O LIMITE DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO NAS MÍDIAS SOCIAIS À LUZ DA CRIMINALIZAÇÃO DAS FAKES NEWS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10227514


Sales, Erivaldo Souza1
Souza, Yuri Lima De2
Ibiapina, Giselle Karolina Gomes Freitas3
Santos, Jane Karla De Oliveira4


RESUMO

Em virtude do surgimento da sociedade informacional, que começa a ditar comportamentos, formas de comunicação, relacionamentos entre as pessoas, forma de consumo, ou seja, a vida em si, gerando consequências principalmente no que diz respeito a garantia dos direitos, como a liberdade de expressão e a privacidade no ambiente virtual, daí então surgiram discussões sobre os limites de liberdade de expressão. Esta pesquisa tem como objetivo geral analisar o limite da liberdade de expressão nas redes sociais no contexto da criminalização das fake news à luz do ordenamento jurídico brasileiro. O trabalho trata da questão de como lidar com os direitos de expressão, de forma a não o ferir, ocorrendo um controle de divulgação de notícias, que podem ser fakesnews. É trabalhado também a questão das fakesnewsno âmbito jurídico, levando-se em consideração como a legislação brasileira está reagindo aos problemas ocorridos nas redes sociais. E ainda é apresentado as consequências causadas pelas fake news no âmbito social, político e jurídico e apresentação de algumas sugestões de possíveis soluções para esses problemas. Ao fim do trabalho conclui-se que o objetivo principal foi atingido, pois respondeu a todos os questionamentos referentes às consequências das fakenewsem todos os âmbitos da sociedade. Entendeu-se, ainda, que a liberdade de expressão, assim como os demais direitos fundamentais, não é um direito absoluto, e é cabível limites sempre que esse se apresentar de forma incompatível com o direito à honra, à imagem, à privacidade e a dignidade da pessoa humana.

Palavras-chave: FakeNews; Liberdade de Expressão; Redes Sociais; Criminalização; Direitos Fundamentais.

ABSTRACT

Due to the emergence of the informational society, which begins to dictate behaviors, forms of communication, relationships between people, forms of consumption, that is, life itself, generating consequences mainly with regard to guaranteeing rights, such as freedom of expression and privacy in the virtual environment, then discussions arose about the limits of freedom of expression. This research has the general objective of analyzing the limits of freedom of expression on social networks in the context of the criminalization of fake news in light of the Brazilian legal system. The work addresses the issue of how to deal with the rights of expression, so as not to harm them, controlling the dissemination of news, which may be fakenews. The issue of fakenewsis also worked on in the legal sphere, taking into account how Brazilian legislation is reacting to problems occurring on social networks. It also presents the consequences caused by fake news in the social, political and legal spheres and presents some suggestions for possible solutions to these problems. At the end of the work, it was concluded that the main objective was achieved, as it answered all questions regarding the consequences of fake news in all areas of society. It was also understood that freedom of expression, like other fundamental rights, is not an absolute right, and limits are applicable whenever this is presented in a way that is incompatible with the right to honor, image, privacy and dignity of human person.

Keywords: FakeNews; Freedom of expression; Social media; Criminalization; Fundamental rights.

INTRODUÇÃO

A atualidade está marcada por muitas mudanças, em todos os cenários, inclusive quando se trata de comunicação e aí cita-se as interações realizadas através das tecnologias, em especial, a internet. Essas interações diminuíram muito a distância entre as pessoas, assim como também acelerou a velocidade da comunicação entre elas. No entanto, é necessário ter cuidado com as violações que podem ocorrer e os direitos constitucionais que podem ser feridos ou não respeitado, por conta da velocidade e da quantidade das informações.

Surge assim um ativismo digital em destaque, em que o uso das ferramentas digitais passa a fazer parte da rotina das pessoas. Emerge, portanto, a sociedade informacional na qual a informação e o conhecimento estão no centro de tudo. Com base nessas informações pode-se afirmar que a internet é a protagonista dessa sociedade informacional, pois o mundo virtual tornou-se uma continuidade da vida real, e, consequentemente, muitos conflitos ocorrem como acontece também no ambiente não virtual. Dessa maneira, é comum que ocorra colisão dos direitos fundamentais no ambiente virtual, mais ainda quando se refere a liberdade de expressão e direitos de personalidade.

O presente estudo tem uma grande relevância para a sociedade, para que percebam a proliferação desordenada deste tipo de (des)informação. Na sociedade contemporânea, isso ganha contornos catastróficos, sobretudo, atrelado ao campo cada vez mais fértil das redes sociais, que tem no seu manuseio pessoas sedentas pelo protagonismo de postagens, seja como produtoras deste conteúdo, seja como meras compartilhadoras e conhecedoras de seus direitos, um dos quais o consagrado pelo art. 5º, IX, da Constituição Federal de 1988, que dispõe sobre a liberdade de expressão.

A escolha do tema apresentado encontra justificativa no fato de serem hoje as fakenews um dos principais temas em debate na atualidade, em que a divulgação em massa deste tipo de conteúdo pode vir a desequilibrar uma disputa eleitoral, no sentido político; pode acabar com a credibilidade de meios de comunicação, no âmbito jornalístico; e é objeto de discussão na academia, congressos e simpósios, em relação ao Direito, vindo até mesmo a surgir manifestações sobre a possibilidade de criação de normas para seu maior controle.

Um dos grandes problemas é que a incontrolável velocidade de compartilhamentos tem tornado a individualização das condutas uma tarefa extremante árdua. Essa individualização seria de extrema relevância tendo em vista que se tem, preliminarmente, dois tipos de condutas, quais sejam: a criação da notícia falsa e o seu compartilhamento.

Outro importante destaque está relacionado ao fato de que muito embora muitos possam ao replicar um conteúdo com esta pecha de notícia falsa, fazer em nome daquele princípio do princípio da liberdade de expressão, as fakes news são notícias falsas e não encontram guarida nas garantias fundamentais. Em contrapartida, o cerceamento das manifestações também não pode ser tão rígido a ponto de fazer alguém perder sua liberdade para expressar sua posição.

Dentro deste espectro, outra abordagem se faz necessária em relação aos princípios colidentes. O estudo possibilitou fixar a posição de que eles se harmonizam e circunstancialmente se sobrepõem um ao outro somente em situações de extrema necessidade, considerando o caso em concreto, porém sem jamais extinguir um deles. Logo, liberdade de expressão vem se harmonizar com a dignidade da pessoa humana, um não podendo extirpar o outro. Este trabalho, além de possuir um papel cientifico importantíssimo, possui também toda uma questão social quando se refere a defender a garantia dos direitos fundamentais nesse mundo digital, em que muitas vezes a noção do privado e do individual se perde um pouco.

É cediço que estratégia principal ao se indagar acerca de uma criminalização das fake news engloba não somente a proteção da vítima como indivíduo, mas subsidiariamente a sociedade, isso porque, há casos em que, embora direcionadas contra alguém, podem vir a implicar em toda estrutura social, podendo influir na conduta de vários indivíduos.

