REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102411231400
Claina Silva de Andrade [1]
Samara de Jesus Pereira[2]
Prof. Orientador: Me. Gesner Lopes Ferraz[3]
RESUMO
Este artigo tem como objetivo analisar a alienação parental, um dos temas mais polêmicos nos âmbitos jurídico e psicológico, no contexto das falsas acusações de estupro de vulnerável. Como a alienação parental é definida pelas interferências no desenvolvimento psicológico da criança – só que, para se dar muito mais complexidade, a alienação parental, por conta do ódio que é disseminado, começa a ganhar cor e peso quando essas discussões têm consequências contra a criança junto a um dos genitores. Este estudo analisa o impacto dessas acusações na relação entre o genitor acusado e a criança, incluindo os efeitos psicológicos e sociais, e as implicações legais dessas acusações. Portanto, de acordo com a Lei nº 12.318/2010 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a análise enfatiza a necessidade de um mecanismo legal cuidadoso que proteja o direito à convivência familiar e evite a instrumentalização de discussões como um meio de retaliar em conflitos de guarda. A partir dos objetivos específicos, busca-se entender as razões que levam a falsas denúncias, as opções legais para lidar com elas e, ainda, desenvolver estratégias que garantam os direitos da criança. Por fim, a qualificação das práticas judiciárias é indispensável, assim como a presença de peritos na área da psicologia e do serviço social que consigam trazer uma visão técnica que auxilie ao juiz a decidir pelo que atende o melhor interesse da criança.
Palavras-chave: alienação parental; falsas acusações; estupro de vulnerável; direitos das crianças; convivência familiar.
This article aims to analyze parental alienation, one of the most controversial topics in the legal and psychological spheres, in the context of false accusations of rape of vulnerable people. Since parental alienation is defined by interference in the psychological development of the child – but to make it much more complex, parental alienation, due to the hatred that is disseminated, begins to gain color and weight when these discussions have consequences against the child with one of the parents. This study analyzes the impact of these accusations on the relationship between the accused parent and the child, including the psychological and social effects, and the legal implications of these accusations. Therefore, in accordance with Law No. 12,318/2010 and the Statute of the Child and Adolescent (ECA), the analysis emphasizes the need for a legal care mechanism that protects the right to family life and prevents the instrumentalization of discussion as a means of retaliation in custody conflicts. Based on specific objectives, the aim is to understand the reasons that lead to false reports, the legal options for dealing with them, and also to develop strategies that guarantee the rights of the child. Finally, the qualification of judicial practices is essential, as is the presence of experts in the area of psychology and social services who can bring a technical vision that helps the judge to decide what is in the best interests of the child.
Keywords: parental alienation; false accusations; child sexual abuse; children’s rights; family life.
1. INTRODUÇÃO
Ao longo da última década tem vindo a emergir no âmbito do debate jurídico e social, especialmente no que diz respeito ao impacto que a alienação parental tem na própria estrutura familiar e no desenvolvimento emocional dos filhos. A alienação parental consiste na interferência na formação psíquica da criança realizada por um dos pais para que ela venha a se afastar do outro, provocando conflitos intensos e complexos na convivência familiar e a saúde mental dos filhos, conforme a Lei nº 12.318/2010.
Neste cenário, um elemento que necessita de atenção especial é a utilização da falsa imputação de certos delitos capitaneados por crimes graves, como o crime de estupro de vulnerável, como um meio de manipular a dinâmica entre os genitores. Acusações equivocadas desse tipo não só podem prejudicar a imagem elaborada e a reputação do pai ou da mãe acusada, como ainda podem agravar o processo de alienação parental, que pode romper de forma irremediável a relação entre o genitor e o filho. Salientando o estado emocional da criança, o relacionamento familiar e onerando o sistema judiciário, que deve funcionar com altíssimo grau de cautela e rigor na investigação dos fatos.
As normas que estão no topo do ordenamento do Direito brasileiro para a proteção dos direitos fundamentais da criança e do adolescente são a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), instituído pela Lei nº 8.069/1990. Esses documentos garantem o direito à convivência familiar e comunitária e destacam a necessidade de um ambiente seguro e harmonioso para o desenvolvimento integral dos menores (Brasil, 1988; Brasil, 1990). O caput do artigo 227 da Constituição da República Brasileira determina que “A família, a sociedade e o Estado têm o dever de garantir, com prioridade absoluta, a efetivação dos direitos” a crianças e adolescentes e estes “devem ser protegidos em relação a todos forma de descaso, discriminação, exploração, violência e opressão” (Brasil, 1988). Nesse sentido, em 2010, foi criada a Lei da Alienação Parental que objetiva proteger crianças e adolescentes da interferência prejudicial na formação psicológica que pode ser provocada por uma guerra entre os pais e garantir a convivência sã e equitativa com ambos os representantes.
