O FEMINICÍDIO DE MULHERES NO CENÁRIO DE VULNERABILIDADE EM MANAUS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102411170002


Christie Esther Maia de Sousa1


RESUMO

O presente ofício objetiva analisar e entender as razões por trás do feminicídio entre mulheres em situação de vulnerabilidade em Manaus, considerando que a taxa vem crescendo a cada dia, o feminicídio em Manaus é um grave reflexo da desigualdade de gênero e das estruturas de poder patriarcais ainda presentes na sociedade. Esse tipo de violência extrema contra as mulheres é frequentemente precedido por ciclos de abuso físico e psicológico, e pode ser agravado por fatores como dependência econômica e histórico de violência doméstica. Dada a necessidade de ações mais eficazes para combater esse problema, implementando leis mais rígidas. A metodologia adotada inclui pesquisa bibliográfica e análise de jurisprudências.

Palavras- Chave: Feminicídios, Vulnerabilidade, Mulheres, Manaus, Violência Doméstica.

ABSTRACT

This letter aims to analyze and understand the reasons behind femicide among women in vulnerable situations in Manaus, considering that the rate has been growing every day, femicide in Manaus is a serious reflection of gender inequality and patriarchal power structures still present in society. This type of extreme violence against women is often preceded by cycles of physical and psychological abuse, and can be aggravated by factors such as economic dependence and a history of domestic violence. Given the increase in the number of reports of domestic violence and femicides in the city, given the need for more effective actions to combat this problem, implementing stricter laws. The methodology adopted includes bibliographic research and analysis of jurisprudence.

Keywords: Femicides, vulnerability, Women, Manaus, domestic violence.

1  INTRODUÇÃO

Em um cenário marcado por profundas desigualdades que limitam diversos direitos fundamentais, é essencial investigar os fatores que contribuem para a vulnerabilidade social, especialmente entre grupos considerados mais suscetíveis, como as mulheres. Na vasta região amazônica, com suas características únicas, as mulheres enfrentam altos níveis de vulnerabilidade social, exacerbados pelo contexto em que vivem, o que torna indispensável a realização de pesquisas que identifiquem esses fenômenos e proponham soluções no âmbito jurídico.

É crucial, portanto, examinar a interseccionalidade de fatores que agravam essa vulnerabilidade, pois sua combinação pode revelar um estado de hiper vulnerabilidade.

O feminicídio, que se refere ao assassinato de mulheres devido à sua identidade de gênero, representa uma das formas mais severas de violência contra o sexo feminino. Muitas vezes, esse crime é precedido por um histórico prolongado de agressões físicas, verbais e psicológicas, frequentemente cometidas por companheiros ou ex-companheiros. Essa realidade cruel afeta mulheres de diferentes condições sociais e regiões, mas se torna ainda mais preocupante em áreas onde há maior vulnerabilidade socioeconômica e desigualdade de gênero.

Em Manaus, capital do Amazonas, essa questão se revela alarmante, especialmente para mulheres em situação de pobreza, que enfrentam dificuldades de acesso a recursos e serviços de apoio. A interação de elementos como a cultura patriarcal, a fragilidade das políticas públicas e a ausência de proteção adequada mantém um ciclo de violência que frequentemente resulta em feminicídio. O enfrentamento ao feminicídio em Manaus está diretamente ligado ao enfrentamento da cultura patriarcal, e exige um compromisso coletivo da sociedade e do poder público para garantir uma cidade mais segura e justa para todas as mulheres

Assim, o objetivo deste estudo é analisar a vulnerabilidade de gênero, destacando a interseccionalidade dos fatores que intensificam essa condição, com foco nas mulheres de Manaus. Uma vez que leis foram criadas para ajudar assegurar as mulheres, ao mesmo tempo é falha.

Para atender a essa proposta, são definidos alguns objetivos específicos: discutir os conceitos que fundamentam a análise, como vulnerabilidade e interseccionalidade; aprofundar a investigação acerca da vulnerabilidade e do interesse do vulnerável com base na literatura existente; apresentar questões relacionadas especificamente à vulnerabilidade de gênero; abordar a violência doméstica como um fator de vulnerabilização das mulheres, analisar as leis que rege as mulheres na sua proteção. O método utilizado para a elaboração deste artigo é o dedutivo, começando pelas questões gerais que cercam o tema até chegar ao problema específico proposto, empregando como recursos metodológicos a pesquisa bibliográfica e documental.

