O USO PROLONGADO DE BENZODIAZEPÍNICOS E SEUS EFEITOS A LONGO PRAZO: UMA REVISÃO DE LITERATURA

THE PROLONGED USE OF BENZODIAZEPINES AND THEIR LONGTERM EFFECTS: A LITERATURE REVIEW

EL USO PROLONGADO DE BENZODIACEPINAS Y SUS EFECTOS A LARGO PLAZO: UNA REVISIÓN DE LA LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10800403


Juliana de Castro1;
Karla Milhomem Costa de Rezende2;
Evandro Glender Moreira Miranda3;
Lílian Raquel Lima Roseno Wanzeler4;
Anne Caroline Dias.5


RESUMO

Os benzodiazepínicos são psicofármacos de grande consumo no Brasil e no mundo, relacionados ao uso indiscriminado pela população e efeitos tóxicos importantes ao organismo. O presente estudo de revisão buscou avaliar os efeitos do uso de benzodiazepínicos a longo prazo, compreendendo quais as consequências de seu uso indiscriminado pelo paciente.  Trata-se de uma pesquisa de revisão integrativa realizada nas bases de dados PubMed, LILACS e SciELO, levando em consideração os seguintes critérios de inclusão: artigos publicados de 2012 a 2023, publicados na íntegra, de acesso completo e gratuito, nos idiomas português ou inglês e que descrevessem as consequências do uso prolongado dos benzodiazepínicos, assim como da sua dependência no organismo. Ficou constatado que o uso prolongado dos benzodiazepínicos pode levar ao comprometimento psicomotor e cognitivo através de incoordenação motora, lentificação da velocidade psicomotora e de alterações no controle e no desempenho motor, além de redução da memória e raciocínio, impactando na funcionalidade e no bem-estar geral do paciente. Outro efeito bem observado pela literatura é o aumento de risco para o desenvolvimento de demência com o uso crônico de benzodiazepínicos, em especial para doença de Alzheimer. Por fim, é destacado o aumento da mortalidade em pacientes com uso crônico de benzodiazepínicos, demonstrando a necessidade em saúde pública que envolve a resolução da problemática e uso correto de tais medicações neste contexto.

Palavras-chave: Benzodiazepinas; Efeitos Adversos a Longo Prazo, Uso Inadequado de Medicamentos.

ABSTRACT                                        

Benzodiazepines are widely consumed psychotropic drugs in Brazil and around the world, related to indiscriminate use by the population and important toxic effects on the body. This review study sought to evaluate the effects of long-term use of benzodiazepines, understanding the consequences of their indiscriminate use by patients. This is an integrative review research carried out in the PubMed, LILACS and SciELO databases, taking into account the following inclusion criteria: articles published from 2012 to 2023, published in full, with complete and free access, in Portuguese or English and describing the consequences of prolonged use of benzodiazepines, as well as their dependence on the body. It was found that prolonged use of benzodiazepines can lead to psychomotor and cognitive impairment through motor incoordination, slowing of psychomotor speed and changes in control and motor performance, in addition to reduced memory and reasoning, impacting functionality and well-being of the general patient. Another effect well observed in the literature is the increased risk of developing dementia with the chronic use of benzodiazepines, especially Alzheimer’s disease. Finally, the increase in mortality in patients with chronic use of benzodiazepines is highlighted, demonstrating the need in public health that involves resolving the problem and correct use of such medications in this context.

Keywords: Benzodiazepines; Long-Term Adverse Effects, Inappropriate Use of Medications.

1.  INTRODUÇÃO

Os Benzodiazepínicos (BZDs) são os psicofármacos mais utilizados globalmente e possuem propriedades farmacológicas que propiciam ação sedativa, hipnótica, ansiolítica, anticonvulsivante e relaxante muscular (OLIVEIRA et al., 2020). A ação principal dos BZDs acontece no receptor GABA (Ácido Gama-Aminobutírico), que aciona o comando do sistema nervoso central através dos neurônios chamados de pré-sináptico, liberando os compostos químicos noradrenalina e serotonina, diminuindo a atividade cerebral, resultando na sensação de bem-estar físico e mental (LEONARDI et al., 2017). 

Nesse contexto, Filho e Silva (2018) afirmam que os Benzodiazepínicos estão entre os fármacos controlados mais consumidos no mundo, sendo que para casos de insônia e/ou ansiedade é recomendado que o tratamento com benzodiazepínico não ultrapasse o tempo de 4 semanas. Hodiernamente, a ansiedade e os distúrbios do sono têm sido obstáculos crescentes, tendo em vista que a sociedade moderna vivencia um elevado nível de estresse, caracterizando assim, um aumento na procura por substâncias que proporcione um bem-estar físico e/ou mental e também que auxilia na insônia. Dessa forma, medicamentos controlados são cada vez mais procurados pela população para essa finalidade. 

Um estudo publicado no Jornal Brasileiro de Psiquiatria mostra que os Benzodiazepínicos estão entre os medicamentos mais prescritos no Brasil, onde o consumo de substâncias dessa classe tem aumentado nas últimas décadas e este uso exacerbado se dá por diversos e complexos fatores. Segundo os dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o clonazepam (um medicamento da classe BZDs) foi a substância de uso controlado mais consumida pelos brasileiros durante os anos de 2007 a 2010, com cerca de 10 milhões de caixas vendidas somente em 2010 (NASCIMENTO et al., 2022).

