O PAPEL DO ENFERMEIRO NA PROMOÇÃO E ADESÃO AO CALENDÁRIO VACINAL: UMA REVISÃO INTEGRATIVA

THE NURSE’S ROLE IN PROMOTING AND ADHERENCE TO THE VACCINATION SCHEDULE: AN INTEGRATIVE REVIEW

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202504251631


Julia Bittencourt Bergmann1
Paloma Aguiar Pinheiro2
Sandra Priscilla Schindler3
Everson da Silva Souza4


Resumo

Este estudo tem como objetivo identificar ações e estratégias realizadas pelo enfermeiro para promover a adesão ao calendário vacinal na população brasileira. Trata-se de uma revisão integrativa da literatura, realizada entre os meses de março e abril de 2025, com busca nas bases de dados Scientific Electronic Library Online (SciELO), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Base de Dados de Enfermagem (BDENF), incluindo artigos publicados em português no período de 2020 a 2025. Foram selecionados oito estudos que relacionassem a atuação do profissional de enfermagem ao processo de imunização e ao aumento da cobertura vacinal. Os resultados evidenciaram a relevância de estratégias de busca ativa no processo de imunização, além da educação permanente e da comunicação qualificada como instrumentos no enfrentamento à hesitação vacinal e no combate à desinformação. Observou-se, ainda, fragilidades na estrutura e na gestão das salas de vacina, bem como lacunas na atuação direta do enfermeiro nesses espaços. Conclui-se que o enfermeiro exerce um papel fundamental no processo de imunização e que as estratégias de enfermagem voltadas à adesão vacinal devem considerar tanto aspectos estruturais e organizacionais quanto elementos de comunicação e fortalecimento do vínculo com a comunidade. Recomenda-se a elaboração de pesquisas mais aprofundadas correlacionando as intervenções em enfermagem com as taxas de cobertura vacinal, além de investimentos em formação continuada, sistemas informatizados e em recursos humanos, garantindo a participação ativa desses profissionais nas salas de vacinação.

Palavras-chave: Enfermeiro. Calendário de vacinação. Imunização. Estratégias de saúde.

1  INTRODUÇÃO

O Programa Nacional de Imunizações (PNI) consolida-se como uma das principais intervenções em saúde pública das últimas décadas (DOMINGUES et al., 2020). Estabelecido em 1973 e regulamentado em 1976, o PNI é responsável por organizar toda a política nacional de vacinação e atua com o objetivo de controle, erradicação e eliminação de doenças imunopreveníveis visando a redução da morbimortalidade por certos agravos (BRASIL, 2014).

Um dos fatores determinantes para o êxito do PNI no cumprimento de sua missão é a atuação da equipe de enfermagem, desde a formulação de estratégias até a implementação de ações nos serviços de saúde (DOMINGUES et al, 2020; OLIVEIRA et al, 2021). Nesse contexto, Queiroz (2009) destaca que o enfermeiro exerce papel fundamental na área de imunização, uma vez que responde pelos aspectos administrativos e técnicos das salas de vacinação. Mais do que isso, é responsável pela supervisão do trabalho desenvolvido nesses espaços, assim como pelo processo de educação permanente da equipe envolvida (BRASIL, 2014).

Apesar da ampla disponibilidade de imunobiológicos no país, destacando o Brasil em nível internacional conforme Domingues & Teixeira (2013), a adesão ao calendário vacinal ainda enfrenta desafios, como a hesitação vacinal e a disseminação de informações falsas (MORAIS et al., 2021). Esses problemas, além do prejuízo que exercem sobre os índices de cobertura vacinal, contribuem para a perpetuação de doenças imunopreveníveis e para o ressurgimento de outras anteriormente consideradas erradicadas (MORAIS et al., 2021).

