REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7937177
Scarlet Frota Aguiar¹
Mariana da Rocha Bezerra¹
Marília Lima Pereira¹
Matheus Gaspar de Miranda¹
Mauricio Barbosa Salviano²
RESUMO
INTRODUÇÃO: A gonadotrofina coriônica humana (hCG) é um hormônio glicoprotéico secretado pelas células do sinciciotrofoblasto, tecido embrionário humano, porém sua forma sintética tem sido utilizada em conjunto a dietas hipocalóricas, como método adjuvante no emagrecimento. OBJETIVOS: Avaliar os efeitos histológicos de aplicações de hCG no tecido adiposo de cobaias Mus musculus musculus, relacionando-os com as modificações de padrão de peso corporal. METODOLOGIA: Estudo quantitativo do tipo experimental com finalidade exploratória. Os sujeitos da pesquisa foram vinte e quatro camundongos do sexo masculino adultos. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética no Uso em Animais (CEUA|FACID|WYDEN) sob o protocolo 11/2016. Os animais foram divididos em quatro grupos (G), onde G1 recebeu dieta normocalórica ad libitum com injeção SC de hCG (0,85UI- G1a) e com injeção SC de placebo (NaCl 0,9% 0,1ml- G1b), G2 recebeu dieta hipercalórica (>5g/dia) com injeção SC de hCG (0,85UI – G2a) e com injeção SC de placebo (NaCl 0,9% 0,1ml- G2b). Os animais foram pesados antes e após o tratamento (15 dias). Ao final do tratamento os animais foram sacrificados e retirados do local de aplicação e de tecido distante, biópsia para histopatologia convencional. Para os testes estatísticos foi utilizado test t. RESULTADOS: Não se observou alteração significativa no peso nos grupos (p>0,05). As avaliações histopatológicas apresentaram à microscopia óptica tecido adiposo normal com células poliédricas e núcleos periféricos e achatados sem distinção entre os grupos G1b e G2b (p>0,05). Não se identificou coalescência nos subgrupos analisados. Os grupos tratados com hCG (G1a e G2a) demonstraram retração tecidual leve, de modo localizado, sem alterações em tecidos adiposos distantes à aplicação. CONCLUSÃO: O experimento demonstrou que não houve diferenças de peso corpóreo antes e depois do tratamento entre os grupos. Foram detectadas alterações no tecido adiposo nos pontos de aplicação do hormônio, o que nos permite concluir que o efeito do hCG parece ser apenas local. Não houve expressividade sistêmica em cobaias, sendo questionável a utilização de protocolos com finalidade emagrecedora.
Palavras-chave: Gonadotrofina coriônica humana, Perda de peso, Endocrinologia
ABSTRACT
INTRODUCTION: Human chorionic gonadotropin (hCG) is a glycoprotein hormone secreted by syncytiotrophoblast, cells of human embryonic tissue, but its synthetic form has been used in conjunction with hypocaloric diets as an adjunctive method for weight loss. OBJECTIVES: To evaluate the histological effects of hCG applications on adipose tissue of mice Mus musculus musculus, relating them to changes in body weight pattern. METHODS: Quantitative experimental study with exploratory objective whose research subjects were twenty-four adult male mice. The research was approved by the Animal Use Ethics Committee (CEUA | FACID | WYDEN) under protocol 11/2016. Animals were divided into four groups (G), where G1 received normocaloric diet and libitum with SC injection of hCG (0.85UI-G1a) and with SC injection of placebo (NaCl 0.9% 0.1ml-G1b), G2 received a hypercaloric diet (> 5g / day) with SC injection of hCG (0.85UI – G2a) and with SC injection of placebo (NaCl 0.9% 0.1ml-G2b). The animals were weighed before and after treatment (15 days). At end of treatment they were sacrificed and removed from the application site and from distant tissue biopsy for conventional histopathology. For statistical tests we used t test. RESULTS: There was no significant change in weight in the groups (p> 0.05). The histopathological evaluations showed under optical microscopy normal adipose tissue with polyhedral cells and flattened peripheral nuclei without distinction between groups G1b and G2b (p> 0.05). No coalescence was identified in subgroups analyzed. Groups treated with hCG (G1a and G2a) showed localized mild tissue retraction, with no changes in adipose tissues distant from the application. CONCLUSION: Experiment showed that there were no differences in body weight before and after treatment between groups. Changes in adipose tissue were detected at the hormone application points, allowing us to conclude that the effect of hCG appears to be only local. There was no systemic expressiveness in mice therefore the use of protocols with a weight loss purpose is questionable.