Em estudos recentes, foi constatado que inúmeros pacientes realizaram tratamentos prolongados com BZDs, sendo que, estes tratamentos duraram vários meses ou até mesmo vários anos. Portanto, tais dados são preocupantes visto que, Filho e Silva (2018) afirmam que pacientes que fazem uso por um período superior a seis meses, enquadram-se como usuários crônicos, deixando de considerar o tempo estabelecido na prescrição, levando em consideração que mesmo 6 em pequenas doses, o medicamento traz graves consequências cognitivas e dependência. 

Assim sendo, o primeiro fenômeno que se observa com o uso crônico dos benzodiazepínicos é o desenvolvimento da tolerância, cuja velocidade de instalação varia para diferentes efeitos. A tolerância ocorre quando a administração repetida de uma droga provoca um desvio da curva de dose-resposta para a direita, de modo que seja necessária uma maior dose (concentração) da droga para produzir o mesmo efeito (NASCIMENTO et al., 2022). 

Os efeitos da sedação são os primeiros a serem atenuados; efeitos anticonvulsivantes são reduzidos mais lentamente e efeitos ansiolíticos demoram mais para desaparecer. O risco maior de tolerância ocorre com uso de doses maiores do que as terapêuticas e por longos períodos (AMARAL; MACHADO, 2012). Conforme Gonçalves (2012), na síndrome de abstinência por benzodiazepínicos, identificam-se como sinais e sintomas físicos e psíquicos os tremores, sudorese, palpitações, letargia, insônia, irritabilidade, dificuldade de concentração. 

Diante disso, conforme afirma Nascimento e colaboradores (2022), a orientação médica em relação ao uso dos benzodiazepínicos é um fator muito importante para diminuir a incidência dos efeitos colaterais e da dependência. Portanto, o efeito farmacológico dos benzodiazepínicos é comprovado por estudos científicos, no qual o uso prolongado tende a ocasionar problemas de tolerância, dependência e crises de abstinência, podendo trazer sérios riscos à saúde pública. 

Por conseguinte, levando em consideração o uso indiscriminado de BZDs e os seus os efeitos tóxicos graves, deficiência cognitiva e alterações psicomotoras são uma problemática que gera grande preocupação para diversos profissionais de saúde. Nesse viés, este estudo tem como objetivo fazer uma revisão na literatura elucidando os efeitos do uso de BZDs a longo prazo, compreendendo quais as consequências de seu uso indiscriminado pelo paciente.

2.  METODOLOGIA

O presente estudo tem como visão geral uma revisão integrativa da literatura, seguindo as seguintes etapas: identificação do tema e seleção da hipótese e objetivos da revisão integrativa; estabelecimento dos critérios de inclusão e exclusão do estudo (seleção da amostragem); definir quais informações serão extraídos dos artigos selecionados; análise dos resultados; discussão e apresentação dos resultados. 

A pesquisa foi realizada a partir de uma busca avançada nas bases de dados SciELO (Scientific Eletronic Library Online), PubMed e LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde), visando ampliar o âmbito da pesquisa e com isso evitar distorções. Será utilizado os descritores em saúde (DeCS) e suas combinações em inglês e português: “efeitos adversos a longo prazo” (“long-term adverse effects”) e “benzodiazepinas” (“benzodiazepines”). Tais descritores foram relacionados a partir do Operador Booleano “AND”.

Para a realização dessa pesquisa, os artigos foram selecionados de acordo com os seguintes critérios: artigos publicados de 2012 a 2023; artigos publicados na íntegra, de acesso completo e gratuito, nos idiomas português ou inglês; e artigos que descrevessem as consequências do uso prolongado dos Benzodiazepínicos, assim como da sua dependência no organismo. Foram excluídos artigos em duplicidade nas bases de dados e aqueles que não abordassem a temática analisada.

3.  RESULTADOS

Com a aplicação dos métodos de busca descritos, foram encontrados 1.746 artigos na base de dados PubMed. As bases de dados SciELO e LILACS não apresentaram artigos com os descritores selecionados. Em seguida, foram aplicados os critérios de inclusão na base de dados PubMed, na seguinte ordem: a partir da seleção de artigos com texto completo disponível, foram encontrados 427 artigos; ao buscar-se por artigos publicados no período de 2012-2023, foram encontrados 324 artigos. Ao serem selecionados artigos nos idiomas inglês ou português, encontrou-se 315 artigos. A partir de uma avaliação crítica dos títulos e resumos com base nos critérios de exclusão, foram selecionados 14 artigos, conforme esquematizado na figura 1, e que se encontram descritos na tabela 1.

Figura 1: Fluxograma de processo de identificação e seleção de artigos.

Fonte: autoral, com base na metodologia aplicada na pesquisa.

