MORTALIDADE NEONATAL POR CAUSAS EVITÁVEIS NO BRASIL NO ANO DE 2021

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10207420


Iasmim de Sousa Araújo1
Gabriel Mendes Portella2
Lucas Alves Dias3
Ricardo Cardoso Menezes4


Resumo

Objetivos: Identificar as variáveis associadas aos óbitos neonatais, em 2021, que podem ser preveníveis por ações voltadas aos cuidados materno-fetais no Sistema Único de Saúde (SUS). 

Métodos: Estudo ecológico transversal, realizado a partir de dados oriundos do departamento de informática do SUS (DataSUS). Análise baseada no cálculo da taxa de mortalidade neonatal por causas evitáveis com variáveis múltiplas.

Resultados: Os óbitos neonatais são os principais determinantes da taxa de mortalidade infantil no Brasil, com destaque na faixa etária neonatal precoce e nas causas evitáveis de óbitos (prevalência de 74,5%). Dentre essas causas, o maior contribuinte é o grupo de causas evitáveis por assistência à gestação (37,3%). Dentre as regiões brasileiras, o Norte tem a maior taxa de mortalidade (10,1%) e o Sul, a menor (6,81%). A principal raça/cor componente em todas as regiões é a parda (52,1%).

Conclusão: A taxa de mortalidade infantil no Brasil permanece distante daquela de países desenvolvidos às custas de causas evitáveis na população neonatal, tendo como principal determinante a assistência prestada à gestação, bem como heterogeneidade regional, tendo o Norte do país a maior taxa. Esses indicadores apontam as metas de direcionamento das ações de saúde pública a fim de melhorar a assistência pré-natal e objetivar a redução de disparidades e promoção da saúde. 

Palavras-chave: Mortalidade Neonatal, causas evitáveis, indicadores de saúde.

Abstract 

Objectives: To identify the variables associated with neonatal deaths in 2021 that could be preventable through actions focused on maternal-fetal care in the Unified Health System (SUS) in Brazil. 

Methods: A cross-sectional ecological study conducted using data from the Department of Health Informatics of SUS (DataSUS). Analysis was based on calculating the neonatal mortality rate due to preventable causes with multiple variables. 

Results: Neonatal deaths are the primary determinants of infant mortality rate in Brazil, particularly in the early neonatal age group and in preventable causes of death (prevalence of 74.5%). Among these causes, the largest contributor is the group of causes preventable by pregnancy care (37.3%). Regarding Brazilian regions, the North has the highest mortality rate (10.1%) while the South has the lowest (6.81%). The main race/ethnicity component in all regions is mixed race (52.1%). 

Conclusion: The infant mortality rate in Brazil remains high compared to that of developed countries due to preventable causes in the neonatal population, with the main determinant being the quality of care provided during pregnancy. There is also regional heterogeneity, with the North of the country having the highest rate. These indicators highlight the goals for directing public health actions to improve pregnancy care and aim for the reduction of disparities and promotion of health. 

Keywords: Neonatal Mortality, preventable causes, health indicators.

INTRODUÇÃO

Nas últimas 3 décadas, o Brasil apresentou redução em mais de dois terços na taxa mortalidade infantil (razão entre óbitos ocorridos em crianças menores de 1 ano de idade em relação aos nascidos vivos), porém com níveis ainda passíveis de redução.1 

Na avaliação da mortalidade infantil, os dados são obtidos através do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), que computa informações oriundas das Declarações de Óbito (DO), e do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos, que obtém dados a partir das Declarações de Nascidos Vivos (SINASC).

Considera-se nascido vivo aquele bebê que após a separação do corpo materno, independente do tempo de gestação, apresentam movimentos respiratórios ou quaisquer sinais de vida, como atividade cardíaca, pulsação do cordão umbilical ou movimentos de contração muscular voluntária1.

O quociente de mortalidade infantil subdivide-se de acordo com os grupos etários utilizados como numerador, denominado neonatal (0 a 27 dias completos de vida) ou pós-neonatal (entre 28 e 364 dias completos de vida) 1

O principal contribuinte na taxa de mortalidade infantil corresponde ao grupo etário neonatal, que pode ainda ser separado nos componentes neonatal precoce (entre 0 e 6 dias completos de vida) e neonatal tardio (entre 7 e 27 dias completos de vida), sendo o primeiro responsável pela maior fração de agravos2.