Contudo, apesar dos avanços alcançados pela Lei de Alienação Parental, a sua aplicação no contexto de falsas acusações de abuso sexual tem sido controversa. Diversas no contexto das disputas de guarda, a alienação parental pode ser aplicada de forma perversa, em que um dos pais apela para falsas denúncias de abuso para excluir o outro da vida familiar. Essa manipulação tem consequências gravíssimas tanto para o pai ou para a mãe de ser acusado sem provas, quanto para a própria criança, que entra numa arena de disputas e manipulação. Macie (2020) destaca que situações como essas podem comprometer o desenvolvimento psicológico da criança, resultando em prejuízos emocionais graves e duradouros
A problemática desta pesquisa é, portanto, o estudo das repercussões da falsa denúncia de crime sexual de vulnerabilidade em sede de alienação parental. A questão central a ser investigada é: quais são os impactos dessas acusações falsas sobre o relacionamento entre o genitor acusado e a criança, e quais os efeitos psicológicos e jurídicos para todos os envolvidos? A pesquisa visa compreender como essas falsas alegações podem agravar a alienação parental e também explorar a dificuldade que o sistema judiciário enfrenta com essas situações.
Estudos indicam que as agressões sexuais infundadas, quando não são investigadas minuciosamente ou julgadas de forma precipitada, podem levar a afastamentos desnecessários das crianças de seus pais, quebrando o vínculo emocional crucial necessário para o desenvolvimento infantil saudável.
Nesse sentido, Barnabé (2019) alerta que uma aplicação inadequada da Lei da Alienação Parental em casos que envolvem acusações de abuso sexual pode resultar na revitimização da criança, expondo-a a situações de risco. Dessa forma, o problema em análise reside não apenas no uso distorcido do conceito de alienação parental, mas também nas falhas processuais que podem ocorrer na gestão de acusações desse tipo.
A escolha do tema justifica-se pela demanda por estudos mais aprofundados sobre o assunto e pela utilização das falsas considerações como estratégia de manipulação em conflitos de guarda. Apesar da vasta literatura sobre alienação parental, relativamente pouca investigação se concentrou especificamente nas falsas alegações de violação de uma pessoa vulnerável e nas suas implicações jurídicas e psicológicas. Portanto, cultural e cientificamente, torna-se primário colmatar com esta lacuna da literatura, promovendo um embasamento que ajuda operadores do Direito, psicólogos e assistentes sociais a lidar, ética e eficientemente, com tais demandas.
O ECA garante a proteção dos direitos das crianças e adolescentes, mas é preciso cautela para que não sejam usados como arma de uma espécie de revanche entre os pais. Segundo Macie (2020), é crucial que a aplicação da Lei da Alienação Parental seja acompanhada de investigações criteriosas e respaldadas por laudos técnicos confiáveis, a fim de evitar julgamentos precipitados e proteger verdadeiramente os menores envolvidos.
O objetivo geral deste trabalho é analisar as consequências das falsas acusações de crime de estupro de vulnerável na dinâmica da alienação parental, considerando os aspectos jurídicos, psicológicos e sociais envolvidos. Para alcançar esse objetivo, foram estabelecidos os seguintes objetivos específicos: (i) investigar os motivos e os impactos das falsas acusações de estupro de vulnerável no contexto da alienação parental; (ii) analisar os mecanismos legais e jurídicos disponíveis para lidar com as falsas acusações de estupro de vulnerável no contexto da alienação parental; e (iii) propor recomendações e estratégias para prevenir e enfrentar as falsas acusações de estupro de vulnerável no contexto da alienação parental, visando proteger os direitos das crianças e garantir a justiça familiar.
De acordo com esses objetivos, o presente estudo pretende colaborar na compreensão das especificidades da Alienação Parental e das falsas alegações de abuso sexual, ainda que em um espaço em que há poucos dados disponíveis, apontados na necessidade de aprimoramento nos processos e dos profissionais. De acordo com Macie (2020), sem a investigação devida e sem a utilização de métodos periciais de forma a realmente garantir ao juízo da tutela uma evidência de que a guarda é realmente necessária, baseada apenas em preferências frágeis, e, dessa forma, podendo acarretar em injustiças tanto à criança quanto ao genitor. Além disso, a presente pesquisa visa contribuir criticamente para a literatura jurídica e para a prática forense, uma vez que os danos das falsas acusações e da alienação parental são por vezes tratados de forma superficial na legislação vigente. Ou seja, a falta de profissionais habilitados para atuar nesses casos, como destacou Barnabé (2019), tem o potencial de intensificar a alienação parental e levar os tribunais a emitirem determinações que não levam em conta os danos psicológicos imediatos aos filhos.
Resumindo-se, este trabalho não apenas problematiza as questões relacionadas à alienação parental e às falsas acusações de abuso sexual, mas também propõe uma reflexão crítica sobre a legislação brasileira e as práticas do Judiciário. Embora o Direito não se proponha a dar respostas absolutas para cada uma das questões, deve adotar um olhar que tenha, em suas diretrizes e decisões, sempre como foco o melhor interesse da criança. Para tanto, é necessário o esforço articulado do Judiciário, dos profissionais de saúde mental e da sociedade, para que uma convivência familiar seja resguardada e que uma resposta estatal aconteça de forma ética, criteriosa e justa.
2. DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
2.1. INTRODUÇÃO SOBRE DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
O estatuto da criança e do adolescente no Brasil tornou-se uma peça valiosa para a proteção e defesa dos direitos desse grupo vulnerável. A Constituição Federal de 1988 e a Lei do Estatuto da Criança e do Adolescente nº 8.069/1990, no contexto do estatuto da proteção integral, afirmando o direito fundamental à convivência familiar e comunitária, e dos demais direitos fundamentais e inalienáveis das crianças e adolescentes definidos pela legislação brasileira e pela Lei da Alienação Parental (Lei nº 12.318/2010), que têm por objetivo fortalecer o direito da convivência familiar em razão do conflito entre os genitores.