Tabela 1. Artigos selecionados para a revisão integrativa

Autor/AnoTítuloObjetivosTipo de EstudoMétodo/AmostraPrincipais Resultados
DAVIES et al., 2022Comparative safety of chronic versus intermittent benzodiazepine prescribing in older adults: A population-based cohort studyComparar os riscos associados ao uso crônico versus intermitente de benzodiazepínicos em idosos.Estudo de coorte prospectivo.Os usuários crônicos e intermitentes de benzodiazepínicos, com base nos 180 dias a partir da prescrição do índice, foram pareados (proporção de 1:2) por sexo, idade e escore de propensão, e depois acompanhados por até 360 dias. As taxas de risco (HR) para os resultados foram calculadas a partir de modelos de regressão de Cox.O estudo demonstra evidências de riscos excessivos significativos associados ao uso crônico de benzodiazepínicos em comparação ao uso intermitente. Os riscos excessivos podem informar a tomada de decisões por adultos mais velhos e médicos sobre se o uso de benzodiazepínicos a curto ou longo prazo é uma opção razoável para o manejo dos sintomas.
DE GAGE et al., 2014Benzodiazepine use and risk of Alzheimer’s disease: case-control studyInvestigar a relação entre o risco de doença de Alzheimer e a exposição a benzodiazepínicos iniciada há pelo menos cinco anos, considerando tanto a relação dose-resposta quanto os pródromos (ansiedade, depressão, insônia) possivelmente associados ao tratamento.Estudo caso-controle.1.796 pessoas com primeiro diagnóstico de doença de Alzheimer e acompanhadas por pelo menos seis anos antes foram comparadas com 7.184 controles quanto a sexo, faixa etária e duração do acompanhamento. Ambos os grupos foram amostrados aleatoriamente de pessoas idosas (idade > 66) que viviam na comunidade em 2000-2009.O uso de benzodiazepínicos está associado a um risco aumentado de doença de Alzheimer. A associação mais forte observada para exposições de longo prazo reforça a suspeita de uma possível associação direta, mesmo que o uso de benzodiazepínicos também possa ser um marcador precoce de uma condição associada a um risco aumentado de demência.
IQBAL et al., 2015Is long-term use of benzodiazepine a risk for cancer?Identificar benzodiazepínicos seguros e inseguros para o risco de câncer entre a população de Taiwan, além de estimar os benzodiazepínicos com sua dose diária definida (DDD) e duração da exposição (LOE) para toxicidade e efeitos carcinogênicos.Estudo longitudinal de caso-controle de base populacional.Durante o período do estudo, foram identificados e analisados ​​42.500 casos diagnosticados de câncer para uso de BZDs. Para cada caso, seis controles elegíveis foram pareados por idade, sexo e data de índice (isto é, livres de qualquer câncer na data do diagnóstico do caso) usando escore de propensão. Para uma estimativa de risco adequada, observou-se os resultados de acordo com o tempo de exposição (LOE) e a dose diária definida (DDD).O uso de diazepam, clorodizepóxido, medazepam, nitrazepam e oxazepam foram considerados mais seguros entre os BZDs. No entanto, o clonazepam foi associado a um maior risco de câncer. Além disso, observou-se que o risco específico de câncer entre o uso de BZDs aumentou em 98% para o cérebro, 25% para colorretal e 10% para o pulmão, em comparação com o uso de não-BZDs.
JANHSEN; ROSER; HOFFMANN, 2015The problems of long-term treatment with benzodiazepines and related substancesFornecer uma visão geral das taxas de uso indevido e dependência de benzodiazepínicos e drogas Z.Revisão de literatura.Realizou-se uma pesquisa bibliográfica seletiva no PubMed. A pesquisa foi limitada a publicações em alemão e inglês desde 2004. A pesquisa identificou 46 correspondências, das quais quatro publicações foram relevantes.Os benzodiazepínicos são geralmente altamente eficazes quando administrados pela primeira vez, mas geralmente devem ser administrados apenas para indicações estritas e por tempo limitado.
LADER, 2014Benzodiazepine harm: how can it be reduced?Analisar brevemente os efeitos adversos dos benzodiazepínicos (BZDs), a curto e longo prazo, e o seu potencial de dependência e abuso.Revisão de literatura.Sem descrição metodológica.Os efeitos adversos do uso de BZDs compreendem sedação subjetivamente e comprometimento cognitivo e psicomotor objetivamente, e habilidades complexas, como dirigir, podem ser comprometidas. A excitação paradoxal pode ter implicações forenses.
MURA et al., 2013Chronic use of benzodiazepines and latent cognitive decline in the elderly: results from the Three-city studyExaminar se o uso prolongado de benzodiazepínicos (BZDs) está associado a um declínio acelerado do desempenho cognitivo, usando um modelo estatístico adaptado especificamente para resultados quantitativos limitados longitudinais multivariados.Estudo de coorte prospectivo.Os dados vieram do estudo “Três cidades”, um estudo francês de base populacional. Todos os sujeitos tinham 65 anos ou mais no momento da inclusão e foram acompanhados por 7 anos. O uso de benzodiazepínicos e o funcionamento cognitivo foram avaliados em cada fase do exame (linha de base, 2, 4 e 7 anos). O declínio cognitivo foi analisado por meio de um modelo misto multivariado não linear com processo latente.O uso crônico de BZDs foi associado a um menor nível cognitivo latente, mas não foi encontrada associação entre o uso crônico e uma aceleração do declínio cognitivo, nem sobre o processo cognitivo latente, nem em testes neuropsicológicos específicos, o que sugere que o uso crônico de BZDs está associado a um pior desempenho cognitivo, mas não a um declínio cognitivo acelerado com a idade.
NADER et al., 2020Is Long-Term Benzodiazepine Use a Risk Factor for Cognitive Decline? Results of a Systematic Review  Revisar criticamente as evidências existentes da associação entre a exposição prolongada aos benzodiazepínicos e o risco de declínio cognitivo em adultos.Revisão sistemática.Foi realizada uma revisão sistemática com síntese narrativa. As bases de dados PubMed e PsycINFO foram pesquisadas usando combinações de palavras-chave relacionadas a “benzodiazepínicos” e “função cognitiva” desde o início do banco de dados até 12 de fevereiro de 2018 para identificar estudos longitudinais prospectivos.Poucas evidências demonstram associação entre o uso prolongado de benzodiazepínicos e um maior risco de declínio cognitivo na população adulta em geral. No entanto, discrepâncias entre os resultados e inconsistências quanto aos domínios cognitivos afetados e limitações metodológicas impedem conclusões definitivas.