O trabalho em tela tem como objetivo geral analisar o limite da liberdade de expressão nas redes sociais no contexto da criminalização das fake news à luz do ordenamento jurídico brasileiro. E como objetivos específicos: evidenciar a colisão entre direitos fundamentais nas redes sociais; entender as fakes news no âmbito do direito penal; e analisar as consequências jurídicas, sociais e políticas das fakenews, bem como as possíveis soluções para a problemática.

O estudo foi elaborado pelo procedimento de pesquisa bibliográfica, a partir do conhecimento de pesquisas já realizadas, visualizando as concepções de autores sobre o tema investigado, quais sejam, Leite, Nucci, Jesus dentre outros. A vantagem da pesquisa bibliográfica está na possibilidade do pesquisador abranger uma maior gama de fenômenos do que aquela que seria possível na pesquisa de campo. O papel do pesquisador neste tipo de pesquisa é coletar dados e informações nas mais diversas fontes bibliográficas existentes, buscando formar seu convencimento no que atine ao assunto.

Em relação à abordagem, trata-se de pesquisa de natureza qualitativa visto que tem como intento gerar conhecimento dirigido à solução de problemas específicos. No tocante aos objetivos, a pesquisa em caráter exploratório, com o propósito de adquirir dados e esclarecimentos, além de proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a constituir hipóteses.

Sendo assim, no presente trabalho, aborda-se na primeira seção a questão das fakes news e o direito penal, como está essa relação, como a legislação brasileira vem lidando com esse problema. Demonstra-se também que, através da internet, o espaço das informações e dos acontecimentos tornaram-se mundiais, pois tudo que acontece é informado em tempo real para todo o mundo. Desse modo, trata-se a criminalização das fakenews, ou seja, o que pode ou não pode, o que realmente está infringido a lei e como saber disso.

Na segunda seção trata-se do confronto entre o Princípio da liberdade de expressão com a privacidade, pois no ambiente virtual a privacidade é violada constantemente. Na terceira seção apresenta-se as consequências políticas, sociais e jurídicas que podem surgir a partir da criação e divulgação das fakenews, bem como aborda-se sobre as possíveis soluções para a problemática.

2. FAKENEWS E O DIREITO PENAL

No que diz respeito a crime no ordenamento jurídico brasileiro é preciso ter o conhecimento do que realmente é bem jurídico tutelado e com base nisso conhecer os critérios de limitação. É necessário fazer um breve histórico sobre delimitação crítica da intervenção penal, para compreender a complexidade dessa questão. No Brasil, quando se refere a Direito Penal, Capez (2017, p.91) afirma que “não há crime quando a conduta não tiver oferecido ao menos um perigo concreto, real, efetivo e comprovado de lesão ao bem jurídico”.

Roxin (2009, p.12) ainda faz uma análise sobre o que pode ser ou não penalizado, quando diz que:

[… ] o critério ‘comportamento’ e sua qualidade devem ser considerados, visto que esse ponto sempre será um problema central não somente para o legislador quanto para a Ciência do Direito Penal, para se dizer o que deve ser penalizado ou não pelo Estado. Porém, a penalização de um comportamento vai além da discricionariedade do legislador, necessitando assim de uma legitimação maior, não podendo esse penalizar algo porque não gosta.

Os bens jurídicos são criados pela Constituição Federal e não pela legislação penal. Zaffaroni (2010) afirma que a legislação penal pode estabelecer delitos que violem de alguma maneira um interesse legalmente protegido, conferindo assim ao sistema penal a responsabilidade de resguardar o bem jurídico já reconhecido. Nesse contexto, cabe ao sistema penal a imposição de uma “sanção” para situações específicas claramente definidas e isoladas, mesmo quando isso decorre de uma obrigação constitucional imperativa.

Capez (2017, 70) diz que “O Direito Penal então pode ser entendido “como um conjunto normativo destinado à tutela de bens jurídicos, isto é, de relações sociais conflitivas valoradas positivamente na sociedade democrática”. Dessa maneira pode- se afirmar que fica designado uma intervenção do direito penal somente se houver um atentado verdadeiro a um bem jurídico, que possa a vir a ter uma afetação por mínimo que seja.

Nucci (2018, p.3, grifo do autor) no que se refere a Direito Penal apresenta a seguinte informação baseada em suas pesquisas:

[…] É o conjunto de normas jurídicas voltado à fixação dos limites do poder punitivo do Estado, instituindo infrações penais e as sanções correspondentes, bem como regras atinentes à sua aplicação. Embora a sua definição se concentre nos limitesdo poder punitivo, significando um enfoque voltado ao Direito Penal Democrático, não se há de olvidar constituir o ramo mais rígido do Direito, prevendo se as mais graves sanções viáveis para o ser humano, como é o caso da privação da liberdade.

Diferente de outras áreas do ordenamento jurídico brasileiro, o Direito Penal possui certas normas que proíbe alguns comportamentos, que se forem violadas haverá penalização públicas. Essas normas estão ligadas ao direito penal, no entanto, por esse motivo, há uma análise no que diz respeito à função de proteção de bens jurídicos e a função de prevenção de delitos.

Quando nos referimos a bens jurídicos e a internet, é preciso dar atenção aos crimes informáticos, pois com o aumento do uso de meios de comunicação, o uso destes podem ser feitos para o bem ou para cometer crimes. O código penal brasileiro segundo Jesus e Milagre (2016, p.47) “é omisso quanto à informática ser um bem protegido pelo Direito Penal”.

No momento em que o Código Penal brasileiro foi criado a informática não era considerada um bem jurídico, pois a comunicação daquele tempo era transmitida através do rádio ou jornais. No entanto, com o avanço da tecnologia, originou-se uma sociedade informatizada e ligada à internet para tudo, que segundo Jesus e Milagre (2016) ficou conhecida como a sociedade da informação. A partir de então fez o Direito olhar para essas práticas com mais atenção para criar penalizações dos crimes que pudessem ocorrer nesse território.

A forma de agir do Direito deve ser sempre para preservar os bens mais importantes das relações sociais, garantindo a preservação dos direitos fundamentais e interferindo o mínimo possível na vida do cidadão. Por isso surgiu uma grande dificuldade na elaboração e na aprovação da lei que classificasse os crimes cibernéticos. No entanto, ainda segundo Jesus e Milagre (2016, p.48):

[…] visto que a informação veiculada nos meios de comunicação que utilizam a internet como meio de propagação ia muito além de dados, isto é, circulação de informações de valores econômicos, como dados bancários de pessoas físicas e jurídicas, chegou-se à conclusão que, onde há relevância econômica, há também uma relevância jurídica.