2  CONTEXTO HISTÓRICO: PAPEL DA MULHER

De acordo com a história bíblica, com a criação de Adão e Eva, já se nota uma diferença entre gêneros, acredita-se que o papel do homem foi sendo construído como o provedor, o lutador que defende sua nação e família. Assim, foi se perpetuando o patriarcado, as mulheres foram se colocando em um papel de algo frágil, delicado, onde o somente o homem seria seu salvador e príncipe.

Para Martins (2019), a concepção da cultura sobre a mulher, relata que:

(…) os tempos mais remotos a mulher era colocada num lugar de inferioridade em relação ao homem, numa situação de submissão perante o sexo masculino. Antes havia a cultura social de patriarcado da sociedade machista, que foi construída através de uma estrutura antiga de dominação dos homens sobre as mulheres. A função masculina era de exercer o trabalho e sustentar a família, e a feminina, era cuidar dos afazeres de casa e dos filhos. Nesse cenário de hierarquia, os homens foram consolidando seu poder diante das mulheres, chegando a violentá-las e matá-las.

Esse cenário começou a mudar com a Revolução Industrial, quando as mulheres ingressaram no mercado de trabalho, o que as levou a reivindicar liberdade, igualdade e a questionar a discriminação que sempre sofreram. Com essas transformações, as mulheres passaram a contribuir financeiramente para a manutenção do lar, adquirindo assim uma certa autonomia. Elas começaram a exigir que os homens participassem das responsabilidades domésticas, promovendo a necessidade de dividir o cuidado dos filhos e as tarefas do dia a dia. (Dias,2014, p.22)

A mulher estava conquistando seu próprio lugar na sociedade e no campo profissional, sem depender mais da supervisão masculina. Conforme afirma a historiadora Juliana Bezerra, “o feminismo no Brasil teve início no século XIX, com a batalha pela educação das mulheres, o direito ao voto e a abolição da escravatura” (BEZERRA, 2018).

Essa mudança consagrou ao direito ao voto feminino, ao ensino, a conseguir alcançar uma graduação, a ocupar alguns cargos restritos, essa mudança foi deferente em casa nação. Mas que ao decorrer do tempo e conhecimento se espalhou ao mundo todos, mais nos países ocidentais.

Em 1988, a Constituição Federal estabeleceu a igualdade de gênero como um direito essencial, conforme mencionado em seu artigo 5º, inciso I, que trata dos direitos e deveres tanto coletivos quanto individuais relacionados às garantias fundamentais, afirmando que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, de acordo com esta Constituição” (BRASIL, C.F, 1988).

Entre as conquistas mais recentes no âmbito da legislação voltada para as mulheres, destaca-se a Lei Maria da Penha, que será discutida neste estudo, criada para enfrentar a violência doméstica e familiar contra as mulheres. Além disso, a Lei do Feminicídio surgiu para consolidar as lutas históricas das mulheres na busca pela realização de seus direitos.

3  O PRINCIPAL MOTIVO DAS CAUSA DE FEMINICÍDIOS

O que leva uma mulher a se tornar vítima fatal do próprio companheiro? O que a leva a ser tantas vezes agredida: fisicamente, sexualmente, financeiramente, psicologicamente e até mesmo morta por uma pessoa que deveria a amar, a proteger, ou, no mínimo, a respeitar? Quais são as raízes desta barbárie? De que forma os casos de feminicídio se tornaram estatísticas tão cruéis e assustadoras dentro do nosso país? Por que elas permanecem em situação de risco com o parceiro violento? Por que as leis não obstam o crime, e como o Estado age (ou reage) em relação a esse cenário?