Esse ambiente e a proteção dos direitos humanos e dos direitos da criança e do adolescente em especial, passaram a ter um outro olhar a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988. Ela é sempre muito atenta a essas duas leis e foi uma das precursoras do princípio da integralidade da proteção que depois virou o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
O artigo 227 da Constituição, afirma que:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (Brasil,1988).
Analisando um passo mais adiante, a adoção do princípio da proteção integral transforma as crianças e adolescentes em verdadeiros sujeitos de direito, em oposição a serem objetos de protecionismo. Esta abordagem necessita de uma atuação tanto do Estado como da sociedade, que se deve debruçar diretamente sobre o desenvolvimento harmonioso e saudável dos menores.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que é de substancial importância na proteção de crianças e adolescentes, foi promulgado em 1990, e é complemento à constitucionalidade, detalhando e especificando direitos fundamentais e diretrizes que auxiliam para a proteção de crianças e adolescentes, a partir de um conceito de desenvolvimento integral bem claro pelo seu art. 3º e o que é mais, artigos que consagram direitos, dentre esses direitos dá-se destaque ao de liberdade, respeito e dignidade (Macie, 2020). Agora vejamos o que leciona o artigo 3º do ECA:
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade (Brasil, 1990).
Regular o efetivo e o acesso imediato aos mecanismos materiais para a efetivação de direitos é uma discussão presente na legislação e no direito perseguindo a sua efetivação, mas muitas vezes limitado por argumentos que ainda escudam práticas de opressão e desamparo. Assim, com relação às práticas políticas e sociais, o ECA, no artigo 4º, por sua vez, diz:
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude (Brasil, 1990).
Por isso, a sociedade e o estado têm a obrigação de oferecer às crianças e aos adolescentes um ambiente em que possam conviver de forma sadia e segura com sua família e a comunidade — o que é próprio ao seu desenvolvimento emocional e social. Essa convivência familiar e comunitária é um direito ilegitimável, pois é reconhecido que a convivência familiar é uma condição incondicional para o desenvolvimento pessoal pleno e integral do menor e, portanto, a proteção da família é a base do desenvolvimento da criança e do adolescente, exigindo -se a atuação do Estado frente a qualquer ameaça e sua privação.
Nesse sentido, Macie (2020) destaca que a proteção à convivência familiar é uma das principais preocupações da legislação brasileira, visto que é no ambiente familiar que a criança e o adolescente encontram as condições ideais para seu desenvolvimento integral. O ECA, em seu artigo 19, reforça que toda criança e adolescente tem direito de ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, quando não for possível o convívio com a família natural (Brasil, 1990). Esta normativa visa proteger a criança de situações de negligência, abandono, maus-tratos e quaisquer práticas que possam comprometer sua integridade física, psicológica e moral.
. DIREITOS FUNDAMENTAIS DAS CRIANÇAS
A Lei nº 12.318/2010, conhecida como Lei da Alienação Parental, surge no contexto jurídico brasileiro como uma resposta às demandas sociais por mecanismos legais que protejam o direito de crianças e adolescentes à convivência familiar, especialmente em casos de dissolução conjugal e conflitos entre os pais.
Essa lei define alienação parental como a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, promovida ou induzida por um dos genitores, avós ou qualquer pessoa que tenha a criança sob sua autoridade, guarda ou vigilância, com o objetivo de afastá-la do convívio com o outro genitor (Brasil, 2010).
De acordo com Macie (2020), a Lei da Alienação Parental representa um importante avanço na legislação brasileira ao reconhecer a alienação parental como uma forma de abuso emocional que pode causar danos profundos ao desenvolvimento psicológico da criança e do adolescente. A autora ressalta que a alienação parental se caracteriza por práticas que vão desde a desqualificação do outro genitor até acusações infundadas de abuso e impedimento de visitas. Essas ações geram um ambiente de tensão e conflito, prejudicando a estabilidade emocional da criança e comprometendo o vínculo parental, que é essencial para seu desenvolvimento sadio.
A legislação visa coibir tais práticas ao permitir que o juiz, ao identificar indícios de alienação parental, adote medidas de intervenção, como advertências, multas, alteração do regime de convivência e até a suspensão da autoridade parental. Tais medidas estão previstas no artigo 6º da Lei nº 12.318/2010, que busca proteger o direito à convivência familiar e evitar que o abuso emocional causado pela alienação parental prejudique o desenvolvimento da criança (Brasil, 2010). A lei reconhece que a convivência saudável com ambos os pais é um direito fundamental e imprescindível para o desenvolvimento integral do menor.
Contudo, a Lei da Alienação Parental também é alvo de críticas e controvérsias, especialmente no que diz respeito à sua aplicação em casos de acusações de abuso sexual. Existem preocupações de que a lei possa ser utilizada como um instrumento para desqualificar denúncias legítimas, favorecendo, em alguns casos, o suposto abusador. Em diversos casos, conforme discutido por Barnabé em seu trabalho sobre as controvérsias da aplicação da lei, foi evidenciado que a má aplicação do conceito de alienação parental pode resultar na revitimização da criança ou adolescente, expondo-os a situações de risco (Barnabé, 2019).
Macie também menciona que a legislação deve ser aplicada com cautela para que não se torne um meio de silenciar denúncias legítimas, ressaltando que é necessário investigar a fundo cada caso e considerar laudos periciais antes de qualquer decisão judicial (2020).
