O PERFIL CLÍNICO-EPIDEMIOLÓGICO DE GESTANTES ACOMETIDAS POR COVID-19 NA REGIÃO NORTE DO BRASIL

THE CLINICAL-EPIDEMIOLOGICAL PROFILE OF PREGNANT WOMEN AFFECTED BY COVID-19 IN THE NORTHERN REGION OF BRAZIL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8071479


Milena Cardoso de Lima; Amanda Monteiro Veloso; Letícia Magalhães da Silva; Maria Dhescyca Ingrid Silva Arruda; Larissa Gomes de Oliveira; Eveline Pinheiro de Souza; Estefany Borges de Sousa; Gilberto Cesar Macedo Cabeça Filho; Gisele Monteiro Viana; Laura Sousa Marques; Karina de Jesus Cruz do Carmo; Andressa Serrão de Jesus; Kleyton dos Santos Tavares; Monike Karina Macedo Soares; Marcos Jessé Abrahão Silva; Letícia Gomes de Oliveira


RESUMO

O presente estudo teve como objetivo descrever o perfil clínico-epidemiológico das gestantes da Região Norte do Brasil que tiveram a COVID-19 entre março de 2020 e março de 2022. Trata-se de um estudo descritivo com delineamento transversal realizado pelo portal Observatório Obstétrico Brasileiro Covid-19, contendo dados públicos sobre Saúde Materno-Infantil das gestantes e puérperas notificados no Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Gripe. O Estado do Pará foi o protagonista em número de óbitos por COVID-19 em gestantes. Os sintomas mais comuns foram tosse, febre e dispneia, afetando, principalmente, o terceiro trimestre gestacional. A frequência da doença foi superior em mulheres pardas com ensino médio completo, e a maior taxa de detecção foi na área urbana, sendo o Zanamivir, antiviral do tipo inibidor de neuraminidase, o mais utilizado nos tratamentos. Os dados analisados caracterizam o perfil clínico-epidemiológico das gestantes acometidas por COVID-19 nessa região, e formam um novo panorama de peculiaridades na manifestação da doença para estratégias em saúde visando este público. Nesse sentido, os casos graves e críticos da doença em grupos de risco, como as mulheres grávidas, precisam ser melhor estudados e discutidos, uma vez que implicam em hospitalizações e óbitos materno e neonatal.

Palavras-chave: COVID-19. Gravidez. Sistemas de Informação em Saúde.

ABSTRACT

The present study aimed to describe the clinical-epidemiological profile of pregnant women in the North Region of Brazil who had COVID-19 between March 2020 and March 2022. This is a descriptive study with a cross-sectional design carried out by the Observatório Obstétrico Brasileiro portal. Covid-19, containing public data on Maternal and Child Health of pregnant and puerperal women notified in the Influenza Epidemiological Surveillance Information System. The State of Pará was the protagonist in number of deaths by COVID-19 in pregnant women. The most common symptoms were cough, fever and dyspnea, mainly affecting the third trimester of pregnancy. The frequency of the disease was higher in brown women with complete secondary education, and the highest detection rate was in urban areas, with Zanamivir, an antiviral of the neuraminidase inhibitor type, being the most used in treatments. The analyzed data characterize the clinical-epidemiological profile of pregnant women affected by COVID-19 in this region, and form a new panorama of peculiarities in the manifestation of the disease for health strategies aimed at this public. In this sense, severe and critical cases of the disease in risk groups, such as pregnant women, need to be better studied and discussed, since they imply hospitalizations and maternal and neonatal deaths.

Keywords: COVID-19. Pregnancy. Health Information Systems.

1 INTRODUÇÃO

Historicamente, a sociedade mundial foi atingida por variados episódios de enfermidades causadoras de preocupações, adoecimentos e mortes. Tais fatos puderam ser observados desde os tempos precedentes à época de Cristo, como revelam os estudos de Hipócrates, nos quais estima-se que Egito, Roma e Grécia foram severamente expostos a doenças infectocontagiosas, com destaque ainda para a Índia, cerca de 500 a.C, que apresenta relatos de mortes com sinais e sintomas sugestivos de cólera (SANTOS, 2021).