Depois de muito tempo de debates no Congresso Nacional, criou-se uma tipificação dos crimes cibernéticos que Jesus e Milagre (2016, p.48) classifica da seguinte maneira:

[…] como salienta Ferreira Lima (2011, p. 6), diante da evolução tecnológica existe uma predisposição social em reconhecer bens jurídicos informáticos e, dentre os que mais se sobressaem, temos o sigilo e a segurança de dados e informações eletrônicas. Para a autora, é tal juízo de reprovação (violação a dados e a informações privadas) que move o Direito Penal. De fato, tal juízo de reprovação existia, mas foi preciso que uma pessoa pública, atriz popular, fosse vítima de um suposto crime informático para que o legislativo finalizasse uma discussão de mais de 10 (dez) anos no congresso nacional, com a aprovação da Lei n. 12.737/2012, sancionada em 30 de novembro do mesmo ano.

Jesus e Milagre (2016, p.48) ainda explica como ficou conhecido o bem jurídico, com o avanço da informatização da sociedade e divulgação de informações através dos meios cibernéticos:

Elevaram-se, pois, os dados informáticos e os dispositivos ao status de valores jurídicos fundamentais das relações sociais de uma sociedade dependente da tecnologia da informação, protegendo-os. Assim, ao tratarmos de “crime informático”, usamos tal nomenclatura justamente para demonstrar qual o bem jurídico protegido pelo Direito Penal, a informática, ou a privacidade e a integridade dos dados informáticos.

Então em 2012 criou-se uma nova Lei, para ser inserida no código Penal, que foi a Lei nº 12.737/2012 que tratava sobre os crimes ocorridos eletronicamente. Através desse avanço tecnológico é natural que as pessoas tenham acesso a toda e qualquer tipo de informação. Ao relações entre os indivíduos com o surgimento da internet tornaram-se mais diversificadas e veloz, tornando-se necessário que se houvesse uma maior fiscalização e uma punição adequada para quem usasse dessa ferramenta para realizar ações depreciativas.

E buscando resolver problemas que viessem a surgir dessa realidade foi criada uma legislação especifica que recebeu o nome de Marco Civil da Internet, Lei de nº 12.965/14, que veio para definir princípios direitos e garantias para o uso da internet no Brasil. Nesse cenário surgiram críticas, por ter muitas questões já repetidas em outras leis. Tomasevicius Filho (2016, 276) ainda destaca que:

Embora o Marco Civil da Internet tenha sido bastante festejado por ser a primeira lei do mundo a disciplinar os direitos e deveres dos usuários da rede, não se perceberão mudanças substanciais, uma vez que esta não acrescentou praticamente nada à legislação vigente. A expectativa criada com a discussão dessa lei deu-se pela crença errônea de que as normas contidas na Constituição Federal, no Código Civil, no Código Penal, nos Códigos de Processo Civil e Penal, no Código de Defesa do Consumidor, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na lei sobre interceptação de comunicações (Lei n.9.296/96) não teriam aplicação nas relações jurídicas estabelecidas na internet.

O objetivo desta legislação é proteger as pessoas que usam suas informações e garantir sua privacidade e neutralidade nas redes sociais. Esta lei tenta impedir que sejam praticadas ações ilegais dentro do espaço virtual, que as autoridades usam para encontrar indivíduos, que por algum motivo, tentam enganar pessoas, organizações ou processos.

O maior problema existente entre as informações da mídia e a questão criminal, tem relação com matérias ou situações não comprovadas, definidas como fake newsou informações inverídicas. Silva (2006) cita o seguinte exemplo, o delito ocorreu e os acontecimentos foram divulgados sem a devida investigação da veracidade, incluindo a divulgação dos nomes dos indivíduos envolvidos e suas características. Assim que essas informações são disseminadas nos meios de comunicação, ocorre uma rápida intensificação da hostilidade pública em relação aos envolvidos no incidente, o que culmina em um “veredito social” antecipado, ocorrendo antes mesmo da avaliação do caso pelos órgãos judiciais.

2.1. A CRIMINALIZAÇÃO DAS FAKENEWS

Em relação a criminalização das fake news e o aumento do uso da internet entre as pessoas para se comunicar Paeseani (2014, p.21) ainda afirma que:

[…] o avanço tecnológico dos meios de propagação de informação em massa, surge a internet, meio capaz de disseminar informações em tempo real e de forma ilimitada, alterando quantitativamente e qualitativamente o nível das informações, possibilitando uma comunicação imediata, criando assim um domínio social do indivíduo: o poder informático.

Paeseani (2014, p.21) ainda acrescenta que “Sendo a internet um meio de disseminar informações de forma irrestrita, surge então o conflito junto às autoridades judiciárias que estão presas às normas e instituições do Estado e, portanto, a uma nação e a um território limitado”. Esse conflito se alastra até a dificuldade de executar as normas judiciais que se referem às redes, dificultando a aplicação das leis na prática por não serem especificas sobre o tema em si, quando se trata de responsabilidade.

Através da ascensão dos meios de comunicação em massa, a imprensa teve um grande destaque. Devido à essa predisposição na divulgação das informações e sua interferência na opinião pública, acaba culminando em uma interferência direta no que diz respeito ao Direito Penal, pois essas notícias acabam despertando nas pessoas esse apelo por justiça.

Lobo, Paixão e Silva (2018) diz que o surgimento das fakenews é um tema de relativa contemporaneidade, e as opções legais atualmente presentes na legislação brasileira se mostram insuficientes para abranger todos os aspectos relacionados a elas. Sendo assim, vários órgãos públicos governamentais como o Ministério Público, o Tribunal Superior Eleitoral e a Polícia Federal, se organizam para debater sobre as medidas que podem ser adotadas, na tentativa de desenvolver projetos para impedir ou diminuir a prática de divulgação de notícias que faltam com a verdade.

Lobo, Paixão e Silva (2018) também salientam a relevância da conexão entre as notícias falsas e a Constituição Federal do Brasil de 1988, bem como o Marco Civil da Internet de 2014. Isso ocorre devido à existência de dispositivos em ambas as legislações que visam enfrentar possíveis abusos, assegurando, ao mesmo tempo, a liberdade de expressão, conforme estipulado na norma constitucional. Essa preocupação com a divulgação de notícias e informações falsas não é uma realidade só do Brasil, outros países também já estudam normas e leis que possam coibir essa prática, no entanto o maior problema dessa situação é conseguir criar a legislação sem ter conflitos com a garantia dos direitos fundamentais e a liberdade de expressão. São muitos os projetos de lei que são enviados para o Congresso com o objetivo de resolver essa questão da punição para quem divulga notícias falsas, no entanto segundo Grigori (2018, online), muitos dos projetos de lei submetidos ao Congresso apresentam textos frágeis, que abrem margem para a instauração de um clima de censura e limitações, resultando na contenção do fluxo de informações pelos cidadãos, devido ao receio das consequências criminais que podem enfrentar.

