O SURGIMENTO DO CÂNCER DE MAMA EM DECORRÊNCIA DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202411211844


Wethyna Cristina Gomes Moreira1
Wandria Lopes Sampaio2
Suzy Cruz Veiga3
Willams Costa de Melo4
Adriano dos Santos Oliveira5


Resumo

O estudo aborda a relação entre violência conjugal e o desenvolvimento de câncer em mulheres, utilizando a técnica de coleta de dados por documentação indireta para realizar uma análise qualitativa. Essa pesquisa se faz necessária no âmbito da enfermagem, uma vez que os números de surgimento do câncer de mama em mulheres estão cada vez mais agravantes, principalmente em ambientes domésticos. A partir deste trabalho, objetiva-se evidenciar que a neoplasia mamária em mulheres, além de ser uma questão genética, pode ser tratada como questão social e de saúde mental. A metodologia consiste na revisão de estudos e dados disponíveis sobre o tema, incluindo estatísticas do Instituto Nacional do Câncer (Inca) que previu, até o final de 2020, 60 diagnósticos de câncer de mama e 50 de colo do útero. A análise qualitativa dos dados coletados permite compreender melhor as interações entre esses fatores e suas implicações para a saúde feminina, evidenciando a necessidade de políticas públicas que abordem tanto a violência quanto a prevenção e o tratamento do câncer. A pesquisa destaca que a violência doméstica é um fator de risco significativo para o câncer de mama, devido ao aumento do estresse e à diminuição do acesso aos cuidados médicos. Um estudo de 2016 da oncologista Cristiana Tavares revelou que 42% das mulheres com câncer de mama haviam sofrido violência conjugal antes do diagnóstico. A coordenadora do Centro Humanitário de Apoio à Mulher (CHAME), Elizabete Brito, ressalta que a violência doméstica compromete a saúde mental e emocional das mulheres, tornando-as mais vulneráveis e menos propensas a buscar atendimento médico. 

Palavras-chave: Câncer de Mama. Violência Doméstica. Saúde da Mulher. Enfermagem.

1. INTRODUÇÃO

A Organização Mundial de Saúde (OMS, 2002) define a violência como o uso intencional de força física ou poder, por meio de ameaças ou atos contra si mesmo, outra pessoa, grupo ou comunidade, que ocasiona ou tem alta probabilidade de resultar em ferimentos ou morte, dano psicológico, mau desenvolvimento e/ou privação. No contexto da violência doméstica, essa definição se torna especialmente relevante, visto que o ambiente familiar, supostamente um local de proteção, pode se transformar em espaço de agressão e abusos. A violência doméstica envolve agressões físicas, psicológicas e emocionais, que afetam não só a integridade física das vítimas, mas também sua saúde mental, gerando traumas duradouros que influenciam todo o seu bem-estar.

Os impactos psicológicos da violência doméstica são profundos. As vítimas frequentemente desenvolvem transtornos mentais como depressão, ansiedade, síndrome do pânico e transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). A saúde mental dessas pessoas se deteriora ao longo do tempo, levando a consequências físicas como o agravamento de condições preexistentes e o desenvolvimento de doenças psicossomáticas. Esse cenário não apenas afeta o indivíduo, mas reflete diretamente no sistema de saúde como um todo. A sobrecarga de atendimentos médicos e psiquiátricos, o aumento de afastamentos laborais por questões emocionais e a dificuldade em manter um estilo de vida saudável são algumas das repercussões da violência doméstica no sistema de saúde (SILVA, 2008).

Além disso, a interseção entre saúde mental e doenças físicas, como o câncer, merece atenção. Estudos indicam que o estresse crônico e o sofrimento emocional prolongado, condições comuns em vítimas de violência doméstica, podem contribuir para o desenvolvimento de doenças graves, incluindo alguns tipos de câncer. O estresse libera hormônios, como o cortisol, que em níveis elevados e persistentes prejudicam o sistema imunológico, tornando o corpo mais suscetível a doenças. Dessa forma, a violência doméstica se apresenta não apenas como uma questão social e psicológica, mas também como um fator de risco para a saúde física geral (AMORIM; SIQUEIRA, 2014).