 De forma continuada, durante o período medieval, a peste bubônica dominou todo o continente europeu, construindo uma narrativa de intenso óbito e perseguição. Dessa maneira, ambas as doenças supracitadas foram consideradas eventos pandêmicos para a sociedade humana, ou seja, causaram elevada disseminação – e letalidade- de magnitude global  (SANTOS, 2021).

Diante disso, percebe-se que a ocorrência de árduas situações no âmbito da saúde acompanha a humanidade desde os primórdios até a contemporaneidade. Assim sendo, a COVID-19 se constitui como uma doença infecciosa respiratória do trato respiratório inferior, a qual tem como agente etiológico o coronavírus 2 da síndrome respiratória (SOUSA et al., 2021).

A partir disso, a cidade chinesa de Wuhan – 2019 – foi a localidade responsável pelas primeiras notificações de quadros críticos de pneumonia à Organização Mundial da Saúde (OMS), e a expansão de casos para outros países, ocasionou a classificação de pandemia no dia 11 de março de 2020 pela citada organização. Assim, a COVID-19 se estabeleceu como uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional – ESPII -, o qual é o nível de alerta mais elevado pelo Regulamento Sanitário Internacional (MARTINS; OMS, 2020).

No que tange a um contexto nacional, o primeiro caso confirmado no Brasil ocorreu no dia 26 de fevereiro de 2020, a partir do retorno da pessoa infectada da região de Lombardia, na Itália e, em menos de 30 dias, todas as Unidades Federativas (UFs) já apresentavam notificações da doença, com destaque para o primeiro óbito ocorrido em 20 de março do mesmo ano (OMS, 2020).

Quanto às manifestações clínicas mais recorrentes da doença, destacam-se: febre, tosse, fadiga, mialgia, dispneia, cefaleia e ocorrências de diarreia. Apesar de apresentar um quadro clínico muito semelhante a síndromes gripais, a COVID-19 possui maior probabilidade de evoluir para infecções críticas, fazendo-se necessário suporte ventilatório e oxigenoterapia (WANG, 2019; RODRIGUEZ, 2020).

Diante disso, a maioria das pessoas desenvolvem sintomas leves a moderados (55%), seguido por quadros assintomáticos (30%), os quais dispõem de uma baixa taxa de mortalidade. Por outro lado, 10% apresentam sintomas graves e 5% sintomas críticos, com exigência de hospitalização, e internação em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), com taxas de óbitos de 15% e 50% – respectivamente. Vale ressaltar ainda que pessoas com saturação de oxigênio menor que 90% tendem a apresentar maior frequência de dispneia e febre em comparação com os que possuem saturação de oxigênio maior que 90% (WANG, 2019; RODRIGUEZ, 2020).

Nesse contexto, o Ministério da Saúde, de acordo com estudos feitos mundialmente, atentou-se em definir os grupos mais vulneráveis (de risco), ou seja, as pessoas com maior potencial de agravamento do quadro clínico no caso de desenvolvimento da doença. Assim, foi instituído que gestantes e puérperas até 14 dias pós-parto, necessitam de maior cautela e apoio perante a difícil realidade vivida. A gestação humana tem duração de 40 semanas, em média 280 dias, sendo segmentada em três trimestres – o primeiro de 0 a 13 semanas, o segundo de 14 a 26 e o terceiro de 27 a 40 – e se configura como um momento de transformações volumosas para a díade mãe-bebê, além de participarem também seu (sua) parceiro(a) e familiares (XAVIER et al., 2020).

Nesse ínterim, torna-se perceptível a necessidade de discorrer sobre a maior taxa de severidade da COVID-19 nas mulheres grávidas no cenário desta pandemia, bem como a relevância em se tratar acerca desse tópico em particular. Assim, o objetivo deste artigo é expor os sintomas mais prevalentes da COVID-19 em gestantes e investigar em qual trimestre gestacional se torna mais atingida pela doença.

