O RETROFIT DE AR CONDICIONADO: MODERNIZAÇÃO E SUSTENTABILIDADE NA CLIMATIZAÇÃO

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ma10202210100959


Katian L. Vitzel Bahis1


Key Words: Ilhas de calor, Economia, Eficiência.

Os edifícios no Brasil representam um grande desafio em termos de consumo de energia. Em 2019, foram responsáveis por 50% do consumo de eletricidade no país, configurando-se como o setor com maior potencial para economia de energia[2].

A Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC), instituída pela Lei nº 12.187 de 2009, representa um marco histórico no compromisso do Brasil com o combate às mudanças climáticas. Através da PNMC, o país se comprometeu voluntariamente a reduzir suas emissões de gases de efeito estufa (GEE) em uma faixa entre 36,1% e 38,9% em relação aos níveis projetados para 2020[3]. O Decreto nº 7.390 de 2010, que regulamenta a PNMC, detalha as medidas a serem implementadas para alcançar essa meta ambiciosa. Entre as diversas ações previstas, destaca-se a promoção da eficiência energética como um dos pilares fundamentais para a redução das emissões de GEE[4].

O uso inadequado de ares condicionados de baixa eficiência, em conjunto com projetos inadequados ao clima local, configura um problema de grande escala que exige medidas urgentes[5]. As consequências decorrentes do uso impróprio de ares condicionados são diversas. O elevado consumo de energia, especialmente durante os horários de pico, sobrecarrega a rede elétrica, resultando em apagões e instabilidade no fornecimento de energia. Além disso, contribui para o aumento das emissões de gases de efeito estufa, intensificando o desafio das mudanças climáticas.

Outro efeito adverso é a formação de “ilhas de calor” nas áreas urbanas, causada pela concentração de aparelhos de ar condicionado. Essa elevação da temperatura local agrava o problema do calor urbano, impactando negativamente a saúde da população, especialmente grupos mais vulneráveis como idosos e crianças. Além disso, o alto consumo de energia tem implicações socioeconômicas, refletindo diretamente nas contas de luz dos consumidores e gerando custos adicionais para as empresas de energia, que são repassados aos consumidores[6].

Para mitigar esses impactos, várias medidas são essenciais. A implementação e aprimoramento de leis que regulamentam a eficiência energética de aparelhos de ar condicionado são fundamentais, estabelecendo padrões mínimos para novos produtos e incentivando a substituição de modelos antigos por versões mais eficientes. A conscientização da população sobre o uso racional de energia e a escolha de aparelhos eficientes também desempenha um papel crucial, podendo ser alcançada por meio de campanhas educativas em diversos canais.

Incentivos governamentais, como benefícios fiscais e programas de financiamento, podem estimular a aquisição de aparelhos de ar condicionado eficientes, tornando essa tecnologia mais acessível e reduzindo o consumo de energia. Adicionalmente, a promoção de projetos arquitetônicos que integrem soluções bioclimáticas, como o uso de materiais refletores de calor e técnicas de sombreamento, pode reduzir a dependência do ar condicionado.

Nesse sentido, os avanços mais recentes foram marcados pela aprovação da portaria Inmetro nº 234/2020, a qual visa o aperfeiçoar os Requisitos de Avaliação da Conformidade (RAC) para Condicionadores de Ar. A classe “A” de eficiência energética passará de 3,23 W/W para 5,5 W/W, exigindo maior eficiência dos equipamentos[7]. Em 2021 a Instrução Normativa Inmetro (INI-C) para a Classe de Eficiência Energética de Edificações Comerciais, de Serviços e Públicas foi aprovada. Ela aperfeiçoa o Requisito Técnico da Qualidade para o Nível de Eficiência Energética de Edifícios (RTQ-C), estabelecendo critérios mais rigorosos para a classificação energética8.