Keywords: Human Chorionic Gonadotropin, Weight Loss, Endocrinology.
1 INTRODUÇÃO
A busca pelo corpo perfeito teve início ainda na Grécia Antiga, onde a forma física perfeita era cultuada e pretendida para a completude do indivíduo intelectual na máxima de “mens sana in corpore sano”, além disso, na sociedade contemporânea, a aparência é um fator importante nas interações sociais, nas quais os indivíduos que se encontram no padrão de beleza imposto são mais bem-vistos e com mais chances de sucesso em detrimento daqueles que não estão no padrão de beleza divulgado (DEL CIAMPO; DEL CIAMPO, 2010).
Devido a isso, a preocupação com a estética corporal tomou maiores proporções com o advento técnico-científico, o avanço das técnicas de cirurgia plástica e do conhecimento de fármacos.
No tocante ao uso de substâncias químicas para promoção de emagrecimento, Melo e Oliveira (2010) relatam que, por parte das pessoas, há associação do medicamento com ideias de milagre, no qual somente a partir do uso de uma substância pode-se alcançar o corpo perfeito.
Os principais fármacos utilizados para emagrecimento são: anorexígenos, que atuam provocando aversão alimentar e acelerando o metabolismo; sacietógenos, que atuam aumentando a liberação de noradrenalina e dopamina, dessa forma reduzindo o sono e a fome; inibidores da enzima lipase, que bloqueiam a quebra da gordura lipase (MEDEIROS; PEDROSO; RADAELLI, 2016). Nesse ínterim, a Gonadotrofina Coriônica Humana passa a ser utilizada a partir da década de 1950, sem haver comprovações científicas concisas de sua eficácia.
2. METODOLOGIA
O método de pesquisa utilizado no projeto foi o estudo quantitativo do tipo experimental com finalidade exploratória. Definiu-se como sujeito da pesquisa, vinte e quatro camundongos de sexo masculino, em maturidade sexual, membros da classe Mammalia, ordem Rodentia, família Muridae, gênero Mus, espécie Mus musculus, que estavam em ótimo estado de saúde. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética no Uso em Animais (CEUA|FACID|WYDEN) sob o protocolo 11/2016. Os camundongos, em um total de vinte e quatro espécimes, foram divididos em dois grupos. O grupo I recebeu dieta normocalórica, “ad libitum”. O grupo II recebeu uma dieta hipercalórica com quantidade acima de cinco gramas por dia de ração em forma de “pellets”. A partir disso, foi feita a verificação de peso das duas divisões do grupo, para início da aplicação do hormônio. Esta fase perfez um total de 12 semanas, na qual 5 camundongos faleceram, sendo 3 deles devido a implementação da ração, apresentando evacuações líquidas e frequentes, e outros 2 morreram por problemas na ventilação do biotério.
A próxima etapa consistiu em dividir os grupos I e II em quatro subgrupos Ia, Ib, IIa e IIb cada qual com seis indivíduos que continuaram a receber a dieta dos grupos. Os subgrupos, Ia e IIa, receberam injeção subcutânea de solução com HCG humana e os subgrupos Ib e IIb injeção subcutânea de solução fisiológica 5 dias por semana durante 15 dias.
A análise dos dados iniciou-se a partir da primeira pesagem, uma semana após a aplicação da primeira dose de HCG para verificação da adequação da espécie nos critérios pré-definidos e para organização dos dados físicos. Sucessivamente, ao longo de 15 dias houve o mesmo procedimento em ambos os grupos finalizando com retirada do tecido subcutâneo da parte aplicada bem como na não aplicada, e os órgãos: baço, coração e fígado.
A metodologia utilizada para o cálculo da dose de HCG para camundongos e diluição de material foi a extrapolação alométrica pela Taxa Metabólica Basal (TMB). Em um primeiro passo, foi feito o cálculo da TMB da seguinte forma:
Humanos: TMB= 70 x 80 0,75= 1872,472
Camundongos: TMB= 70 x 0,032 0,75= 5,2961
Dose total para o animal alvo: 300UI/1872,472*5,2961≅ 0,85UI
Como segundo passo, foi realizado o cálculo de diluição do HCG, encontrando-se a concentração de 8,5UI/mL Portanto, cada animal recebeu 0,1 mL de solução aplicada em uma seringa de insulina no dorso do lado esquerdo inferior.
