O CASO XUCURU VS. BRASIL E O DIREITO DOS POVOS INDÍGENAS SOBRE SUAS TERRAS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7068994


Autora:
Vanessa Gomes Lopes


RESUMO

O presente trabalho propõe fazer uma análise acerca do Caso Xucuru vs. Brasil, julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. Este processo teve por objeto, dentre outros temas, julgar a ocorrência de violações ao direito à propriedade comunal do povo indígena.

Palavras-chave: Comunidades tradicionais. Povo indígena. Direito de propriedade.

ABSTRACT

The present work proposes to make a brief analysis about the Case Xucuru vs. Brazil, judged by the Inter-American Court of Human Rights. This process aimed, among other matters, at judging the occurrence of violations of the indigenous people’s right to communal property.

Keywords: Traditional communities. Indigenous people. Property right.

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho propõe fazer uma análise acerca do Caso Xucuru vs. Brasil, julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH). Este processo teve por objeto, dentre outros temas, julgar a ocorrência de violações ao direito à propriedade comunal do povo indígena.

Além disso, visa avaliar se houve ou não o devido cumprimento da sentença da Corte IDH após mais de 6 (seis) anos de sua prolação.

2. O CASO XUCURU VS. BRASIL

A demarcação da Terra Indígena Xucuru, no Município de Pesqueiras-PE, teve início em 1989 e foi finalizada somente em 2005, ou seja, 16 (dezesseis) anos depois. Nesse ínterim, ocorreram vários conflitos entre indígenas e não indígenas, resultando, inclusive, na morte de lideranças, a exemplo de um cacique.

Ocorre que, mesmo após a definitiva demarcação das terras, o Estado manteve-se omissivo na promoção da desintrusão do território, o que provocou – no âmbito interno – o ajuizamento de uma ação de reintegração de posse e uma ação de anulação do processo administrativo de demarcação e – no âmbito internacional – o peticionamento junto à Comissão Interamericana de Direitos Humanos e, posteriormente, perante à Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Inicialmente o caso foi levado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) pelo Movimento Nacional de Direitos Humanos – Região Nordeste, pelo Gabinete de Assessoria Jurídica das Organizações Populares (Gajop) e pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), em 16 de outubro de 2002.

Em outubro de 2002, “a CIDH decidiu outorgar medidas cautelares em favor do Cacique Marquinhos e de Zenilda Maria de Araújo, e solicitou ao Estado que adotasse todas as medidas necessárias para proteger a integridade pessoal e a vida dos beneficiários e iniciasse imediatamente uma investigação séria e exaustiva a respeito dos fatos que originaram as medidas cautelares” 1.

No mês de julho de 2015 a CIDH produziu um relatório de mérito reconhecendo a responsabilidade do Estado brasileiro pelas violações de direitos humanos em face do Povo Xucuru, emitindo, consequentemente, uma série de recomendações.

Ocorre que, em março de 2016, a Comissão entendeu que o Brasil ainda não tinha conseguido avançar no cumprimento das medidas impostas e, diante desse quadro, remeteu o processo à Corte IDH.

Em resumo, quanto às alegações preliminares, a Corte julgou ser competente para o deslinde do caso, pois embora tratasse de omissão que teve início antes da data de reconhecimento da competência da Corte pelo Brasil, as violações continuaram ocorrendo após este marco.

No que concerne ao julgamento de mérito, o Estado brasileiro restou condenado por violar os seguintes direitos do Povo Xucuru: (i) garantia judicial de prazo razoável ao julgamento do processo; (ii) à proteção judicial; e (iii) à propriedade coletiva.

Por conseguinte, a Corte IDH, por unanimidade, entendeu que:

(i) A sentença, por si só, é uma forma de reparação dos danos;
(ii) “O Estado deve garantir, de maneira imediata e efetiva, o direito de propriedade coletiva do Povo Indígena Xucuru sobre seu território, de modo que não sofram nenhuma invasão, interferência ou dano, por parte de terceiros ou agentes do Estado que possam depreciar a existência, o valor, o uso ou o gozo de seu território”2;
(iii) “O Estado deve concluir o processo de desintrusão do território indígena Xucuru, com extrema diligência, efetuar os pagamentos das indenizações por benfeitorias de boa-fé pendentes e remover qualquer tipo de obstáculo ou interferência sobre o território em questão, de modo a garantir o domínio pleno e efetivo do povo Xucuru sobre seu território, em prazo não superior a 18 meses”3;
(iv) O Estado deve promover a publicação da sentença; e
(v) O pagamento de indenizações por danos materiais.

Por conseguinte, embora o caso tenha sido julgado em fevereiro de 2018, de acordo com o processo de supervisão de cumprimento de sentença, apenas a reparação do item (iv) – a publicação da sentença – foi realizado, estando todos os demais itens ainda pendentes.

3. CONCLUSÃO

Diante de todo o exposto, percebe-se que, mesmo após (i) a realização de um processo administrativo de demarcação de terras; (ii) o ajuizamento de uma ação de reintegração de posse; (iii) o ajuizamento de uma ação de anulação do processo administrativo de demarcação de terras; (iv) o peticionamento junto à CIDH; e (v) o encaminhamento do caso à Corte IDH; os direitos dos povos indígenas continuam sendo reiteradamente violados pelo Estado brasileiro.

Assim, fica o seguinte questionamento: o que deverá ser feito para dar visibilidade às comunidades tradicionais e para dar efetividade aos seus direitos?


1 Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Relatório nº 98/09, de 29 de outubro de 2009.

2 Corte IDH. Povo Indígena Xucuru e seus membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 5 de fevereiro da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

3 Idem.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Relatório nº 98/09, de 29 de outubro de 2009. Disponível em: <http://cidh.oas.org/annualrep/2009port/brasil4355.02port.htm>. Acesso em 02 setembro 2022.

Corte IDH. Casos em etapa de Supervisão de Cumprimento de Sentença. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/supervisiones/SCS/brasil/xucuru/xucurup.pdf> e <https://www.corteidh.or.cr/docs/supervisiones/SCS/brasil/xucuru/xucuruc.pdf>.

Corte IDH. Povo Indígena Xucuru e seus membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 5 de fevereiro da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em 08 de julho de 2022.

Réu Brasil. Disponível em: <https://reubrasil.jor.br/caso-do-povo-indigena-xucuru-e-seus-membros-versus-brasil/>. Acesso em 20 de agosto de 2022.


Pós-graduada em Direito Tributário (Universidade Anhanguera).
E-mail: vanessagomeslopes@gmail.com