Estudo realizado pela Confederação Nacional de Municípios (CFM, 2024) apontou que a média de cobertura vacinal para crianças com até cinco anos de idade atingiu o patamar de 66,2% no ano de 2023, refletindo uma redução de 21% em relação à cobertura média do ano de 2014 (83,8%). O estudo ainda mostra que, embora os menores níveis dos últimos 10 anos foram registrados na vigência da pandemia de Covid-19 (63,3% em 2021), a cobertura vacinal vem em uma decrescente desde o ano de 2016, sendo apontada a baixa conscientização da população sobre a importância da vacinação como um dos principais motivos (CFM, 2024).

Diante desse cenário, é fundamental a adoção de estratégias que reforcem a confiança da população nas vacinas, fortaleçam a comunicação em saúde e garantam o acesso equitativo aos serviços de imunização. O enfermeiro destaca-se como agente apto a estabelecer estratégias eficazes de educação, comunicação e de combate à desinformação (SANTOS et al., 2021). Nesse contexto, também é papel do enfermeiro promover, junto à equipe, uma educação continuada e permanente, assegurando que as melhores evidências científicas sejam incorporadas às práticas de imunização, conferindo maior segurança à população (SANTOS et al., 2021).

Complementando as estratégias de comunicação e de educação permanente, a presença ativa do enfermeiro é indispensável para o funcionamento eficiente das salas de vacinação (OLIVEIRA et al., 2013; RIBEIRO, MELO & TAVARES, 2017). Através da atuação direta ou supervisão das atividades de administração, conservação e controle dos imunobiológicos, assim como do acompanhamento aos eventos adversos pós-vacinação e do registro das doses aplicadas e gestão dos dados de vacinação, o enfermeiro atua como garantidor da qualidade, segurança e eficácia do processo de imunização (SANTOS et al., 2021).

Diante dos desafios persistentes na adesão ao calendário vacinal e da redução das taxas de vacinação, intensificada com a pandemia de COVID-19, torna-se imperativo sistematizar as evidências científicas sobre as estratégias lideradas por enfermeiros para reverter esse cenário. Embora existam estudos pontuais sobre a atuação desses profissionais em salas de vacina, faltam revisões integrativas que consolidem as evidências disponíveis, especialmente no que diz respeito às estratégias adotadas além das salas de vacinação para promoção do calendário vacinal e combate à hesitação vacinal.

Para responder nossa indagação acerca do tema, elaboramos a seguinte pergunta de pesquisa: “Quais são as principais ações e estratégias adotadas pelo enfermeiro para promoção e adesão do calendário vacinal na população brasileira?”.

Portanto, esta revisão integrativa tem como objetivo sintetizar e analisar as evidências disponíveis sobre o papel do enfermeiro na promoção e adesão ao calendário vacinal, identificando práticas eficazes de enfermagem e os principais desafios enfrentados. A escolha pelo método de revisão integrativa justifica-se pela necessidade de síntese abrangente que englobe diferentes tipos de estudos, permitindo uma visão holística do tema.

2  METODOLOGIA 

O presente estudo trata-se de uma revisão integrativa da literatura, que tem como objetivo identificar e analisar a produção científica relacionada a determinado problema ou assunto (BOTELHO, CUNHA & MACEDO, 2011). Através desta, busca-se por meio de outros estudos já publicados ampliar as informações sobre o tema: “O papel do enfermeiro na promoção e adesão ao calendário vacinal”.

Esta revisão seguiu a metodologia proposta por Whittemore & Knafl (2005), que compreende as etapas de formulação do problema; definição dos critérios de inclusão e exclusão; coleta de dados; análise crítica dos estudos; interpretação dos resultados; e apresentação da revisão. 

Como pergunta norteadora para este estudo, buscou-se identificar quais são as principais ações e estratégias adotadas pelo enfermeiro para promoção e adesão do calendário vacinal na população brasileira.

As buscas foram realizadas entre os meses de março e abril de 2025, nas bases de dados Scientific Electronic Library Online (SciELO), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Base de Dados de Enfermagem (BDENF).