2 MÉTODOS

Trata-se de um estudo epidemiológico descritivo, retrospectivo, com delineamento transversal, com abordagem quantitativa e variáveis qualitativas, o qual buscou as principais evidências acerca de gestantes infectadas pela COVID-19 a partir de dados públicos consolidados. A partir da transversalidade do estudo foi possível descrever e analisar o fenômeno, buscando relacionar as variáveis do estudo, enquanto com o método epidemiológico foi permitido a investigação da saúde do grupo de interesse e os fatores associados. A justificativa da proposta deste trabalho está em colaborar com a comunidade científica, tal como com a sociedade como um todo, especificamente à população feminina que perpassa pelo período gravídico durante essa crítica conjuntura de saúde (SILVA, 2019; CALDEIRA, 2018).

O estudo foi realizado no Norte do Brasil, integrado pelos estados: Acre, Amazonas, Amapá, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. Em 2020, tal região possuía uma população de 18 milhões de habitantes, sendo o estado do Amazonas com maior área territorial e o estado do Pará com maior população (IBGE, 2017).

Em relação a primeira etapa do método, a pergunta norteadora foi definida a partir da estratégia de busca PICo [P (população): Gestantes; I (fenômeno de interesse): Sintomatologia; Co (contexto): Covid-19]. Assim, formulou-se a seguinte questão de pesquisa: “Quais sintomatologias são mais prevalentes em gestantes acometidas por COVID-19 na região Norte?”. Esta estratégia foi utilizada em virtude de gerar perguntas baseadas na construção de evidências científicas (FIOCRUZ, 2022).

Os dados para a realização da pesquisa foram coletados na plataforma do Observatório Obstétrico Brasileiro Covid-19 (OOBr Covid-19), no qual é possível monitorar e analisar dados públicos sobre Saúde Materno-Infantil das gestantes e puérperas notificados no Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe).

A coleta de dados ocorreu no dia 28 de março de 2022. A população do estudo foram gestantes acometidas por COVID-19 e o período analisado foi março de 2020 a março de 2022, até a 12° semana epidemiológica. As variáveis foram coletadas na aba “Informações Gerais” da plataforma, no qual foram buscados a “Tabela de Informações Gerais” para os dados epidemiológicos e a “Tabela de Sintomas” para os dados sintomatológicos. Posteriormente, foram aplicados os filtros: Região Norte, diagnóstico de COVID-19: Antígeno, PCR e Sorologia e idade gestacional: 1° ao 3° trimestre. 

O quesito diagnóstico da doença para este estudo seguiu as recomendações da ANVISA por meio da Resolução 766 de 18 de março de 2020, o qual dispõe sobre os testes diagnósticos para COVID-19. O teste padrão ouro é o RT-PCR que busca detectar RNA do vírus ainda nos primeiros dias de infecção, mesmo sem a presença de sintomas.  Existem também os testes sorológicos para a detecção de anticorpos IgA, IgG e IgM, indicado a partir do 8° dia desde o início dos sintomas (RAI et al., 2021).

Deve-se levar em consideração que existem outros testes para rastreio da COVID-19, sejam eles moleculares ou sorológicos, como o teste da amplificação isotérmica mediada por loop de transcrição reversa (RT-LAMP) e ensaio de imunoabsorção enzimática (ELISA), mas estes não foram disponibilizados de maneira massiva à população brasileira devido muito provavelmente ao seu custo, relativa eficiência e acurácia, além de necessidade de profissionais devidamente treinados. De modo que foram excluídos da avaliação do presente estudo as categorias de diagnóstico “Outros” e “Casos não-confirmados” (ANTUNES et al., 2015).

