstico de esclerose múltipla.

Os resultados dos estudos de Heine e colaboradores (2017) sobre o treinamento aeróbico em bicicleta ergométrica, e de Feys e colaboradores (2019) com foco em programas de corrida, mostram melhora significativa na capacidade aeróbica, redução da fadiga e aumento da capacidade ao exercício. Vale ressaltar que a percepção da caminhada e a qualidade de vida estão relacionadas ao funcionamento físico. Neste sentido, o estudo de Briken e colaboradores (2014) forneceu evidências adicionais de que o treinamento físico padronizado melhora a aptidão aeróbica e a capacidade de caminhar em pacientes com esclerose múltipla.

Embora o estudo de Riksfjord e colaboradores (2017) não tenha encontrado melhorias significativas na eficiência ventilatória ou capacidade aeróbica, é importante enfatizar que mesmo discretas melhoras na capacidade funcional podem ser clinicamente significativas, especialmente dados os desafios enfrentados pelos pacientes com esclerose múltipla. Ainda, Kasser e colaboradores (2020) destacaram a segurança do exercício aeróbico em pacientes com esclerose múltipla, enfatizando que esse tipo de exercício pode não apenas ser seguros, mas também benéfico para o controle postural e oscilações durante a marcha.

Por fim, os resultados em conjunto dos estudos analisados sugerem que a incorporação do exercício aeróbico no plano de tratamento de pacientes com esclerose múltipla pode ser benéfica na melhora da qualidade de vida e funcionalidade, e possivelmente retardar a progressão da esclerose múltipla. No entanto, é importante reconhecer a individualidade do paciente e adaptar o programa de exercícios às suas necessidades e capacidades específicas. Isto revela a grande relevância do exercício no tratamento da esclerose múltipla e destaca a importância de estudos futuros que explorem mais estes benefícios e otimizem programas de treinos específicos para esta população.

REFERÊNCIAS

O que é Esclerose Múltipla (EM) – ABEM | Associação Brasileira de Esclerose Múltipla.” Disponível em: https://www.abem.org.br/esclerose-multipla/o-que-e-esclerose-multipla/ [Acesso em 09/11/2023].

DIGHRIRI, Ibrahim M; ALDALBAHI, Ahood A; ALBELADI, Fatimah; et al. “An Overview of the History, Pathophysiology, and Pharmacological Interventions of Multiple Sclerosis.” Cureus, v. 15, n. 1, 2023. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC9888604 [Acesso em 09/11/2023].

RODRÍGUEZ MURÚA, Sofía; FAREZ, Mauricio F.; QUINTANA, Francisco J. “The Immune Response in Multiple Sclerosis.” Annual Review of Pathology: Mechanisms of Disease, v. 17, n. 1, p. 121–139, 2022. Disponível em: The Immune Response in Multiple Sclerosis | Annual Review of Pathology: Mechanisms of Disease [Acesso em 09/11/2023].

Number of People with MS | Atlas of MS.” Atlasofms.org [Acesso em 09/11/2023].

Diagnóstico da Esclerose Múltipla: Revisões.” ABN – Academia Brasileira de Neurologia. Disponível em: https://abneuro.org.br/2022/01/06/diagnostico-da-esclerose-multipla-revisoes [Acesso em 09/11/2023].

MARQUES, N. I., et al. “Prevalência da Esclerose Múltipla na Região Sul: Um Estudo Epidemiológico.” Revista Uningá, v. 57, n. S1, p. 074–075, 2021. Disponível em: https://revista.uninga.br/uninga/article/view/3843 [Acesso em 09/11/2023].

SILVA, V. M., & SILVA, D. F. “Esclerose Múltipla: Imunopatologia, Diagnóstico e Tratamento – Artigo de Revisão.” Interfaces Científicas – Saúde E Ambiente, 2(3), 81–90, 2014. Disponível em: https://periodicos.set.edu.br/saude/article/view/1447 [Acesso em 09/11/2023].

HEINE M., et al. “Does Aerobic Training Alleviate Fatigue and Improve Societal Participation in Patients with Multiple Sclerosis? A Randomized Controlled Trial.” Multiple Sclerosis Journal. 23(11):1517-1526, 2017. Disponível em: https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/1352458517696596 [Acesso em 09/11/2023].

