THE USE OF SACUBITRIL/VALSARTAN IN THE TREATMENT OF HEART FAILURE
EL USO DE SACUBITRILO/VALSARTÁN EN EL TRATAMIENTO DE LA INSUFICIENCIA CARDÍACA
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202411221611
Raiza Gabriela Gomes Vilarinho1*
Daniel Mayco de Melo Oliveira1
Thadeu do Lago Baratta Monteiro1
Nagele de Sousa Lima1
Adelia Dalva da Silva Oliveira1
RESUMO
Objetivo: Reunir informações detalhadas da eficácia do sacubitril/valsartana no contexto da IC, abordando desde o impacto epidemiológico da doença até as nuances do mecanismo de ação do fármaco e seus resultados clínicos. Revisão bibliográfica: A IC é frequentemente a manifestação final de várias doenças cardiovasculares, como hipertensão arterial sistêmica, infarto agudo do miocárdio, cardiomiopatias e valvopatias. A combinação de sacubitril e valsartana representa uma inovação significativa no tratamento da insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida (ICFER). A evidência clínica demonstra claramente sua superioridade em relação aos IECA tradicionais, com melhorias substanciais na mortalidade cardiovascular, nas hospitalizações e na qualidade de vida dos pacientes. Considerações finais: Apesar dos avanços representados por sacubitril/valsartana, é essencial reconhecer que o tratamento não é isento de desafios. O monitoramento cuidadoso é necessário para gerenciar potenciais efeitos adversos, como hipotensão e hiperpotassemia. A combinação de mecanismos de ação e os resultados positivos dos estudos clínicos reforçam sua posição como uma escolha de tratamento de primeira linha para ICFER.
Palavras-chave: Insuficiência Cardíaca, Sacubitril/valsartana, Doenças Cardiometabólicas.
ABSTRACT
Objective: To gather detailed information on the efficacy of sacubitril/valsartan in the context of heart failure, covering everything from the epidemiological impact of the disease to the nuances of the drug’s mechanism of action and its clinical outcomes. Literature Review: Heart failure often represents the final manifestation of various cardiovascular diseases, such as systemic arterial hypertension, acute myocardial infarction, cardiomyopathies, and valvular diseases. The combination of sacubitril and valsartan represents a significant innovation in the treatment of heart failure with reduced ejection fraction (HFrEF). Clinical evidence clearly demonstrates its superiority over traditional ACE inhibitors, with substantial improvements in cardiovascular mortality, hospitalizations, and patients’ quality of life. Final Considerations: Despite the advancements represented by sacubitril/valsartan, it is essential to recognize that treatment is not without challenges. Careful monitoring is necessary to manage potential adverse effects, such as hypotension and hyperkalemia. The combination of mechanisms of action and the positive results from clinical studies reinforce its position as a first-line treatment choice for HFrEF.
Keywords: Obesity, Cardiometabolic Diseases, Pandemic.
RESUMEN
Objetivo: Reunir información detallada sobre la eficacia del sacubitril/valsartán en el contexto de la insuficiencia cardíaca, abordando desde el impacto epidemiológico de la enfermedad hasta las particularidades del mecanismo de acción del fármaco y sus resultados clínicos. Revisión Bibliográfica: La insuficiencia cardíaca suele ser la manifestación final de diversas enfermedades cardiovasculares, como la hipertensión arterial sistémica, el infarto agudo de miocardio, las miocardiopatías y las valvulopatías. La combinación de sacubitril y valsartán representa una innovación significativa en el tratamiento de la insuficiencia cardíaca con fracción de eyección reducida (IC-FEr). La evidencia clínica demuestra claramente su superioridad en relación con los IECA tradicionales, con mejoras sustanciales en la mortalidad cardiovascular, las hospitalizaciones y la calidad de vida de los pacientes. Consideraciones Finales: A pesar de los avances representados por sacubitril/valsartán, es esencial reconocer que el tratamiento no está exento de desafíos. Se requiere un monitoreo cuidadoso para gestionar los posibles efectos adversos, como la hipotensión y la hiperpotasemia. La combinación de mecanismos de acción y los resultados positivos de los estudios clínicos refuerzan su posición como una opción de tratamiento de primera línea para la IC-FEr.