A Vitimologia é o estudo global da vítima. Nas palavras do criminólogo e advogado israelita, Benjamin Mendelsohn, trata-se de “ciência que procura estudar a personalidade da vítima sob os pontos de vista psicológico e sociológico na busca de

entender a permanência dessas vítimas com o agressor. Mas para a sociedade a principal causa é a

A vulnerabilidade das mulheres em Manaus, como em outras regiões do Brasil, pode ser atribuída a uma série de fatores interligados que envolvem aspectos sociais, econômicos, culturais e estruturais. Abaixo, detalho alguns dos principais fatores que contribuem para a vulnerabilidade das mulheres na cidade:

4  FATORES QUE CONTRIBUEM PARA A VULNERABILIDADE DESSAS MULHERES EM MANAUS

A cidade de Manaus em si para os moradores não é segura, pois de acordo com os dados o deputado Comandante Dan, presidente da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam), citou na tribuna para destacar o “Mapa da Segurança Pública 2024 – ano base 2023”, que está disponível no portal do Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Esse relatório indica que, em termos absolutos, Manaus ocupa a terceira posição entre as dez cidades brasileiras com o maior número de homicídios dolosos em 2023. O ranking é liderado pelo Rio de Janeiro, com 1.118 casos, seguido por Salvador, que teve 986 ocorrências. A capital do Amazonas contabilizou 866 assassinatos.

“Ao nos debruçamos sobre a informação, vemos que o Amazonas está em sexto lugar na taxa de homicídios dolosos (31,79 por 100 mil), mas a capital é a primeira, o que inclusive deve direcionar as ações e prioridades estratégicas da segurança pública, foram 866 crimes em Manaus e 387 no interior”,( Dan, 2024).

Se para a população local a cidade não oferece segurança, lembraremos que as mulheres fazem parte dessas estatísticas, e logo elas não estão seguras.

De forma geral não se pode afirmar que apenas um motivo seja relevado como a maior causa das mortes de mulheres, acredita-se que na região de Manaus, o maior fator contribuinte, seja a instabilidade profissional das mulheres, o que acarreta na dependência financeiras de seus parceiros. Uma vez que as mulheres ainda são criadas em uma cultura do ‘’ homem provedor””, acabam se submetendo a vários tipos de tragédia, levando na sua morte. Mas existem fatores principais que acarretam nas suas mortes como:

4. 1 Desigualdade de Gênero e Violência

A violência de gênero, tanto física quanto psicológica, é uma das principais causas da vulnerabilidade das mulheres em Manaus. Mulheres enfrentam altos índices de violência doméstica, assédio sexual e feminicídios. Dados de organizações como o “Mapa da Violência’’ indicam que, na Região Norte do Brasil, especialmente em cidades como Manaus, os índices de violência contra mulheres estão entre os mais altos do país. Fatores como machismo, misoginia e normas culturais que desvalorizam as mulheres contribuem para essa realidade.

“A violência de gênero está profundamente conectada à ideia de que a mulher é propriedade do homem. O feminicídio, portanto, é uma consequência dessa visão que desconsidera a mulher como sujeito de direitos.” —Lélia Gonzalez,

4.2 Desigualdade Econômica

As mulheres em Manaus, especialmente as negras, indígenas e periféricas, enfrentam barreiras significativas no acesso a recursos econômicos. A desigualdade salarial entre homens e mulheres é um reflexo dessa disparidade, onde as mulheres ganham, em média, menos do que os homens, mesmo desempenhando funções semelhantes. Além disso, muitas mulheres dependem economicamente de seus parceiros ou familiares, o que pode torná-las mais vulneráveis à violência e dificultar sua capacidade de alcançar autonomia.

4. 3 Falta de Acesso a Serviços Públicos

A falta de acesso a serviços de saúde, educação e assistência social de qualidade também é um fator importante. Muitas mulheres em Manaus, especialmente nas periferias e em áreas rurais, enfrentam dificuldades para acessar serviços de saúde reprodutiva, como contracepção, tratamento para doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), e até mesmo cuidados médicos básicos. A escassez de políticas públicas efetivas de apoio à mulher, como programas de acolhimento para vítimas de violência, também agrava essa situação.

4. 4 Racismo e Discriminação Étnico-Racial

A discriminação racial é um fator adicional que torna as mulheres negras, indígenas e periféricas ainda mais vulneráveis. Mulheres negras em Manaus enfrentam a interseção entre a desigualdade de gênero e o racismo estrutural, o que as coloca em uma situação de desvantagem ainda maior no mercado de trabalho, no acesso à educação e no enfrentamento da violência.

