REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202408071245
Geovana Cardoso do Prado;
Orientador: Prof°. Dr. José Rodrigues do Carmo Filho
RESUMO
A resistência antimicrobiana é originada tanto por processos naturais quanto por seleção artificial. Esse cenário se associa, diretamente, ao uso inadequado desses medicamentos, representando uma preocupação significativa para a saúde pública global. Objetivo: Analisar o uso de antibióticos e a presença de bactérias multirresistente. Métodos: Trata-se de uma revisão literária de 7 artigos que foram pesquisados por meio das bases de dados BVS, LILACS, MEDLINE, WPRIM Pacífico Ocidental, CUMED e Google Acadêmico. Resultados: Foram incluídos 7 artigos na revisão narrativa deste trabalho. O uso de antibióticos, tanto em animais, quanto em humanos gera um aumento da presença de bactérias resistentes a antimicrobianos na comunidade e nos hospitais. Isso minimiza o espectro de antibióticos eficientes no mercado. Devido a isso, causa um aumento no tempo de internação desses pacientes. Conclusão: Adotar medidas como a educação contínua para profissionais de saúde e o público em geral. Essas medidas são fundamentais para enfrentar esse desafio complexo e garantir o uso sustentável de antibióticos para as gerações futuras.
Palavras-chave: Uso de antibióticos; Resistência bacteriana; Prescrição médica.
ABSTRACT
Antimicrobial resistance originated by both natural processes and artificial selection. This scenario is directly associated with the inappropriate use of these medications, representing a significant concern for global, public health. Objective: To analyze the use of antibiotics and the presence of multidrug-resistant bacteria. Methods: This is a literary review of 7 articles that were researched through VHL, LILACS, MEDLINE, WPRIM Pacific Western, CUMED and Google Scholar. Results: 7 articles were included in the narrative review. The use of antibiotics, both in animals and in humans, increases the presence of antimicrobial-resistant bacteria in the community and in hospitals. Which minimizes the spectrum of efficient antibiotics on the market. Due to this, it causes an increase in the length of stay for these patients in hospitals. Conclusion: Adopt measures such as continuing education for health professionals and the public. These measures are essential to address this complex challenge and ensure the sustainable use of antibiotics for future generations.
Keywords: Use of antibiotics; Bacterial resistance; Medical prescription
1. INTRODUÇÃO
Durante a Primeira Guerra Mundial, o médico oficial inglês Alexander Fleming concentrou-se profundamente no estudo da bactéria Staphylococcus aureus. Nesse período de intensa dedicação, Fleming acabou exaurido, o que o levou a conceder-se férias, deixando suas amostras sem supervisão. Como consequência desse descuido, as culturas acabaram se contaminando com mofo originário do fungo Penicillium, que secretava uma substância capaz de eliminar a bactéria. Logo, dando origem ao primeiro antibiótico do mundo (CAPA NOSSA, 2009).
No processo evolutivo das bactérias, a resistência bacteriana pode surgir de forma natural, ou ser adquirida através de processos como mutação genética ou transferência de genes entre diferentes espécies bacterianas. Quando expostas a um antibiótico, as bactérias suscetíveis são eliminadas, enquanto as resistentes possuem uma vantagem competitiva em termos de sobrevivência e reprodução. Com o tempo, esse processo resulta em um aumento na proporção de bactérias resistentes dentro da população, devido à pressão seletiva exercida pelo ambiente, um fenômeno conhecido como seleção natural (SOARES, COSTA, 2023).
As bactérias empregam várias estratégias para resistir aos antimicrobianos. Uma delas é a seleção de linhagens que contêm genes de resistência em seus plasmídeos, os quais podem ser transferidos para outras espécies, aumentando o número de espécies resistentes. Além disso, a permeabilidade limitada é outra maneira pela qual bacilos Gram-negativos adquirem resistência a antibióticos como penicilina, eritromicina, clindamicina, vancomicina e trimetoprim, especialmente na Pseudomonas aeruginosa. Adicionalmente, os Gram-negativos podem apresentar enzimas beta-lactamases em seu espaço periplásmico, que degradam os antibióticos antes de chegarem ao peptidoglicano (MOURA et al., 2017).
A resistência antimicrobiana é uma ameaça em constante crescimento para a saúde pública global, responsável pelo aumento da morbimortalidade entre os pacientes hospitalizados e por consequência o aumento significativo nos custos com saúde é ocasionado pela prescrição de medicamentos mais caros e pelo prolongamento do período de internação (ANVISA, 2023).