Outro aspecto relevante é que a Lei da Alienação Parental impõe a necessidade de profissionais especializados para a avaliação dos casos, incluindo psicólogos e assistentes sociais, a fim de garantir que as decisões judiciais sejam tomadas com base em critérios técnicos e com respeito ao princípio do melhor interesse da criança. Macie (2020) ressalta que a atuação desses profissionais é fundamental para evitar erros que possam resultar em consequências graves, como a retirada indevida de crianças do convívio com um dos genitores ou a concessão da guarda ao genitor alienador.
A convivência familiar é reconhecida pela legislação brasileira como um dos direitos fundamentais da criança e do adolescente, sendo indispensável para seu desenvolvimento físico, emocional e social. A Constituição Federal de 1988 e o ECA priorizam a manutenção dos laços familiares, entendendo que o ambiente familiar proporciona segurança, afeto e apoio necessários para que a criança e o adolescente possam se desenvolver de maneira plena. Macie (2020) argumenta que a ruptura desse convívio pode causar prejuízos irreparáveis, afetando a autoestima e a capacidade de estabelecer vínculos emocionais saudáveis ao longo da vida.
Nesse sentido, a Lei da Alienação Parental complementa a legislação existente ao reconhecer a importância de ambos os genitores no processo de formação da identidade da criança e do adolescente. A alienação parental, ao criar barreiras entre a criança e um dos pais, constitui uma ameaça ao desenvolvimento saudável e ao direito de convivência familiar, e, por isso, a intervenção do Estado é fundamental para garantir que o melhor interesse da criança prevaleça em todas as decisões judiciais.
Por fim, é importante destacar que a convivência familiar, além de ser um direito garantido por lei, é essencial para que a criança e o adolescente desenvolvam uma noção equilibrada de pertencimento e proteção (Anunciação, 2023). Conforme Macie, o Estado e a sociedade têm o dever de promover políticas públicas que incentivem e resguardem essa convivência, evitando que situações de conflito conjugal interfiram no desenvolvimento saudável dos menores e que práticas de alienação parental prejudiquem o estabelecimento de vínculos afetivos (2020).
3. ACUSAÇÕES NO CONTEXTO DE ALIENAÇÃO PARENTAL
Neste capítulo, examina-se o papel das acusações, tanto verdadeiras quanto falsas, de estupro de vulnerável, especialmente no contexto da alienação parental. A partir de uma análise crítica, explora-se a aplicação da Lei de Alienação Parental (Lei nº 12.318/2010) e suas controvérsias, com especial atenção às consequências jurídicas impostas ao genitor alienador e as implicações das acusações falsas e verdadeiras.
3.1. FALSAS E VERDADEIRAS ALEGAÇÕES DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL
A distinção entre acusações verdadeiras e falsas de estupro de vulnerável apresenta-se como um aspecto central e delicado na dinâmica da alienação parental. Segundo Macie (2020), as denúncias de abuso sexual infantil, quando inseridas em contextos litigiosos de guarda, revelam-se particularmente complexas devido à natureza sigilosa e à subjetividade que permeiam a investigação desses casos. A autora destaca que, apesar de a legislação atual proporcionar mecanismos para proteger a criança, a utilização desses recursos em disputas de guarda pode levar à banalização das acusações e ao desgaste psicológico das partes envolvidas, incluindo a própria criança.
Para Macie, as acusações verdadeiras configuram situações de extrema gravidade, nas quais a proteção integral da criança deve prevalecer sobre quaisquer outros direitos (2020). A autora esclarece que, no cenário de alienação parental, tais acusações podem ser instrumentalizadas, gerando uma confusão entre a necessidade de resguardar o menor e o uso indevido de alegações como estratégia de alienação. A legislação brasileira, em resposta a essa necessidade, estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) como um mecanismo de proteção prioritária (Brasil, 1990). Ações investigativas adequadas, conforme Macie, tornam-se essenciais para garantir que a acusação seja avaliada de maneira justa, sem influências externas do conflito conjugal.
Por outro lado, as falsas alegações de abuso sexual infantil são frequentemente associadas a tentativas do genitor alienador de prejudicar a convivência entre a criança e o outro genitor, o que caracteriza um quadro de alienação parental. Conforme exposto por Barnabé (2019), o principal desafio nesses casos é diferenciar alegações legítimas de táticas de manipulação emocional, dada a dificuldade em se obter provas diretas do abuso. Para garantir que esses casos sejam tratados com seriedade, o ideal é que profissionais qualificados sejam responsáveis por conduzir a investigação e realizar perícias psicológicas, um procedimento que, embora previsto na legislação, é frequentemente negligenciado (Barnabé, 2019).
3.2. CONTROVÉRSIAS NA LEI DA ALIENAÇÃO PARENTAL
A Lei nº 12.318/2010, conhecida como Lei de Alienação Parental, enfrenta diversas críticas e controvérsias, especialmente quando há suspeitas de falsas acusações de abuso sexual. Uma crítica comum, como aponta Macie (2020), é a possibilidade de que o caráter punitivo da lei possa ser aplicado de forma precipitada, sem uma investigação adequada, expondo crianças a riscos adicionais. Em situações em que o juiz, com base em indícios, decreta medidas provisórias, como a alteração da guarda, existe o risco de decisões equivocadas, o que, em última instância, pode significar que a criança seja afastada de um genitor protetor e exposta a abusos do outro.