” A tentativa de dominação do masculino sobre o feminino é ato contínuo, porém em tempos atuais há a aplicação do princípio da igualdade, não havendo diferenciação entre os sexos, raça, cor ou credo”. (Azevedo, 2018).

4. 5 Pobreza e Desigualdade Social

A pobreza é uma realidade para grande parte da população feminina em Manaus. Muitas mulheres vivem em condições de vulnerabilidade extrema, especialmente em áreas periféricas da cidade e na zona rural. A falta de oportunidades de emprego, a ausência de infraestrutura básica e a escassez de políticas públicas adequadas para essas mulheres ampliam ainda mais suas dificuldades.

4. 6 Tráfico de Pessoas e Exploração Sexual**

Em Manaus, como em outras regiões do Brasil, o tráfico de mulheres para fins de exploração sexual é um problema grave. O aumento do turismo sexual e a vulnerabilidade econômica das mulheres, muitas das quais são induzidas ou forçadas a entrar nesse mercado, contribuem para o crescimento desse problema. A falta de políticas eficazes de combate ao tráfico e a dificuldade de acesso a serviços de proteção social e jurídica para as vítimas tornam essa situação ainda mais complexa.

4. 7 Tradições Culturais e Normas Sociais

As normas culturais e sociais podem reforçar estereótipos de gênero que limitam as mulheres, impondo-lhes papéis tradicionais de mãe, esposa ou cuidadora. Em muitos casos, essas normas dificultam o acesso das mulheres a oportunidades educacionais e profissionais, além de manterem práticas de violência ou abuso no espaço doméstico. Em algumas comunidades, as práticas tradicionais podem agravar ainda mais a opressão feminina, como em casos de casamento precoce ou “rituais” de submissão.

4.8 Ausência de Redes de Apoio

A falta de uma rede de apoio robusta para mulheres, como ONGs, grupos de apoio e centros de atendimento, também contribui para a vulnerabilidade das mulheres em Manaus. Muitas mulheres não têm acesso a uma rede de apoio psicológico, social ou jurídico que as ajude a sair de situações de violência ou a enfrentar dificuldades no mercado de trabalho.

4. 9 Falta de Políticas Públicas Efetivas

Apesar dos avanços em termos de políticas públicas voltadas para os direitos das mulheres, como a Lei Maria da Penha e a criação de delegacias especializadas, a implementação dessas políticas em Manaus ainda é insuficiente. A falta de recursos, infraestrutura e treinamento adequado para profissionais de saúde, segurança pública e assistência social acaba dificultando o efetivo atendimento às mulheres em situação de vulnerabilidade.

Para a defensora pública Margarida, “A falta de políticas públicas eficazes de proteção às mulheres, aliada à impunidade dos agressores, contribui diretamente para o aumento do feminicídio. Quando as mulheres denunciam, muitas vezes não há resposta adequada.” (Buzitti,2023).

4.  10 Migração e Deslocamento

Manaus é uma cidade com grande fluxo migratório, especialmente de mulheres que vêm de outras regiões do Amazonas ou de estados vizinhos em busca de melhores condições de vida. Muitas dessas mulheres chegam à cidade sem redes de apoio e enfrentam desafios adicionais, como a adaptação à nova realidade, falta de moradia e empregos precários. Além disso, a migração pode expô-las ao tráfico de pessoas e outras formas de exploração. Na cidade de Manaus, é muito comum as mulheres irem pra área urbana em busca de melhoria de vida, mas na maioria acabam sendo escravizadas em casas de família diferente

Margarida ainda diz que “A vulnerabilidade das mulheres em Manaus é um problema complexo, que envolve uma série de fatores estruturais, sociais, culturais e econômicos”. A superação dessa vulnerabilidade exige ações coordenadas entre governos, sociedade civil e organizações internacionais, com foco em políticas públicas de igualdade de gênero, combate à violência, melhoria no acesso à educação e saúde, e promoção de uma cultura de respeito aos direitos das mulheres.