Esse cenário, se associa diretamente ao uso inadequado desses medicamentos, representando uma preocupação significativa para a saúde pública global. Embora no Brasil a dispensação de antimicrobianos apenas mediante prescrição médica seja regulamentada por lei, muitos indivíduos ainda conseguem acesso a esses fármacos de forma ilegal. Isso ocorre seja através de profissionais que possuem acesso direto a esses antibióticos, seja por farmácias que não são devidamente fiscalizadas. Como resultado, muitas prescrições de antibióticos são realizadas sem uma real necessidade e, em alguns casos, os pacientes utilizam a medicação de maneira inadequada, não seguindo as orientações adequadas (MIRANDA, VIEIRA, SOUZA, 2023).
Uma das consequências desse cenário é uma crescente ameaça mundial com o surgimento e disseminação de novos mecanismos de resistência antimicrobiana, comprometendo nossa capacidade de tratar doenças infecciosas comuns. Esta realidade resulta em enfermidades prolongadas, incapacidade e, em casos extremos, fatalidades. A ausência de antimicrobianos eficazes não apenas torna arriscados procedimentos médicos cruciais, como transplantes de órgãos e quimioterapia, mas também encarece a atenção médica, prolongando internações hospitalares e aumentando a necessidade de cuidados intensivos (OPAS,2024).
De acordo com Centers for Disease Control and Prevention (CDC) dos Estados Unidos, mais de 2,8 milhões de infecções resistentes a antibióticos ocorrem anualmente no país, resultando em mais de 35 mil mortes. Na União Europeia, a resistência microbiana aos antimicrobianos é responsável por cerca de 33 mil mortes por ano e estima-se que gere um custo anual de 1,5 bilhão de euros em despesas de saúde e perda de produtividade (CDC,2019).
O CDC calculou que a resistência antimicrobiana custa cerca de US$ 55 bilhões anualmente nos Estados Unidos, dos quais US$ 20 bilhões são para despesas com saúde aumentando os custos desta e aproximadamente US$ 35 bilhões representam perda de produtividade (CDC,2013). De acordo com um estudo, foi observado que pacientes com culturas positivas para a presença de bactérias multirresistente passam em medias 16,3 dias aumentando o tempo de internado comparando a paciente com culturas negativas (MILAN et al.,2017).
Com isso, podemos nos questionar quais são os fatores que contribuem para o desenvolvimento de resistência bacteriana devido ao uso de antibióticos?
JUSTIFICATIVA
Os antibióticos são substâncias capazes de interromper a reprodução de microrganismos. Eles são prescritos para tratar infecções causadas por esses microrganismos sensíveis, porém seu uso deve ser cuidadosamente controlado. Ana Paula Matos Porto, infectologista da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) do Hospital de Messejana Dr. Carlos Alberto Studart Gomes, esclarece que a resistência microbiana é a capacidade dos micro-organismos, como bactérias, fungos ou outros parasitas, de resistir aos efeitos dos medicamentos utilizados para prevenir e tratar infecções. Com isso, o uso indiscriminado desses antibióticos pode levar à resistência bacteriana aos medicamentos disponíveis, dificultando cada vez mais o tratamento das infecções (FORTES, 2021).
A Portaria GM/MS nº 2616, de 12/05/1998, estabeleceu a exigência de desenvolvimento e aplicação de um programa para o uso adequado de antimicrobianos nos estabelecimentos de saúde pelas CCIH(ANVISA,2017).
No entanto, em 2019, as infecções resistentes a medicamentos foram responsáveis pela morte de mais de 1,2 milhão de pessoas em todo o mundo. Segundo um novo relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), os óbitos associados à resistência antibacteriana atingiram 4,95 milhões em 2023. O estudo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente alerta para a ameaça de mais 10 milhões de mortes diretas ligadas ao problema até 2050 (ONU,2023).
Tendo em vista da existência de Portarias que estabelecem o uso adequado de antibióticos nos ambientes de saúde e, apesar disso, um aumento dos índices de mortalidade, há uma relevância da produção de trabalhos científicos que destacam o uso indiscriminado de antibióticos e a prevalência de bactérias multirresistentes em que se torna ainda mais clara com as previsões de altos índices de mortalidade associados a esse problema.