OH; PARK; SONG, 2021Benzodiazepine Use and Long-Term Mortality in South Korean Adult Population: A Cohort StudyInvestigar se o uso de benzodiazepínicos está associado a um maior risco de mortalidade por todas as causas em 5 anos e examinamos a associação entre o uso de benzodiazepínicos e a mortalidade específica da doença em 5 anos.Estudo de coorte de base populacional.Em 2010, os usuários de benzodiazepínicos foram definidos como indivíduos que receberam benzodiazepínicos continuamente durante 30 dias para administração regular, e todos os outros indivíduos foram incluídos no grupo controle. O desfecho primário foi a mortalidade por todas as causas em 5 anos, avaliada de 2011 a 2015.O uso de benzodiazepínicos foi associado ao aumento da mortalidade por todas as causas em 5 anos na população adulta sul-coreana. Mais estudos são necessários para confirmar esses achados.
RITVO et al., 2023Long-term consequences of benzodiazepine-induced neurological dysfunction: A surveyDescrever e quantificar melhor as consequências para a vida de sintomas associados ao uso de benzodiazepínicos.Estudo secundário a partir de banco de dados.O estudo contou com 1.207 usuários de benzodiazepínicos de grupos de apoio a benzodiazepínicos e locais de saúde/bem-estar que completaram a pesquisa. Os entrevistados incluíram aqueles que ainda tomam benzodiazepínicos (n = 136), diminuem gradualmente (n = 294) ou descontinuam totalmente (n = 763).Muitos sintomas prolongados subsequentes ao uso e descontinuação de benzodiazepínicos (disfunção neurológica induzida por benzodiazepínicos) foram demonstrados entre os usuários, os quais experimentaram baixa energia, distração, perda de memória, nervosismo, ansiedade e outros sintomas.
SLUISZEN et al., 2019Driving performance and neurocognitive skills of long-term users of benzodiazepine anxiolytics and hypnoticsComparar o desempenho real de direção e as habilidades relacionadas à direção de pacientes em uso de ansiolíticos ou hipnóticos benzodiazepínicos por pelo menos 6 meses com controles saudáveis.Estudo caso-controle.Os participantes foram 44 usuários de longo prazo de benzodiazepínicos e ansiolíticos relacionados aos benzodiazepínicos (n = 12) e hipnóticos (n = 32) e 65 controles saudáveis ​​pareados. O desempenho foi avaliado por meio de um teste de direção na estrada que mede o desvio padrão da posição lateral e uma bateria de tarefas neurocognitivas.Os efeitos prejudiciais dos hipnóticos benzodiazepínicos no desempenho ao dirigir podem ser atenuados ao longo do tempo após uso prolongado (ou seja, 3 anos ou mais), embora as deficiências neurocognitivas possam permanecer.
TAIPALE et al., 2020Incidence of and Characteristics Associated With Long-term Benzodiazepine Use in FinlandInvestigar a incidência do uso prolongado de benzodiazepínicos e medicamentos relacionados (BZDR) e os fatores associados ao desenvolvimento do uso prolongado, implementando um desenho de acompanhamento com novos usuários.Estudo de coorte de base populacional.Este estudo utilizou uma coorte nacional de 129.732 novos usuários de BZDR na Finlândia. O acompanhamento continuou até a morte, por muito tempo, internação a termo, um intervalo de 2 anos no uso de BZDR, ou 31 de dezembro de 2015. A população foi analisada de acordo com a idade no início do tratamento, categorizada em subcortes mais jovens (< 65 anos) e mais velhas (≥ 65 anos).Os resultados deste estudo sugerem que a incidência do uso subsequente de BZDR a longo prazo em indivíduos que iniciam o uso de BZDR é elevada, especialmente entre pessoas idosas, e que o BZDR específico utilizado inicialmente é associado ao desenvolvimento do uso prolongado de BZDR e deve ser cuidadosamente considerado ao prescrever BZDRs.
TAKADA; FUJIMOTO; HOSOMI, 2016Association between Benzodiazepine Use and Dementia: Data Mining of Different Medical DatabasesPara examinar a associação entre o uso de ansiolíticos benzodiazepínicos e o risco de demência, realizou-se a mineração de dados de um banco de dados de notificações espontâneas e de um grande banco de dados organizado de prescrições.Estudo secundário a partir de banco de dados.Dados do Sistema de Notificação de Eventos Adversos da Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA (FAERS) do primeiro trimestre de 2004 até o final de 2013 e dados do banco de dados on-line de reações adversas de vigilância do Canadá do primeiro trimestre de 1965 até o final de 2013 foram usado para as análises.Abordagens multimetodológicas que utilizam diferentes métodos, algoritmos e bases de dados sugerem que o uso prolongado de benzodiazepínicos e de benzodiazepínicos de ação prolongada está fortemente associado a um risco aumentado de demência.
ZETSEN et al., 2022Cognitive Functioning in Long-Term Benzodiazepine UsersExaminar o desempenho cognitivo em quatro domínios cognitivos em usuários de benzodiazepínicos (BZDs) de longo prazo, em comparação com dados normativos.Estudo secundário a partir de banco de dados.Testes neuropsicológicos direcionados a diferentes domínios cognitivos foram administrados a 92 pacientes com uso prolongado de benzodiazepínicos que foram aceitos para inscrição em um programa de descontinuação de benzodiazepínicos em um hospital acadêmico.Dos usuários de BZDs de longo prazo, 20,7% poderiam ser classificados como deficientes cognitivos em todos os domínios, com os maiores efeitos encontrados nos domínios velocidade de processamento e atenção sustentada, e um pior desempenho geral em mulheres, um efeito que parece ser moderado pela ansiedade-estado.
ZHONG et al., 2015Association between Benzodiazepine Use and Dementia: A Meta-AnalysisQuantificar a associação entre o uso prolongado de benzodiazepínicos e o risco de demência e explorar um potencial padrão dose-resposta.Revisão de literatura com metanálise.Utilizou-se as bases PubMed, Embase e Cochrane Library até 17 de agosto de 2014. Incluiu-se estudos de caso-controle ou de coorte prospectivos que forneceram estimativas de risco sobre a associação do uso de benzodiazepínicos com risco de demência.Os usuários de benzodiazepínicos a longo prazo apresentam um risco aumentado de demência em comparação com os que nunca usaram. No entanto, os resultados do estudo devem ser tratados com cautela devido a estudos limitados e potencial causalidade reversa.