O condicionamento de ar, independentemente de sua finalidade, implica, inicialmente, na limitação dos valores pré-estabelecidos das grandezas que representam as condições a serem mantidas nos recintos ao longo do tempo de aplicação do processo. Essas grandezas incluem a temperatura do ar no termômetro de bulbo seco, a umidade relativa do ar, a movimentação do ar, o grau de pureza do ar, o nível de ruído admissível e a porcentagem ou volume de renovação do ar[9].

O propósito do condicionamento de ar é realizar o controle automático da atmosfera de um ambiente. Esse controle visa proporcionar o conforto humano ou garantir o desempenho adequado de processos industriais ou científicos. Assim, os elementos a serem principalmente controlados incluem a pureza, a movimentação, a temperatura e a umidade do ar, obedecendo aos limites estabelecidos por normas ou especificações. Em determinadas aplicações, a pressão do ar no ambiente também deve ser controlada.

O termo “retrofit”, derivado da fusão das palavras “retro” do latim e “fit” do inglês, refere-se a uma modificação de um equipamento ou instalação existente, visando à melhoria de seu desempenho, de sua operação ou de ambos. Essa prática visa realçar o valor dos equipamentos, prolongar sua vida útil e atender às atuais exigências de qualidade ambiental, mediante modificações que buscam exclusivamente aprimorar a eficiência8,[10]

Os retrofits, focados na modernização de edifícios já existentes, desempenham um papel crucial nas estratégias de redução do consumo energético. Em casos específicos, essas intervenções podem resultar em reduções expressivas, variando de 50% a 90% no consumo de energia destinada ao aquecimento e arrefecimento dos edifícios[11. Essa notável economia não apenas contribui para a sustentabilidade ambiental, alinhando-se a padrões mais eficientes, mas também promove uma gestão mais racional dos recursos. Assim, os retrofits surgem como uma abordagem eficaz na busca por soluções sustentáveis no setor da construção. Além disso, o retrofit de ar condicionado destaca-se como uma prática vital para preservar a eficiência e longevidade desses equipamentos[12]. Essa intervenção envolve a substituição dos fluidos refrigerantes e a modernização do sistema, desempenhando um papel crucial na promoção do uso consciente dos aparelhos, garantindo não apenas sua durabilidade, mas também uma série de benefícios ambientais e econômicos, como o conforto térmico, iluminação, controle de ruído e redução de poluentes[13].

A substituição do fluido refrigerante é um ponto central do retrofit e, portanto, uma ação de grande importância. O fluido refrigerante desempenha um papel vital na capacidade do ar condicionado em criar um ambiente agradável e fresco, propiciando a mudança de estado físico para o estado gasoso. No entanto, o impacto ambiental do fluido refrigerante utilizado é uma consideração crítica[14].

O retrofit propõe a substituição de fluidos à base de cloro, prejudiciais à camada de ozônio, por alternativas que não só preservam o meio ambiente, mas também promovem a segurança dos ocupantes do espaço climatizado. Fluidos à base de dióxido de carbono, dióxido de enxofre e amônia, entre outros, representam opções mais sustentáveis e alinhadas com as exigências contemporâneas de responsabilidade ambiental[15].

Dentre os benefícios do retrofit, destaca-se o prolongamento da vida útil dos aparelhos de ar condicionado. A prática oferece menor impacto ambiental, equilibrando a funcionalidade do sistema com a preservação ambiental. O excelente custo/benefício, a maior segurança proporcionada pelos fluidos mais seguros e a melhoria na eficiência contribuem para uma significativa redução no consumo de energia, aspecto relevante para a sustentabilidade energética. É crucial salientar que a escolha do fluido refrigerante adequado deve considerar as características específicas do local de aplicação, seja uma residência, um estabelecimento comercial ou um edifício. A orientação de um profissional capacitado é fundamental para determinar a eficiência energética, custo/benefício e outras variáveis que impactam o desempenho do equipamento.

