O PROCESSO ESTRUTURAL NO ÂMBITO DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7069000


Autora:
Vanessa Gomes Lopes


RESUMO

O presente trabalho propõe fazer uma breve análise acerca da origem histórica do chamado processo estrutural (structural litigation), além do estabelecimento de seu conceito. Ainda, trata das grandes repercussões do instituto na seara jurisprudencial, a exemplo dos processos em que o Supremo Tribunal Federal reconheceu o Estado de Coisas Inconstitucional. A importância na disseminação do conhecimento acerca desses processos visa a resolução definitiva de casos em que se vislumbra a reiterada violação de direitos humanos.

Palavras-chave: Processo estrutural. Ativismo judicial. Reiterada violação de direitos humanos.

ABSTRACT

The present work proposes to make a brief analysis about the historical origin of the structural litigation, in addition to the establishment of its concept.Still, it deals with the great repercussions of the institute in the jurisprudential field, like the cases in which the Federal Supreme Court recognized the Unconstitutional State of Things. The importance of disseminating knowledge about these processes aims at the definitive resolution of cases in which the repeated violation of human rights is envisaged.

Keywords: Structural litigation. Judicial activism. Repeated violation of human rights.

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho propõe fazer uma análise acerca da origem histórica do processo estrutural, estabelecendo um conceito para o instituto.

Além disso, visa examinar a repercussão do processo estrutural na seara jurisprudencial, a exemplo das ações em que o Supremo Tribunal Federal reconheceu o Estado de Coisas Inconstitucional.

Diante desse quadro, aponta a importância na disseminação do conhecimento acerca desses processos e, especialmente, na resolução definitiva de casos em que se vislumbra a reiterada violação de direitos humanos.

2. PROCESSO ESTRUTURAL: CONCEITO E ORIGEM HISTÓRICA

O processo estrutural teve sua origem marcada durante a chamada “Corte Warren”, ocorrida entre os anos 1953 e 1969, ocasião em que foi julgado o caso Brown v. Board of Education of Topeka pela Suprema Corte Americana.

No caso supracitado, ao reconhecer a inconstitucionalidade da segregação racial nas escolas de Topeka, a Suprema Corte ressaltou a imensa dificuldade em implementar de forma abrangente sua decisão, o que deu ensejo ao caso Brown II, por meio do qual a Corte determinou que fossem elaboradas estratégias de eliminação da referida prática segregacionista.

Nesse contexto, de acordo com Edilson Vitorelli1, o processo estrutural – ou structural litigation“é um processo coletivo no qual se pretende, pela atuação jurisdicional, a reorganização de uma estrutura burocrática, pública ou privada, que causa, fomenta ou viabiliza a ocorrência de uma violação pelo modo como funciona, originando um litígio estrutural”.

Em resumo, o processo estrutural tem por escopo alterar todo um estado de desconformidade de determinada estrutura e promover sua transição para um estado de conformidade, um estado ideal2.

Ressalte-se, então, que a resolução prática dos litígios estruturais demanda uma conduta de ativismo judicial para retirar da inércia os demais responsáveis pela perpetuação da situação jurídica ilegal.

3. O PROCESSO ESTRUTURAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Atualmente já temos diversos exemplos de processos estruturais nos tribunais brasileiros. O primeiro caso noticiado, e também o mais emblemático, foi a ADPF 347, na qual o Supremo Tribunal Federal – STF reconheceu a existência de um Estado de Coisas Inconstitucionais no sistema carcerário brasileiro.

Nesta ação, considerando a omissão dos Poderes Legislativo e Executivo e a necessidade de uma completa reestruturação do sistema carcerário, o STF determinou a observância de diversas medidas aos juízes e Tribunais, mas também aos demais poderes, a fim de tirá-los da inércia, coordenando, assim, o estabelecimento de ações voltadas à resolução definitiva do problema3.

Dentre outros casos, podemos ainda citar: (i) a tutela do direito fundamental à educação de crianças e adolescentes em áreas constantemente afetadas por operações policiais4; (ii) a tutela do direito à saúde de indígenas para a contenção do avanço da Covid-195; e (iii) a tutela do direito à vida, à integridade física e outros direitos fundamentais dos cidadãos na implementação de políticas de segurança pública (conhecida como a “ADPF das favelas”)6.

4. CONCLUSÃO

Conforme buscou-se demonstrar, o processo estrutural – embora não o faça de forma expressa – integra o microssistema de processos coletivos e possui a finalidade de evitar a multiplicidade de ajuizamento de ações com o mesmo escopo, além de buscar uma solução definitiva para a reiterada violação de direitos humanos perpetrada por parte de determinada instituição.

Por conseguinte, para que a resolução dos litígios estruturais se dê de forma adequada, o Superior Tribunal de Justiça – STJ entende que “é preciso que a decisão de mérito seja construída em ambiente colaborativo e democrático, mediante a efetiva compreensão, participação e consideração dos fatos, argumentos, possibilidades e limitações do Estado em relação aos anseios da sociedade civil adequadamente representada no processo, por exemplo, pelos amici curiae e pela Defensoria Pública na função de custos vulnerabilis, permitindo-se que processos judiciais dessa natureza, que revelam as mais profundas mazelas sociais e as mais sombrias faces dos excluídos, sejam utilizados para a construção de caminhos, pontes e soluções que tencionem a resolução definitiva do conflito estrutural em sentido amplo7.


1 VITORELLI, Edilson. Levando os conceitos a sério: processo estrutural, processo coletivo, processo estratégico e suas diferenças. Revista dos Tribunais Online, Revista de Processo, vol. 284/2018, p. 333-369, Out/2018.

2 DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil, v. 4, Juspodivm, 2020.

3 STF. Plenário. ADPF 347 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 09/09/2015.

4 STF. Plenário. RE 956.475/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 12/05/2016.

5 STF. Plenário. ADPF 709 Ref-MC/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 03 e 05/08/2020.

6 STF. Plenário. ADPF 635 MC-ED/RJ, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 02 e 03/02/2022.

7 STJ. REsp 1.854.842/CE, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 02/06/2020.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARENHART, Sérgio Cruz. A prova estatística e sua utilidade em litígios complexos. In: Revista Direito e Práxis. Rio de Janeiro, vol. 10, nº 1, 2019.

CABRAL, Antonio; ZANETI JR., Hermes. Entidades de infraestrutura específica para a resolução de conflitos coletivos: as claims resolution facilities e sua aplicabilidade no Brasil. In: Revista de Processo. São Paulo: RT, 2019, vol. 287.

DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 4, Juspodivm, 2020.

TOSTA, André Ribeiro; MARÇAL, Felipe Barreto. Gerenciamento processual adequado de demandas formalmente individuais a partir de uma visão estruturante: o reforço proporcionado pelo art. 21 da LINDB. In: ARENHART, Sérgio Cruz; JOBIM, Marco Félix (Org.). Processos estruturais. 2ª ed. Salvador: Juspodivm, 2019.

VITORELLI, Edilson. Levando os conceitos a sério: processo estrutural, processo coletivo, processo estratégico e suas diferenças. Revista dos Tribunais Online, Revista de Processo, vol. 284/2018, p. 333-369, Out/2018.

WATANABE, Kazuo. Relação entre demanda coletiva e demandas individuais. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2006, vol. 139.


Pós-graduada em Direito Tributário (Universidade Anhanguera).
E-mail: vanessagomeslopes@gmail.com