Considerou-se para o estudo como semana epidemiológica segundo convenção internacional as semanas de domingo a sábado. Dessa forma, as variáveis epidemiológicas da exposição coletadas foram: raça, escolaridade, momento gestacional, histórico de viagens, zona de residência, enquanto as variáveis de exposição correspondente a sintomatologia das usuárias foram: febre, tosse, dor de garganta, dispneia, desconforto respiratório, saturação, diarreia, vômito, dor abdominal, fadiga, perda de olfato, perda de paladar. Para a organização da triagem dos dados, foi feita a coleta deles em planilhas do Excel da Microsoft versão 2018, no qual foram criadas tabelas para representação dos resultados e posterior discussão (BRASIL, 2016).

Este estudo abordou a metodologia RECORD (Reporting of studies Conducted using Observational Routinely collected health Data), a qual utiliza um check list de 13 itens referentes ao Título, Resumo, Introdução, Método, Resultado, Discussão e outros dados do artigo. Quanto aos aspectos éticos desta pesquisa, não foi necessário a submissão para avaliação em Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) por utilizar dados secundários, sendo amparado juridicamente pela Resolução n° 466/12 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) (BENCHIMOL, 2015; BRASIL, 2012; CHEN et al., 2020).

3 RESULTADOS

No início da pandemia. o país enfrentou uma verdadeira crise no setor de saúde e, segundo pesquisadores do Boletim Extraordinário do Observatório Covid-19 Fiocruz, tratou-se do “maior colapso sanitário e hospitalar da história do Brasil”, perpassando desde mais de 4 mil óbitos diários, no dia 8 de abril de 2021, até a escassez de leitos e oxigênio em hospitais de diversos estados, com destaque para o Amazonas (MOURA et al., 2021; BRASIL, 2019).

Desta forma, analisando os resultados obtidos, o total de gestantes na região Norte foram 1329 distribuídas entre os anos 2020 e 2022 até a 12° semana epidemiológica, como representado no Gráfico 1 evidenciou-se que o ano de 2021 obteve o maior número de casos (54% deste quantitativo), seguido por 2022 em 4,2% e 2020 com 4%, segundo dados retirados do OOBr. 

Gráfico 1 : Casos de gestantes acometidas por COVID-19 na região Norte por ano, Belém, PA, Brasil, 2022.

Fonte: Dados do SIVEP-Gripe, 2022.

Em relação a sintomatologia apresentada pelas gestantes é possível observar que a tosse (71,3%) foi o sintoma mais recorrente, seguido de febre (63,4%) e dispneia (56,1%), e a dor abdominal (9,2%) foi menos recorrente, conforme é apresentado na Tabela 1.

Tabela 1 : Frequência das manifestações clínicas de gestantes acometidas por covid-19 entre março de 2020 a março de 2022 na região Norte, Belém, PA, Brasil, 2022

SINTOMASFREQUÊNCIA
Febre843
Tosse947
Dor de garganta503
Dispneia746
Desconforto Respiratório694
Hipóxia394
Diarreia158
Vômito176
Dor Abdominal122
Fadiga332
Perda Olfativa210
Perda de Paladar201

                                              Fonte: Dados do SIVEP-Gripe, 2022.

Já na Tabela 2 estão expostas as variáveis epidemiológicas desse grupo populacional encontradas no OOBr COVID-19. Quanto à classificação de cor e raça, a maior incidência consta em grávidas que se autodeclararam da cor parda com 1038, brancas com 120 casos, pretas com 57 casos, indígenas com 56 casos, e amarelas com menor número, apenas 11. No quesito escolaridade, observou-se maior frequência de gestantes acometidas pela doença com escolaridade até o Ensino Médio, seguido do Ensino Fundamental II. Na variável referente ao momento gestacional, sobressai o terceiro trimestre.

Tabela 2 : Variáveis epidemiológicas de gestantes acometidas por COVID-19 de março de 2020 a março de 2022 na região Norte. Belém, PA, Brasil, 2022.

Fonte: Dados do SIVEP-Gripe, 2022.

A coleta de dados no OOBr permitiu conhecer a zona de residência das gestantes, da qual destaca-se a zona urbana como mais frequente, enquanto a zona rural e periurbana foram menos identificadas, conforme o Gráfico 2, além de um percentual de 21,4% que precisavam viajar para outro município para receber atendimento.