Utilizaram-se os seguintes Descritores em Ciências da Saúde (DeCS): “Enfermagem”, “Enfermeiro”, “Vacinação”, “Coberturas Vacinais”, “Imunização” e “Calendário de Vacinação”, combinados com os operadores booleanos “AND” e “OR”.

Os critérios de inclusão adotados consideraram artigos disponíveis nas bibliotecas eletrônicas supracitadas, publicados no período de 2020 a 2025, no idioma português, que tivessem relação com os descritores selecionados. Foram excluídos os artigos duplicados e aqueles que possuíssem alguma restrição de acesso, assim como monografias, revisões, cartas ao editor, editoriais e estudos que não abordassem diretamente o tema proposto ou não respondessem à pergunta norteadora.

A seleção dos artigos foi realizada em duas etapas. Inicialmente foi feita uma triagem a partir dos títulos e resumos de modo a verificar a aderência ao tema, selecionado aqueles que atenderam aos critérios de inclusão para leitura completa. Na segunda etapa, os artigos completos foram avaliados de acordo com a relevância para atingir os objetivos deste estudo. 

Os dados extraídos dos artigos selecionados foram organizados através de um quadro síntese contendo: autores, ano de publicação, título, periódico, tipo de estudo e objetivo. Por fim, estes artigos foram analisados e interpretados, o que permitiu a realização da discussão dos resultados.  

3  RESULTADOS

A busca inicial nas bases de dados através dos descritores controlados DeCS resultou em 1.132 artigos, distribuídos da seguinte forma: SciELO (372), LILACS (402) e BDENF (358). 

Após aplicação dos critérios de inclusão relacionados ao período de publicação e ao idioma, foram selecionados 264 artigos, sendo SciELO (78), LILACS (94) e BDENF (92). 

Em seguida, aplicaram-se os critérios de exclusão, os quais permitiram a remoção de 89 artigos duplicados, 2 artigos com restrição de acesso (total e/ou parcial) e 12 estudos pertencentes a outros gêneros de produção científica.

A partir dos 161 estudos restantes, realizou-se a triagem por título e resumo, a qual resultou na exclusão de 127 artigos por ausência de pertinência temática. Dessa forma, restaram selecionados 34 artigos para leitura na íntegra.

Após a leitura completa, 26 estudos foram excluídos por não abordarem diretamente a questão de pesquisa, de forma que 8 artigos compuseram a amostra final desta revisão integrativa.

A sequência destas etapas é ilustrada na Figura 1 por meio da adaptação do modelo de fluxograma PRISMA (GALVÃO, TIGUMAN & SARKIS-ONOFRE 2022), elaborado pelas autoras.

Figura 1 – Fluxograma PRISMA adaptado para as etapas da revisão integrativa

Fonte: das autoras

Utilizou-se um quadro resumo (Quadro 1) para sintetizar as principais informações dos estudos selecionados, tais como:  autores, ano de publicação, título, periódico, tipo de estudo e objetivo. Além disso, os artigos foram enumerados na coluna “ID” com o intuito de facilitar a posterior análise e identificação durante as etapas.