Palabras-clave: Insuficiencia Cardíaca, Sacubitril/valsartán, Enfermedades Cardiometabólicas.
INTRODUÇÃO
A insuficiência cardíaca (IC) representa um dos principais desafios para a medicina contemporânea, configurando-se como uma síndrome clínica complexa resultante de diversas condições que afetam a estrutura e a função do coração, culminando na incapacidade deste em suprir as demandas metabólicas do organismo. Essa condição é responsável por elevadas taxas de hospitalização e mortalidade, além de ser um fator de grande impacto econômico, sobretudo nos sistemas de saúde pública (MCDONAGH TA, et al., 2021). Diante disso, o desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas têm se tornado uma prioridade, visando tanto a redução dos eventos adversos quanto a melhoria da qualidade de vida dos pacientes acometidos.
Historicamente, o tratamento da IC com fração de ejeção reduzida (ICFER) baseava-se principalmente no uso de inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA), bloqueadores do receptor de angiotensina II (BRA) e betabloqueadores, todos focados na modulação neuro-hormonal (HEIDENREICH PA, et al., 2022). No entanto, embora essas terapias tenham demonstrado benefícios clínicos significativos, a taxa de mortalidade e morbidade permaneceu elevada, evidenciando a necessidade de estratégias mais eficazes e abrangentes (MONZO L, et al., 2020).
Nesse contexto, a introdução de novas classes de fármacos, como a combinação de sacubitril e valsartana, trouxe uma nova perspectiva no manejo da IC. O sacubitril/valsartana combina dois mecanismos complementares: o sacubitril, um inibidor da neprilisina, e a valsartana, um antagonista do receptor de angiotensina II. O sacubitril promove a inibição da degradação de peptídeos natriuréticos, substâncias com propriedades vasodilatadoras, natriuréticas e anti-hipertróficas, enquanto a valsartana atua bloqueando os efeitos deletérios da angiotensina II no sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA) (AMBROSY AP, et al., 2020). Essa combinação sinérgica se mostrou capaz de otimizar os efeitos benéficos sobre o remodelamento cardíaco, redução da sobrecarga hemodinâmica e melhora da função sistólica.
Diante do supracitado, o presente artigo tem como objetivo reunir informações detalhadas da eficácia do sacubitril/valsartana no contexto da IC, abordando o impacto epidemiológico da doença, a eficácia da droga em questão, o tratamento da IC e seus resultados clínicos.
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Epidemiologia da IC
Estima-se que aproximadamente 64 milhões de pessoas ao redor do mundo convivam com IC, e esse número é proporcional ao aumento da expectativa de vida da população global. A IC afeta aproximadamente 1 a 2% da população adulta em países desenvolvidos, com a prevalência saltando para mais de 10% entre indivíduos idosos (SAVARESE G, et al., 2022). Alguns fatores de risco como diabetes mellitus, dislipidemia, tabagismo, obesidade e condições como doença arterial coronariana também contribuem significativamente para o aumento do risco de desenvolvimento da IC (SONG P, et al., 2019).