Quanto ao momento ideal para troca do retrofit, não há uma periodicidade fixa para a substituição do fluido de ar condicionado, pois ele se transforma ao longo do tempo, perdendo eficiência. No entanto, vazamentos de fluido refrigerante podem indicar a necessidade de troca, exigindo atenção ao funcionamento do aparelho, pois a falta de fluido pode resultar na interrupção de seu funcionamento. Aproveitar o momento da troca do fluido refrigerante para realizar uma manutenção abrangente do aparelho é prática recomendável. A substituição de filtros e uma limpeza minuciosa contribuem para garantir o pleno funcionamento do sistema, maximizando sua eficiência e prolongando sua vida útil.

Em suma, o consumo de energia em edifícios no Brasil exige uma resposta multifacetada e abrangente. Através de medidas que combinam regulamentação, conscientização, incentivos financeiros, soluções tecnológicas inovadoras e práticas de retrofit eficientes, podemos construir um futuro mais sustentável para o país. A mudança de paradigma energético nos edifícios brasileiros é fundamental para reduzirmos significativamente o consumo de energia, as emissões de gases de efeito estufa e os impactos socioeconômicos negativos. Ações conjuntas do governo, empresas, profissionais da área e da sociedade civil são essenciais para construirmos um futuro mais verde e próspero para as próximas gerações.