Diante desse cenário, de acordo com (GARBIN, C; GARBIN, A; DOSSI, A; DOSSI, M, 2006), torna-se imperativo discutir a relação entre violência doméstica, saúde mental e o impacto no contexto geral de saúde pública. O objetivo deste estudo é investigar como a violência doméstica afeta a saúde mental das vítimas e suas implicações para a saúde física, com foco no surgimento de doenças crônicas como o câncer. A pesquisa busca contribuir para o desenvolvimento de políticas públicas eficazes que abordem tanto a prevenção da violência quanto o tratamento integrado das consequências para a saúde.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 

A violência contra a mulher é mostrada atualmente como um problema histórico, social e mundial, presente em diferentes culturas e sociedades, razão pela qual é considerada como um fenômeno sociocultural que afeta a multidimensionalidade da mulher (SCHRAIBER; D’OLIVEIRA; COUTO, 2006; ALIELLO et al., 2005). Contudo, é no espaço doméstico onde a maior parte das agressões ocorre (BRASIL, 2008a; TELES; MELO, 2003; GALVÃO; ANDRADE,2004), e é praticada pelos próprios maridos e/ou companheiros (OMS, 2002).

O texto de Schraiber (et al., 2006) aborda a violência contra a mulher como um fenômeno complexo e multifacetado, que se entrelaça com questões históricas e sociais. Essa perspectiva é fundamental, pois reconhece que a violência não é um ato isolado, mas sim um reflexo de estruturas de poder, desigualdades de gênero e normas culturais enraizadas nas sociedades. É especialmente preocupante que a maioria das agressões ocorra no ambiente doméstico, onde as mulheres deveriam se sentir mais seguras. O fato de que os agressores são frequentemente maridos ou companheiros ressalta a intimidade e a traição de confiança envolvidas nesses atos de violência. Isso indica uma dinâmica de controle e dominação que perpetua o ciclo da violência e torna ainda mais difícil para as vítimas buscarem ajuda. A caracterização da violência contra a mulher como um fenômeno sociocultural também implica que as soluções devem ir além do tratamento das consequências imediatas. É necessário promover mudanças profundas nas atitudes sociais, educar sobre igualdade de gênero e criar espaços seguros para que as mulheres possam denunciar agressões sem medo de retaliação. Além disso, é crucial que haja políticas públicas integradas que abordem não apenas a proteção das vítimas, mas também a responsabilização dos agressores e a prevenção da violência em suas raízes. A colaboração entre governos, organizações da sociedade civil e comunidades é essencial para efetivar mudanças significativas nesse contexto. A conscientização sobre essa questão deve ser contínua para que possamos avançar na luta contra a violência de gênero em todas as suas formas. 

Atualmente, há o II Plano Nacional de Políticas para Mulheres (BRASIL, 2008) que apresenta um capítulo sobre “Enfrentamento de todas as formas de violência contra mulheres”. Nele é mencionado que a intervenção pública deve ser multissetorial, o desenvolvimento das ações deve ocorrer de forma simultânea, de maneira a desconstruir desigualdades e combater discriminações de gênero; interferir nos padrões sexistas/machistas ainda presentes na sociedade brasileira; promover o empoderamento das mulheres; e garantir atendimento qualificado e humanizado àquelas que estão em situação de violência. O II Plano Nacional de Políticas para Mulheres é um passo significativo na luta contra a violência de gênero no Brasil. A proposta de uma intervenção pública multissetorial é essencial, pois a violência contra as mulheres é um problema complexo que não pode ser abordado apenas por uma única esfera do governo ou por uma única abordagem. É necessário envolver diferentes setores, como saúde, educação, justiça e assistência social, para que as ações sejam integradas e eficazes. A ênfase na desconstrução das desigualdades e no combate aos padrões sexistas e machistas é crucial. 