No Brasil, estima-se que a condição afete cerca de 2 milhões de pessoas, representando uma das principais causas de internação hospitalar no sistema público de saúde (SUS) (SOUZA M, et al., 2022). Um estudo realizado por Vieira BGDP et al. 2024 teve como objetivo descrever o perfil epidemiológico das hospitalizações por insuficiência cardíaca no estado do Pará entre 2012 e 2022, com comparações ao cenário nacional. Tratou-se de uma pesquisa descritiva e quantitativa, na qual foram analisados dados de morbidade hospitalar no estado, obtidos do sistema de informações hospitalares do SUS. Variáveis como faixa etária, sexo, cor/raça, região de saúde, tempo médio de permanência hospitalar e taxa de mortalidade foram incluídas na análise, realizada com auxílio do Microsoft Excel®. Os resultados revelaram um total de 53.236 internações, concentradas majoritariamente na Região Metropolitana I, com destaque para o ano de 2012, seguido de uma tendência de redução. A maior proporção de pacientes estava na faixa etária de 70 a 79 anos (24,5%), com predominância do sexo masculino (57%) e de indivíduos de raça parda (57%). A taxa de mortalidade foi de 9,28%, mais alta na região do Baixo Amazonas, onde também houve um aumento de 4% nos óbitos, afetando principalmente homens brancos. O tempo médio de internação foi de 7,7 dias, apresentando uma tendência de crescimento ao longo do período estudado, sendo maior entre indivíduos de raça branca. Em conclusão, o perfil de internações por insuficiência cardíaca no Pará aponta para uma predominância de indivíduos pardos, homens e com idade acima de 60 anos, com uma redução nas taxas de internação, embora a taxa de mortalidade esteja em ascensão.
A IC pode ser classificada de acordo com a fração de ejeção (FE) do ventrículo esquerdo, sendo dividida em IC com fração de ejeção preservada (ICFEP) e insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida (ICFER). A ICFER, definida por uma fração de ejeção inferior a 40%, é a forma mais estudada da doença e está associada a maiores taxas de mortalidade. Já a ICFEP, que afeta uma parcela significativa de pacientes idosos e mulheres, ainda apresenta desafios terapêuticos devido à sua fisiopatologia mais complexa e menos compreendida (DEMIR AR, et al., 2021).
Dessa forma, a IC continua a ser um desafio global de saúde pública, exigindo intervenções terapêuticas precoces, otimização de recursos e maior conscientização sobre os fatores de risco para a prevenção e o manejo adequado da doença.
Fisiopatologia e manifestações clínicas da IC
A insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada (IC-FEp) apresenta uma fisiopatologia complexa e ainda não totalmente compreendida, diferenciando-se da insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida (IC-FEr) em diversos aspectos. Pacientes com IC-FEp tendem a ser mais idosos, predominantemente do gênero feminino e apresentam diversas comorbidades cardiovasculares, como hipertensão arterial (HTA), fibrilação atrial (FA), doença arterial coronariana (DAC) e hipertensão pulmonar (HTP), além de condições não cardiovasculares, incluindo diabetes mellitus (DM), doença renal crônica (DRC) e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). Esses fatores contribuem significativamente para a morbidade e mortalidade nesses pacientes, que têm menor incidência de infarto agudo do miocárdio (IAM) e morte súbita, comparados aos pacientes com IC-FEr (FERNANDES SL, et al. 2020).
Em termos de funcionamento cardíaco, a IC-FEp não está limitada à disfunção diastólica, como se acreditava anteriormente, podendo envolver comprometimentos tanto sistólicos quanto diastólicos. Essa condição resulta de uma variedade de alterações estruturais, como fibrose e hipertrofia cardíaca, além de disfunções microvasculares e metabólicas, o que aumenta a rigidez do coração e compromete sua capacidade de relaxamento. Tais mudanças elevam as pressões de enchimento do ventrículo esquerdo (VE), levando a adaptações estruturais no átrio e no ventrículo direito, além de hipertensão pulmonar, observada em 53-83% dos casos. Outros mecanismos, como incompetência cronotrópica e disfunção autonômica, agravam o quadro, enquanto alterações endoteliais e musculoesqueléticas contribuem para a intolerância ao esforço e a baixa capacidade aeróbica (MARTINEZ PF, et al., 2021).