Ainda sobre a questão da criminalização pela prática de disseminar informações falsas através dos meios de comunicação em massa, necessita-se que sejam averiguados os princípios que guiam o Direito Penal em relação a questões de mudanças legislativas na aplicabilidade das penas. Nucci (2018, p.284) diz que:

Ao longo dos anos, várias modificações legislativas, inseridas no Código Penal, implicaram na perda de harmonia entre crimes e penas, abrindo oportunidade para o desprestígio do princípio da proporcionalidade. Não bastasse, a legislação especial também consagrou alterações destoantes do contexto uniforme do Direito Penal, ora tipificando condutas inócuas, ora aplicando severas sanções para condutas de menor alcance.

Nucci (2018, p.215) ainda diz que “é desejável, na medida em que se acate a liberdade individual como bem supremo, preservando-se a dignidade da pessoa humana na exata demanda do Estado Democrático de Direito.” Essa liberdade do indivíduo é comprovada em várias maneiras dentro de uma sociedade democrática, como podemos citar, o direito de ir e vir; possuir e usufruir dos bens; zelar pela intimidade, entre tantos outros. Tudo isso é reconhecido e controlado por lei, e qualquer ação que coloquem essas ações em perigo deve ser sufocada, com as normas jurídicas competentes.

Ainda citando Nucci (2018, p.215) quando ele fala “O eficiente equilíbrio entre liberdade e punição penal, modelado pela razoabilidade e pela proporcionalidade, constitui o demonstrativo eficaz de que se cultua e respeita o Estado Democrático de Direito, nos parâmetros delineados pelo art. 1 da Constituição Federal”. Dessa maneira é possível entender que o Direito Penal pode ser usado de forma subsidiaria aos outros ramos do ordenamento jurídico, ou seja, é necessário extinguir todas as maneiras de punição extrapenais, e só depois de todas as tentativas nesse âmbito é que deve aplicar a forma penal incriminador, que será papel do Estado.

Muitas convicções estão incluídas quando se refere ao direito à informação, e o ponto chave é a presença de verdades e mentiras. Existem aqueles que defendem que deve existir uma tipificação criminal para quem pratica a divulgação de informações falsas, através das redes sociais ou meios de comunicação em massa, pois considera-se a questão que a população tem direito a ter acesso a informações corretas e verdadeiras.

De acordo com as análises de Burg e Greggo (2018), a disseminação de notícias falsas acarreta prejuízos significativos para a sociedade em geral. Quando uma notícia ou informação falsa é amplamente difundida e compartilhada repetidamente, ela adquire uma aura de relevância que leva as pessoas a conferirem credibilidade a essa informação, levando-as a considerá-la como verídica. Esse cenário representa um risco substancial no contexto atual.

Para aqueles que defendem a elaboração de um novo tipo penal para a disseminação de fake news valerá as práticas das ações que tiverem o objetivo de criar e propagar as informações mentirosas, com o intuito de confundir ou mudar a verdade sobre o fato relevante, o tornando algo inverídico.

3. A COLISÃO DOS PRINCÍPIOS DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO X PRIVACIDADE

É inegável a função imprescindível da liberdade de expressão na construção de uma estrutura democrática de um país. Conforme Dahl (2012), esta, a liberdade de expressão, é um dos institutos políticos necessários em larga escala para que se possa construir verdadeiramente um processo de consolidação democrática.

O ponto crucial, então, está na questão dos limites. É possível o estabelecimento prévio de um limite? No julgado da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 130 o Supremo Tribunal Federal debateu, obter dictum, sobre tal questão. A manifestação do Ministro Ricardo Lewandowsky, precursor desta questão, foi a seguinte:

[…] não se mostra possível ao legislador ordinário graduar de antemão, de forma minudente, os limites materiais do direito de retorção, diante da miríade de expressões que podem apresentar, no dia-a-dia, os agravos veiculados pela mídia em seus vários aspectos. (BRASIL, 2009, p.103).

Ainda na mesma ação, não se desconhece a imposição de limites à liberdade de expressão da imprensa. Ao contrário, o próprio Supremo Tribunal Federal a admite, mas em caráter de colisão de direitos fundamentais, sobrelevando a liberdade de imprensa diante da magnitude de atuação desta em um regime democrático.

Não obstante, quando se retira o ator (imprensa) e se vai à análise do indivíduo como fonte de informação, nota-se, claramente, no STF, uma mudança de postura. Assim, existe um posicionamento antagônico quando se trata de liberdade de expressão do indivíduo (REALE JÚNIOR, 2010).

Nesse diapasão, a doutrina de Reale Júnior (2010) com base na análise da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal aponta que existem limites à liberdade de expressão que podem ser colhidos de forma prévia, a exemplo da dignidade da pessoa humana e da vedação à discriminação.

Em continuidade com o tema do presente trabalho, ao analisar a colisão de direitos fundamentais na internet, e em especial nas redes sociais digitais, os principais direitos violados quando se utiliza indevidamente tais redes são a liberdade de expressão e à privacidade (LEITE, 2016).

Leite (2014, online) aduz que o abuso do direito de liberdade vai de encontro aos outros bens jurídicos, também tutelados pelo Direito, tal como o direito de privacidade. E, considerando-se que a liberdade de expressão é um direito fundamental que decorre da liberdade de pensamento, sendo o mais amplo deles, e que a privacidade é a capacidade que o indivíduo tem de impedir que estranhos se intrometam na sua vida privada e familiar, e também de obstar o acesso a informações sobre a intimidade de cada um dos membros da família, bem como impedir a divulgação de informações íntimas e privadas, fica evidente a existência de colisão desse direitos no uso das redes sociais digitais.

Ao analisar uma situação hipotética, fica fácil compreender esse choque de direitos nas redes sociais: Um indivíduo compartilha num grupo de amigos no WhatsApp, um “print” (captura em forma de imagem tudo o que está presente na tela) de uma conversa com outra pessoa. Então há que se identificar que a “Privacidade” de um foi violada, quando se fez chegar a conhecimento de terceiros a conversa que deveria ficar em sigilo, e tal violação se deu quando o outro exerceu a sua liberdade de expressão e compartilhou o texto da conversa com outrem.

Situações como essa são recorrentes no uso das redes sociais digitais e há que se considerar que não necessariamente irão provocar danos a algum dos envolvidos, contudo, é possível que possa ocasionar acontecimentos desagradáveis e por isso o uso da ética se faz necessário também no uso das mídias digitais.

4. CONSEQUÊNCIAS POLÍTICAS, SOCIAIS, JURÍDICAS E POSSÍVEIS SOLUÇÕES PARA A PROBLEMÁTICA

Apesar da expressão fake news tenha se destacado recentemente, ele existe desde o final do século XIX e, como já mencionamos anteriormente, se refere à criação e à propagação de notícias falsas, mas aparentemente verdadeiras, pois, geralmente, imitam o discurso jornalístico. A diferença é que, na sociedade contemporânea, há um grande potencial de criação e disseminação de notícias falas, propiciado pelo contexto do ambiente online.

