BALANCED ENVIRONMENT, QUALITY OF LIFE AND HUMAN DIGNITY: A LOOK AT THE GREEN AREAS OF BIG CITIES
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8384685
Naímah Oliveira Mahfuz [1]
Císara Ferri Muniz[2]
Gabrielli Teresa Gadens Marcon [3]
Resumo
Este trabalho foi constituído por uma pesquisa de revisão bibliográfica focada nas áreas de meio ambiente, educação ambiental e direitos humanos. O objetivo central do estudo foi demonstrar que o meio ambiente equilibrado está intimamente associado à sadia qualidade de vida e, consequentemente, à dignidade humana. Utilizamos as áreas verdes presentes em grandes centros urbanos para falarmos dos estudos sobre bem estar junto da natureza, mas também abordamos outros quesitos fundamentais como saneamento básico, por exemplo. Constatou-se que a desigualdade ambiental atinge as populações mais carentes, e que essa exclusão é ainda pior quando nos referimos a minorias étnicas. Enfatiza-se a importância da Educação Ambiental e do Desenvolvimento Sustentável, neste cenário, como uma abordagem essencial para o enfrentamento da desigualdade ambiental.
Palavras-chave: Dignidade. Humana. Educação. Saúde. Ambiente.
1 INTRODUÇÃO
Este estudo é intitulado “Meio ambiente equilibrado, qualidade de vida e dignidade humana”, porque tem como tema principal os Direitos Humanos, mais precisamente o Princípio da Dignidade Humana, e será através dele que abordaremos assuntos relacionados ao meio ambiente.
Para a realização deste estudo foi desenvolvida uma pesquisa de revisão bibliográfica focada nas áreas de meio ambiente, educação ambiental e direitos humanos, mas também interessada em assuntos mais específicos como a distribuição espacial dos espaços verdes nas grandes cidades, e em temas como a desigualdade ambiental.
A questão norteadora do estudo busca descobrir se o meio ambiente equilibrado interfere com a sadia qualidade de vida e assim, consequentemente, com a dignidade humana. Através da leitura aprofundada de uma série de trabalhos científicos, buscamos averiguar a hipótese de que a interação com a natureza é benéfica para o desenvolvimento humano e que a privação dessa experiência tem consequências pouco satisfatórias para uma vida saudável. Por “natureza” compreenda-se todos os processos ambientais capazes de fornecer ao ser humano uma vida de qualidade.
Como modelo de analise focamos nas áreas verdes presentes em grandes cidades, pois estes locais tem sido objeto de várias pesquisas envolvendo um tipo de estudo sobre como as pessoas interagem com o espaço natural. Por “áreas verdes” compreende-se um espaço aberto e coberto por vegetação, que pode ser uma praça, um parque, uma avenida arborizada, ou até mesmo o pátio de uma escola. A distribuição das áreas verdes será discutida mais adiante procurando correlacionar padrões ligados ao nível socioeconômico de seus habitantes, sempre buscando linkar questões ligadas aos “parâmetros” meio ambiente, qualidade de vida e dignidade humana.
À luz do que foi exposto, o objetivo central deste estudo foi demonstrar que o meio ambiente equilibrado está intimamente associado à sadia qualidade de vida e, consequentemente, à dignidade humana. Para que o objetivo central fosse plenamente alcançado, cumpriu-se a realização dos seguintes objetivos específicos: realizar uma pesquisa bibliográfica que demonstrasse a correlação entre meio ambiente equilibrado, sadia qualidade de vida e dignidade humana; analisar a influência das áreas verdes sobre parâmetros como meio ambiente equilibrado, sadia qualidade de vida e dignidade humana; correlacionar educação ambiental e desenvolvimento sustentável como meios para integrar meio ambiente equilibrado, sadia qualidade de vida e dignidade humana.
Na sequência desta Introdução, está o item Metodologia, que explica brevemente como foi sistematizada a pesquisa. A Metodologia antecede o Referencial Teórico porque este último faz parte dos resultados, já que o artigo se trata de uma pesquisa eminentemente bibliográfica. Os Resultados vêm acompanhados da discussão do trabalho e apresentam uma visão abrangente das principais obras envolvendo áreas verdes e sua relação com a questão da desigualdade ambiental e os Direitos Humanos. Finalmente, as considerações finais encerram o texto, sintetizando as principais percepções desenvolvidas pelos autores.