Gráfico 2 : Zona de residência de precedência das gestantes acometidas por COVID-19 na região Norte. Belém, PA, Brasil, 2022

Fonte: Dados do SIVEP-Gripe, 2022.

Outrossim, segundo os dados coletados, o Zanamivir foi o antiviral mais utilizado no tratamento medicamentoso das gestantes infectadas pela COVID-19 na Região Norte. 

No que diz respeito aos estados da região com maior número de óbitos, destaca-se o Pará, seguido do estado do Amazonas. Já o Acre foi o que menos registrou óbitos maternos por COVID-19, visualizado no Gráfico 3.

Gráfico 3 : Casos de óbitos por COVID-19 em gestantes por Unidade Federativa da Região Norte de 2020 a 2022 até a 12° semana epidemiológica. Belém, PA, Brasil, 2022.

Fonte: Dados do SIVEP-Gripe, 2022.

4 DISCUSSÃO

Em vista de as grávidas pertencerem ao grupo de risco para a doença, percebeu-se a partir de intensas investigações que a infecção se modificou na maneira de acometimento no ciclo gravídico-puerperal, uma vez que, inicialmente, o cerne era direcionado apenas para as gestantes de risco obstétrico, pelo fato de o vírus atingir quanto à frequência e severidade da doença as mulheres grávidas e não grávidas de maneira igual. Porém, a partir de reavaliações, constatou-se que as gestantes possuem uma evolução para quadros moderados e graves mais velozes, indicando uma letalidade de 11,5%, em 2021, naquelas internadas. Seguindo essas proposições, as gestantes expostas ao SARS-CoV-2 apresentam maiores chances de progredirem a pré-eclâmpsia, admissão na UTI, parto prematuro, e maior índice de morbidade neonatal e perinatal grave, além da mortalidade materna e perinatal (BRASIL, 2012; CHEN et al., 2020).

Além de que se destaca que no início da pandemia, o Ministério da Saúde do Brasil estabeleceu como caso suspeito pessoas retornando de viagem internacional e/ou contato próximo com caso confirmado ou suspeito de COVID-19 em 14 dias, apresentando febre e pelo menos um sintoma respiratório sugestivo. Ademais, o caso era confirmado a partir de diagnóstico laboratorial-resultado positivo em RT-PCR conforme protocolo Charité- ou clínico epidemiológico em casos de contato próximo com infectado, apresentando febre ou pelo menos um sintoma respiratório em 14 dias. Esses nuances de diagnóstico tornaram a doença em um primeiro momento um grande desafio para a detecção, sobretudo, devido a sua similaridade com síndromes gripais e representa uma limitação para o enquadramento de casos deste estudo (FIOCRUZ, 2021; UNA-SUS, 2020).

Nesse sentido, em um contexto epidemiológico, muitos países apresentaram duas ou mais ondas da Covid-19, e ainda se fala em novos surtos. No que diz respeito ao Brasil, o segundo pico de casos da doença ocorreu entre novembro de 2020 até meados de abril de 2021, somando um total de 23 semanas epidemiológicas, assim como nos resultados desse estudo. Dessa forma, foram registrados 8.246.530 novos casos na segunda onda, sendo a média semanal de 358.545 e média semanal de óbitos 9.105 na população em geral. Para a realidade materna, o número de óbitos aumentou 2,0 vezes no grupo obstétrico com comorbidades e apenas 1,6 na população não-obstétrica com comorbidade de 2020 a 2021 (OPAS, 2022; RASMUSSEN et al., 2019).

Nesse sentido, associa-se os resultados desta pesquisa a outro estudo, no qual os sintomas mais comuns em gestantes também foram: febre e tosse. Eles também descreveram fadiga, dispneia, cefaleia, mialgia, diarreia, náuseas e vômitos em menor proporção. Chenobservou que no terceiro trimestre de gestação, manifestações clínicas como febre, tosse, mialgia, dor de garganta e mal-estar se assemelham aos sintomas de mulheres não grávidas. Além disso, em outra pesquisa, os primeiros sintomas apresentados por mulheres no terceiro trimestre gestacional foram: febre e tosse, seguido de diarreia (CHEN; ZHU, 2019; VEGA et al., 2020.