Quadro 1 – Síntese dos estudos selecionados para revisão integrativa

IDAutor/Ano de PublicaçãoTítulo do ArtigoPeriódicoTipo de EstudoObjetivo
1Campos et al., 2023Oportunidades de abordagens sobre imunização durante o atendimento à demanda espontâneaArquivos de Ciências da Saúde da UNIPAREstudo qualitativo, descritivo e transversalExaminar sob a perspectiva de enfermeiros de duas UBSs com diferentes modelos de agendamento a discussão da imunização durante atendimentos sem agendamento prévio
2Duarte et al., 2021Aspectos organizacionais e uma agenda para o acesso à vacinação sob a ótica do usuárioTexto &ContextoEnfermagemEstudo de casos múltiplos  holístico-qualitativoCompreender o acesso à vacinação e os seus aspectos organizacionais no cotidiano da Atenção Primária à Saúde sob a ótica do usuário
3Duarte et al., 2020Vacinação como demanda programada: vivências cotidianas de usuáriosRevista Brasileira de EnfermagemEstudo de casos múltiplos, holístico-qualitativo Compreender a vacinação como uma demanda programada e o acesso a essa demanda no cotidiano dos serviços de saúde, sob a ótica dos usuários
4Ferreira et al., 2021Análise da situação vacinal de idososRevista da Escola de Enfermagem da USPEstudo transversal e analíticoDescrever as características sociodemográficas, a capacidade funcional e a situação vacinal de idosos, e verificar os fatores associados à situação vacinal incompleta e a ausência do cartão de vacinas
5Frugoli et al., 2021Fake news sobre vacinas: uma análise sob o modelo dos 3Cs da Organização Mundial da SaúdeRevista da Escola de Enfermagem da USPPesquisa qualitativa exploratóriaAnalisar as fake news sobre imunobiológicos tomando como referência a hesitação vacinal no modelo dos 3Cs (confiança, complacência e conveniência) da OMS
6Maciel et al., 2023Implementação da Prática Avançada de Enfermagem no enfrentamento do atraso vacinal: um relato de experiênciaOnline Brazilian Journal of NursingRelato de experiênciaDescrever a implementação de práticas avançadas de enfermagem para abordar o atraso na imunização em crianças menores de dois anos de idade
7Silva et al., 2020Imunização: OConhecimento e práticas dosprofissionais de enfermagem na sala de vacinaRevista NursingPesquisa qualitativa exploratóriaIdentificar o conhecimento e práticas dos profissionais que atuam na sala de imunização na Estratégia de Saúde da Família
8Vieira et al., 2021Cobertura vacinal da Penta valente e da Estratégia de Saúde da Família*Revista de Enfermagem da UFSMEstudo epidemiológico observacionalAvaliar a cobertura vacinal da Penta valente em menores de um ano nas regiões e capitais brasileiras e a cobertura da Estratégia de Saúde da Família (ESF)

Fonte: das autoras

Os oito estudos incluídos na amostra final foram publicados majoritariamente entre 2020 e 2021 (75%), com predominância de abordagens qualitativas, especialmente do tipo exploratória, e estudos de casos múltiplos. 

Os principais temas abordados no contexto da pergunta norteadora deste estudo envolveram estratégias de busca ativa, ações educativas, enfrentamento à desinformação e organização das salas de vacinação, com ênfase no papel do enfermeiro como articulador das ações de imunização. 

Evidenciou-se a relevância da educação permanente e da comunicação qualificada como instrumentos no enfrentamento à hesitação vacinal e na promoção da adesão ao calendário vacinal. Observou-se, ainda, fragilidades na estrutura e na gestão das salas de vacina, bem como lacunas na atuação direta do enfermeiro nesses espaços. 

Esses achados indicam que as estratégias de enfermagem voltadas à adesão vacinal devem considerar tanto aspectos estruturais e organizacionais quanto elementos de comunicação e fortalecimento do vínculo com a comunidade.

4  DISCUSSÃO

Esta revisão integrativa, que buscou identificar as principais ações e estratégias do enfermeiro na promoção e adesão ao calendário vacinal na população brasileira, reuniu oito estudos publicados entre 2020 e 2024. Os resultados desta análise convergem para a atuação do profissional de enfermagem em quatro eixos principais: estratégias de busca ativa, ações educativas em saúde, enfrentamento à desinformação e a organização das salas de vacinação. Em todos esses eixos, o enfermeiro se destaca como um articulador fundamental para o sucesso das ações de imunização (CAMPOS et al., 2024; MACIEL et al., 2023; SILVA et al., 2020; VIEIRA et al., 2021).