Esses padrões estão profundamente enraizados na cultura e nas práticas sociais, e sua mudança é fundamental para criar um ambiente mais seguro e igualitário para as mulheres. O empoderamento das mulheres é outra prioridade importante; quando as mulheres têm acesso à educação, recursos econômicos e oportunidades de liderança, elas se tornam mais capazes de reivindicar seus direitos e enfrentar situações de violência. Além disso, conforme a pesquisa de Fegadoli (2010), o compromisso com um atendimento qualificado e humanizado para as mulheres em situação de violência é vital. Muitas vezes, as vítimas enfrentam barreiras significativas ao buscar ajuda, incluindo o estigma social e a falta de compreensão por parte dos serviços disponíveis. Um atendimento que seja acolhedor, respeitoso e que compreenda as especificidades da experiência feminina pode fazer toda a diferença na recuperação das vítimas.

Por fim, a necessidade de ações simultâneas sugere uma abordagem proativa, onde diferentes frentes atuam em conjunto para promover mudanças efetivas. Isso não só fortalece o impacto das políticas implementadas, mas também demonstra um compromisso real com a erradicação da violência contra as mulheres em todas as suas formas. Essa visão integrada e abrangente é fundamental para transformar a realidade das mulheres brasileiras e garantir seus direitos fundamentais. A violência contra as mulheres é um fenômeno global, atualmente, o Brasil ocupa o 5º posto em escala mundial em homicídios contra a mulher, ficando abaixo apenas de El Salvador, Colômbia, Guatemala e Rússia (MENEGUEL, 2017).

Estudos apontam, que em 2019, 3.737 mulheres foram assassinadas no Brasil e 1.314 (35%) foram registradas como feminicídio, o que equivale a dizer que a cada sete horas, uma mulher é morta (FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA, 2021). Segundo o Fórum de Segurança Pública, nas últimas três edições (2017, 2019 e 2021) dois fatores não se modificaram: (1) as mulheres sofreram mais violência dentro de casa e (2) os agressores são pessoas conhecidas da mulher, o que torna alto o grau de complexidade ao enfrentamento da violência de gênero no que se refere à proteção da mulher, punição do agressor e medidas de prevenção. 

As mulheres estão em situação de vulnerabilidade extrema, vivendo com medo de ser agredida no local em que deveria estar mais segura: o seu próprio lar, essa violência é cometida por aqueles com quem ela possui vínculos, o que piora ainda mais a sua situação, deixando-a absolutamente indefesa. O tipo de agressor é perpetrado por companheiros, ex-companheiros e parentes, representando 70% dos casos de violência contra as mulheres (ENGEL, 2020).

Segundo Meneguel (2017), a violência contra as mulheres no Brasil é uma grave questão de escala global. O país ocupa a quinta posição mundial em homicídios femininos, refletindo uma realidade alarmante. Em 2019, um número significativo de mulheres foi assassinado, com muitos casos classificados como feminicídio, motivados por questões de gênero. A maioria das violências ocorre dentro do lar, onde as casas, que deveriam ser seguras, se tornam perigosas. Os agressores, muitas vezes conhecidos das vítimas, como companheiros ou familiares, complicam a proteção e a aplicação de medidas eficazes contra eles.

A vulnerabilidade das mulheres é enfatizada, pois muitas vivem com medo constante de serem agredidas em seus próprios lares. Essa realidade gera um sentimento de impotência e desamparo. A estatística de que 70% dos casos de violência são perpetrados por companheiros, ex-companheiros ou parentes destaca a necessidade urgente de intervenções sociais e políticas que abordem não apenas a punição dos agressores, mas também medidas preventivas e apoio às vítimas. Esse panorama evidencia a urgência em discutir e implementar políticas públicas eficazes para combater a violência de gênero e proteger as mulheres em situação de vulnerabilidade. (GARBIN et al., 2006).