5  AS MEDIDAS E INICIATIVAS EM MANAUS.

Na esfera legislativa, destacam-se a Lei n.º 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), que proporcionou uma abordagem mais rigorosa e direta para enfrentar a violência doméstica contra mulheres, e a Lei n.º 13.104/2015 (Lei do Feminicídio), que resultou em mudanças no Código Penal brasileiro, classificando o homicídio motivado por ódio à mulher como um crime hediondo, que anteriormente era tratado como uma infração de menor gravidade. (BRASIL, 2006). A Lei Maria da Penha enfatiza, em seus dispositivos, a necessidade de colaboração entre diferentes Poderes e instituições.

Inaugurou diversas inovações, principalmente ao estabelecer, em seu artigo inicial, a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, que definem medidas de assistência e proteção às vítimas, refletindo o esforço do legislador em concretizar os direitos garantidos pela Constituição de 1988. A Lei n.º 13.104/2015, por sua vez, modificou o artigo 121 do Código Penal de 1940, ao definir o homicídio cometido especificamente contra mulheres, buscando combater a impunidade e enfatizar a responsabilidade do Estado, que, por um longo período, demonstrou conivência, por ação ou omissão, com a continuidade da violência de gênero. (Brasil, 2015).

A criação da Lei do Feminicídio foi fruto de uma recomendação da Comissão Mista de Inquérito sobre Violência contra a Mulher (CPMI-VCM), que analisou casos de violência em vários estados do Brasil entre março de 2012 e julho de 2013. Inicialmente, a proposta de lei argumentava que o feminicídio representava uma manifestação extrema da violência de gênero, resultando na morte de mulheres, e indicava como possíveis condições para sua ocorrência a existência de um relacionamento íntimo ou de parentesco entre o agressor e a vítima, além de ações de violência sexual, mutilação ou desfiguração da mulher, realizadas antes ou durante o crime.

5.  1 Lei Maria da Penha

Analisando a Lei Maria da Penha podemos ressaltar que a mesma apartou determinados artigos para tratar das medidas de proteção de urgência. Desde o primeiro artigo da lei, é razoável ver o intento de instituir mecanismos que consistem em ativos para coibir a violência. Mais nomeadamente, as exposições acerca delas começam a ser ilustradas no artigo 18 e vão até o artigo 24-A, que fala ao seu não cumprimento.

Art. 1. Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.(Brasil, 2022 input Dario, 2022).

6  A LEI DE EXECUÇÃO PENAL É O CUMPRIMENTO DE SENTENÇA PELAS CONDENADAS DEFINITIVAS.

As normas e leis são criadas com o objetivo de organizar e disciplinar os conflitos surgidos em decorrência das condutas humanas. Cabe ao Estado, ao surgir um conflito, intervir, regulamentando condutas reprováveis para aquela sociedade, e cabe aos indivíduos aprender a viver em sociedade e respeitar as regras oriundas do Poder Público, sob pena de lhes ser imposta alguma sanção3.

De acordo com Margareth Buzetti (2023), estudo sentes constataram que o feminicídio é o resultado final de uma série de atos anteriores voltados a lesionar ou subjugar a mulher. Entretanto, embora a legislação tenha sido aperfeiçoada no sentido de aumentar a punibilidade para quem comete o crime de feminicídio, e de outros crimes praticados contra a mulher, tais medidas não têm se mostrado eficazes para impedir o aumento exponencial de casos verificado nos últimos anos.

Em março de 2023, noticiou-se pela imprensa que o Brasil bateu recorde de feminicídios no primeiro semestre de 2022. De acordo com dados publicados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), 699 casos foram registrados entre janeiro e junho, o que representaria uma média de quatro mulheres mortas por dia. Em 2019, no mesmo período, foram registrados 631 casos.

Dois anos depois, em 2021, 677 mulheres foram assassinadas em decorrência da violência de gênero. Os dados foram coletados com as pastas estaduais de Segurança Pública pelo FBSP e representam somente os crimes que chegaram a ser registrados formalmente, e com a correta tipificação legal. Portanto, o fato é que após oito anos da promulgação da Lei nº 13.104, de 9 de março de 2015, a Lei do Feminicídio, o assassinato de mulheres em situação de violência doméstica e familiar ou em razão do menosprezo ou discriminação à sua condição aumentaram no país.