Os sintomas clínicos da IC são variados e refletem tanto a congestão venosa quanto a diminuição do débito cardíaco. A congestão pulmonar é uma manifestação comum, resultando em dispneia, ortopneia (dificuldade em respirar ao deitar-se) e episódios de dispneia paroxística noturna. Esses sintomas ocorrem devido ao acúmulo de líquido nos pulmões, que aumenta a pressão nos capilares pulmonares e causa edema intersticial e alveolar. Além disso, a congestão sistêmica pode levar a sintomas como edema periférico, ascite (acúmulo de líquido na cavidade abdominal) e aumento do volume hepático, frequentemente associado à hepatomegalia (MOREIRA FL e DA SILVA GW, 2021).
A redução do débito cardíaco pode causar fadiga, fraqueza e diminuição da capacidade de exercício, uma vez que os músculos e tecidos não recebem oxigênio e nutrientes suficientes. A incapacidade do coração em manter um débito adequado também pode resultar em sintomas como tontura e síncope, especialmente em situações de estresse ou esforço físico (FERNANDES F, et al., 2024).
Portanto, a manifestação clínica da IC reflete o impacto dessas disfunções sobre a capacidade do coração de manter um fluxo sanguíneo adequado e de adaptar-se às necessidades do organismo, evidenciando a necessidade de uma abordagem terapêutica abrangente e personalizada.
Tratamento com Sacubitril Valsartana e seu mecanismo de ação
O sacubitril/valsartana destaca-se como uma terapia inovadora para a insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida (ICFER), devido à sua ação dupla. O valsartana age como bloqueador dos receptores de angiotensina II, proporcionando um efeito vasodilatador que ajuda a reduzir a pressão arterial. O sacubitril, por sua vez, é um inibidor da enzima neprilisina, responsável pela degradação dos peptídeos natriuréticos, bradicinina e outros mediadores vasodilatadores importantes. Ao bloquear a neprilisina, o sacubitril eleva os níveis de peptídeos natriuréticos no organismo, prolongando seu tempo de ação nos tecidos. Isso resulta em efeitos vasodilatadores, natriuréticos e antiproliferativos, que aliviam a sobrecarga de volume, reduzem a pressão nas câmaras cardíacas e promovem um melhor funcionamento do coração. Com o aumento dos peptídeos natriuréticos, ocorre uma eliminação de sódio mais eficiente pelos rins, o que alivia a congestão e melhora os sintomas da insuficiência cardíaca, proporcionando uma abordagem mais abrangente e eficaz para os pacientes (BECK-DA-SILVA, L e ROHDE LE, 2019).
Telesca M et al. (2024) analisaram os efeitos do sacubitril/valsartana em um modelo experimental de IC associado ao envelhecimento com fração de ejeção preservada (ICFEp). No estudo, ratas idosas da linhagem Fisher 344 foram tratadas com sacubitril/valsartan ou apenas valsartan por 12 semanas, observando-se que ambos os tratamentos apresentaram efeitos benéficos semelhantes na redução da hipertrofia cardíaca, com diminuição significativa da espessura da parede do miocárdio e da área transversal dos miócitos. Contudo, nenhum dos tratamentos demonstrou eficácia na redução da fibrose miocárdica em corações envelhecidos, e tanto a disfunção diastólica quanto a presença de fibrose permaneceram, mesmo com o uso do medicamento. Além disso, a ativação endotelial, a inflamação miocárdica e o estresse oxidativo continuaram a ser observados, indicando a complexidade do processo de envelhecimento na IC. As ações dos tratamentos sugerem, ainda, uma possível relação entre a redução da hipertrofia e a modulação do sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA), com destaque para a restauração parcial do SRAA cardioprotetor, o que pode ter contribuído para a atenuação do aumento de tamanho dos cardiomiócitos, embora não tenha sido suficiente para resolver por completo as disfunções associadas à idade.
Um estudo realizado por Bhatt AS, et al., (2021) verificou que o uso de β-bloqueadores e ARM foi avaliado em pacientes randomizados para sacubitril/valsartana ou enalapril durante 12 meses. No total, 8.398 pacientes tinham dados completos na linha de base, com 87% usando β-bloqueadores e 56% ARM. As doses médias de ambos os medicamentos foram semelhantes entre os grupos ao longo do acompanhamento. Novos inícios de β-bloqueadores e ARM foram raros e similares entre os grupos. Houve menos descontinuações de ARM no grupo sacubitril/valsartana [6,2% vs. 9,0%, P = 0,001], mas as descontinuações de β-bloqueadores foram semelhantes.