2. MÉTODO
Trata-se de uma revisão narrativa da literatura. A busca dos estudos foi realizada nas bases de dados eletrônicas: Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Literatura Internacional em Ciências da Saúde (MEDLINE), Western Pacific Region Index Medicus Pacifico Ocidental (WPRIM Pacifico Ocidental) Committee on Undergraduate Medical Education (CUMED), Google Acadêmico. Foram utilizados os descritores padronizados pelos Decs/Mesh: Resistência Bacteriana a Medicamentos e uso de Antibacterianos, e o acesso aos artigos será determinada por parâmetros limitadores da busca inicial: pesquisa em sítios eletrônicos de acesso público, disponíveis online e no formato de texto completo, utilizando os operadores booleanos AND.
Os critérios de inclusão foram: artigo disponível com texto completo em suporte eletrônico, publicado em periódicos nacionais e ou internacionais no período de 2010 a 2024, nos idiomas português, inglês e espanhol, e que tratassem da temática. Também poderiam ser usados manuais e resoluções do Ministério da Saúde do Brasil.
Foram excluídos do estudo: teses, dissertações, monografias, capítulos de teses, livros, capítulos de livros, anais de congressos ou conferências, relatórios técnicos e científicos, matéria de jornal, revistas que não tenham caráter científico, relatos de experiência, editoriais, debates, artigos de revisão, resenhas e artigos incompletos, não convergentes com este estudo e os artigos repetidos em mais de um sítio.
Os estudos selecionados foram postos em um fluxograma, e a seleção das publicações foi feita por meio da leitura dos títulos e resumos. Após esta triagem os estudos foram lidos na íntegra.
Os títulos e resumos das publicações serão revisados e analisados, segundo os critérios de inclusão. Em seguida, será feita uma síntese dos estudos em um quadro sinótico, considerando o nome dos autores, título do artigo, periódico, objetivos, método, principais resultados e conclusões que serão expostos em um quadro sinótico. Posteriormente, será feita análise descritiva, subsidiando a construção de um texto consolidado, constituindo, assim, os resultados deste trabalho.
O tipo de estudo que foi realizado dispensou a avaliação ética por se tratar de revisão narrativa.
Aspectos éticos
Ressalta-se que o presente estudo, por se tratar de pesquisa documental, não foi submetido à análise por Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos, contudo foram respeitados os princípios da honestidade e fidedignidade, assim como a autoria dos artigos pesquisados.
Objetivo
Elaborar uma síntese da literatura sobre o uso de antibióticos e a presença de bactérias multirresistentes.
3. RESULTADOS
Foram identificados 1196 artigos nas bases de dados analisadas sendo selecionados 138 estudos que abordaram em seu título uso indiscriminado de antibióticos e a presença de bactérias multirresistente. Após a leitura prévia, foram excluídos 131 artigos, incluindo revisão de literatura (N=109), artigos pagos (N=6), e os que não continham informações relevantes para a formação deste trabalho (N=16), por fim foram então incluídos 7 artigos (Figura 1).
Fig 1. Estratégia de busca e seleção
E no que tange ao recorte temporal de publicação pode-se considerar que os estudos são recentes, visto que quatro artigos são entre os anos de 2010 a 2014 (57%), dois artigos entre os anos 2016 a 2018 (29%) e um entre os anos de 2020 a 2023 (14%).
Com relação ao tipo de metodologia aplicada nos artigos selecionados para este trabalho, um era estudos de estudo de pesquisa de campo quantitativo (14%), dois estudos descritivos (14%), um estudo qualitativo (14%), um estudo de análise retrospectiva (29%), dois estudos de análise retrospectiva (14%), um estudo ecológico (5%) e dois estudos epidemiológicos prospectivos (29%).
O idioma inglês foi predominante entre os estudos selecionados, podendo ser encontrados em diferentes bases de dados também nos idiomas português e espanhol. O tema abordado foi dividido em três subtemas, onde um artigo (14%) retratava o uso de antibiótico e a presença de bactérias resistentes na comunidade, quatro (57%) sobre o uso de antibiótico e a presença de bactérias resistentes em hospital, dois (29%) correlação entre prescrição médica de antibióticos e a presença de bactérias multirresistentes (Quadro 1).
QUADRO 1: Caracterização dos estudos selecionados
4. DISCUSSÃO
O uso inadequado de antibióticos é uma prática comum, muitas vezes sem evidências que justifiquem sua necessidade. Embora um estudo tenha revelado que 59% da população reconhece os riscos de tal comportamento, a maioria ainda os utiliza sem prescrição médica e de forma indiscriminada (MARTINS et al., 2015).