Segundo Maria Berenice Dias (2013), a lei deveria ser revista para tornar obrigatória a perícia psicológica em todos os casos onde há alegação de abuso sexual, uma vez que as decisões sem esse respaldo pericial abrem brechas para injustiças. Este tipo de perícia é essencial para fornecer uma análise imparcial e baseada em critérios técnicos, reduzindo o impacto de eventuais acusações infundadas.
A falta de clareza na lei quanto ao conceito de alienação parental, que pode abranger tanto comportamentos intencionais quanto não intencionais, é outro ponto controverso. Como observa Macie (2020), a subjetividade envolvida nas decisões judiciais nesses casos, aliada à ausência de diretrizes específicas, facilita o uso inadequado da lei. Alguns autores argumentam que, ao priorizar uma solução imediata, a legislação negligencia a necessidade de uma investigação aprofundada, o que compromete o direito das crianças à proteção integral.
3.3 PUNIÇÃO PARA O ALIENADOR
A Lei de Alienação Parental prevê diversas punições para o genitor alienador, variando desde advertências até a suspensão da autoridade parental (Brasil, 2010). Quando as alegações de alienação parental são confirmadas, o juiz pode determinar a mudança da guarda, assegurar a convivência com o genitor alienado e, em casos extremos, suspender os direitos parentais do alienador. No entanto, conforme Macie (2020), essas medidas punitivas, quando aplicadas sem o devido rigor técnico e respaldo pericial, podem ter consequências irreversíveis para as crianças, especialmente se forem baseadas em falsas acusações.
Barnabé (2019) discorre sobre a importância de um acompanhamento psicológico contínuo dos envolvidos para mitigar os impactos das sanções aplicadas. Ela ressalta que, quando um genitor é punido pela prática de alienação parental, a criança deve receber apoio psicológico para lidar com a transição e o afastamento de um dos genitores, minimizando o risco de danos emocionais. Além disso, Macie aponta que a inclusão de acompanhamento psicossocial nas penalidades reforça a necessidade de o sistema jurídico envolver profissionais capacitados para auxiliar o judiciário na tomada de decisões (2020).
Embora a lei busque equilibrar a relação entre os genitores e proteger a criança, a aplicação das punições deve considerar o contexto em que as alegações surgiram. Como bem argumenta Macie (2020), a aplicação cega de sanções, sem avaliação criteriosa dos fatos, pode levar a injustiças, beneficiando o verdadeiro abusador em vez de proteger a criança. Portanto, cabe ao judiciário, com o suporte técnico adequado, diferenciar acusações legítimas de táticas de alienação, priorizando o bem-estar da criança.
A análise apresentada, reforça a complexidade das acusações de abuso sexual no contexto da alienação parental. A distinção entre alegações verdadeiras e falsas é fundamental, mas também é indispensável que a aplicação da lei ocorra com rigor técnico, assegurando que a proteção integral da criança seja sempre a prioridade. As controvérsias que envolvem a Lei de Alienação Parental demonstram a necessidade de uma revisão que privilegie investigações qualificadas e decisões pautadas em perícias adequadas, evitando a aplicação precipitada de sanções que possam comprometer o bem-estar dos menores.
4. CONSEQUÊNCIAS PSICOLÓGICAS E JURÍDICAS
A complexidade dos casos de alienação parental tem trazido implicações significativas para o sistema jurídico e para a saúde mental das crianças e dos genitores envolvidos. Quando se trata de acusações de abuso sexual no contexto de alienação parental, as consequências psicológicas e jurídicas ganham proporções ainda mais graves, uma vez que há uma sobreposição de direitos fundamentais, incluindo o direito à proteção da criança e o direito ao convívio familiar. Neste capítulo, serão abordados os impactos da implantação de falsas memórias em crianças, as consequências para o genitor alienado e exemplos de julgados e jurisprudência que ilustram as decisões do STJ e do STF em casos de acusações de abuso infantil no contexto de alienação parental.
4.1 CONSEQUÊNCIA DA IMPLANTAÇÃO DE FALSAS MEMÓRIAS – FATORES PSICOLÓGICOS E PSICOSSOCIAL PARA A CRIANÇA
A construção de falsas memórias em crianças tem sido um tema amplamente discutido pela psicologia e pelo direito, especialmente nos casos em que um dos genitores é acusado de abuso sexual em contextos de separação e alienação parental. Estudos mostram que crianças são altamente influenciáveis e, em situações de intensa manipulação emocional, podem desenvolver memórias que não correspondem à realidade, acreditando genuinamente em eventos que jamais ocorreram (Macie, 2020). Segundo Macie, o fenômeno das falsas memórias é particularmente relevante em casos de alienação parental, uma vez que o genitor alienador pode implantar narrativas falsas na mente da criança para afastá-la do outro genitor, minando o vínculo afetivo entre ambos.
De acordo com a autora, a criação de falsas memórias ocorre de forma gradual, com o genitor alienador, geralmente o guardião da criança, insistindo em determinadas narrativas até que a criança passe a considerá-las verdadeiras.