Fonte: autoral, com base nas referências consultadas para a revisão integrativa.

4.  DISCUSSÃO

Os benzodiazepínicos são uma classe farmacológica essencial a diversas áreas da medicina como medicina de emergência, anestesiologia, emergências psiquiátricas, tratamento de epilepsia e manejo da dor. Entretanto, seu uso contínuo e prolongado pode promover diversos efeitos adversos não desejados, o que justifica a adesão de um período de uso seguro para essas drogas, assim como determinado na década de 1980 pelo Instituto Federal Alemão de Medicamentos e Dispositivos Médicos, o qual limita a utilização de benzodiazepínicos para no máximo 4 semanas (JANHSEN; ROSER; HOFFMANN, 2015). 

A duração do período de uso seguro dos benzodiazepínicos pode variar entre os países. Na Inglaterra, por exemplo, o Formulário Nacional Britânico recomenda que o uso ininterrupto de benzodiazepínicos não ultrapasse 4 semanas, enquanto que na Finlândia, as diretrizes definem que essa classe medicamentosa deve ser prescrita por, no máximo, 12 semanas, incluindo nesse prazo o período de descontinuação da droga (TAIPALE et al., 2020). Contudo, o uso por períodos prolongados continua sendo frequente, como tem sido demonstrado repetidamente nas pesquisas desenvolvidas pelo mundo todo, por exemplo de acordo com um estudo de coorte realizado com dados da Instituição de Seguro Social da Finlândia, cerca de 30% dos novos usuários de benzodiazepínicos com menos de 65 anos e 55% dos novos usuários com mais de 65 anos de idade se tornaram usuários crônicos desses fármacos, com um uso por mais de 180 dias (TAIPALE et al., 2020). 

O consumo crônico dos benzodiazepínicos está epidemiologicamente relacionado a usuários idosos, mulheres, pessoas com múltiplas comorbidades, com doenças psiquiátricas e/ou história pregressa de alcoolismo e uso de substâncias de abuso (LADER, 2014; TAIPALE et al., 2020). Dentre os efeitos adversos do uso prolongado dos benzodiazepínicos, pode-se destacar: dependência, comprometimento psicomotor, comprometimento cognitivo, demência, excitação paradoxal, câncer e aumento da mortalidade (BILLIOTI DE GAGE et al., 2014; LADER, 2014; ZHONG et al., 2015). 

Dependência 

A dependência dos benzodiazepínicos é caracterizada por uso compulsivo e por apresentação de sintomas de abstinência quando há a retirada ou a redução das doses da droga, o que corrobora com a definição de dependência da Organização Mundial da Saúde (OMS), segundo a qual dependência é o forte sentimento de compulsão para consumir uma substância, associada à dificuldade em controlar o uso dela, com desenvolvimento de tolerância aos efeitos do fármaco e presença de um estado de abstinência (JANHSEN; ROSER; HOFFMANN, 2015; LADER, 2014). A abstinência acomete aproximadamente 1/3 dos usuários crônicos dos benzodiazepínicos. Nesse contexto, um estudo realizado com dados do Inquérito Epidemiológico sobre o Abuso de Substâncias no ano de 2011, evidenciou que cerca de 1 milhão de alemães com idade entre 18 e 64 anos apresentavam sinais e sintomas de dependência a benzodiazepínicos (JANHSEN; ROSER; HOFFMANN, 2015). 

Dentre os sintomas de abstinência aos benzodiazepínicos, os mais comuns são insônia, ansiedade, alteração de humor para hipotônico na maioria dos casos e para hipertônico em uma minoria, mialgia, espasmos musculares, tremores, cefaleia, náuseas e vômitos, sudorese e turvação da visão. Há, também, sintomas menos frequentes como distúrbios sensoriais de hipersensibilidade/hiposensibilidade ou alteração qualitativa da visão, audição, paladar e tato; e há sintomas raros como crise convulsiva e episódio de psicose (JANHSEN; ROSER; HOFFMANN, 2015). 