Propagar informações inverídicas acarreta inúmeras consequências danosas, tais como: riscos para a saúde pública, prejuízos aos processos eleitorais democráticos, incentivo ao preconceito, violação da honra e imagem das pessoas, linchamento de inocentes, legitimação da violência, entre outras.

4.1. CONSEQUÊNCIAS POLÍTICAS DAS FAKENEWS

O termo fake news começou a ganhar mais visibilidade em 2016, pois, no cenário das eleições nos EUA, a intensa divulgação de conteúdos falsos pode ter influenciado a eleição do então presidente Donald Trump. A característica proeminente das notícias falsas é o apelo para a emoção do leitor, em detrimento da veracidade da informação. Cita-se o conceito de pós-verdade, em que se apela para as emoções e crenças pessoais, a fim de distorcer a realidade, moldar a opinião pública e influenciar atitudes das pessoas.

Em regra, existe a tendência das pessoas compartilharem mais a mentira que a verdade e o motivo é que a mentira se adéqua mais facilmente aos discursos políticos. Tem um público muito dividido e apaixonado pelas suas convicções políticas, sendo assim, ele confirma com o que ele já pensa e aperta o botão de compartilhamento muito rápido e a notícia falsa se difunde.

A criação de fake news envolve um grande mercado financeiro, já que as empresas lucram com a publicidade gerada pelos inúmeros cliques nesses conteúdos, uma vez que, por serem mais espetaculares que as notícias verdadeiras, produzem mais engajamento nas redes sociais. Tal mercado é alimentado por pessoas de grande influência e grande poder aquisitivo, tais como políticos, que investem altos valores na produção e veiculação de informações inverídicas.

Em períodos eleitorais a situação se agrava, pois, notícias falsas sobre os candidatos são publicadas a todo momento nas redes sociais, com o objetivo de prejudicar ou então de destacar algum candidato, mas não dá para saber de imediato o que é verdade e o que é mentira.

Por isso e outros motivo a necessidade de conscientizar a família e a sociedade para o bom uso das redes sociais, divulgando e compartilhando informações reais. Ter cuidado de verificar a fonte de uma notícia antes de divulga-la, tudo isso com o intuito de identificar fake newse não as divulgar.

Mello (2020, p.24) destaca sobre a presença dos fakes news nas campanhas eleitorais da seguinte maneira:

[…] denunciando os esquemas utilizados para distorcer a realidade ou até mesmo abafar a verdade. Alguns dos exemplos dados por ela são as plataformas Facebook e Instagram, onde é possível pagar para que determinados conteúdos sobressaiam ou alcancem determinadas categorias de público. Outro exemplo dado é a utilização de robôs ou bots; ou ainda pessoas contratadas, chamadas de trolls, a fim de aumentar o engajamento de publicações no Twitter e no Facebook com curtidas e comentários.

E então quando uma informação falsa passa por todos esses aplicativos e redes, ela será propagada em larga escala que passará uma sensação de que é algo familiar, porque ela vai se repetir muitas vezes, e esse processo vai resultar que a pessoa vai levar essa informação como real e verdadeira, sendo mais complicado desfazer essa perspectiva. Funciona como aquela ideia que uma mentira contada muitas vezes vira verdade, na política isso leva o nome de “ilusão da verdade”.

Dessa maneira é possível afirmar que essa prática de divulgar notícias falsas pode interferir no regime político do país, no caso do Brasil, na democracia. Dessa foram Abreu (2020, online) afirma que “não é correto dizer que o cidadão tem seu direito de escolha garantido, pois, a partir do momento que a realidade é modificada perante notícias falsas, as pessoas passam a acreditar em uma mentira e, de maneira consequente, elegem a mentira.”

Podemos citar, como exemplos marcantes do que foi explanado acima, o que a empresa Cambridge Analytica fez tanto nos Estados Unidos e como no Reino Unido durante as eleições de Donald Trump e a aprovação do Brexit. Com base em pesquisa realizada no g1.globo.com:

a Cambridge Analytica é uma empresa de análise de dados que trabalhou para campanha do republicano Donald Trump nas eleições de 2016, nos Estados Unidos. Na Europa a empresa foi contratada pelo grupo que promovia o Brexit (a saída do Reino Unido da União Europeia). Tal companhia, segundo a investigação dos jornais The Guardian e The New York Times, teria comprado acesso a informações pessoais de usuários do Facebook e usado esses dados para criar um sistema que permitiu predizer e influenciar as escolhas dos eleitores nas urnas (BBC, 2018, online).

Conforme com os dados citados no site acima, cerca de 50 milhões de usuários foram coletados sem autorização. Continham detalhes sobre os usuários do aplicativo como seus gostos, hábitos e sua rede de contatos, além de elementos pessoais como nome, profissão, local de moradia, os quais não faziam ideia que as informações seriam utilizadas para outros propósitos (BBC, 2018, online).

Ainda com base nas informações do g1.globo.com, a partir do inventário de dados de cada usuário, compartilhavam-se notícias falsas específicas, uma vez que essa base de dados era uma ferramenta poderosa já que possibilitava que as campanhas identificassem pessoas que estavam em dúvida e direcionava a elas mensagens com maior probabilidade de convencê-las (BBC, 2018, online).

Dessa forma, se aquele perfil demonstrava uma preocupação com a economia, a empresa pagava para exibir publicações falsas sobre a taxa de desemprego nos Estados Unidos, ou compartilhava informações de que o Reino Unido perdia milhões de dólares por semana enquanto se mantinha na União Europeia. Se a preocupação era sobre segurança nacional, a empresa comprava anúncios com notícias falsas de que a candidata Hillary Clinton tinha alguma responsabilidade pela criação do Estado Islâmico.

4.2. CONSEQUÊNCIAS SOCIAIS DAS FAKENEWS

A questão de viver com base nas informações das redes socias, que podem ser verdadeiras ou não, tem afetando a vida de várias famílias pelo mundo e no Brasil isso não é diferente. Existem interferências que não geram nenhum dano as pessoas, que não tem consequências negativas, como existem interferências que geram graves consequências, que podem resultar danos negativos a imagem da pessoa ou da família.

Evidencia-se, assim, outro papel prejudicial das fake news que é a velocidade e a urgência, em que se consegue definir e julgar uma imagem e uma pessoa. Ocorrem casos que geram até agressão nas pessoas afetadas pela informação falsa, inclusive agressão em seus familiares também. Síbilia (2008, p.35) chama atenção para essas consequências que as notícias falsas estão causando na vida das pessoas:

As fake news crescem vertiginosamente e se antes tinham o objetivo somente de causar ilusão a respeito da própria pessoa que postava – uma imagem inferior à real, caso quisesse fazer drama, expondo-se excessivamente, de forma vitimizada e exagerada; e de forma superior para causar sucesso, passando a imagem de que ela é muito mais do que é de fato, visando impressionar e se supervalorizar, uma conduta a que Paula Síbilia denomina “show do eu” atualmente o cenário é muito mais grave, pois está vitimizando pessoas inocentes, levando-as a óbito.