Com isso, essa preocupação ganha ainda mais relevância quando consideramos a relação entre o uso de antibióticos em animais e a presença de resistência bacteriana em humanos. Por exemplo, em uma pesquisa evidencia a presença de Staphylococcus resistente à meticilina (MRSA) em 390 pessoas ligadas a fazendas de corte de carne bovina identificou que 33% dos agricultores e 8% membros da família desse estava colonizado por essa bactéria. O risco de ser portador de MRSA aumentou com mais contato direto e indireto com esses animais. Além disso, 28% desses bovinos mostraram uma prevalência de serem portadores de MRSA, quando tratados com antibióticos. Esses resultados evidenciam a ligação entre o uso de antibióticos em animais e o aumento da resistência bacteriana em humanos, representando a evidência mais robusta até o momento da transferência de organismos resistentes a antimicrobianos para humanos (GRAVELAND et al., 2010).
Ademais, constatou-se em um estudo que os animais que abrigavam Staphylococcus spp multirresistentes, tornando-os não apenas reservatórios, mas também fontes de transmissão para os seres humanos, tanto em ambientes hospitalares quanto em cuidados diários realizados por cuidadores e tutores desses animais. Esses resultados ressaltam a preocupação com o uso indiscriminado de antibióticos, uma vez que o gênero Staphylococcus demonstrou resistência total ou intermediária à maioria dos antibióticos testados. Essa resistência abrangente pode ser atribuída à capacidade inata desse microrganismo de desenvolver resistência aos antibióticos, representando um desafio significativo no tratamento de infecções causadas por Staphylococcus spp (SOUZA et al., 2020).
Durante a pandemia causada pelo Covid-19, foi identificada elevada taxa de comportamento inadequado quanto ao uso de medicamentos. No estudo desenvolvido por GALVÃO et al., (2023), 8,8% dos participantes acreditaram que antibióticos podem tratar ou prevenir a doença, enquanto 21,3% não têm uma opinião formada sobre o assunto. Esses equívocos podem contribuir para o surgimento de bactérias multirresistentes, potencialmente aumentando o número de hospitalizações e internações em unidades de terapia intensiva. O uso indiscriminado de antibióticos, principalmente os macrolídeos, para infecções respiratórias pode perturbar a microbiota por até 180 dias, promovendo o desenvolvimento de bactérias multirresistentes.
Diante disso, é essencial adotar medidas para uma utilização mais criteriosa dos antimicrobianos. Isso inclui evitar prescrições indiscriminadas, como o uso de azitromicina durante a pandemia de Covid-19, e utilizar biomarcadores para personalizar as prescrições. Além disso, é importante dar preferência aos antimicrobianos por via oral em vez de intravenosa, quando possível. Essas estratégias são fundamentais para mitigar o surgimento de resistência bacteriana e preservar a eficácia dos antibióticos no tratamento de infecções (GALVÃO et al., 2023).
O uso inadequado de antibióticos afeta tanto país desenvolvido quanto em desenvolvimento. A falta de compreensão sobre a importância da prescrição médica e a fácil disponibilidade desses medicamentos são fatores que contribuem para a recorrência desse problema. Portanto, a resistência antimicrobiana bacteriana, resultante desse uso inadequado, é uma ameaça global que compromete a eficácia dos antibióticos, dificultando o tratamento de infecções bacterianas comuns (YUSEF et al., 2018).
Somado a isso, mais de um terço (38%) dos pacientes participantes de um estudo, não conseguiram recordar o nome do antibiótico que lhe foi prescrito. Embora a maioria tenha afirmado ter obtido o medicamento por meio de prescrição médica, uma parcela significativa (38%) adquiriu os antibióticos sem orientação, seja pela automedicação, orientações de farmacêuticos, seja por seguir conselhos de familiares e vizinhos. Assim, fica evidente a falta de consciência e cuidado no uso de antibióticos, uma vez que a automedicação e a obtenção sem orientação profissional podem contribuir para o aumento da resistência antimicrobiana. (YUSEF et al., 2018).