Dentre os pacientes que apresentam dependência ao uso de benzodiazepínicos existem os que fazem uso abusivo, ou seja, que utilizam da medicação de forma recreativa e ilícita, seja de maneira isolada ou em associação com outras drogas. O padrão de uso varia desde a frequência, até a forma de administração da substância, a qual passa a ser consumida não apenas por via oral, mas por via inalatória ou endovenosa. Além dos riscos relacionados ao uso crônico dessas substâncias, há riscos relacionados a forma de administração, como aquisição de infecções virais por compartilhamento de seringas ou necrose local de tecido; há riscos relacionados também com a potencialização do efeito de outras drogas e o risco de overdose (LADER, 2014).

Pesquisas demonstram que pessoas em uso de benzodiazepínicos a longo prazo, que estão descontinuando gradualmente essa droga e que descontinuaram totalmente o fármaco podem apresentar sintomas neurológicos como ansiedade, insônia, agitação, baixa energia, fraqueza muscular, dores e sofrimento no corpo. Esses sintomas são mais presentes e graves em pessoas que descontinuaram totalmente o fármaco e podem ainda estar presentes após um ano da cessação da medicação (RITVO et al., 2023). 

Um estudo realizado com usuários atuais em dose plena e em regressão de doses, e com ex-usuários de benzodiazepínicos, desenvolvido através de pesquisa online, questionou aos participantes sobre a presença e a intensidade de 23 sintomas neurológicos (ansiedade, insônia, agitação, baixa energia, fraqueza muscular, dores e sofrimento no corpo, dentre outros) e sobre como esses sintomas impactam na vida dessas pessoas. O estudo teve a participação de 1207 entrevistados, destes 54,7% afirmaram apresentar pelo menos 17 dos 23 sintomas listados, sendo que os sintomas mais citados foram ansiedade, medo e/ou nervosismo afirmados por 88,1% dos entrevistados. Distúrbios relacionados ao sono foram pontuados por 86,9% dos participantes; baixos níveis de energia foi citado por 86,2% das pessoas; e dificuldade de concentração/atenção foi informada por 85,3% dos usuários; 40% pontuou ainda que os sintomas duraram um ano ou mais, deixando evidente que os efeitos a longo prazo dos benzodiazepínicos no organismo humano persistem mesmo após a cessação de seu uso (RITVO et al., 2023). 

O estudo citado deixou evidente que esses sintomas não são efeito rebote da cessação do uso de benzodiazepínicos, uma vez que a maior parte dos sintomas desenvolvidos divergiram dos sintomas para os quais a medicação foi indicada e prescrita, sendo, portanto caracterizados como um efeito duradouro derivado do uso ou da descontinuação desta classe de medicamentos (RITVO et al., 2023). 

Comprometimento psicomotor 

A longo prazo, os benzodiazepínicos podem promover comprometimento psicomotor através de incoordenação motora, lentificação da velocidade psicomotora e de alterações no controle e no desempenho motor, o que impacta diretamente na funcionalidade e no bem estar geral do paciente, uma vez que este pode passar a apresentar dificuldades na execução de ações primordiais como falar, andar e se alimentar, bem como de atividades básicas do dia-a-dia como a realização do autocuidado e de atribuições mais complexas como trabalhar e dirigir (NADER; GOWING, 2020; SLUISZEN et al., 2019). 

Um dos grandes riscos do comprometimento psicomotor nos usuários crônicos de benzodiazepínicos são as quedas e fraturas. Estudos indicam que a incidência de quedas e de fraturas de quadril podem aumentar em até 50% entre idosos que fazem uso de benzodiazepínicos a longo prazo, principalmente se estes pacientes fazem uso dessa classe medicamentosa em associação com fármacos de outras classes (LADER, 2014).

Em concordância com esses achados, um estudo realizado no Canadá com usuários crônicos e intermitentes de benzodiazepínicos deixou evidente que o índice de internações, quedas e fraturas entre esses é maior do que em pessoas que não fazem uso de benzodiazepínicos, principalmente entre os que fazem uso crônico constante (DAVIES et al., 2022). Em consonância com tais dados, há também estudos que evidenciam que o risco de usuários crônicos de benzodiazepínicos dirigirem é semelhante ao risco de se dirigir sob o efeito de álcool em uma concentração sanguínea de 0,05% e 0,075% (SLUISZEN et al., 2019).

É importante destacar, ainda, um estudo realizado sobre os efeitos do uso contínuo de benzodiazepínicos sobre a capacidade de conduzir veículos, o qual foi realizado na Holanda através de testes de condução, testes neurocognitivos e questionários, e que deixou evidente que o uso a longo prazo dessa classe de medicamentos tem relação bem estabelecida com o

comprometimento da condução de veículos até os 3 primeiros anos de uso, tendo pouca relação com o uso contínuo após esse período de tempo (SLUISZEN et al., 2019). 

Com base em tais evidências, a legislação holandesa estabelece que condutores usuários de benzodiazepínicos são incapazes de dirigir, e que aqueles que já fazem uso de benzodiazepínicos por mais de três anos podem solicitar uma avaliação da capacidade psicomotora para retornar a dirigir, demonstrando a interferência da medicação neste contexto da vida cotidiana (SLUISZEN et al., 2019).