Atualmente, o feminicídio é tratado como homicídio qualificado, sendo considerado um crime de ódio motivado pelo gênero da vítima. No entanto, é importante reconhecer que o feminicídio possui particularidades e características próprias que o distinguem de outros tipos de homicídios. Dados estatísticos evidenciam que as mulheres são mais frequentemente vítimas de violência doméstica e crimes de ódio decorrentes de questões de gênero.

O feminicídio é a manifestação mais extrema dessa violência, representando um grave atentado ao direito à vida e à dignidade das mulheres. Sendo assim, é importante considerar o feminicídio como um crime autônomo, de forma a reconhecer a gravidade e a especificidade desse tipo de violência. Tal medida permitirá uma melhor compreensão e identificação desse delito, facilitando a coleta de dados estatísticos mais precisos sobre os casos de violência contra as mulheres, de modo a auxiliar no desenvolvimento de políticas públicas e estratégias de prevenção mais adequadas. Com isso, será possível uma resposta mais efetiva por parte do sistema de justiça.

6.1  PROJETO DE LEI 4266

Art. 1º Os arts. 92, 129, 141 e 147 Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, passam a viger com a seguinte redação:

Arti. 92.……………………………………………………………………………………………

II – a incapacidade para o exercício do poder familiar, da tutela ou da curatela nos crimes dolosos sujeitos à pena de reclusão cometidos contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar, contra filho, filha ou outro descendente, tutelado ou curatelado, bem como nos crimes cometidos contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121A deste Código;

§ 1º Os efeitos de que trata este artigo são automáticos, devendo ser declarados na sentença.

§ 2º Será aplicado ao condenado por crime praticado contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código, o efeito previsto no inciso I deste artigo, sendo igualmente vedada a sua nomeação, designação ou diplomação em qualquer cargo, função pública ou mandato eletivo entre o trânsito julgado da condenação até o efetivo cumprimento da pena.

§ 3º Na hipótese de condenação por crime praticado contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código, os efeitos dos incisos I e II do caput e do § 2º deste artigo serão automáticos.” (NR)

“Lesão Corporal Art. 129…………………………………………… …………………

Violência doméstica

§ 9º…………………Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos. ……………….

§ 13………………………………………………………. Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5

(cinco) anos.” (NR)

“Disposições comuns Art. 141………………………………………… ………………

§ 3º Se o crime é cometido contra mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código, aplica-se a pena em dobro.” (NR).

“Ameaça Art. 147…………………………………………

§ 1º Se o crime é cometido contra mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código, aplica-se a pena em dobro.

§ 2º Somente se procede mediante representação, exceto na hipótese prevista no § 1º deste artigo” (NR).

Art. 2º O Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, passa a viger acrescido do seguinte art. 121-A:

“Art. 121-A. Matar mulher por razões da condição do sexo feminino: Pena – reclusão, de 20 (vinte) a 40 (quarenta) anos.

§ 1º Considera-se que há razões de condição do sexo feminino quando o crime envolve: I – violência doméstica e familiar;

II – Menosprezo ou discriminação à condição de mulher.

§ 2º A pena do feminicídio é aumentada de um 1/3 (um terço) até a metade se o crime é praticado:

I – Durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto, ou se a vítima for a mãe ou a responsável por criança ou adolescente menor de dezoito anos ou, qualquer que seja a idade, se deficiente ou portador de necessidades especiais; II – contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos, com deficiência ou portadora de doenças degenerativas que acarretem

vulnerabilidade física ou mental; condição limitante ou de

  1. – na presença física ou virtual de descendente ou de ascendente da

vítima;

  1. – em descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas nos

incisos I, II e III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006.

  • – nas circunstâncias previstas nos incisos III, IV e VIII do § 2º do art. 121 deste Código. Coautoria § 4º Comunicam-se ao coautor ou partícipe as circunstâncias pessoais elementares do crime previstas no § 1º deste artigo.”

Altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), o Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 (Lei das Contravenções Penais), a Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), a Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei de crimes hediondos) e a Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), para tornar o feminicídio crime autônomo, agravar a sua pena e de outros crimes praticados contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, bem como para estabelecer outras medidas destinadas a prevenir e coibir a violência praticada contra a mulher.