O que é mais sério é que a veracidade da informação muitas vezes não dá tempo de ser provada e já acontece uma reação da sociedade, que pode resultar até mesmo em justiças feitas com as próprias mãos por algo que não se sabe nem se é real, pois a notícia uma vez sendo divulgada nas redes, tomam uma grande proporção e foca como se fosse verdade, e uma injustiça ou calúnia pode ocorrer facilmente.

4.3. CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DAS FAKENEWS

Juridicamente falando sobre as fakes news, será relembrado que a liberdade de expressão não é um direito absoluto, portanto precisa respeitar outros princípios, com base nessa afirmação Custódio (2019, online) busca esclarecer essa situação da seguinte forma:

É muito comum que se confunda o resguardo desses direitos como censura, contudo, respeitado o entendimento contrário, essa é uma conclusão equivocada, pois a censura pressupõe uma exceção prévia à manifestação do pensamento ou, ainda, um silenciamento posterior com base em meros pressupostos de ordem ideológico-políticos, o que é totalmente diferente da responsabilização de pessoas que abusam da liberdade de expressão ao ponto de lesarem outros direitos.

Então fica na responsabilidade dos juízes a importante tarefa de identificar se houve ou não alguma irregularidade na liberdade de expressão. Custódio (2019, online) ainda esclarece que “não se condena ninguém por meras opiniões ou visões de mundo. Ocorrem condenações, obviamente, quando ocorrem crimes contra a honra devido às falas que ultrapassam o limite da liberdade de expressão e são, na verdade, crimes como calúnia, injúria e difamação”.

4.3.1. Marco Civil da Internet

Desde que se percebeu que as interações estabelecidas na internet exerciam influência para além do âmbito virtual, a necessidade de regulamentação tornou-se evidente, e o Direito não pode se eximir dessa responsabilidade. Essa informação foi obtida no site www.aurum.com.br, que aborda essa temática (AURUM, 2021, online). No ano de 2014 a Lei nº 12.965/14 foi editada, onde nela estabelece princípios, garantias e deveres em relação ao uso da internet no Brasil, citada por Carvalho e

Kanffer (2018, online):

Segundo a legislação, o uso da Internet é permeado por inúmeros princípios, como a preservação e a garantia da neutralidade da rede (art. 3.º, inciso IV, Lei 12.965/14) e a liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento (art. 3.º, inciso I, Lei 12.965/14), e tem como objetivos o acesso à informação, ao conhecimento e à participação na vida cultural e na condição dos assuntos públicos (art. 4.º, inciso II, Lei 12.965/14).

A Lei nº 12.965/14, além de dispor sobre garantias como a liberdade de expressão, defesa do consumidor e proteção da liberdade; também tratou de estabelecer formas de tornar seus dispositivos eficazes, prevendo, nos termos do seu art. 19, caput, a responsabilização daqueles que atuarem de forma lesiva no que tange aos direitos ali previstos como a responsabilidade subjetiva dos provedores de aplicação de internet, que seria o caso de sites como Google ou Yahoo.

Durante a pesquisa realizada no site acima citado, torna-se necessário destacar, ainda, que a elaboração do Marco Civil da Internet se deu com a participação da sociedade, mediante a apresentação em debates e audiências públicas, bem como com a elaboração de comentários e propostas registradas no site criado com tal finalidade. (AURUM, 2021, online).

Leite (2016) destaca que um dos meios utilizado pelo Estado para impor limites nos ambientes virtuais foi a instituição da Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014, conhecida como Marco Civil da Internet, “a qual estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil” e possui como pilares a neutralidade de rede, liberdade de expressão e privacidade. No que se refere a liberdade de expressão tal Lei procura equilibrá-la com a proteção à intimidade, a honra e a imagem das pessoas.

Com base na fala de Nunes e Miranda (2019) a remoção de conteúdo da internet, prevista no Marco Civil da Internet, é uma forma de limitação da liberdade de expressão, contudo para que tal remoção aconteça exige-se que o conteúdo objeto da remoção seja ilícito, cabendo ao Poder Judiciário definir aquilo que deve ser enquadrado como ilícito. Nesse sentido é importante salientar que o juízo de valor estabelecido sobre determinado conteúdo postado na internet, dependerá da estratégia hermenêutica adotada pelo juiz ao caso concreto.

Sarlet, Marinoni e Mitidiero (2017) destaca que eventuais limitações dos direitos fundamentais só serão possíveis se existente compatibilidade formal e material com a Constituição. Entende-se por plano formal a investigação da competência, do procedimento e da forma adotados pelo Estado. Já a perspectiva material se ocupa da observância da proteção do núcleo essencial destes direitos, assim como do atendimento das exigências da proporcionalidade e da razoabilidade, categorias estas que acabam funcionando como limites aos limites dos direitos fundamentais.

Com base nas informações do site citado, é correto afirmar que o Marco Civil da Internet é uma resposta à necessidade de proteger dados pessoais que podem ser indevidamente utilizados por terceiros. Isso se deve ao fato de que a mera exposição pública de um dado no meio digital ou seu compartilhamento com terceiros não garante automaticamente que esse dado não será utilizado ou divulgado de forma não autorizada (AURUM, 2021, online).

4.3.2. Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)

Uma consequência jurídica significativa foi a promulgação da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, conhecida como Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Essa legislação foi aprovada por unanimidade e em regime de urgência pelo Plenário do Senado, no mês de julho de 2018. Importante destacar que ela se aplica não apenas a empresas sediadas no Brasil, mas também àquelas com sede no exterior, desde que estejam envolvidas em operações de tratamento de dados realizadas no território nacional (BRASIL, 2018).

Em síntese, a lei proíbe o tratamento dos dados pessoais para a prática de discriminação ilícita ou abusiva, ou seja, garante “a cada cidadão a privacidade de informações pessoais, como nome, endereço, e-mail, idade, estado civil, e obriga os sites, por exemplo, a esclarecer como os dados são tratados, armazenados e para que finalidade.” (BRASIL, 2018).

A LGPD estabelece diversas sanções administrativas para casos de violação das suas disposições. Entre as medidas destacam-se a advertência, que pode vir acompanhada de medidas corretivas; a aplicação de multas; o bloqueio ou eliminação dos dados pessoais vinculados à irregularidade; a suspensão parcial das operações do banco de dados; ou a proibição parcial ou total da atividade de tratamento de dados. Essas sanções visam garantir o cumprimento adequado das normas de proteção de dados pessoais estabelecidas pela legislação (BRASIL, 2018).

4.3.3. Inquérito das fakenews

Em pesquisa realizada no site g1.globo.com, foi encontrado o Inquérito nº 4781- STF, iniciado a partir de uma decisão do presidente do STF, Dias Tóffoli, chamado “inquérito das fakenews”, cujo objeto, conforme:

despacho de 19 de março de 2019, é a investigação de notícias fraudulentas (fakenews), falsas comunicações de crimes, denunciações caluniosas, ameaças e demais infrações revestidas de animus caluniandi, diffamandi ou injuriandi, que atingem a honorabilidade e a segurança do Supremo Tribunal Federal, de seus membros; bem como de seus familiares, quando houver relação com a dignidade dos Ministros. (D’AGOSTINO, 2020, online).