No que se refere à questão social, Silva em seu estudo sobre a COVID-19, afirma que a pandemia avançou mais entre as pessoas com baixo nível de escolaridade, pois, em geral, contraiam o vírus por meio do trabalho informal. Por consequência, repercutia diretamente em baixo nível de isolamento social ou na impossibilidade de cumprir a quarentena, assim, adoecendo e infectando pessoas de sua convivência (SILVA, 2021).

Na variável referente ao momento gestacional, os dados corroboram com o estudo de Rasmussen et al., no qual predominou a infecção por SARS-CoV-2 no terceiro trimestre. Destaca-se também o trabalho de Vega-Rojas et al., no qual foi possível identificar a prevalência da idade gestacional entre 33 e 38 semanas, especificamente (VEGA et al., 2020).

Associa-se a prevalência do terceiro trimestre gestacional entre as gestantes acometidas por COVID-19 com as modificações do organismo materno nesse período. Em relação ao sistema respiratório, é sabido que este sofre alterações funcionais e hormonais, as quais tornam a gestante menos resistente à hipóxia e mais suscetível a pneumonias virais. Além disso, há alterações anatômicas, que se referem a restrição que o crescimento uterino causa no diafragma, que corroboram para a diminuição da capacidade respiratória, principalmente no último trimestre (CHILIPIO-CHICLLA, 2020).

Relaciona-se a maior prevalência de casos no terceiro trimestre gestacional à restrição de acesso a serviços de saúde, dentre eles, a assistência pré-natal, configurando limitação na identificação de gestantes infectadas, principalmente, no começo da gestação. Ao que se refere a zona de residência, a grande notificação na área urbana se deve ao alto fluxo de pessoas e aglomerações, fato que favorece a contaminação pelo vírus (BRITO et al., 2021).

Em consonância com o presente trabalho, no estudo de De Brito et al.,a maior parte das gestantes estudadas também eram de zonas urbanas (85,19%). O medicamento mais utilizado segundo os registros avaliados (Zanamivir) é um tipo de inibidor da neuraminidase (NAI), o qual atua como seu próprio nome diz na inibição das proteínas virais, neuraminidases (NAs), encontradas na superfície viral, atuando no bloqueio da reprodução dos vírus por gemulação. Dessa forma, ele age inibindo a liberação do vírus a partir da célula hospedeira e propagação pelo trato respiratório. Este grupo de medicamentos é de uso muito comum na prática clínica para tratamento anti-influenza, sobretudo, as Influenzas A e B (FORMIGA; OROOJALIAN, 2020).

No que condiz à COVID-19, um estudo sugere que os inibidores da neuraminidase podem servir como intervenções direcionadas ao hospedeiro para atenuar a disfunção dos neutrófilos, já que uma das características imunológicas durante o quadro clínico infeccioso de SARS-CoV-2 é o aumento do nível de neutrófilos por linfócitos, além de formação de armadilhas extracelulares de neutrófilos (NETs), que exacerbam o processo inflamatório, através da situação de NETose (ZHANG et al., 2022).

Vale ressaltar que esse tipo de droga (principalmente, Oseltamivir, conhecido popularmente como Tamiflur) tem sido estudada em ensaios clínicos ainda em andamento para o combate do SARS-CoV-2. Além disso, o peramivir, outro fármaco da mesma classe, foi detectado em estudo de Zhang por ter impacto direto na diminuição da liberação de citocinas pró-inflamatórias de mau prognóstico (no fenômeno de tempestade de citocinas desencadeado pela doença em pacientes graves), podendo assim ser um agente candidato para a COVID-19 e outras doenças relacionadas com a Síndrome da Tempestade de Citocinas (FORMIGA et al., 2020).