Assim, apresentamos o presente projeto de lei, que altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), o Decreto-lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 (Lei das Contravenções Penais), a Lei nº 7.210, de 11 de julho de

1984 (Lei de Execução Penal), a Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei de crimes hediondos) e a Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), para tornar o feminicídio crime autônomo, agravar a sua pena e de outros crimes praticados contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, bem como para estabelecer um amplo conjunto de medidas destinadas a prevenir e coibir a violência praticada contra a mulher.

De acordo com a PL – 4266, 2023, esclarece que Além de transformar o feminicídio em crime autônomo, verificamos a necessidade de aumentar as penas mínima e máxima para quem comete esse crime odioso, que será fundamental para transmitir uma mensagem clara de repúdio a esse delito e garantir maior proteção às mulheres. A punição adequada é essencial para desencorajar os agressores e promover a justiça, proporcionando um ambiente seguro e igualitário para todas as pessoas, independentemente do seu gênero.

Por sua vez, também agravaremos as penas daqueles crimes que são considerados precursores do crime de feminicídio, que são os crimes de lesão corporal (leve ou grave), vias de fato, contra a honra ou de ameaça, praticados contra a mulher. (Revista Senado, 2023)

No nosso entendimento, tais crimes precisam ter a sua punibilidade agravada, para que, desde o início, seja possível impedir que o agressor progrida em sua empreitada criminosa, chegando no crime mais grave, que é o feminicídio.

No mesmo sentido, agravaremos a pena do crime de descumprimento de medidas protetivas, de modo a impedir que o agressor continue a molestar a vítima, inclusive por meio da prática de novos crimes contra mulher. Outra medida que entendemos necessário implementar é a previsão legal da perda do poder familiar para o agressor. É corriqueiro que agressores tenham sua liberdade concedida em curto espaço de tempo e retomam seu convívio com os descendentes sem restrição, causando sofrimento tanto à vítima quanto aos infantes, que são obrigados a conviver com aquele que em muitas vezes lhes causaram traumas psicológicos de difícil reparação.

Nesse diapasão, relativo à restrição de direitos, estabeleceremos também a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo para aquele que for condenado por crime praticado contra a mulher, impedindo, igualmente, a sua nomeação, designação

ou diplomação nessas atribuições públicas entre o trânsito julgado da condenação até o efetivo cumprimento da pena. Aquele que pratica crime contra a mulher, com violência de gênero, não deve exercer qualquer atribuição pública, uma vez que esta pressupõe a lisura e a correição no trato com as demais pessoas. No âmbito da execução penal, deixaremos expresso na lei acerca da imperatividade na monitoração eletrônica na fiscalização do condenado por crime contra a mulher que esteja usufruindo de qualquer benefício no qual ocorra a sua saída de estabelecimento penal. Tal medida é essencial tanto para impedir o agressor de praticar novos crimes contra a mulher, quanto para possibilitar que as autoridades possam realizar o monitoramento e tomar medidas urgentes. Estabeleceremos também, no âmbito da execução penal, a vedação de visita íntima para aquele que for condenado por crime contra a mulher. Com isso, buscamos impedir o contato do agressor com a vítima, ou qualquer outra mulher, que, não raras vezes, é coagida a visitá-lo, com o único propósito de satisfazer as necessidades sexuais daquele que já a agrediu

anteriormente.

Por fim, destacamos que, na execução penal, a progressão de regime é uma ferramenta importante para a ressocialização dos condenados. No entanto, em casos de feminicídio, a punição não pode ser flexibilizada prematuramente, já que esse crime revela uma violência extrema e um risco elevado às mulheres.