O câncer de mama é a neoplasia mais preocupante entre as mulheres, afetando negativamente sua autoimagem e percepção da sexualidade, além de causar impacto psicológico, funcional e social. A prevenção primária é crucial para a saúde feminina, dada a prevalência e as taxas de incidência, morbidade e mortalidade. De acordo com estimativas do Instituto Nacional do Câncer (Inca) para 2016-2017, foram registrados cerca de 600 mil novos casos de câncer no Brasil. A distribuição dos tipos de câncer entre as mulheres é a seguinte: mama (28,1%), intestino (8,6%), colo do útero (7,9%), pulmão (5,3%) e estômago (3,7%).

A incidência de câncer é maior nas regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste. A mortalidade tem diminuído na última década em muitos países desenvolvidos, devido a melhorias em triagens e tratamentos. O avanço em biologia molecular tem aprofundado a compreensão dos subtipos de câncer. A doença é multifatorial, com poucos casos hereditários relacionados a mutações genéticas. Em mulheres jovens, o câncer é mais agressivo, com piores prognósticos em comparação com as acima dos 50 anos. A agressividade é avaliada por critérios morfológicos, e tumores de mama regulados por estrógenos apresentam altos níveis de receptores de estrogênio (SILVA, 2020).

3. METODOLOGIA 

Este artigo caracteriza-se como uma pesquisa bibliográfica e descritiva, com base na coleta de informações dos trabalhos de Silva (2008), Fegadoli (2010) e Silva (2020). Utilizando o estudo de caso como metodologia e a técnica de coleta de dados por documentação indireta, visa realizar uma análise qualitativa. O trabalho foi estruturado em etapas para categorizar os tipos de violência no convívio doméstico e suas possíveis consequências para o desenvolvimento do câncer de mama.

Quadro 01: Tópicos e Aspectos em comum nos artigos incluídos na pesquisa.

Fonte: Os próprios autores, 2024.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES 

De acordo com Diniz e Angelim (2003), fatores psicossociais podem desempenhar um papel significativo no agravamento do câncer de mama, influenciando tanto o desenvolvimento da doença quanto o progresso do tratamento. Aqui estão alguns dos principais fatores psicossociais que podem agravar o câncer de mama:

• Violência Doméstica e Abuso: Estudos indicam que mulheres que enfrentam violência conjugal ou abuso têm um risco aumentado de desenvolver câncer de mama. O estresse contínuo e a falta de suporte social adequado podem enfraquecer o sistema imunológico e afetar negativamente a saúde geral.

• Estresse Crônico: O estresse prolongado pode alterar o equilíbrio hormonal e enfraquecer o sistema imunológico, fatores que estão associados ao desenvolvimento e progressão de diversos tipos de câncer, incluindo o câncer de mama.

• Baixa autoestima e Depressão: Problemas emocionais como baixa autoestima e depressão podem levar a um autocuidado inadequado, incluindo a negligência de exames preventivos e tratamentos. A depressão também pode afetar a capacidade do corpo de combater a doença e responder ao tratamento.

• Isolamento Social: A falta de suporte social e o isolamento podem intensificar o sofrimento emocional e diminuir a adesão ao tratamento. O suporte emocional é crucial para a recuperação e para lidar com o impacto do câncer e do tratamento.

• Fatores Socioeconômicos: Baixa renda e falta de acesso a recursos médicos e psicológicos podem agravar o câncer de mama. Mulheres com menos recursos podem ter menos acesso a cuidados médicos regulares e suporte psicológico, afetando negativamente o manejo da doença.

• Fatores Culturais e Sociais: Estigmas culturais e sociais relacionados ao câncer e à saúde mental podem impedir que mulheres busquem ajuda ou tratamento adequado. Isso pode levar a diagnósticos tardios e tratamentos menos eficazes.