Comprometimento cognitivo 

O uso prolongado de benzodiazepínicos está associado ao comprometimento cognitivo do usuário, sendo que tal comprometimento mantém relação direta com a concentração, a frequência e o tempo de uso da substância, sendo amplificado nos casos em que o paciente faz uso concomitante de benzodiazepínico e álcool (LADER, 2014; ZETSEN et al., 2022). Um estudo holandês com 92 participantes usuários crônicos de benzodiazepínicos evidenciou o comprometimento cognitivo derivado do uso dessa classe de fármacos sobre as habilidades de processamento sensorial, habilidades visuoespaciais, função executiva, velocidade psicomotora, controle motor, raciocínio verbal, memória episódica e de trabalho (ZETSEN et al., 2022).

Ademais, esse mesmo estudo demonstrou a recuperação parcial da função cognitiva dos usuários de benzodiazepínicos após 10 meses de abstinência acompanhada por profissionais, porém não conseguiu comprovar uma recuperação absoluta da capacidade cognitiva (ZETSEN et al., 2022). Corroborando com esta informação, um estudo francês que avaliou 5.195 idosos com mais de 65 anos, que faziam uso de benzodiazepínicos a longo prazo, evidenciou através de diversos testes neurocognitivos que essa classe medicamentosa não promove um aceleramento do declínio cognitivo entre os idosos, porém acarreta um comprometimento cognitivo, principalmente da memória visual imediata, da atenção e da velocidade de processamento visuomotor (MURA et al., 2013).

Dentre as habilidades cognitivas afetadas, pode-se destacar a habilidade da memória. Estudos de meta-análise com comparação de ensaios já demonstraram que o uso prolongado de benzodiazepínicos prejudica a memória dos usuários em vários aspectos, como memória de trabalho, memória episódica, memória não verbal e memória verbal, sendo esta última inclusive a mais afetada. Tais estudos também demonstram que quanto mais complexo o aprendizado a ser memorizado pior a execução da função pelo paciente (LADER, 2014; NADER; GOWING, 2020; ZETSEN et al., 2022).

Outra capacidade cognitiva afetada pelo uso de benzodiazepínicos é o raciocínio. Com a utilização a longo prazo dessas drogas, o usuário passa a apresentar desorientação e redução da velocidade de processamento, sendo que há estudos que demonstram também redução da inteligência (LADER, 2014; NADER; GOWING, 2020; ZETSEN et al., 2022). 

Demência  

A demência é associada em muitos estudos ao uso de benzodiazepínicos a longo prazo. Uma revisão sistemática realizada com 6 grandes estudos observacionais com a população asiática evidenciou que os usuários crônicos de benzodiazepínicos apresentam duas vezes mais chance de desenvolver futuramente demência quando comparados com pessoas que não fazem uso dessa classe medicamentosa, chegando a conclusão de que os benzodiazepínicos agem como um fator de risco para o desenvolvimento de demência (ZHONG et al., 2015). 

Em concordância com essa revisão sistemática, um estudo de caso-controle realizado no Canadá com 8.980 participantes, demonstrou que o risco de demência em idosos aumenta cerca de 50% entre os usuários crônicos de benzodiazepínicos, especificamente para doença de Alzheimer. O estudo observou também que o risco aumenta de acordo com a exposição cumulativa, sendo mais presente entre usuários de benzodiazepínicos de ação prolongada (BILLIOTI DE GAGE et al., 2014). 

Consoante a esses achados, uma pesquisa realizada com dados do Sistema de Notificação de Eventos Adversos da Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA de 2004 a 2013 e dados do banco de dados on-line de reações adversas de vigilância do Canadá de 1965 a 2013, afirmou que o uso de benzodiazepínicos tanto de ação longa, quanto os de ação curta, média e ultra-longa, à longo prazo, aumentam os riscos para o desenvolvimento de demência, contudo, destacou que os de ação longa são os que mais se relacionam ao aumento do risco (TAKADA; FUJIMOTO; HOSOMI, 2016).

É importante destacar que essa correlação de causa-consequência entre uso de benzodiazepínicos a longo prazo e o desenvolvimento de demência ainda não é convencionado, uma vez que a demência pode ser antecedida por pródromos (depressão, ansiedade, insônia e agitação) até uma década antes dos sintomas patognomônicos da síndrome e que esses sintomas prodrômicos classicamente são tratados com benzodiazepínicos, o que levanta uma teoria de causalidade reversa em que a síndrome demencial promove o uso de benzodiazepínicos (BILLIOTI DE GAGE et al., 2014; ZHONG et al., 2015).

Contudo, a meta-análise dos estudos desenvolvidos com a população asiática citada acima destaca um estudo em especial que acompanhou usuários crônicos de benzodiazepínicos por cerca de 22 anos, iniciando o acompanhamento desde a primeira prescrição para essa classe farmacológica. O tempo de duração desse estudo, em particular, permite a superação da teoria de causalidade reversa, uma vez que demonstrou o desenvolvimento de demência em usuários crônicos de benzodiazepínicos que iniciaram o

uso dessas drogas bem antes do tempo máximo associado ao surgimento de pródromos (ZHONG et al., 2015). 

Excitação paradoxal  

Também conhecida como “anestesia emocional”, a excitação paradoxal é mais um dos efeitos proporcionados pelo uso a longo prazo dos benzodiazepínicos. Essa excitação rebote é uma tentativa do organismo em tentar contornar os efeitos sedativos da medicação. A excitação paradoxal é caracterizada por sintomas de ansiedade, agitação aguda e hiperatividade que podem resultar em desinibição e impulsos agressivos, estes são muito associados a atos criminosos de agressão e violência (LADER, 2014).