WARUTKAR V., GULRANDHE P., MORGHADE S., KRISHNA KOVELA R., QURESHI MI. “Physiotherapy for Multiple Sclerosis Patients From Early to Transition Phase: A Scoping Review.” Cureus. Oct 27;14(10): e30779, 2022. doi: 10.7759/cureus.30779. PMID: 36447691; PMCID: PMC9701161. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC9701161/ [Acesso em 09/11/2023].

MENDES, K. D. S.; SILVEIRA, R. C., C., P.; GALVÃO, C. M.. “Revisão Integrativa: Método de Pesquisa para a Incorporação de Evidências na Saúde e na Enfermagem.” Revista da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (EERP/USP), 2008. Disponível em: https://www.scielo.br/j/tce/a/XzFkq6tjWs4wHNqNjKJLkXQ/ [Acesso em 09/11/2023].

DE SOUZA, M. T.; DA SILVA, M. D.; DE CARVALHO, R. “Revisão Integrativa: O que é e Como Fazer.” Journal Einstein, 2010. Disponível em: https://journal.einstein.br/pt- br/article/revisao-integrativa-o-que-e-e-como-fazer/ [Acesso em 09/11/2023].

HEINE M.; VERSCHUREN O.; HOOGERVORST E.L.; VAN MUNSTER E.; HACKING H.G.; VISSER-MEILY A.; TWISK J.W.; BECKERMAN H.; DE GROOT V.; KWAKKEL G.; TREFAMS-ACE study group. “Does Aerobic Training Alleviate Fatigue and Improve Societal Participation in Patients with Multiple Sclerosis? A Randomized Controlled Trial.” Mult Scler. Oct; 23(11):1517-1526, 2017. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5624301/ [Acesso em 09/11/2023].

FEYS, P.; MOUMDJIAN, L.; VAN HALEWYCK, F.; WENS, I.; EIJNDE, B.O.; VAN WIJMEERSCH, B.; POPESCU, V.; VAN ASCH, P. “Effects of an Individual 12-Week Community-Located ‘Start-to-Run’ Program on Physical Capacity, Walking, Fatigue, Cognitive Function, Brain Volumes, and Structures in Persons with Multiple Sclerosis.” Mult Scler. Jan; 25(1):92-103, 2019. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29113572/ [Acesso em 09/11/2023].

RIKSFJORD, S.M.; BRÆNDVIK, S.M.; RØKSUND, O.D.; AAMOT, I.L. “Ventilatory Efficiency and Aerobic Capacity in People with Multiple Sclerosis: A Randomized Study.” SAGE Open Med. Dec 12;5:2050312117743672, 2017. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29113572/ [Acesso em 09/11/2023].

BRIKEN, S.; GOLD, S.M.; PATRA, S.; VETTORAZZI, E.; HARBS, D.; TALLNER, A., KETELS G., SCHULZ K.H., HEESEN C. “Effects of Exercise on Fitness and Cognition in Progressive MS: A Randomized, Controlled Pilot Trial.” Mult Scler. Mar;20(3):382-90, 2014. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/24158978/ [Acesso em 09/11/2023].

HEINRICH I., ROSENTHAL F., PATRA S., SCHULZ K.H., WELSCH G.H., VETTORAZZI E., ROSENKRANZ S.C., STELLMANN J.P., RAMIEN C., PÖTTGEN J., GOLD S.M., HEESEN C. “Arm Ergometry to Improve Mobility in Progressive Multiple Sclerosis (AMBOS)-Results of a Pilot Randomized Controlled Trial.” Front Neurol. Jul 19;12:644533, 2021. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC8326796/ [Acesso em 09/11/2023].

KASSER, S.L.; JACOBS, J.V.; SIBOLD, J.; MARCUS, A.; COLE, L. “Using Body-Worn Sensors to Detect Changes in Balance and Mobility After Acute Aerobic Exercise in Adults with Multiple Sclerosis.” Int J MS Care. Jan-Feb;22(1):1-6, 2020. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7041613/ [Acesso em 09/11/2023].


1Fisioterapeuta. Pós-graduanda em Fisioterapia Neurofuncional pela CERTRO
2Fisioterapeuta. Pós-graduanda em Fisioterapia em Terapia Intensiva pelo HMV
3Fisioterapeuta e Doutora em Ciências do Movimento Humano na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professora titular no Centro Universitário Ritter dos Reis – UniRitter
4Fisioterapeuta e Mestre em Ciências Pneumológicas na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professor titular no Centro Universitário Ritter dos Reis – UniRitter