A relevância das estratégias de busca ativa para aprimorar a cobertura vacinal é amplamente sustentada pelas evidências dos estudos (CAMPOS et al., 2024; MACIEL et al., 2023). A abordagem do usuário durante o atendimento à demanda espontânea representa uma das principais estratégias para mitigar as Oportunidades Perdidas de Vacinação (OPVs), sendo um momento crucial para identificar indivíduos que possam estar com o esquema vacinal incompleto (CAMPOS et al., 2024). Em vez de esperar que os usuários procurem especificamente pela vacinação, os profissionais de saúde, especialmente os enfermeiros, podem aproveitar o contato inicial por qualquer motivo de saúde para verificar o status vacinal do usuário (CAMPOS et al., 2024; DUARTE et al., 2020).

Enfatiza-se, entretanto, que para potencializar e garantir o aproveitamento de todas as oportunidades de imunização, toda a equipe de saúde deve estar engajada e comprometida na verificação vacinal, encaminhando o usuário à sala de vacinação sempre que necessário, mesmo que a procura inicial pelo serviço tenha ocorrido por outra finalidade (DUARTE et al., 2020). Nesse sentido, é fundamental a articulação de estratégias entre a equipe de enfermagem e os agentes comunitários de saúde (ACS), seja na realização de visitas domiciliares (CAMPOS et al., 2024; MACIEL et al., 2023) ou então na busca pelo paciente através do contato telefônico (MACIEL et al., 2023). 

A educação em saúde emerge como um pilar fundamental para impulsionar a adesão vacinal, conforme destacado em múltiplos estudos (CAMPOS et al., 2024; DUARTE et al., 2020; MACIEL et al., 2023; VIEIRA et al., 2021). Ações educativas direcionadas aos usuários abrangem a disseminação de informações sobre a relevância da imunização em todas as fases da vida, desde a infância até a idade adulta (CAMPOS et al., 2024; DUARTE et al., 2020; MACIEL et al., 2023). Essas orientações não devem se restringir às consultas de enfermagem, podendo ser abordadas em quaisquer outros espaços das Unidades Básicas de Saúde (UBS) (DUARTE et al., 2020; MACIEL et al., 2023). Nesse contexto, os estudos de Campos et al. (2024) e Frugoli et al. (2021) enfatizam que essa educação deve ir além da simples informação sobre o calendário vacinal, buscando explicar o motivo e a importância de cada imunobiológico, assim como os eventos adversos esperados.

A efetividade das ações educativas é amplificada pela utilização de diversos recursos e abordagens. Dentre estes, a realização de campanhas de vacinação e o uso de plataformas digitais para agendamento e acompanhamento são exemplos de ações que visam facilitar o acesso à vacinação (MACIEL et al., 2023; VIEIRA et al., 2021). Adicionalmente, a realização de atividades extramuros de conscientização na comunidade e no ambiente escolar permitem alcançar um público mais amplo e ajudam a reforçar o papel educativo da enfermagem (CAMPOS et al., 2024; MACIEL et al., 2023). Os enfermeiros ganham destaque diante destas ações, visto que frequentemente lideram ou participam ativamente dessas iniciativas.

Insere-se nesse contexto, ainda, a comunicação qualificada e a prática da escuta ativa pelos profissionais de enfermagem. Enquanto a primeira fortalece o vínculo de confiança com o paciente, criando um ambiente saudável de diálogo para dirimir dúvidas, medos e receios relacionados à vacinação (DUARTE et al., 2021; CAMPOS et al., 2024); a segunda, por sua vez, permite aos profissionais compreenderem as motivações por trás da não adesão vacinal. Essas habilidades são fundamentais no arcabouço de ferramentas do enfermeiro a fim de realizar um planejamento mais assertivo e eficaz de ações educativas, que considerem as necessidades e particularidades de cada indivíduo, contribuindo para o aumento das coberturas vacinais (CAMPOS et al., 2024).