Nesse cenário, um grupo de indivíduos foi perguntado sobre suas percepções em relação ao uso de antibióticos, a maioria dos entrevistados concordou que o uso inadequado contribui para a resistência aos antibióticos (93%) e que usar menos antibióticos ajudaria na redução dessa resistência (69%). Curiosamente, mesmo que 76% dos entrevistados tenham reconhecido que a resistência aos antibióticos é um problema nos hospitais americanos, uma proporção semelhante (70%) respondeu de forma neutra ou discordou da afirmação de que a resistência aos antibióticos é um problema geral. Por fim, a maioria dos entrevistados (89%) acreditava que as pessoas podem desenvolver imunidade aos antibióticos (CARTER et al., 2016).
Sob esse viés, em outra pesquisa foi observado que quase todos os pacientes reconheceram a ligação entre o uso de antibióticos e a resistência, mas sua compreensão frequentemente não estava alinhada com a visão científica aceita de que a resistência aos antibióticos é uma característica das bactérias. Os pacientes raramente mencionavam a ideia de uma “bactéria resistente” e mais frequente se referiam à resistência aos antibióticos como um conceito que chamamos de “corpo resistente” (BROOKES-HOWEEL et al., 2012). Logo, abordar esse equívoco é crucial para desenvolver melhores métodos de comunicação sobre o uso adequado de antibióticos e a resistência aos antibióticos, tanto em interações clínicas entre médicos e pacientes quanto em campanhas de saúde pública.
Em outro estudo, foi discutido sobre a prática da automedicação, no qual 51,72% do grupo A e 58,87% do grupo B afirmam se automedicar, predominantemente por influência de familiares ou amigos respectivamente. Foi observado que 118 alunos do grupo A (81,38%) e 67 do grupo B (54,03%) afirmam possuir conhecimento dos efeitos causados pelo uso inadequado de antibióticos e que isso pode causar resistência bacteriana. A análise desse ponto sugere que o “suposto” conhecimento sobre resistência bacteriana leva ao aumento da autoconfiança e, consequentemente, à automedicação. No entanto, a resistência aos antibióticos pode ser reduzida pelo uso racional, considerando as propriedades farmacológicas dos antimicrobianos, como a farmacocinética e a farmacodinâmica, bem como os testes de diagnóstico e testes de susceptibilidade antimicrobiana (CAMPOS et al., 2019).
A prescrição excessiva de antibióticos, principalmente de amoxicilina, foi consideravelmente maior entre os praticantes de Odontologia com bacharelado em cirurgia dentária em comparação com os praticantes de Odontologia com Especialização com Mestrado em Cirurgia Dentária. Observou-se que a conscientização sobre a profilaxia antimicrobiana e a resistência aos antibióticos foi satisfatória em ambos os grupos. Entretanto, houve uma falta geral de atenção em relação às diretrizes para recomendação de prescrição de antibióticos em ambos os grupos (RAMACHANDRAN et al., 2019).
De acordo com isso, a eficácia dos antibióticos pode ser comprometida se não forem tomados nos horários prescritos, pois esses medicamentos permanecem no organismo por um período específico. Portanto, é essencial seguir rigorosamente as instruções de dosagem. A administração inadequada dos medicamentos pode permitir que as bactérias se adaptem e se multipliquem, aumentando a resistência aos antibióticos (MARTINS et al., 2015).
Logo, durante este estudo, observou-se um aumento na resistência às fluoroquinolonas entre os isolados de E. coli adquiridos na comunidade (IAC) e naquelas infecções associadas à assistência à saúde (IRAS), com taxas ligeiramente mais altas neste último grupo. Encontramos uma correlação entre o uso ambulatorial de fluoroquinolonas e a resistência à ciprofloxacina, tanto em isolados IAC quanto IRAS. Essa constatação confirma dados anteriores que mostraram que regiões com maior uso de fluoroquinolonas têm taxas mais altas de E. coli resistente às fluoroquinolonas (VERNAZ et al., 2011).
A resistência à claritromicina em H. pylori mostrou uma associação significativa com o consumo comunitário de macrolídeos em 2013, de macrolídeos de ação intermediária e macrolídeos de ação prolongada. A resistência bacteriana à levofloxacina apresentou uma associação significativa com o consumo comunitário de quinolonas em 2013 e quinolonas de segunda (MEGRAUD et al., 2021). Com isso, fica evidente que o uso de antimicrobianos possui relação direta com a presença de bactérias resistentes na comunidade.