O ora citado ministro abriu essa investigação com base no art. 43, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), que prevê:

Art. 43. Ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do Tribunal, o Presidente instaurará inquérito, se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribuição a outro Ministro.

§ 1º. Nos demais casos, o Presidente poderá proceder na forma deste artigo ou requisitar a instauração de inquérito à autoridade competente.

§ 2º. O Ministro incumbido do inquérito designará escrivão dentre os servidores do Tribunal (STF, 1940).

De acordo com a pesquisa realizada no site citado acima, o referido presidente determinou a abertura da investigação. O escolhido para ser o responsável foi o Ministro Alexandre de Moraes, que tomou várias decisões como: determinar que a Receita Federal suspendesse investigações abertas contra 133 contribuintes, entre eles, o ministro Gilmar Mendes do STF, pois afirmou terem sido abertas de forma ilegal e ainda afastou 2 servidores; ordenou busca e apreensão nas casas de usuários, empresários e blogueiros de redes sociais ligados ao presidente Jair Bolsonaro que fizeram críticas e ameaças a ministros, além de impor o bloqueio das contas de sete investigados em redes sociais e no WhatsApp; também foi ordenada a remoção de um artigo publicado nos sites O Antagonista e na revista digital Crusoé, o qual abordava de forma desfavorável o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). Essa ação foi considerada como censura tanto por organizações da sociedade civil, incluindo a Ordem dos Advogados do Brasil, quanto por associações que representam jornalistas. Além disso, alguns ministros do STF manifestaram desaprovação, levando o responsável pela decisão a recuar e autorizar a republicação do artigo no site da revista (D’AGOSTINO, 2020, online).

Algumas críticas foram levantadas contra esse inquérito, dentre as quais diziam que era ilegal e inconstitucional. Juristas críticos dizem que contraria os princípios constitucionais e do direito penal brasileiro que é baseado no sistema acusatório, em que é central a atuação do ministério público na condução de investigações, fato que não ocorreu. Outra crítica, é uma falta de delimitação mais objetiva quem seriam as pessoas investigadas e por quais motivos, tornando-se muito ampla.

O partido Rede Sustentabilidade, em 2019, apresentou ação que contesta a legalidade da investigação pedindo a extinção do inquérito, que foi distribuída para o ministro Edson Fachin, relator do processo (D’AGOSTINO, 2020, online).

De acordo com o site supramencionado, com 10 (dez) votos a favor e 1(um) contra o plenário do Supremo decidiu dar prosseguimento ao inquérito das fakenews. O voto do ministro relator sustentou a necessidade de prosseguir com a investigação, desde que esta seja conduzida em conjunto com o Ministério Público. Além disso, enfatizou a importância de garantir que os advogados tenham acesso aos documentos e respeitou o princípio da liberdade de expressão (D’AGOSTINO, 2020, online).

Prosseguindo com as informações pesquisadas, o decano Celso de Mello também se posicionou a favor da validade do inquérito. O ministro argumentou que é “indispensável deter” o que ele caracterizou como uma “máquina de fake news”. Ele destacou que o inquérito tinha como “legítimo objetivo viabilizar a defesa institucional do STF, proteger a honorabilidade desta alta Corte e preservar a integridade física e moral dos juízes que a integram” (D’AGOSTINO, 2020, online).

Ele também declarou que as investigações do inquérito trouxeram à tona a presença de uma estrutura criminosa, cujo suporte operacional se manifesta por meio de uma verdadeira máquina de disseminação de notícias falsas. Essa máquina operou e continua a fazê-lo com o respaldo de vários núcleos, incluindo um núcleo financeiro sustentado por financiamento substancial, sistemas organizados, divisão de tarefas e estruturas próprias (D’AGOSTINO, 2020, online).

Finalmente, conforme indicado por este site, o ministro Dias Toffoli, que preside o STF, foi o último a emitir seu voto a favor da continuação do inquérito, declarando que:

Trata-se de um cenário sujeito à difusão massiva e maliciosa de informações inverídicas para a sociedade, seja por ação humana ou de robôs e que a liberdade de expressão não respalda a alimentação do ódio, da intolerância e da desinformação. Essas situações representam o exercício abusivo desse direito. (D’AGOSTINO, 2020, online).

Com efeito, ao julgar essa ação, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu que o inquérito é legal.

4.3.4. Medida Provisória

A medida provisória (MP) 1068/2021, assinada pelo presidente Jair Bolsonaro no dia 06 de setembro, que altera o Marco Civil da Internet (MCI), terminou sendo devolvida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. Essa informação pode ser consultada no site www.andes.org.br. (REDE BRASIL, 2021, online).

Na fonte mencionada, está registrada a informação de que o governo está obstaculizando as iniciativas de combate às notícias falsas e prejudicando os esforços das plataformas de redes sociais para remover vídeos e postagens contendo informações incorretas, ou para suspender contas, seja de forma integral ou parcial, “exceto por justa causa” (REDE BRASIL, 2021, online).

A matéria em questão ressaltou que o ato presidencial chamou a atenção, principalmente por ter sido promulgado nas proximidades do dia 7 de setembro, ocasião em que ocorreram manifestações em apoio a Bolsonaro. O texto proíbe “aos provedores de redes sociais a adoção de critérios de moderação ou limitação do alcance da divulgação de conteúdo que impliquem censura de ordem política, ideológica, científica, artística ou religiosa” (REDE BRASIL, 2021, online). Na prática, essa medida dificulta ainda mais o combate a boatos, informações distorcidas e mentiras disseminadas com objetivos políticos (ADIs). (REDE BRASIL, 2021, online). Segundo a Coalizão Direitos na Rede, um coletivo que reúne aproximadamente 50 entidades da sociedade civil e organizações acadêmicas em defesa dos direitos digitais, foi divulgada uma nota de alerta. Nela, destaca-se que o presidente da

República demonstrou preocupação com possíveis intervenções das plataformas de redes sociais nos conteúdos postados por ele e seus apoiadores. Apesar de contar com a condescendência das empresas, ele optou por intervir de forma unilateral no funcionamento das redes sociais, indo contra os princípios do Marco Civil da Internet (REDE BRASIL, 2021).

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), especialistas em direito digital e parlamentares também criticaram o texto que dificultava a suspensão, o cancelamento ou a exclusão de contas que disseminassem notícias falsas ou conteúdo de ódio, pois acreditam que a MP representa um retrocesso que fragiliza as conquistas do Marco Civil da Internet (REDE BRASIL, 2021, online).

Ao devolver o texto, Rodrigo Pacheco argumentou, entre outros pontos, que o assunto não era urgente, nem relevante para ser tratado por uma medida provisória que tem efeito mediato de lei (REDE BRASIL, 2021, online).