Zhou W et al. (2024) realizou uma meta-análise que incluiu seis estudos clínicos com 6217 pacientes com DRC, mostrando que sacubitril/valsartana reduziu o risco de morte cardiovascular e hospitalização por insuficiência cardíaca, além de prevenir a elevação da creatinina sérica. Resultados indicaram também uma menor incidência de redução acentuada da taxa de filtração glomerular (TFGe) em pacientes tratados com sacubitril/valsartana em comparação com outros inibidores como os IECA/BRAs, sugerindo efeitos protetores na função renal a longo prazo. No entanto, um efeito colateral observado foi a ocorrência de hipotensão, sem aumento significativo no risco de hipercalemia. Dessa forma, o sacubitril/valsartana pode ser considerado uma alternativa benéfica e segura para pacientes com DRC, embora mais estudos sejam necessários para consolidar esses achados e determinar a sua aplicabilidade em larga escala.
A introdução do sacubitril/valsartana nas diretrizes clínicas reflete seu impacto positivo na prática clínica, oferecendo uma opção terapêutica que pode melhorar substancialmente o manejo da IC e proporcionar um alívio significativo para os pacientes. O tratamento com esse medicamento representa, portanto, um avanço importante na terapia da insuficiência cardíaca, alinhado com a necessidade de estratégias mais eficazes e personalizadas para o controle da doença.
Análise da eficácia da utilização da Sacubitril/Valsartana
O sacubitril/valsartana tem se destacado como uma terapia inovadora para insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida (ICFER). A eficácia desta combinação de fármacos foi amplamente documentada sobretudo no ensaio clínico randomizado controlado por placebo PARADIGM-HF realizado em 2014, que incluiu mais de 8.400 pacientes com ICFER. Os resultados mostraram que a combinação de sacubitril/valsartana reduziu a mortalidade cardiovascular em 20% em comparação com o enalapril, um IECA tradicional. Além disso, houve uma redução significativa de 21% nas hospitalizações por insuficiência cardíaca. Estes resultados sublinham a eficácia do sacubitril/valsartana na melhoria dos desfechos clínicos e na redução das complicações associadas à IC (GONÇALVES AV, et al. 2020).
A capacidade do sacubitril/valsartana de diminuir a taxa de mortalidade é atribuída à sua ação combinada de inibir a neprilisina e bloquear o receptor de angiotensina II. Esta combinação não só reduz a carga de sintomas agudos, mas também aborda os mecanismos de progressão da doença, resultando em uma melhora substancial na sobrevivência dos pacientes. A redução das hospitalizações por IC é outro aspecto crucial da eficácia do sacubitril/valsartana. Hospitalizações frequentes são um reflexo da gravidade da doença e têm um impacto significativo na qualidade de vida dos pacientes e nos custos associados ao tratamento. O sacubitril/valsartana tem mostrado reduzir a frequência e a gravidade das exacerbações da insuficiência cardíaca, contribuindo para uma melhor gestão da doença a longo prazo. Isso é particularmente relevante, pois hospitalizações repetidas são comuns em pacientes com IC e podem levar a um ciclo de deterioração clínica e aumento dos custos de saúde (AVILA WS, et al., 2020).
Ademais, pacientes tratados com essa medicação relataram melhoras significativas em parâmetros funcionais, como a capacidade de exercício e a percepção dos sintomas. As avaliações de qualidade de vida, como o questionário Kansas City Cardiomyopathy Questionnaire (KCCQ), mostraram que o sacubitril/valsartana proporciona uma melhora na capacidade funcional e na qualidade de vida geral dos pacientes (CHWARTZMANN P, 2020).