Câncer  

A correlação entre a utilização a longo prazo de benzodiazepínicos e o aumento no risco de desenvolvimento de câncer é controversa entre os estudos, uma pesquisa de caso-controle dinamarquesa investigou essa correlação utilizando bases de dados nacionais, com dados de 2002 a 2009, e evidenciou que essa classe farmacológica não está relacionada ao aumento de risco de câncer (IQBAL et al., 2015). 

Em contrapartida, um estudo longitudinal de caso-controle realizado com a base de dados nacional de Taiwan, utilizando dados de 1996 a 2011, demonstrou a existência de uma correlação entre o uso crônico de benzodiazepínicos e o aumento do risco de câncer, destacando uma elevação de 21% para câncer em geral, 98% para câncer de cérebro, 59% para câncer de esôfago, 41% para câncer de pâncreas, 39% para câncer de bexiga, 25% para câncer colorretal e 10% para câncer de pulmão, quando comparado a pacientes que não fazem uso de benzodiazepínicos; o estudo não identificou associação significativa para câncer cervical, de ovário e de estômago (IQBAL et al., 2015). 

Ademais, o estudo também evidenciou as principais drogas relacionadas ao aumento de risco de câncer, destacando o clonazepam, lorazepam, alprazolam e o bromazepam como fármacos de maior risco (IQBAL et al., 2015). 

Em relação ao câncer de mama, um estudo de caso-controle com base populacional desenvolvido em Taiwan, investigou a correlação entre o desenvolvimento de câncer de mama e a utilização de benzodiazepínicos, através de dados do Departamento Nacional do seguro de saúde e dados de expressão gênica do câncer de mama do Atlas do Genoma do Câncer, chegando a conclusão de que alguns benzodiazepínicos apresentam fator oncogênico para o desenvolvimento de câncer de mama, dentre os estudados na pesquisa, o que mais apresentou evidências de oncogenicidade para a mama foi o diazepam (IQBAL, 2017). 

Mortalidade  

As pesquisas demonstram que há uma relação direta entre o uso crônico de benzodiazepínicos e o aumento da taxa de mortalidade entre seus usuários. Um estudo realizado na Pensilvânia com 10.529 pessoas usuárias de benzodiazepínicos evidenciou que usuários de medicações hipnóticas, mesmo que de uso ocasional, têm um risco três vezes maior de morrer em dois anos e meio (JANHSEN; ROSER; HOFFMANN, 2015; LADER, 2014). Corroborando com esse achado, um estudo de coorte desenvolvido na Coreia do Sul comparou a mortalidade por todas as causas entre os anos de 2011 a 2015 de pessoas usuárias de benzodiazepínicos por mais de 30 dias contínuos com pessoas que não fizeram uso dessa substância e chegou a conclusão de que os benzodiazepínicos aumentam a mortalidade de seus usuários em 1,15 vezes (OH; PARK; SONG, 2021). 

A especificidade do aumento do risco de mortalidade por etiologia da morte ainda não é convencionada, uma vez que apresenta achados difusos entre os estudos. Nesse contexto, dois grandes estudos de coorte na França e no Reino Unido evidenciaram que o uso a longo prazo de benzodiazepínicos aumenta o risco de mortalidade por todas as causas dentro de 1 ano, enquanto que o estudo sul-coreano evidenciou que o uso crônico de benzodiazepínicos está relacionado ao aumento da mortalidade por doenças dos sistemas nervoso, cardiovascular, digestivo e por lesões e envenenamentos, deixando evidente que o uso desses fármacos não está associado ao aumento do risco de mortalidade por câncer, doenças infecciosas, parasitárias, endócrinas, respiratórias, metabólicas ou musculoesqueléticas (OH; PARK; SONG, 2021).

5.  CONCLUSÃO

 A partir do presente estudo de revisão, fica evidente a relevância da compreensão acerca dos principais efeitos a longo prazo desencadeados pelo uso crônico dos benzodiazepínicos. Ficou constatado que o uso prolongado dos benzodiazepínicos pode levar ao comprometimento psicomotor através de incoordenação motora, lentificação da velocidade psicomotora e de alterações no controle e no desempenho motor, impactando na funcionalidade e no bem-estar geral do paciente. Além disso, verificou-se que tal uso prolongado pode impactar na redução da memória e raciocínio, em que o usuário passa a apresentar desorientação e redução da velocidade de processamento. Outro efeito bem observado pela literatura é o aumento de risco para o desenvolvimento de demência com o

uso crônico de benzodiazepínicos, em especial para doença de Alzheimer. Por fim, é destacado o aumento da mortalidade em pacientes com uso crônico de benzodiazepínicos, demonstrando a necessidade em saúde pública que envolve a resolução da problemática e uso correto de tais medicações neste contexto.

REFERÊNCIAS

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ZHONG, G. et al. Association between benzodiazepine use and dementia: a meta-analysis. PloS One, v. 10, n. 5, p. e0127836, 2015.


1Graduanda do 7º período de Medicina, Instituição: Afya – Palmas – TO, E-mail: ragju@uol.com.br;
2Graduanda do 7º período de Medicina, Instituição: Afya – Palmas – TO, E-mail: karlamcfisio@yahoo.com.br;
3Graduando do 7º período de Medicina, Instituição: Afya – Palmas – TO, E-mail: Glendermiranda1@hotmail.com;
4Graduanda do 7º período de Medicina, Instituição: Afya – Palmas – TO, E-mail: lilianraquel.med@gmail.com;
5Doutorado e Graduação em Biomedicina, Instituição: Afya – Palmas – TO, E-mail: Nevesannecarold@gmail.com