A medida provisória, após ser considerada inconstitucional pela assessoria jurídica do Senado, não apenas foi devolvida, mas também chegou a ser suspensa pela ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), que atuou como relatora em oito ações que questionavam a constitucionalidade da MP (REDE BRASIL, 2021, online).

4.3.5. Projeto de lei

Conforme Gurgel (2021), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) encaminhou ao Congresso Nacional um projeto de lei destinado a modificar o Marco Civil da Internet, propondo alterações nas normas que regem o funcionamento das redes sociais, especialmente no que diz respeito à remoção de conteúdo pelas empresas. Nesse contexto, de acordo com informações presentes no site da CNN, o conteúdo da proposta de lei aparenta ser semelhante ao da medida provisória que foi devolvida pelo presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco.

É relevante destacar que, de acordo com Gurgel (2021), tanto o procurador- geral da República, Augusto Aras, quanto o presidente do Conselho Federal da OAB, Felipe Santa Cruz, já expressaram sua oposição ao texto perante o STF. Uma pesquisa realizada no site da Câmara dos Deputados revelou que o documento em questão é o Projeto de Lei nº 3227/2021, que propõe alterações na Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014, e na Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1988, com o objetivo de regulamentar o uso de redes sociais.

4.4. POSSÍVEIS SOLUÇÕES PARA A PROBLEMÁTICA

Combater a criação e a propagação das fakenewsenvolve muita complexidade e requer ações conjuntas. Como possíveis soluções, podemos citar criminalização da prática e punição dos responsáveis; obrigar as empresas responsáveis pelo Google e redes sociais a ter suas próprias iniciativas para coibir a disseminação de boatos, por meio de mecanismos que identifiquem conteúdos falsos; investir em campanhas de educação digital, com vistas à utilização responsável da Internet, levando os usuários a conhecer os mecanismos para identificar as notícias inverídicas e, consequentemente, não compartilhá-las.

Seria importante, para identificar se é fake news, checar algumas evidências dessas notícias. Nome de pessoas, instituições, localidade, ir atrás das fontes de quem publicou, se viu em outras mídias grandes. Se perguntar se aquela notícia tem algum propósito ou intenção de prejudicar alguém ou intenção política. Checar a linguagem se tem erro de português, se tem edição na imagem. Seguindo esses passos, ficam mais fácil de saber se a notícia é verdadeira ou falsa.

As plataformas, atualmente, estão sendo bastante pressionadas a responder esses problemas das notícias falsas. Elas endureceram bastante o combate, com certa cautela para não determinar o que é verdadeiro e o que é falso. Basicamente o que as plataformas fazem é identificar os atores maliciosos e tentar retirá-los por outras violações de regras da comunidade, ex-manipulação de algoritmo ou uso de contas falsas.

À guisa das considerações expendidas, pode-se inferir que a responsabilidade da divulgação das fake news é de todos. A propagação dessas informações precisa ser controlada tanto pelas empresas como pelas redes sociais. Por conseguinte, ficaria a cargo dos órgãos públicos a função de fiscalizar e punir aqueles que criam ou divulgam essas notícias falsas. É imperioso destacar, ainda, a necessidade de haver uma maior criticidade por parte dos usuários em reconhecer e detectar a veracidade das notícias que recebem e que repassam.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É notório que com o surgimento da internet ocorreu uma transformação nos meios de comunicação no que se refere a velocidade de transmissão e quantidade de informações. Diversificando e ampliando a comunicação de forma ampla, instantânea e diversificada.

Com base nisso, o Direito percebeu a necessidade de haver uma maior preocupação em defender e preservar os direitos dos cidadãos, em meio a esse crescimento exacerbado desses novos meios. Dessa forma, busca-se a efetividade do poder punitivo sem que ocorra a violação dos princípios constitucionais e mantendo a proteção dos bens jurídicos, que é a função primordial do Estado Democrático de Direito.

Com o avanço da globalização, dos meios de comunicação, das tecnologias, as informações passaram a ser compartilhadas com mais rapidez e em maior quantidade, e, consequentemente, os conteúdos dessas informações (que podem ser verdadeiros, originando notícias informativas, ou falsas gerando fake news) podem ser prejudiciais à sociedade.

As fakesnews tem tido grande destaque nas redes pelo fato das suas propagações acontecerem de forma muito banal. As notícias falsas divulgadas atualmente em grande parte têm por objetivo difamar ou desrespeitar alguém nas redes sociais, isso tem ocorrido constantemente prejudicando pessoas ou grupo de pessoas.

Torna-se de extrema importância que a sociedade tenha consciência dos malefícios de uma divulgação falsa que prejudique alguém, para que essas informações sejam reduzidas, banidas e não compartilhadas, a fim de que a internet se torne um local mais seguro e que as informações passem a ser mais confiáveis.

Ao final do trabalho e respondendo aos questionamentos iniciais, pode-se concluir que o objetivo geral foi alcançado, já que se propôs a analisar os limites da liberdade de expressão nas redes sociais no contexto da criminalização das fakenews à luz do ordenamento jurídico brasileiro.

Demonstrou-se que liberdade de expressão é um direito fundamental garantido a todos, para que tenham liberdade de pensamentos e ideias através da escrita, da fala, das artes, ou qualquer meio que achemos necessário, e que não pode ser praticada com o intuito de promover ações criminosas ou que incentivem situações de ódio ou intolerância.

Constatou-se que, com o incremento das redes sociais, surgiram novas questões a serem reguladas pelo direito. Nesse contexto, entendeu-se a existência de colisão de direitos fundamentais no uso das redes sociais digitais, bem como promoveu-se uma reflexão sobre como os usuários podem interagir de modo a reduzir a ocorrência desses choques de direitos.

Evidenciou-se, ainda, que a liberdade de expressão, assim como os demais direitos fundamentais, não é um direito absoluto, por conseguinte é cabível limites sempre que esse se apresentar de forma incompatível com o direito à honra, à imagem, à privacidade e a dignidade da pessoa humana.

Em relação aos objetivos específicos o resultado também foi positivo, pois foi demonstrado a relação existente e a linha tênue entre as fakesnew se a garantia dos direitos fundamentais no âmbito das redes sociais; além de promover o entendimento das fakenews no âmbito do direito penal, como também as consequências que a sua propagação pode causar na esfera social, jurídica e política.

Por fim, foram sugeridas algumas possíveis soluções para lidar com os problemas das fakes news, dentre elas podemos citar a produção de campanhas efetivas de educação digital, com vistas à utilização responsável da Internet.

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1 Aluna de bacharelado em Direito da FACULDADE DE TECNOLOGIA DE TERESINA – CET

2 Aluno de bacharelado em Direito da FACULDADE DE TECNOLOGIA DE TERESINA – CET.

3 Professora Me. Orientadora da Faculdade CET.

4 Professora. Me. Coorientadora da Faculdade CET