Estudos realizados por Guazelli (2019) indicam que esse processo de alienação impacta gravemente a saúde mental da criança, provocando confusão e sofrimento, que podem levar a traumas psicológicos de longo prazo. Além disso, Macie observa que, ao ter a realidade manipulada, a criança pode desenvolver transtornos de ansiedade, depressão e baixa autoestima, uma vez que sua percepção de segurança e confiabilidade nos adultos é comprometida.
Nesse contexto, Gardner (2002, s/p), em seus estudos, fez a seguinte definição de Síndrome de Alienação Parental (SAP):
A Síndrome de Alienação Parental (SAP) é um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor (o que faz a “lavagem cerebral, programação, doutrinação”) e contribuições da própria criança para caluniar o genitor alvo. Quando o abuso e/ou a negligência parentais verdadeiros estão presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assim a explicação de Síndrome de Alienação Parental para a hostilidade da criança não é aplicável.
A Síndrome da Alienação Parental (SAP), conceituada por Richard Gardner, é um reflexo extremo das falsas memórias implantadas em crianças, caracterizando-se pelo afastamento emocional e pela repulsa da criança em relação ao genitor alienado, sem motivos concretos que justifiquem tal aversão (Gardner, 2001).
Urge mencionar que a Síndrome da Alienação Parental e a Alienação Parental, não se confundem. Nessa toada, a SAP (Síndrome da Alienação Parental) seria a junção dos sintomas causados pela Alienação Parental. Sendo assim, o Projeto de Lei n.º 4.053/08, que deu origem à Lei da Alienação Parental, os termos são tratados de forma parecidas. Vejamos alguns trechos do Projeto de Lei n.º 4.053/08:
Também não há, atualmente, definição ou previsão legal do que seja alienação parental ou síndrome da alienação parental.
Uns chamam de “síndrome de alienação parental”; outros, de “implantação de falsas memórias.
O psiquiatra americano Richard Gardner nominou de “síndrome de alienação parental”: programar uma criança para que odeie o genitor sem qualquer justificativa (Brasil, 2008).
Dessa forma, a implantação de falsas memórias, não diz respeito a SAP, com foi trazido no Projeto de Lei, e sim com a Alienação Parental.
Embora o conceito de síndrome seja controverso e muitas vezes contestado na doutrina brasileira, a alienação parental é reconhecida pela Lei nº 12.318/2010, que propõe medidas de proteção à criança e ao adolescente contra abusos psicológicos. Macie (2020) alerta, no entanto, que o uso do conceito de síndrome pode, em alguns casos, servir de base para diagnósticos precipitados e decisões judiciais inadequadas, que acabam por desconsiderar a complexidade dos vínculos familiares e a singularidade de cada caso.
4.2 CONSEQUÊNCIA PARA O GENITOR ALIENADO
As consequências para o genitor injustamente acusado de abuso no contexto de alienação parental são devastadoras, tanto no âmbito pessoal quanto no social. Macie (2020) destaca que o genitor alienado passa a experimentar uma série de emoções negativas, incluindo sentimentos de impotência, vergonha e desamparo diante de uma acusação que afeta diretamente sua honra e sua relação com os filhos. O processo judicial em si já é um fator de estresse, mas, no caso das falsas acusações, esse sofrimento é potencializado pela manipulação emocional e pela distorção da realidade, o que gera um impacto psicológico profundo e duradouro.
Para o genitor alienado, a experiência de ser afastado do convívio com o filho por meio de acusações infundadas pode causar sintomas de ansiedade e depressão, além de afetar sua autoestima e sua saúde física. Como afirma Macie (2020), muitas vezes o genitor alienado enfrenta o estigma social e a desconfiança da comunidade, o que dificulta o restabelecimento de laços familiares e a recuperação emocional. Além disso, o processo pode acarretar danos financeiros significativos, uma vez que os custos com advogados, perícias e o tempo dedicado ao litígio tendem a ser elevados.
A alienação parental também repercute na esfera profissional do genitor alienado, que, em razão do desgaste emocional, pode ter sua produtividade reduzida e até enfrentar dificuldades para manter o emprego (Barnabé, 2019). A reincorporação do genitor alienado à vida da criança, mesmo quando a justiça determina a reintegração do convívio, tende a ser lenta e dolorosa, exigindo acompanhamento psicológico tanto para o genitor quanto para a criança, devido às marcas deixadas pela experiência alienadora.
4.3 JULGADOS E JURISPRUDÊNCIA
A jurisprudência brasileira vem apresentando decisões cada vez mais complexas e cuidadosas em casos de alienação parental e falsas acusações de abuso sexual. Tanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) quanto o Supremo Tribunal Federal (STF) têm buscado estabelecer parâmetros para diferenciar situações reais de abuso de estratégias manipulativas de alienação parental, de forma a proteger os interesses da criança sem comprometer os direitos dos genitores.
Em um recente julgamento do STJ, no Recurso Especial n.º 1.635.428, a Corte reafirmou a necessidade de cautela nas decisões envolvendo acusações de abuso no contexto de alienação parental, salientando que a aplicação de medidas extremas, como a alteração de guarda, deve ser fundamentada em perícias robustas e avaliações psicológicas rigorosas (STJ, 2019). A jurisprudência tem enfatizado que decisões baseadas em meros indícios ou depoimentos não corroborados podem resultar em injustiças, tanto para a criança quanto para o genitor alienado, reforçando a importância de um processo de avaliação multidisciplinar.