As causas atribuíveis podem ser classificadas em não-evitáveis e evitáveis. Este último grupo diz respeito às causas que podem ser prevenidas total ou parcialmente com medidas de saúde pública voltadas à cobertura vacinal ampla, assistência à gestação e ao parto, cuidados ao recém-nascido, diagnóstico precoce de agravos e demais causas agrupadas.

Considerado um dos principais indicadores de qualidade de vida, saúde e bem-estar das nações, a taxa de mortalidade neonatal mostra-se, ainda, passível de melhorias, tendo a erradicação dos óbitos por causas evitáveis como uma das metas da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU)3.

Métodos

Trata-se de um estudo ecológico, do tipo observacional e transversal, de análise da tendência multifatorial e da distribuição espacial da mortalidade neonatal e sua relação com as causas de mortes evitáveis; tendo tais associações baseadas nos dados do ano de 2021 registrados no território brasileiro. 

Os dados obtidos foram extraídos, através do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DataSUS), do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (SINASC), por meio do instrumento TABWIN. As informações retiradas dos sistemas supracitados estão registradas nas Declarações de Óbitos (DO) e nas Declarações de Nascidos Vivos (DNV). 

Foram analisadas as seguintes variáveis: óbitos neonatais; faixa etária (neonatal precoce – de 0 a 6 dias, neonatal tardia – de 7 a 27 dias); grupos de causas evitáveis, de acordo com a lista de tabulação de causas evitáveis em menores de 5 anos publicadas pelo Ministério da Saúde (reduzíveis pelas ações de imunização, reduzíveis por adequada atenção à mulher na gestação, reduzíveis por adequada atenção da mulher no parto, reduzíveis por adequada atenção ao recém-nascido, reduzíveis por ação de diagnóstico e tratamento adequado, reduzíveis por ações de promoção à saúde vinculadas a ações de atenção), além de causas mal definidas, demais causas; região de residência materna: Nordeste, Norte, Centro-oeste, Sul e Sudeste; raça/cor. Foi estabelecido, como variável independente, os grupos de causas evitáveis e, como variáveis dependentes, número de óbitos por faixa etária, número de óbitos por região e número de óbitos por raça/cor.

Através do TABWIN, foram criadas tabelas de associação de dados, alternando as variáveis escolhidas para o estudo entre linhas e colunas, utilizando suas frequências absolutas e relativas. O ano selecionado no instrumento foi 2021, com resgate de elementos de todo o território nacional. 

Em seguida, foi calculada a taxa de mortalidade neonatal. Para o cálculo, utilizou-se, como numerador, os óbitos ocorridos no ano de 2021 em crianças de idade entre 0 e 27 dias de vida e, como denominador, o número de nascidos vivos.  Foram analisadas, de forma comparativa, as taxas de mortalidade neonatal relativa a cada grupo de causa evitável e, também, relativa a cada região do país. 

Como o estudo refere-se a uma análise de dados secundários, disponíveis em sistema governamental e de domínio público, não sendo possível identificação dos indivíduos referentes aos dados agrupados, não se torna necessário a submissão do projeto do estudo à apreciação de um Comitê de Ética em Pesquisa (CEP). Assim como previsto na resolução nº 510 de 07 de abril de 2016 do Conselho Nacional de Saúde (CNS)4.

Resultados 

Na análise dos dados, foi visto que, durante o ano de 2021, ocorreram 22.455 óbitos no período neonatal, sendo 74% desses óbitos desencadeados por causas evitáveis. O maior número de óbitos faz parte do período neonatal precoce (16.747 bebês no período neonatal precoce e 5.708 bebês no neonatal tardio), correspondendo a uma prevalência de 74,5%.

A taxa de mortalidade neonatal no Brasil é de 8,3% por 1000 nascidos vivos. A região com maior taxa de mortalidade neonatal é a região Norte com 10,1% por 1000 nascidos vivos, seguida do Nordeste (9,37%), Centro-oeste (8,3%), Sudeste (7,69%) e Sul (6,81%).