Em uma pesquisa realizada no hospital, uma parcela significativa dos médicos entrevistados (71%) desconhecia que o hospital fazia parte de uma rede de vigilância de resistência bacteriana. Além disso, apenas 6% conheciam os resultados sobre resistência bacteriana do Hospital Docente Pablo Arturo Suárez (HAPS), enquanto 39% conheciam resultados locais ou nacionais, 18% em países latino-americanos, 23% de outros estudos e 20% não responderam. Dos 68% dos entrevistados afirmaram não ter restrições para o uso de antibióticos nos serviços do HPAS. Aqueles que responderam afirmativamente não diferenciaram entre restrições de uso para diminuir a resistência bacteriana e limitações farmacológicas ou logísticas. Os antibióticos mais prescritos foram as penicilinas de amplo espectro com inibidores de betalactamases, seguidas por cefalosporinas e quinolonas. Os medicamentos mais prescritos pelos médicos incluíram Ampicilina + IBL, Cefazolina, Ciprofloxacina, Ampicilina, Amoxicilina, Cefalexina e Ceftriaxona. Em relação às bactérias gram-negativas isoladas no hospital, esses apresentaram alta resistência contra a ampicilina de 67% a 88%, tanto na comunidade quanto no hospital (CEVALLOS et al., 2012). Em vista disso, a resistência bacteriana é um cenário que afeta tanto a comunidade quanto os hospitais, devido ao uso indiscriminado de antibióticos.
As infecções relacionadas à assistência à saúde (IRAS) foram predominantemente causadas por bactérias Gram-negativas, especialmente aquelas capazes de fermentação, com um fenótipo característico de produção de beta-lactamase de espectro estendido (ESBL). A resistência à oxacilina foi observada em quase metade dos isolados de Staphylococcus aureus. Houve uma redução significativa no consumo de piperacilina + tazobactam e vancomicina, tanto globalmente quanto na unidade de terapia intensiva (UTI), acompanhada por um menor uso de ceftriaxona e oxacilina, enquanto o consumo de amicacina e meropeném aumentou. Uma correlação positiva, e não linear, foi observada entre o consumo de cefalosporinas de quarta geração e o aumento de cepas de bactérias Gram-negativas fermentadoras multirresistentes, assim como entre o uso de oxacilina e a resistência de Staphylococcus aureus. O crescimento da resistência bacteriana a vários agentes requer uma gestão mais criteriosa das infecções e contribui para o aumento dos encargos no sistema de saúde. A monitorização do consumo de antimicrobianos pode facilitar análises em vários aspectos, incluindo padrões de prescrição, introdução de novos medicamentos e mudanças na microbiota bacteriana local (FURTADO et al., 2019).
Nos últimos três anos de uma pesquisa, houve um aumento significativo na prescrição de fluoroquinolonas e carbapenêmicos. Quanto aos agentes antimicrobianos individuais, observou-se um aumento na prescrição de ceftriaxona, ciprofloxacino, levofloxacino, meropenem, ertapenem e piperacilina-tazobactam, enquanto a prescrição de cefepima, moxifloxacino e imipenem diminuiu significativamente. Durante o período do estudo, a E. coli resistente à ciprofloxacina foi o organismo mais resistente aos antimicrobianos (HSU et al., 2010).
A conformidade com as diretrizes institucionais para o manejo de doenças infecciosas no período pós-intervenção foi de 82%. Em relação à ecologia bacteriana, observou-se uma diminuição significativa na resistência de Pseudomonas aeruginosa a antimicrobianos, incluindo os carbapenêmicos. A média da taxa de IRAS no período pós-intervenção foi significativamente menor em comparação com o período pré-intervenção (PALLARES; CATAÑO, 2017).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante da crescente preocupação com a resistência bacteriana decorrente do uso de antibióticos foi analisado um uso indiscriminado destes. Com isso se torna urgente adotar medidas para reduzir esse problema global. A falta de consciência sobre a importância da prescrição médica e a automedicação contribuem significativamente para essa questão, exigindo uma abordagem abrangente que inclua educação contínua para profissionais de saúde e o público em geral. Além disso, é essencial promover o uso responsável de antimicrobianos, evitando prescrições desnecessárias e implementando estratégias para controlar a disseminação de cepas multirresistentes, visando preservar a eficácia dos antibióticos no tratamento de infecções. Essas medidas são fundamentais para enfrentar esse desafio complexo e garantir o uso sustentável de antibióticos para as gerações futuras. Ademais, com este estudo foi evidenciado uma escassez de artigos na área clínica sobre esse assunto em contraste a sua importância.
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