O enfrentamento à desinformação, que está ligado às iniciativas educativas conduzidas pelos profissionais de enfermagem e à comunicação clara e acessível de informações verídicas, constitui uma barreira contemporânea que impacta diretamente a adesão vacinal (FRUGOLI et al., 2021; VIEIRA et al., 2021). Em seus trabalhos, Frugoli et al. (2021) e Vieira et al. (2021) alertam que a disseminação de fake news sobre imunobiológicos colaboram para um ambiente de desconfiança por parte dos usuários, assim como reforçam movimentos antivacina na população.

Exige-se, dessa forma, um posicionamento ativo dos profissionais de enfermagem no combate às informações falsas, o que deve ocorrer por meio de sólido conhecimento técnico e orientação completa ao paciente acerca dos imunobiológicos (FRUGOLI et al., 2021; VIEIRA et al., 2021). A capacitação em saúde, diante desse cenário, contribui na preparação desses profissionais para comunicar de forma clara e acessível acerca da segurança e importância do processo de imunização (FRUGOLI et al., 2021). Ao se manterem atualizados sobre as evidências científicas e ao utilizarem estratégias de comunicação eficazes, os enfermeiros auxiliam a população a discernir informações confiáveis de enganosas.

A organização das salas de vacinação é um fator determinante para o acesso e a qualidade dos serviços de imunização (CAMPOS et al., 2024; DUARTE et al., 2021; SILVA et al., 2020). A falta de um ambiente adequado e de recursos suficientes dificulta o fluxo de atendimento, impactando negativamente a experiência do usuário, o que se reflete na efetividade da cobertura vacinal (DUARTE et al., 2021).

Nesse panorama, intensifica-se a necessidade de uma supervisão adequada e da presença do enfermeiro como responsável técnico na sala de vacinação (SILVA et al., 2020; VIEIRA et al., 2021). Esse profissional é fundamental para garantir a segurança dos procedimentos (conservação, manipulação e administração dos imunobiológicos), além da atualização dos conhecimentos da equipe em relação às modificações e diretrizes do Programa Nacional de Imunizações (PNI) (SILVA et al., 2020; VIEIRA et al., 2021; DUARTE et al., 2021). Mais do que isso, a presença do enfermeiro junto às salas de vacinação deve colaborar para o registro correto das doses administradas e para o agendamento das doses subsequentes, permitindo a identificação de usuários faltosos e casos de atraso vacinal, assim como a intervenção por parte desses profissionais de modo a assegurar a continuidade dos esquemas de imunização (DUARTE et al., 2021; MACIEL et al., 2023).

O papel do enfermeiro como articulador das ações de imunização perpassa os temas destacados. Esse profissional, como líder da equipe de enfermagem e elo entre o serviço e o usuário, destaca-se na implementação e no monitoramento das estratégias de promoção e adesão vacinal (SILVA et al., 2020; VIEIRA et al., 2021). Além disso, é peça-chave na educação permanente dentro da UBS, abrangendo principalmente a atualização de conhecimentos envolvendo técnicos de enfermagem e agentes comunitários de saúde acerca das melhores práticas em imunização. 

Os desafios enfrentados pelo enfermeiro no processo de imunização giram em torno da sobrecarga de atividades dentro da UBS impedindo uma maior dedicação à sala de vacinação (SILVA et al., 2021); da subutilização de sistemas informatizados para registro vacinal associada à ausência da caderneta vacinal por parte dos usuários em consultas convencionais na unidade (DUARTE et al., 2020; CAMPOS et al., 2024); da falta de engajamento de toda a equipe atuante na Atenção Primária de Saúde (DUARTE et al., 2020); da ascensão do movimento antivacina e os diversos motivos que levam à hesitação vacinal pelos usuários (FRUGOLI et al., 2021; VIEIRA et al., 2021); e da limitação de horários e/ou restrição de acesso às salas de vacinação devido à organização da UBS ou inadequada estrutura física desses espaços (DUARTE et al., 2021).