• Histórico Familiar e Genético: Além dos fatores psicossociais, um histórico familiar de câncer de mama pode aumentar o risco de desenvolvimento da doença. O estresse associado ao conhecimento desse risco também pode impactar a saúde mental e o bem-estar geral.

Esses fatores psicossociais não são causas diretas do câncer, mas podem influenciar a forma como a doença se desenvolve e é tratada. É importante abordar esses aspectos de forma integrada, oferecendo suporte emocional, psicológico e social às pacientes para melhorar os resultados e a qualidade de vida durante o tratamento do câncer de mama.

O câncer é definido como uma doença degenerativa que surge do acúmulo de lesões genéticas nas células, levando a um crescimento e reprodução descontrolados. Este processo resulta na formação de tumores ou neoplasias, com o câncer podendo afetar qualquer parte do corpo e sem predisposição específica de idade ou sexo.

Durante a vida, o sistema imunológico geralmente identifica e elimina células anormais. No entanto, falhas neste processo, combinadas com fatores denominados agentes promotores, podem permitir o crescimento contínuo dos tumores. A evolução clínica e a sobrevida das pacientes são influenciadas por diversos fatores, como a taxa de crescimento do tumor, potencial de metástase e o estado imunológico, nutricional e psicológico da paciente.

O câncer de mama é particularmente temido entre as mulheres, não apenas por suas implicações físicas, mas também por seu impacto na percepção da feminilidade e identidade sexual. O comprometimento da mama pode levar a questões profundas relacionadas à sexualidade, aparência e autoestima. Além disso, o tratamento do câncer de mama, frequentemente longo e mutilador, afeta significativamente a esfera biológica, espiritual, social e psicológica das mulheres.

Ao analisar os trabalhos de Silva (2008), Fegadoli (2010) e Silva (2020), percebe-se que, no Brasil, o câncer de mama é uma das principais causas de mortalidade feminina e o segundo tipo de câncer mais frequente globalmente, representando 22% dos novos casos anuais. O diagnóstico tardio, particularmente entre as mulheres de menor poder aquisitivo, agrava o quadro clínico e reduz a chance de tratamento eficaz. A sobrevida média de cinco anos para a população mundial é de 61%. Em resumo, os textos destacam a complexidade do câncer de mama, sua importância como uma questão de saúde pública e a necessidade de uma abordagem multifacetada para seu tratamento e prevenção.

Segundo Fernandes & Mamede (2004), o cotidiano também pode ser atribuído como causa do câncer de mama, onde a qualidade de vida é colocada em questão. Fernandes & Mamede (2004) relatam a experiência de pessoas que tiveram câncer e, durante suas vidas, precisaram conter emoções, apresentando sintomas depressivos e agressivos com influências de elementos externos e dificuldade em lidar com os sentimentos. Com isso, altos níveis de endorfina eram liberados na corrente sanguínea, desencadeando a produção de fenômenos psicossomáticos, como nos relatos.

Segundo Fernandes e Mamede (2004) destaca a relação entre o cotidiano, a qualidade de vida e a saúde mental, especialmente no contexto de pessoas que enfrentaram o câncer de mama. Fernandes & Mamede (2004) sugerem que as emoções reprimidas e a dificuldade em lidar com sentimentos podem ter um impacto significativo na saúde física, contribuindo para o desenvolvimento de doenças como o câncer.

Quando se fala em violência contra a mulher, essa perspectiva é muito relevante. A violência, seja física, emocional ou psicológica, pode levar as mulheres a sofrerem em silêncio, reprimindo suas emoções e vivenciando altos níveis de estresse e sofrimento. A falta de apoio emocional e a pressão social para “manter as aparências” podem resultar em problemas de saúde mental e até mesmo física.