Após os procedimentos, foram confeccionadas tabelas com os dados colhidos e gráficos para efeito comparativo às descobertas feitas, com cálculos de variância e desvio-padrão do peso antes da metodologia e depois do estudo. Além da quantificação e descrição de quais foram os sintomas apresentados com as espécies.
3 RESULTADOS
No presente trabalho não se observou alteração significativa no peso dos animais que receberam a aplicação do hormônio hCG. Durante as 3 semanas de pesagens que se seguiram ao final de cada semana de aplicação, não foi constatado perda de peso em nenhum dos grupos da pesquisa, seja no subgrupo tratado com hCG, seja com o grupo tratado com placebo (soro fisiológico).
Quanto às alterações histológicas, o tecido adiposo examinado nos 4 subgrupos da pesquisa, apresentou-se à microscopia óptica, com aspecto normal e células poliédricas, com núcleo periférico e achatado, sem identificação de coalescência em todos os subgrupos analisados. Observou-se pequena deformação em adipócitos nos subgrupos tratados com hCG e nos subgrupos controle, de modo localizado, sem alterações em tecidos adiposos distantes à aplicação.
Grupo I (Dieta normocalórica): A e C (aplicação); B e D (tecidos distantes)
Grupo II (Dieta hipercalórica): A e C (aplicação); B e D (tecidos distantes)
4 DISCUSSÃO
O HCG é um hormônio glicoproteico secretado pelas células do sinciciotrofloblasto, tecido embrionário humano e sua utilização para fins de emagrecimento foi descrita em 1954 pelo médico Albert Theodore William Simeons, que propôs um protocolo de perda de peso com base no uso do HCG (SIMEONS, 1964). O método caiu em desuso durante um período, tendo retornado à utilização em maior escala após larga divulgação nos Estados Unidos do método editado pelo Dr. Sheri Emma Brick, que sugere o uso do HCG em um novo protocolo de aplicação.
Segundo Emma (2013), o HCG deve ser administrado somente por via intramuscular e não é o responsável pela perda de peso das pacientes que o utilizam, e sim o responsável pela manutenção da integridade muscular, evitando a sarcopenia, e assim, garantindo que não haja perda muscular em dietas restritivas. Dessa forma, pacientes em dietas hipocalóricas perdem somente gordura, ao invés de perder gordura e massa muscular.
Estudo realizado por Calguner et al. (2013) demonstrou, em cobaias, que o HCG tem efeito sobre os receptores de leptina OBRa e OBRb, dos adipócitos, podendo sugerir alterações teciduais compatíveis com redução de gordura, tais quais: deformação de tecido adiposo no grupo controle, imunoreatividade plasmática e nuclear, com grupos de coalescência celular.
Neste trabalho, foram observadas deformações nos adipócitos dos subgrupos recebedores do hormônio hCG, entretanto as alterações ocorreram somente de modo parácrino, sem visualização de alteração similar em tecido distante da aplicação. Não houve deformação nos subgrupos que receberam placebo.
Qualquer deformação a nível de adipócitos não foi acompanhada de redução significativa do peso total dos animais tratados com o hormônio, o que está em consonância com os achados na pesquisa de Calguner et al. (2013).
Salienta-se também que pesquisa realizada por Maymó (2010) relatou que o HCG estimula a transcrição e a síntese de leptina na placenta e estaria relacionado com o aumento da quantidade da isoforma solúvel do receptor de leptina. Desse modo, a leptina é libertada principalmente pelos adipócitos no tecido adiposo branco e mostra os seus efeitos sobre os neurônios do núcleo arqueado no hipotálamo. Esse mecanismo ocorre especialmente no período gestacional.
Desse modo, apesar de estabelecida a relação entre hCG e receptores de leptina no tecido adiposo de camundongos, qualquer repercussão no peso dos animais após a aplicação não foi constatada.
5 CONCLUSÃO
Não ocorreu redução significativa de peso nos animais tratados com HCG, e as alterações teciduais no local da aplicação foram encontradas tanto em grupos que receberam o hormônio, quanto em grupos que receberam placebo. Desse modo, não se apresentou indícios válidos de alterações que possam fundamentar o uso do hCG com finalidade emagrecedora.
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¹Médicos pela Unifacid Wyden (2021);
²Mestre em Medicina Veterinária pela Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista (2011). Doutor em Medicina Veterinária pela UFRGS (2014).