O STF, por sua vez, em julgados recentes, tem reforçado a aplicação do princípio do melhor interesse da criança, estabelecendo que, em casos de suspeita de alienação parental, é essencial garantir a segurança psicológica e física do menor (STF, ADI n.º 6.181, 2020). Em sua análise, a Corte reiterou a relevância de uma perícia imparcial e de uma investigação minuciosa, apontando que decisões precipitadas podem desestabilizar a estrutura familiar e causar danos irreparáveis. A jurisprudência sugere que a aplicação da Lei nº 12.318/2010 deve ser acompanhada de um olhar crítico e cuidadoso, evitando-se interpretações mecânicas e rígidas que desconsiderem as particularidades de cada caso.
Outro caso emblemático foi o julgamento do STF na ADI n.º 4.424, em que a Corte decidiu pela necessidade de que as medidas de proteção previstas na Lei de Alienação Parental sejam aplicadas com base em laudos técnicos confiáveis e imparciais, resguardando o direito à convivência familiar e evitando que a lei seja utilizada como um instrumento de vingança entre os genitores (STF, 2021). Esse entendimento ressalta o papel fundamental do poder judiciário em agir com prudência, assegurando que a alienação parental seja efetivamente combatida sem, contudo, legitimar práticas abusivas e injustas.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A alienação parental e as falsas acusações de abuso sexual no contexto das disputas de guarda são questões sensíveis que exigem uma abordagem cuidadosa e multidisciplinar. O impacto psicológico na criança e no genitor alienado, bem como a complexidade dos processos judiciais, torna evidente a necessidade de que a legislação e a jurisprudência atuem de forma integrada, assegurando que as medidas aplicadas sejam proporcionais e baseadas em evidências concretas. A contribuição de profissionais de diversas áreas, incluindo psicólogos, assistentes sociais e advogados, é essencial para uma análise abrangente e precisa dos casos de alienação parental.
Para Macie (2020), a correta aplicação da Lei de Alienação Parental e o desenvolvimento de uma jurisprudência sólida e prudente são passos fundamentais para garantir que as crianças não sejam expostas a conflitos familiares abusivos, preservando, ao mesmo tempo, o direito dos genitores à convivência familiar e ao respeito. Esse equilíbrio entre proteção e convivência é o desafio contínuo que o sistema de justiça brasileiro enfrenta, e os recentes julgados do STJ e STF indicam um caminho de maior sensibilidade e rigor técnico na resolução desses casos.
O presente trabalho teve como objetivo investigar o impacto das falsas acusações de estupro de vulnerável dentro da dinâmica da alienação parental, explorando os fundamentos legais e psicológicos que permeiam essa temática, com especial atenção à legislação brasileira, à jurisprudência e aos impactos psicológicos e sociais para todos os envolvidos. A análise permitiu compreender a profundidade e complexidade do tema, evidenciando a necessidade de um cuidado redobrado nas práticas jurídicas e psicológicas em casos que envolvem tanto a suspeita de abuso sexual quanto a possibilidade de manipulação psicológica, intencional ou não, de crianças e adolescentes por parte dos genitores.
No primeiro capítulo, foi abordado o contexto dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes, delineando como a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) asseguram a proteção desses indivíduos. A legislação brasileira possui uma série de dispositivos que visam garantir os direitos das crianças, incluindo o direito à convivência familiar e à proteção contra abusos. No entanto, a aplicação prática desses direitos ainda enfrenta desafios, especialmente quando há acusações de abuso no contexto de disputas de guarda. Foi nesse contexto que a Lei da Alienação Parental (Lei nº 12.318/2010) surgiu como uma tentativa de equilibrar as relações familiares e garantir a convivência dos filhos com ambos os genitores, mesmo após a separação dos pais. A lei reconhece a alienação parental como uma forma de abuso psicológico e interfere para prevenir o afastamento injusto de um dos pais.
O segundo capítulo focou nas acusações no contexto da alienação parental, diferenciando acusações verdadeiras e falsas de estupro de vulnerável. Foi discutido como a Lei da Alienação Parental busca estabelecer mecanismos para proteger os direitos das crianças e dos genitores, mas também como ela pode ser usada de forma indevida, tornando-se um instrumento de vingança e manipulação em conflitos familiares. A análise apontou que as acusações de abuso sexual, especialmente quando infundadas, podem causar danos irreparáveis à criança, ao genitor acusado e ao sistema de justiça.
Essa situação também levanta questões sobre a aplicabilidade e efetividade da lei, que, em certos casos, falha em proteger aqueles que realmente são vítimas de abuso e punir os que fazem uso da falsa denúncia como instrumento de alienação. Destacou-se a importância de uma análise criteriosa em casos que envolvem acusações sérias, sugerindo que o juiz não se baseie apenas em indícios superficiais, mas em provas concretas e avaliações técnicas realizadas por profissionais qualificados.
No terceiro capítulo, foram discutidas as consequências psicológicas e jurídicas da alienação parental e das falsas acusações de abuso sexual. Com base na literatura sobre psicologia infantil, foi analisado o fenômeno da implantação de falsas memórias, que pode ocorrer tanto de forma intencional quanto não intencional por parte do genitor alienador. Esse fenômeno evidencia como a criança pode ser influenciada a acreditar em eventos que não ocorreram, com o intuito de prejudicar o outro genitor. O capítulo também explorou os impactos no genitor alienado, ressaltando as consequências emocionais, sociais e jurídicas para aquele que é injustamente acusado.