5  CONCLUSÃO

Ao analisarmos a literatura, fica evidente que o papel do enfermeiro na promoção e adesão ao calendário vacinal vai muito além de sua atuação nas salas de vacinas. É preciso considerar um conjunto amplo de ações que abrangem desde a educação permanente em saúde, até a realização de ações de busca ativa e a comunicação clara e acessível com os usuários. As estratégias analisadas colaboram para a ampliação das coberturas vacinais e para a consolidação das políticas de imunização.

As evidências reunidas reforçam que o enfermeiro é um agente essencial na implementação de iniciativas que potencializam as coberturas vacinais, tais como a verificação do status vacinal durante o atendimento a demandas espontâneas na UBS, a realização de ações extramuros, a disseminação de informações claras sobre vacinação e a capacitação da equipe de saúde sobre o tema. Essas ações se traduzem em avanços na política de imunização, especialmente em cenários de hesitação vacinal, muitas vezes alimentados pela propagação de fake news, teorias conspiracionistas e movimentos antivacina, sobretudo após a pandemia de COVID-19. Acreditamos que a chave para combater a desinformação seja o diálogo aberto e a construção de uma relação de confiança com a comunidade, o que é uma vantagem deste profissional, haja vista sua proximidade à população alvo.

Embora esta revisão tenha reunido estudos relevantes publicados entre 2020 e 2024, verificaram-se algumas limitações, como a escassez de estudos quantitativos acerca dos benefícios de estratégias adotadas, assim como a avaliação dessas no longo prazo. Além disso, faltam evidências sobre o baixo aproveitamento de sistemas informatizados para acompanhamento individualizado do paciente e sobre os impactos do uso de tecnologias digitais nas coberturas vacinais. Tais lacunas sugerem a necessidade de pesquisas que quantifiquem o custo-efetividade das ações de enfermagem em relação aos índices de coberturas vacinais, assim como de estudos comparativos entre distintas abordagens educativas, a fim de fortalecer a prática baseada em evidências.

Diante dos resultados apresentados, recomenda-se o fortalecimento das ações de capacitação contínua para os enfermeiros, assim como o investimento em sistemas informatizados para facilitar o acompanhamento vacinal. Ademais, é necessário um trabalho em sintonia de toda a equipe de saúde para potencializar as ações de busca ativa e o enfrentamento à desinformação. 

Reitera-se, assim, a relevância do enfermeiro como peça-chave na promoção da imunização, contribuindo diretamente para o fortalecimento das políticas públicas e para a proteção da saúde coletiva no país. Sua atuação dentro das estratégias apresentadas permite elevar as taxas de adesão vacinal, reforçando a necessidade de investimentos em capacitação contínua, tecnologias digitais e em recursos humanos, permitindo uma presença mais ativa desse profissional nas salas de vacinação. Afinal, a vacinação é um direito de todos e um dever do Estado, sendo essencial para proteger a população contra doenças imunopreveníveis e contribuir para evitar surtos de doenças já erradicadas.

REFERÊNCIAS

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1 Discente do Curso Superior de Enfermagem da Universidade do Sul de Santa Catarina Campus Florianópolis Centro. E-mail: juliabittencourtbergmann@gmail.com
2 Discente do Curso Superior de Enfermagem da Universidade do Sul de Santa Catarina Campus Florianópolis Centro. E-mail: palomaap@hotmail.com
3 Discente do Curso Superior de Enfermagem da Universidade do Sul de Santa Catarina Campus Florianópolis Centro. E-mail: spschindler91@gmail.com
4 Docente do Curso Superior de Enfermagem da Universidade do Sul de Santa Catarina Campus Tubarão. Mestre em Ciências da Saúde pela Universidade do Sul de Santa Catarina. E-mail: everson.souza1@ulife.com.br