A partir dos dados analisados, observa-se que, dentro das causas de morte avaliadas, o grupo de maior prevalência é o de reduzíveis por adequada atenção à mulher na gestação, responsável por 37,3% da totalidade de óbitos neonatais, com maior predominância na população neonatal precoce. Seguido do grupo de demais causas (23,91%), reduzíveis por adequada atenção ao recém-nascido (21,69%), reduzíveis por adequada atenção à mulher no parto (10,99%), causas mal definidas (2,05%), reduzíveis por ações de promoção à saúde vinculadas a ações de atenção (1,18%), reduzíveis por ação de diagnóstico e tratamento adequado (0,48%) e reduzíveis pelas ações de imunização (0,009%).
Quanto à variável raça/cor, observa-se maior prevalência de mortes em crianças com idade menor que 28 dias na população parda, correspondendo a 52,1% dos óbitos neonatais; enquanto a de menor prevalência é de raça amarela, com 0,18%. 

Discussão 

Avaliando as principais etiologias dentro de cada grupo de causas evitáveis, tem-se feto e recém-nascido afetados por afecções maternas como causa mais prevalente dentro do grupo reduzíveis por adequada atenção à mulher na gestação; hipóxia intrauterina e asfixia ao nascer é a mais preponderante em redutíveis por adequada assistência à mulher no parto; infecções específicas do período neonatal, exceto rubéola congênita e hepatite viral congênita, como principal em redutíveis por adequada atenção ao recém-nascido; síndrome de Down e pneumonia como principais causas no grupo de reduzíveis por ações de diagnóstico e tratamento adequados; síndrome da rubéola congênita e hepatite vital congênita sendo as mais importantes de reduzíveis pelas ações de imunização; e outros riscos acidentais à respiração como predominante dentre causas evitáveis por promoção à saúde vinculadas a ações de atenção à saúde.

As principais causas evitáveis em cada região seguem, em caráter relativo, o padrão das mortes neonatais de aspecto geral do Brasil, estando, portanto, o grupo de causas redutíveis por adequada atenção à mulher na gestação com maior taxa de mortalidade em todas as cinco regiões.

Situações que demonstram maior organização e rigor no cuidado materno e fetal-neonatal desde a gestação até à vida extrauterina estão associadas a melhores desfechos neonatais. Dados do SINASC e da Pesquisa Nacional de Saúde revelam maior alcance na atenção pré-natal no que se refere à quantidade de consultas pré-natais e início de acompanhamento em tempo oportuno5, entretanto, faz-se necessário reavaliar a estrutura dos serviços e melhorar a assistência, incentivando medidas de prevenção em saúde e identificando, de forma precoce, possíveis complicações.
Além disso, investir no acesso a unidades especializadas em cuidados neonatais intensivos e intermediários, de modo a garantir que recém-nascidos prematuros ou com complicações recebam atenção imediata e especializada 12 13.

A região Sul demonstrou a menor taxa de mortalidade neonatal, enquanto as regiões Norte e Nordeste demonstraram as maiores taxas, fato que também é demonstrado em outros estudos e em análises de dados do Ministério da Saúde6. Tal situação demonstra a importância de investimento local na capacitação do cuidado em saúde e na melhoria da qualidade de vida, com a intenção de abranger a população mais vulnerável com ações pertinentes e verdadeiramente efetivas7. As diferenças ligadas ao desenvolvimento econômico, incentivos financeiros, escolaridade e extensão da rede de assistência são pontos que interferem nos indicadores de saúde8.

Conclusão

Foi observado uma participação considerável das causas evitáveis no número de óbitos neonatais, sobretudo no período neonatal precoce. As etiologias de maior impacto nos dados avaliados estavam relacionadas direta ou indiretamente com a assistência à mulher durante a gestação, a assistência à mulher durante o parto e a assistência ao recém-nascido. A região com maior taxa de mortalidade neonatal foi o Norte, sendo a região Sul com a menor taxa. Isso explana a necessidade de discutir medidas de prevenção e promoção de saúde, dispondo de maior ordenação e abordagem rigorosa no cuidado materno-fetal. Portanto, deve-se realizar enfoque na prevenção de complicações, incentivo na continuidade de consultas no pré-natal, capacitação e treinamento de profissionais, promoção do aleitamento materno e aumento de centros especializados em serviço neonatal. A análise reforça a indispensabilidade de ações efetivas para diminuição das disparidades e para melhoria da qualidade de vida. 

Referências bibliográficas

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1Médica formada pela Universidade Federal do Ceará, campus Sobral.
2Médico formado pela Universidade Federal do Ceará, campus Sobral.
3Médico formado pela Universidade Federal do Ceará, campus Sobral.
3Médico formado pela Universidade Federal do sul da Bahia.