7  CONSIDERAÇÕES FINAIS

A cultura patriarcal, que historicamente colocou os homens em posições de poder sobre as mulheres, ainda exerce grande influência em muitas sociedades. Essa cultura perpetua a ideia de que as mulheres são subjugadas aos homens, seja no âmbito doméstico, profissional ou social. O feminicídio frequentemente ocorre como uma manifestação extrema de violência de gênero, onde o agressor se sente sem direito de controlar ou punir a mulher pela sua autonomia ou resistência. O combate ao feminicídio requer um esforço conjunto de diversas áreas da sociedade. Através de uma combinação de políticas públicas eficazes, educação, sensibilização e suporte institucional, é possível reduzir significativamente a vulnerabilidade das mulheres e prevenir futuros casos de feminicídio. Este estudo ressalta a urgência de ações coordenadas e efetivas para proteger as mulheres e erradicar o feminicídio, garantindo

uma sociedade mais justa e segura para todas. A educação sobre igualdade de gênero, o fortalecimento das redes de apoio e a implementação mais rigorosa de políticas públicas são essenciais para a prevenção e redução dessas violências. Além disso, é crucial combater a culpabilização das vítimas, rejeitar a normalização da violência contra a mulher e trabalhar contra o machismo estrutural presente na sociedade.

Diante disso, é importante tornar mais rígida a progressão de regime nos casos de feminicídio para garantir que os condenados cumpram um tempo mínimo de pena em regime fechado antes de progredir para um regime menos restritivo, visando assegurar a proteção das mulheres e evitar a impunidade para crimes tão graves.

8  REFERÊNCIAS

AZEVEDO, Maria Amélia. Mulheres espancadas: a violência denunciada. p.19 “Os estudos histórico-antropológicos parecem indicar que a dominação da mulher pelo homem é universal e resultou de uma apropriação, por este, de poderes femininos originários, com a finalidade de controlar a reprodução da própria sociedade”.

ADORNO, Sérgio e ALBUQUERQUE, Otávio. Estudo das ocorrências de homicídio no fluxo do sistema de justiça criminal. Relatório Final de Pesquisa. Pesquisa Estudo da Impunidade Penal. Município de São Paulo, 1988. Núcleo de Estudos da Violência-NEV/USP, 2003.

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Senado Federal. Brasília: Senado 1988.LEI N 13.104/15 FEMINICÍDIO. httpss://goo.gl/JVA9FJ.acesso em: 02 de outubro de 2024.

BEZERRA,         Juliana.        Feminismo        no        Brasil.        Disponível                         em:

<https://www.todamateria.com.br/feminismo-no-brasil/>. Acesso em:

BRASIL. Projeto de Lei nº 8305, de 17 de dezembro de 2014. Altera o art. 121 do DecretoLei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, e o art. 1º da Lei

nº 8.072, de 25 de julho de 1990, para incluir o feminicídio no rol dos crimes hediondos. Lei Ordinária 13104/2015. Brasília, DF, 17 dez. 2014. Disponível em:

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BRASIL. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras   providências.    Disponível em:

Lei Ordinária 13104/2015. Brasília, DF, 17 dez. 2014. Disponível em:

<https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=85886 0>. Acesso em: 04. 11.2024.

DARIO, Michel. Feminicídio no Brasil: Uma análise perante ao Sistema Penal pátrio (Direito Penal Livro 1) (Portuguese Edition) (p. 14). Edição do Kindle.

Secretária de Segurança Pública do Estado do Amazonas. Dados Estatísticos.2020/2021.        Disponível em: https://ssp.am.gov.br/ssp-dados/ LIILIANE, LUY, IVY. Feminicídio no Brasil a cultura de matar mulheres. Volume 01. P.02

JESUS, Damasio de. Violência contra Mulher. 2ª edição, 2014.

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Dario, Michel. Feminicídio no Brasil: Uma análise perante ao Sistema Penal pátrio (Direito Penal Livro 1) (Portuguese Edition) (p. 21).

SANEMATSU, Débora Prado e Marisa (Org.). Feminicídio #InvisibilidadeMata. São Paulo: Instituto Patrícia Galvão, 2017.35 SANEMATSU, Debora Prado e Marisa, Op. cit., 2017.

MARGARETH, Buzetti -Projeto de Lei n° 4266, de 2023- Disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/senadores/senador/-/perfil/6304.                                                                                                      Acesso                                                                                                        em: 10.11.2024.


1 Graduanda do Curso e Direito do Centro Universitário Fametro. E-mail: chistiezouza@outlook.pt
https://orcid.org/0009-0003-4238-5869