Além disso, o texto menciona os fenômenos psicossomáticos, que se referem à manifestação de sintomas físicos decorrentes de fatores psicológicos. Isso é particularmente importante no contexto da violência contra a mulher, pois as experiências traumáticas podem se manifestar em doenças físicas. A compreensão das ligações entre saúde mental, repressão emocional e doenças físicas é fundamental para abordar adequadamente o problema da violência contra as mulheres e promover um ambiente onde elas possam expressar seus sentimentos e buscar ajuda sem medo ou vergonha. 

O Instituto Nacional do Câncer (Inca) previu que, até o final do ano de 2020, 60 mulheres em Roraima seriam diagnosticadas com câncer de mama e outras 50 com câncer de colo do útero. Pesquisas indicaram que a violência conjugal pode ser um fator de risco significativo para o desenvolvimento do câncer de mama, uma vez que a violência doméstica está associada a um maior estresse e menor acesso a cuidados médicos.

Um estudo realizado em 2016 pela oncologista Cristiana Tavares revelou que 42% das mulheres com câncer de mama entrevistadas haviam sofrido violência conjugal antes do diagnóstico. Elizabete Brito, coordenadora do Centro Humanitário de Apoio à Mulher (CHAME), enfatiza que a violência doméstica afeta a saúde mental e emocional das mulheres, tornando-as mais vulneráveis e menos propensas a buscar atendimento médico.

Durante a pandemia, o CHAME adaptou seus serviços e recebeu mais de 500 pedidos de ajuda por telefone, orientando as vítimas sobre como formalizar denúncias e procurar apoio. A psicóloga Naira de Oliveira, da Unacon (Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia, do Hospital Geral de Roraima), observou que a violência psicológica pode ser difícil de identificar e frequentemente contribui para o agravamento de doenças como o câncer, pois o estresse emocional pode impactar a saúde física.

Para apoiar as mulheres em tratamento, a Unacon criou o grupo Girassol, e o CHAME promoveu palestras sobre prevenção da violência, buscando fortalecer a autoestima e oferecer estratégias de enfrentamento.

De acordo com o FEMAMA (Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama), embora a causa exata do câncer de mama ainda não seja completamente conhecida, médicos e cientistas concordam que múltiplos fatores estão envolvidos no seu desenvolvimento, incluindo idade avançada, obesidade, falta de atividade física, histórico familiar e questões reprodutivas.

Uma nova pesquisa conduzida pela médica Cristiana Tavares, do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc)/Universidade de Pernambuco (UPE), destaca um possível fator adicional: a violência doméstica, tanto física quanto psicológica. Em um estudo com 200 mulheres, 84 diagnosticadas com câncer de mama relataram ter sofrido agressões de parceiros, o que representa 42% dos casos analisados.

Cristiana Tavares sugere que o estresse crônico associado à violência doméstica pode enfraquecer o sistema imunológico. “Estudos indicam que traumas profundos, como a depressão, podem reduzir as defesas naturais do corpo, comprometendo a capacidade de combater células cancerígenas,” afirma.

A Dra. Cristiana observa que o estresse psicológico crônico é um achado comum entre pacientes com câncer. Eventos estressantes ao longo da vida podem impactar a saúde emocional e até mesmo a sobrevivência de pacientes com câncer de mama. “A violência doméstica representa um estresse crônico que afeta diretamente o sistema imunológico, crucial para a defesa contra o câncer de mama e outras neoplasias.”

A Dra. Maira Caleffi, presidente voluntária da FEMAMA e chefe do setor de Mastologia do Hospital Moinho de Ventos, acredita na conexão entre violência contra a mulher e câncer de mama. Ela destaca que frequentemente as equipes de assistência não estão preparadas para lidar com os traumas da violência. “As mulheres enfrentam duplo sofrimento. É essencial abrir discussões científicas para melhor identificar essas pacientes na prática clínica. Oferecer tratamento avançado não é suficiente se a paciente continua a sofrer violência em casa, o que pode prejudicar sua luta pela vida.”