1Fonte: Com quinze anos de experiência sólida no mercado de Engenharia Civil, sou um profissional dedicado e apaixonado por criar soluções inovadoras no setor imobiliário e de construção. Graduado em Engenharia Civil pela Faculdade de Engenharia Industrial (FEI) em São Paulo, Brasil, tenho uma base sólida de conhecimento que me permite abordar projetos com uma perspectiva técnica e estratégica. Ao longo da minha carreira, adquiri expertise em diversas áreas, incluindo análise de viabilidade técnica e financeira de projetos imobiliários, gerenciamento de interfaces entre stakeholders e supervisão de obras de construção e manutenção. Sou habilidoso em conduzir análises documentais detalhadas para otimizar o monitoramento de métricas e facilitar processos de tomada de decisão informados, resultando em redução de custos e prazos de projeto. Minha jornada profissional inclui passagens por instituições renomadas, como o Banco Itaú Unibanco S.A., onde desempenhei papeis-chave, desde Engenheiro de Manutenção Predial até Analista Operacional de Empréstimo Imobiliário. Nessas funções, fui responsável por planejar e supervisionar atividades de manutenção predial, avaliar a viabilidade de projetos imobiliários e garantir a conformidade com regulamentações e padrões de qualidade. Destaco também minha contribuição como Assistente de Gerente de Projeto na BWB – Builders Without Borders, sediada em Orlando, FL. Nessa posição, colaborou estreitamente com equipes multidisciplinares para coordenar e supervisionar diversos aspectos de projetos de construção, desde a coordenação com subcontratados até a garantia da segurança no local de trabalho. Além da minha formação acadêmica, busco constantemente aprimorar minhas habilidades por meio de cursos adicionais, como Imersão na Indústria da Construção Americana e Navegação Básica em SAP, entre outros. Meu compromisso com a excelência, aliado à minha capacidade de liderança, tomada de decisões estratégicas e foco na entrega de resultados, me coloca em uma posição única para enfrentar os desafios e oportunidades no setor de Engenharia Civil. Estou entusiasmado para continuar contribuindo para projetos inovadores e impactantes que impulsionam o desenvolvimento urbano e promovam o bem-estar da comunidade.
2Fonte: EMPRESA DE PESQUISA ENERGÉTICA (EPE). Ações para promoção da eficiência energética nas edificações brasileiras: no caminho da transição energética (Nota Técnica). Brasília: EPE, 2020.
3Fonte: BRASIL. Lei nº 12.187, de 29 de dezembro de 2009. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20072010/2009/lei/l12187.htm.
4Fonte: Decreto nº 7.390, de 9 de dezembro de 2010. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20072010/2010/Decreto/D7390.htm.
5Fonte: LAMBERTS, R.; CLETO, L. T. Certificação de Sistemas PBE Edifica. In: SEMINÁRIO PROGRAMA BRASILEIRO DE ETIQUETAGEM EM EFICIÊNCIA ENERGÉTICA PARA SISTEMAS DE REFRIGERAÇÃO E AR-CONDICIONADO. Anais […]. São Paulo: ABRAVA, 2018. Disponível em: http://abrava.com.br/wpcontent/uploads/2018/08/Seminario-PBE-RAC-03-PBE-EDIFICA-Lamberts-eTomaz_compressed-1.pdf.
6Fonte: SANTOS, A. F. D. DOS, & DIAS, M. V. Retrofit do sistema de ar condicionado em edifício escolar em Cuiabá-MT como contribuição para redução do consumo de energia e das emissões de CO². Repositório da Universidade Federal de Santa Catarina, 2022. https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/238385.
7Fonte: INSTITUTO NACIONAL DE METROLOGIA, QUALIDADE E TECNOLOGIA. INMETRO. Portaria nº 234, de 29 de junho de 2020. Aperfeiçoamento parcial dos Requisitos de Avaliação da Conformidade para Condicionadores de Ar, estabelecendo o Índice de Desempenho de Resfriamento Sazonal (IDRS), a reclassificação das categorias de eficiência energética e determinando outras providências para a disponibilização destes produtos no mercado nacional. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, n.124, p.99, 01 de julho de 2020.
8Fonte: INSTITUTO NACIONAL DE METROLOGIA, QUALIDADE E TECNOLOGIA INMETRO. Portaria nº 42, de 24 de fevereiro de 2021. Aprova a Instrução Normativa Inmetro para a Classificação de Eficiência Energética de Edificações Comerciais, de Serviços e Públicas (INI-C) que aperfeiçoa os Requisitos Técnicos da Qualidade para o Nível de Eficiência Energética de Edifícios Comerciais, de Serviços e Públicos (RTQ-C), especificando os critérios e os métodos para a classificação de edificações comerciais, de serviços e públicas quanto à sua eficiência energética. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, n.45, p.44, 09 de março de 2021a.
9Fonte: MATOS, R. S. Apostila de Climatização. Universidade Federal do Paraná, Departamento de Engenharia Mecânica, Curitiba, 2010. 133 f. Apostila.
10Fonte: ROMÉRO, M. A. Retrofit e APO: conforto ambiental e conservação de energia.In: Reabilita – Curso de pós-graduação lato sensu em Reabilitação Ambiental Sustentável Arquitetônica e Urbanística. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de Brasília. Brasília, 2020.
11Fonte: INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE (IPCC). Climate Change 2014:Mitigation of Climate Change. 2014b.Disponível emhttp://report.mitigation2014.org/spm/ipcc_wg3_ar5_summary-for-policymakers_approved.pdf.
12 Fonte: AMORIM, C. N. D. Retrofit e preservação de edifícios não residenciais modernos em Brasília: uma abordagem para eficiência energética e iluminação natural. 2021.
13 Fonte: ALAZAZMEH, A.; ASIF, M. Retrofitting de edifícios comerciais: Avaliação de melhorias no desempenho energético e na qualidade do ar interior. Estudos de caso em engenharia térmica , 100946. https://doi.org/10.1016/J.CSITE.2021.100946. 2021.
14 Fonte: GONÇALVES, G. O. Avaliação termo-econômica da substituição de fluidos refrigerantes em equipamentos: condicionamento de ar e conservação de produtos em uma empresa de grande porte. 2017.
15 Fonte: SOUZA, L. M. P. Avaliação experimental de um sistema de refrigeração em cascata utilizando o dióxido de carbono como fluido refrigerante. Tese (doutorado) Universidade Federal de Uberlândia. 2016.