Adicionalmente, essa droga demonstrou benefícios em subgrupos específicos de pacientes. A combinação desses compostos é eficaz em diversas faixas etárias, incluindo idosos, e em pacientes com comorbidades como diabetes mellitus e hipertensão. Essa eficácia em diferentes populações reforça a versatilidade do tratamento e sua aplicabilidade em uma ampla gama de pacientes com ICFER (VELOSO TM, et al., 2023).
No entanto, apesar dos benefícios substanciais, o uso de sacubitril/valsartana não está isento de desafios. O medicamento pode estar associado a efeitos adversos, como hipotensão, hiperpotassemia e disfunção renal, que requerem monitoramento cuidadoso. É fundamental ajustar a dose e monitorar os níveis de potássio e a função renal para minimizar o risco de efeitos adversos. A gestão desses riscos é crucial para garantir a segurança e a eficácia do tratamento a longo prazo (DE SOUZA ACD, et al., 2022).
Um estudo retrospectivo realizado por Brockmöller J, et al., (2022) analisou 69 pacientes com ICFEP e hipertensão pulmonar isolada pós-capilar (IpcPH, n = 53) ou combinada pós-capilar e pré-capilar (CpcPH, n = 16), avaliando os efeitos do tratamento com sacubitril/valsartana na hipertensão pulmonar. A medida da pressão arterial pulmonar foi realizada através de cateterização do coração direito, tanto no início do estudo (antes do uso de sacubitril/valsartana) quanto após um período de 99 dias (média de 94 a 123 dias) após a troca para sacubitril/valsartana. Os resultados mostraram uma redução significativa nas pressões arteriais pulmonares (sistólica/diastólica/média) em ambos os grupos de pacientes quando comparados com as medições antes do início da terapia. No grupo IpcPH, as pressões foram reduzidas de 47 (40-55)/18 (15-23)/31 (26-35) mm Hg para 44 (38-52)/15 (12-19)/28 (22-33) mm Hg (P < 0,01). No grupo CpcPH, as pressões diminuíram de 61 (50-79)/24 (19-30)/40 (31-53) mm Hg para 54 (43-57)/18 (12-23)/34 (30-36) mm Hg (P < 0,05). A dose mediana de sacubitril/valsartana foi de 24/26 mg, administrada duas vezes ao dia em ambos os grupos. Clinicamente, a classe funcional da New York Heart Association (NYHA) melhorou em pelo menos 1 classe em 32 dos 69 pacientes (P < 0,01). Concluiu-se que o tratamento com sacubitril/valsartana melhorou a hipertensão pulmonar em pacientes com ICFEP, tanto nos casos de IpcPH quanto CpcPH. No entanto, são necessários ensaios clínicos prospectivos e randomizados para confirmar esses resultados.
Kanaoka K et al., (2024) revelam a complexidade envolvida no manejo de pacientes com insuficiência cardíaca e pressão arterial sistólica (PAS) baixa ao iniciar o tratamento com sacubitril/valsartana. Em uma coorte de 964 pacientes, observou-se que 40,2% apresentavam PAS basal abaixo de 110 mm Hg, sendo que esses pacientes enfrentaram uma taxa considerável de eventos adversos (24%). Kanaoka et al. identificaram uma associação significativa entre uma PAS basal mais baixa e a probabilidade de eventos adversos (OR ajustada de 3,33 para PAS entre 100-109 mm Hg), ressaltando que uma baixa taxa de filtração glomerular (<30 mL/min/1,73 m²) e uma alta classificação na New York Heart Association (NYHA) também eram fatores de risco. Esses achados indicam a necessidade de uma avaliação cuidadosa da função renal e da gravidade da insuficiência cardíaca ao introduzir o medicamento em pacientes de alto risco.