O uso dessas drogas com frequência por pacientes com COVID-19, como foi demonstrado neste estudo para as grávidas na Região Norte para Zanamivir possivelmente se deve à semelhança dos sintomas da doença em destaque com síndromes gripais e o posterior diagnóstico dela, falta de informação sobre a doença ou atendimento profissional para melhoria da apresentação clínica do paciente. Deve-se levar em conta que atualmente, apesar de existir uma gama de opções terapêuticas para a doença e esse tipo de medicamento estar em investigação para este fim, não existem tratamentos específicos definidos para a COVID-19 (CASCELLA et al., 2022).

Contudo, segundo Scheler, na segunda onda da Covid-19, em 2021, houve um aumento expressivo de mortalidade materna em todos os estados brasileiros, sendo mais acentuado na região Norte, especialmente, nos estados do Amazonas e Roraima. O devido estudo do autor associa a alta mortalidade no estado do Amazonas, ao colapso de saúde na cidade Manaus, devido a intensidade da pandemia graças ao surgimento de uma variante do vírus mais transmissível nessa localidade (SCHELER et al., 2022).

A nível nacional, a região Norte e Nordeste obtiveram maiores números de óbitos em decorrência da fragilidade na assistência prestada pelas equipes de Unidade de Terapia Intensiva (UTI). A assistência nos Estados que não apresentam bom desenvolvimento repercutiu de forma negativa nos desfechos de diversos casos clínicos. Em virtude da falta de insumos, ausência de suporte de oxigênio para pacientes graves e a não adesão aos métodos farmacológicos para minimização das repercussões clínicas da COVID-19 ao paciente (GRASSELLI et al., 2020).

Segundo Lim, as altas taxas de mortalidade entre as gestantes está associado à falta de infraestrutura nas maternidades, destacando as que possuem vínculo com o Sistema Único de Saúde (SUS). Evidencia-se a presença de negligência por parte dos profissionais durante este período, dificultando o repasse de informações acerca dos cuidados para evitar a contaminação pelo SARS-CoV-2 e consequentemente prevenir complicações graves durante o período gestacional (DASHRAATH et al., 2019).

As contribuições deste presente estudo retratam conhecimentos sobre as peculiaridades da manifestação da COVID-19 nessa população de mulheres e incentiva novas pesquisas para o aprofundamento da temática. Dessa forma, novos estudos dos tipos ensaios clínicos, estudos de coorte, caso-controle, transversais, ecológicos, experimentais, relatos e séries de caso podem agir direcionados nas lacunas deste. No que tange as limitações, entende-se que na atualidade novas avaliações sobre o panorama estudado podem terem sido desenvolvidos, logo é um cenário passível de alterações.

5 CONCLUSÃO

A gravidez confere às mulheres alterações anatômicas e fisiológicas que interferem na funcionalidade de alguns sistemas do organismo, como é o caso do sistema respiratório, o principal afetado pelo vírus SARS-CoV-2.

O Brasil é um país continental, possuindo uma população heterogênea, os quais apresentam diferentes estados de saúde, atividades laborais, condições socioeconômicas diferentes e, foram expostas ao vírus de maneiras distintas. Diante disso, alguns aspectos foram evidenciados na presente pesquisa, na qual ressalta o Estado do Pará como protagonista em número de óbitos por COVID-19 em gestantes em relação à região Norte. Os sintomas mais apresentados foram tosse, febre e dispneia, afetando principalmente o terceiro trimestre gestacional.

A infecção pelo novo coronavírus manifesta, principalmente, quadros leves a moderados, no entanto, os casos graves e críticos em grupos de risco, como as mulheres grávidas precisam ser mais bem estudados e discutidos, uma vez que implicam em hospitalização e óbito. No Brasil, a pandemia causada pelo SARS-CoV-2 encontrou um cenário despreparado, implicando em elevadas taxas de mortalidade e escassez de materiais hospitalares, especialmente nas maternidades.

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