A análise da jurisprudência revelou que o sistema judiciário brasileiro enfrenta dificuldades em lidar com esses casos, muitas vezes com julgamentos baseados em provas insuficientes e interpretações subjetivas, o que reforça a necessidade de aprimoramento dos mecanismos de análise e julgamento nesses processos.
O objetivo principal deste trabalho foi alcançado, na medida em que proporcionou uma visão ampla e detalhada sobre o impacto das falsas acusações de estupro de vulnerável na dinâmica da alienação parental, abordando tanto os aspectos legais quanto os psicológicos. A investigação permitiu compreender como a Lei da Alienação Parental, embora tenha sido criada com boas intenções, pode ser manipulada para fins de vingança pessoal, e como essa manipulação pode causar danos profundos e de longa duração. Ademais, o trabalho demonstrou a importância de uma atuação multidisciplinar nos casos de alienação parental, com a presença de profissionais qualificados em psicologia, serviço social e direito para avaliar as alegações e proteger o bem-estar da criança.
Além disso, os capítulos apresentaram uma análise criteriosa das consequências das falsas acusações, tanto para a criança quanto para os genitores, o que atende aos objetivos específicos propostos inicialmente. A pesquisa também revelou que, embora a legislação brasileira contemple a alienação parental e busque proteger o direito de convivência familiar, ainda há lacunas na sua aplicação e na interpretação das situações, especialmente nos casos que envolvem acusações de abuso sexual. Essa constatação reforça a necessidade de aprimoramento da legislação e de maior capacitação dos operadores do direito.
A partir dos resultados obtidos, algumas propostas de aprimoramento na legislação e nas práticas jurídicas podem ser sugeridas para melhor atender aos interesses das crianças e proteger os direitos dos genitores envolvidos em processos de alienação parental. Essas propostas buscam minimizar os danos causados pelas falsas acusações e assegurar uma aplicação mais justa e eficiente da Lei da Alienação Parental. Uma sugestão seria a realização de perícias psicológicas e biopsicossociais obrigatórias em todos os casos que envolvem suspeitas de alienação parental e falsas acusações de abuso sexual.
Esses exames devem ser realizados por equipes multidisciplinares e altamente capacitadas, que possam oferecer um diagnóstico imparcial e fundamentado, minimizando o risco de decisões baseadas em percepções subjetivas ou insuficientes. Além disso, juízes, promotores e advogados que atuam em casos de família devem receber treinamento contínuo sobre os aspectos psicológicos e sociais da alienação parental e das falsas acusações de abuso sexual, permitindo uma melhor compreensão da complexidade dessas situações e ajudando a evitar decisões precipitadas e a proteger o melhor interesse da criança.
É necessário revisar a Lei nº 12.318/2010, estabelecendo critérios mais rigorosos para a aplicação das sanções previstas, especialmente nos casos de inversão de guarda. A lei deve ser ajustada para garantir que essas sanções sejam aplicadas apenas quando houver provas concretas e não apenas baseadas em indícios ou suspeitas superficiais. A obrigatoriedade do acompanhamento psicológico para a criança e ambos os genitores durante o processo, independentemente de quem seja o acusado, ajudaria a proteger a criança contra os danos emocionais decorrentes de processos de alienação e falsas acusações, além de oferecer suporte para o genitor injustamente acusado.
O Poder Judiciário também deve desenvolver diretrizes específicas para identificar sinais de falsas memórias em crianças, com a ajuda de especialistas em psicologia infantil. Essas diretrizes poderiam ser aplicadas durante as entrevistas com as crianças e na análise dos depoimentos, reduzindo o risco de condenações injustas. A lei deve prever sanções mais claras para o genitor que faz uso de falsas acusações como forma de alienação parental, incluindo responsabilização civil e penal, como uma forma de dissuadir comportamentos que prejudiquem o outro genitor e a criança. É essencial que o sistema judiciário demonstre que as falsas acusações são inaceitáveis e que aqueles que manipulam o sistema para seu benefício pessoal serão punidos.
A análise realizada ao longo deste trabalho evidencia que o fenômeno da alienação parental e as falsas acusações de abuso sexual representam grandes desafios para o sistema judiciário e para a sociedade. A Lei da Alienação Parental, embora seja um avanço no reconhecimento de abusos emocionais e psicológicos sofridos por crianças, ainda necessita de ajustes para garantir a proteção do interesse superior do menor e a aplicação justa e equilibrada de suas disposições. O aprimoramento da legislação e das práticas jurídicas, conforme proposto, poderá contribuir para uma abordagem mais humana, justa e efetiva, que leve em conta as complexidades da dinâmica familiar e assegure a proteção dos direitos das crianças e dos genitores.
Por fim, é crucial que o Direito continue a evoluir em resposta às demandas sociais, adaptando-se às novas realidades e buscando sempre proteger o bem-estar das crianças e adolescentes. Somente por meio de uma atuação integrada e multidisciplinar, com o apoio de profissionais capacitados e uma legislação mais robusta, será possível minimizar os danos causados pela alienação parental e as falsas acusações, promovendo um ambiente mais seguro e saudável para o desenvolvimento das crianças.
REFERÊNCIAS
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[1] Estudante de Direito da Faculdade Independente do Nordeste
[2] Estudante de Direito da Faculdade Independente do Nordeste
[3] Professor de Direito da UESB