Em 2020, o INCA estimou 66.280 novos casos de câncer de mama, correspondendo a 29,7% do total. “Isso reforça a necessidade de acesso rápido e tratamento adequado,” ressalta Dra. Maira.

A FEMAMA busca assegurar que o tratamento ocorra em centros especializados com suporte multiprofissional, incluindo mastologistas e psicólogos. “Esse avanço seria significativo para o tratamento,” afirma Dra. Maira.

“Implementar políticas públicas e fortalecer a atenção primária à saúde no combate à violência doméstica, além de reforçar o papel da equipe interdisciplinar em oncologia para apoiar e proteger pacientes vítimas de violência, pode mudar drasticamente o futuro de uma geração,” conclui Dra. Cristiana.

5. CONCLUSÃO

A pesquisa abordou a interseção entre violência doméstica e câncer de mama, destacando a complexidade e a gravidade desses fenômenos sociais e de saúde pública. A partir da definição de violência proposta pela OMS e da análise do referencial teórico sobre a violência contra a mulher, ficou evidente que este é um problema multifacetado, com profundas raízes socioculturais e históricas. A violência, especialmente a violência doméstica, é uma realidade que perpetua ciclos de abuso e sofrimento, e sua relação com o câncer de mama emerge como uma preocupação significativa.

A discussão dos fatores psicossociais que podem influenciar o desenvolvimento e a progressão do câncer de mama revelou a importância de um olhar integrado sobre a saúde das mulheres. Aspectos como estresse crônico, baixa autoestima, isolamento social e violência doméstica são fatores críticos que afetam não apenas a saúde mental e emocional das mulheres, mas também podem impactar negativamente o manejo e a evolução do câncer de mama.

A análise das políticas públicas, como o II Plano Nacional de Políticas para Mulheres, e as estatísticas alarmantes sobre a violência contra as mulheres no Brasil, ressaltam a necessidade urgente de uma abordagem multissetorial e integrada. A implementação de estratégias eficazes que envolvam saúde, justiça, educação e apoio social é essencial para enfrentar tanto a violência doméstica quanto os desafios relacionados ao câncer de mama.

Além disso, os dados recentes e as pesquisas apontam para uma conexão preocupante entre violência doméstica e câncer de mama, sugerindo que o estresse e o trauma resultantes da violência podem desempenhar um papel significativo na saúde das mulheres. A importância de intervenções que ofereçam suporte psicológico, social e médico adequado não pode ser subestimada. As estratégias de prevenção e tratamento devem incorporar uma visão holística que aborda tanto os aspectos físicos quanto emocionais da saúde das mulheres.

Portanto, para efetivar mudanças significativas, é imperativo fortalecer a colaboração entre governos, organizações não governamentais e comunidades, e promover políticas públicas que integrem o combate à violência doméstica com estratégias de prevenção e tratamento do câncer de mama. Somente através de um esforço conjunto e coordenado será possível melhorar a qualidade de vida das mulheres e reduzir o impacto devastador desses problemas inter-relacionados.

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1Discente do Curso Superior de Enfermagem da Faculdade Metropolitana de Manaus – FAMETRO. e-mail: wethynag@gmail.com
2Discente do Curso Superior de Enfermagem da Faculdade Metropolitana de Manaus – FAMETRO. e-mail: wandrialopes16@gmail.com
3Discente do Curso Superior de Enfermagem da Faculdade Metropolitana de Manaus – FAMETRO. e-mail: veigasuzy@icloud.com
4Docente do Curso Superior de Enfermagem da Faculdade Metropolitana de Manaus – FAMETRO. Especialista em Urgência, Emergência e UTI Adulto e Obstetrícia, Ginecologia e UTI Neonatal. e-mail: willamscostademelo@gmail.com
5Docente do Curso Superior de Enfermagem da Faculdade Metropolitana de Manaus – FAMETRO. Especialista Enfermagem do Trabalho. e-mail: adriano.oliveira@fametro.edu.br