REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7068984
Autora:
Vanessa Gomes Lopes
RESUMO
O presente trabalho propõe fazer uma análise acerca do Caso Gomes Lund e outros vs. Brasil, também chamado de “Guerrilha do Araguaia”, julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. A importância de se fazer um detido estudo sobre o tema pode ser verificada em diversos aspectos, mas aqui será detalhada a justiça de transição, assunto caríssimo para os países que, como o Brasil, passaram por uma ditadura.
Palavras-chave: Justiça de transição. Ditadura. Corte Interamericana de Direitos Humanos.
ABSTRACT
The present work proposes to make an analysis about the Case Gomes Lund v. Brazil, also called “Guerrilha do Araguaia”, judged by the Inter-American Court of Human Rights. The importance of carrying out a detailed study on the subject can be verified in several aspects, but here the transitional justice will be detailed, a very important subject for countries that, like Brazil, went through a dictatorship.
Keywords: Transitional justice. Dictatorship. Inter-American Court of Human Rights.
1. INTRODUÇÃO
O Caso Gomes Lund e outros vs. Brasil, também chamado de “Guerrilha do Araguaia”, foi julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos em 24 de novembro de 2010.
Este caso teve especial importância por ter tratado do controle de convencionalidade e, também, da justiça de transição. No presente trabalho iremos nos ater à análise da justiça de transição e às consequências trazidas ao país por meio desse julgado.
2. GOMES LUND VS BRASIL: ESTUDO DE CASO
A Guerrilha do Araguaia tivera início no ano de 1966 com ativistas do Partido Comunista do Brasil (PC do B), que instigavam uma mobilização social, a formação de um verdadeiro exército popular, com o fito de depor o governo brasileiro da época, que era ditatorial.
Nesse contexto, surgiram várias campanhas militares para eliminar o foco da guerrilha na região do Araguaia, sul do Pará. Durante as referidas operações militares foi desencadeado o desaparecimento forçado de 60 (sessenta) guerrilheiros, além de inúmeros relatos das práticas de tortura e de execução extrajudicial.
Com o fim do regime militar e a restauração do regime democrático no país, surgiram várias iniciativas de reconhecimento e responsabilização dos crimes ocorridos durante o regime militar.
Entretanto, a reabertura da democracia foi marcada pela promulgação da Lei 6.683, de 1979, a Lei de Anistia, que promoveu uma anistia ampla e irrestrita a todas as pessoas que “cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações vinculadas ao poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares”1.
Assim, o Estado se absteve de investigar e punir os responsáveis pelos repugnantes atos de tortura, desaparecimento forçado e execução extrajudicial ocorridas à época em função da Lei de Anistia.
3. A JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO
A Justiça de Transição trata de um conjunto de medidas reparatórias da ocorrência de diversas violações de direitos humanos decorrentes de um período ditatorial2. Nesse sentido, o papel da justiça de transição é demonstrar a impossibilidade de retomar a democracia do momento em que ela foi interrompida, sendo necessário um olhar crítico acerca dos fatos ocorridos no passado e que podem persistir no presente3.
Diante desse quadro, entende-se que a justiça de transição possui os seguintes objetivos:
(i) julgar os responsáveis pela prática de crimes e de graves violações de direitos humanos;
(ii) estabelecer a verdade acerca dos fatos ocorridos no período ditatorial;
(iii) registrar e reconhecer a memória das violações para que se possa construir uma nova fase da história do país;
(iv) realizar a efetiva reparação às vítimas; e
(v) reestruturar as instituições que participaram das referidas violações.
Assim, a justiça de transição é imprescindível para a promoção de uma verdadeira “reconciliação nacional” como forma de garantir que novas violações sistemáticas de direitos humanos possam voltar a ocorrer.
4. DA SENTENÇA PROFERIDA PELA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS
O caso brasileiro foi levado a julgamento perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos, que decidiu que:
(i) o Brasil foi responsável pela violação à integridade pessoal das vítimas e de seus familiares;
(ii) o desaparecimento forçado é uma violação permanente e, por isso, o crime persiste enquanto os restos mortais da vítima não forem encontrados;
(iii) o princípio da legalidade não pode ser utilizado como obstáculo ao julgamento e à aplicação de sanções aos agentes responsáveis pela prática de crimes;
(iv) a omissão estatal na busca da verdade dos fatos viola o direito à verdade; e
(v) as disposições da Lei de Anistia são inconvencionais, posto que impedem a investigação e o julgamento das graves violações de direitos humanos ocorridos à época.
5. CONCLUSÃO
Diante de todo o exposto, é imprescindível ressaltar que nenhuma lei ou norma de direito interno deve ser utilizada como forma de obstacularizar o cumprimento da obrigação estatal de punir a ocorrência de crimes de lesa-humanidade, seja por disporem acerca de anistia, de excludente de punibilidade ou outras formas.
Por conseguinte, a própria Corte Interamericana entendeu que “é preciso ultrapassar o positivismo exacerbado, pois só assim se entrará em um novo período de respeito aos direitos da pessoa, contribuindo para acabar com o círculo de impunidade no Brasil. É preciso mostrar que a Justiça age de forma igualitária na punição de quem quer que pratique graves crimes contra a humanidade, de modo que a imperatividade do Direito e da Justiça sirvam sempre para mostrar que práticas tão cruéis e desumanas jamais podem se repetir, jamais serão esquecidas e a qualquer tempo serão punidas”4.
1 BRASIL. Lei n. 6.683, de 28 de agosto de 1979. Concede anistia e dá outras providências. Diário Oficial da União: Brasília-DF, p. 12.265.
2 SOARES, Inês Virgínia Prado. KISHI, Sandra Akemi Shimada. Memória e Verdade: a Justiça de Transição no Estado Democrático Brasileiro. 1. Ed., São Paulo. Editora Forum.
3 TONTINI, Cristina. O que é a justiça de transição? Canal Ciências Criminais, 2019.
4 Corte Interamericana de Direitos Humanos. Caso Gomes Lund e outros (“Guerrilha do Araguaia”) vs. Brasil, julgado em 24 de novembro de 2010.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Lei n. 6.683, de 28 de agosto de 1979. Concede anistia e dá outras providências. Diário Oficial da União: Brasília-DF, p. 12.265.
Corte Interamericana de Direitos Humanos. Caso Gomes Lund e outros (“Guerrilha do Araguaia”) vs. Brasil, julgado em 24 de novembro de 2010.
SOARES, Inês Virgínia Prado. KISHI, Sandra Akemi Shimada. Memória e Verdade: a Justiça de Transição no Estado Democrático Brasileiro. 1. Ed., São Paulo. Editora Forum.
TONTINI, Cristina. O que é a justiça de transição? Canal Ciências Criminais, 2019.
Pós-graduada em Direito Tributário (Universidade Anhanguera).
E-mail: vanessagomeslopes@gmail.com