Complementando essas descobertas, o estudo de Tiwari K et al., (2024) sugere uma abordagem comparativa na terapêutica da insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida (HFrEF), comparando a eficácia do sacubitril/valsartana com a dapagliflozina, um inibidor do cotransportador de sódio-glicose-2 (SGLT2i). Em um ensaio clínico pragmático, os pesquisadores avaliaram a variação dos níveis do pró-peptídeo natriurético cerebral N-terminal, bem como o GDF-15, um marcador promissor para prognóstico em HFrEF. Este estudo inclui uma análise de custo-efetividade para avaliar o custo do tratamento de eventos cardiovasculares, uma questão importante para a tomada de decisão em cenários reais. A pesquisa busca oferecer aos profissionais de saúde dados comparativos que possam orientar na escolha entre essas terapias.
Outro estudo relevante é o de Park CS, et al., (2024), que examina a recuperação funcional em pacientes com HFrEF após um ano de tratamento com ARNI. Utilizando o registro STRATS-HF-ARNI, que abrangeu 1.074 pacientes, eles diferenciaram pacientes que alcançaram uma melhora na fração de ejeção (HFimpEF) daqueles com HFrEF persistente (perHFrEF). A análise demonstrou que 46,4% dos pacientes obtiveram melhora significativa na fração de ejeção ventricular, enquanto 53,6% mantiveram uma fração de ejeção reduzida, indicando que fatores como idade avançada e volumes diastólicos finais elevados do ventrículo esquerdo são preditores para perHFrEF. Além disso, a presença de fibrilação atrial e pressão arterial sistólica elevada foi associada a melhores prognósticos. Esse estudo destaca que a resposta ao tratamento com ARNI pode variar amplamente, com uma redução significativa no risco de mortalidade entre os pacientes com melhora na fração de ejeção em comparação aos que mantiveram a disfunção cardíaca.
Erdogan BR, et al., (2024) contribuem para a compreensão dos mecanismos moleculares subjacentes aos efeitos do sacubitril/valsartana, especificamente em modelos de diabetes tipo 2. A pesquisa mostrou que o tratamento melhorou a função sistólica em modelos de ratos diabéticos por meio de uma responsividade aprimorada dos receptores β1 e β2-adrenérgicos (ß-AR), embora não tenha impacto sobre a função diastólica. Esses dados sugerem que o benefício do sacubitril/valsartana pode estar ligado à sua capacidade de melhorar a responsividade dos receptores β-AR, uma observação que pode ter implicações na escolha do tratamento para pacientes diabéticos com insuficiência cardíaca.
As evidências clínicas demonstram claramente a superioridade da sacubitril/valsartana em relação aos IECA tradicionais, com melhorias substanciais na mortalidade cardiovascular, nas hospitalizações e na qualidade de vida dos pacientes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A combinação de sacubitril e valsartana representa um marco significativo no tratamento da insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida (ICFER). A análise da eficácia deste tratamento revela benefícios substanciais em termos de redução da mortalidade cardiovascular, diminuição das hospitalizações por insuficiência cardíaca e melhoria na qualidade de vida dos pacientes. Apesar dos avanços representados por sacubitril/valsartana, é essencial reconhecer que o tratamento não é isento de desafios. O monitoramento cuidadoso é necessário para gerenciar potenciais efeitos adversos, como hipotensão e hiperpotassemia. Ajustes de dose e monitoramento da função renal são componentes cruciais para maximizar os benefícios do tratamento enquanto minimizam os riscos. A implementação de estratégias de manejo eficazes pode assegurar que os pacientes se beneficiem plenamente das vantagens oferecidas por esta terapia. Portanto, o sacubitril/valsartana representa um avanço significativo na terapia da IC, oferecendo uma opção terapêutica que pode melhorar substancialmente os desfechos clínicos e a qualidade de vida dos pacientes. A combinação de mecanismos de ação e os resultados positivos dos estudos clínicos reforçam sua posição como uma escolha de tratamento de primeira linha para ICFER.
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1Centro de Educação Tecnológica de Teresina, Teresina – PI.
*E-mail:raizagabrielavilarinho@gmail.com