2 METODOLOGIA
O presente estudo se caracteriza como uma pesquisa qualitativa de revisão bibliográfica, que utilizou fontes obtidas em meio eletrônico, tendo sido realizada através de consultas a artigos e notas científicas, publicados em periódicos reconhecidos na área, e a livros e revistas voltados aos principais tipos de especialidade abordados (meio ambiente, educação ambiental, desenvolvimento sustentável e direitos humanos). Também foram consultadas monografias, dissertações e teses, além de anais de eventos científicos e trabalhos técnicos. O acesso à maior parte da bibliografia foi obtido juntos a sites fidedignos da Internet, como sites governamentais, sites oficiais de Instituições de Ensino Superior, sites de Institutos, Fundações, Entidades, Organizações, entre outros. Foram amplamente utilizadas bases de dados online como: SciELO, Periódicos Capes, Web of Science, Google Acadêmico, Science.gov, ScienceResearch.com, BDTD, entre outros.
A consulta em meio eletrônico fez uma revisão dos trabalhos publicados desde o ano de 2002 até 2020, dando preferência àqueles relacionados com as áreas de meio ambiente, educação ambiental, desenvolvimento sustentável, e direitos humanos. Dentre as subáreas examinadas deu-se primazia àquelas correlacionadas com a presença de espaços verdes em áreas urbanas. Questões relacionadas com exclusão e desigualdade ambiental também receberam destaque. Foram considerados os periódicos de maior relevância em cada área, o que foi estimado através da classificação Qualis Capes acima de B4.
Para refinar a busca foram usadas palavras-chave como: “educação ambiental”, “meio ambiente”, “desenvolvimento sustentável”, “direitos humanos”, “áreas urbanas”, “desequilíbrio ambiental”, “áreas verdes”, “desigualdade ambiental”, “exclusão ambiental”, “dignidade humana”, “desenvolvimento”, “qualidade de vida”, “saúde”, “planejamento urbano”, “programas sociais”, “inclusão”, etc. As palavras foram digitadas isoladamente ou de maneira combinada durante a busca, dependendo do nível de refinamento buscado.
Os resultados da pesquisa bibliográfica foram compilados e organizados na forma de texto e encontram-se nos itens apresentados a seguir.
3 REFERENCIAL TEÓRICO
Quando o assunto é Meio Ambiente e os mecanismos que regulam a relação do ser humano com a natureza – no âmbito jurídico – faz-se necessário ressaltar que o Princípio da Dignidade Humana tem prioridade no Direito Ambiental. Tal princípio, caracteriza-se como um dos fundamentos da nação brasileira, sendo abordado logo no primeiro artigo de nossa Constituição Federal (CF), como segue abaixo:
Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (…) III – a dignidade da pessoa humana (…) (BRASIL, 1988, grifo nosso).
O Artigo 225 da Constituição – dedicado exclusivamente ao Meio Ambiente – pode ser considerado um desdobramento do fundamento constitucional contido no terceiro Inciso, do primeiro Artigo da CF, ou seja, do próprio princípio da dignidade humana. Vejamos:
Artigo 225 – Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (BRASIL, 1988, grifo nosso).
O reconhecimento internacional do princípio da dignidade humana e sua relação com o meio ambiente equilibrado surgiu – oficialmente – em 1972[4], na Declaração de Estocolmo (Suécia), e foi reafirmado durante ECO 92[5]:
Princípio 1 – Os seres humanos constituem o centro das preocupações relacionadas com o desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva em harmonia com o meio ambiente” (DECLARAÇÃO DO RIO DE JANEIRO, 1992, grifo nosso).
Voltando ao Artigo 225 da CF, este elenca uma série de mecanismos que visam efetivar o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado; dentre os quais, enfatizamos aquele dedicado à Educação:
§ 1º – Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (…) VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente” (BRASIL, 1988).
Visando o cumprimento do parágrafo e Inciso acima mencionados, foi promulgada a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA) – ou Lei Federal nº 9795/1999 – disposta a promover o princípio da dignidade humana, dentre outros conceitos provenientes – principalmente – da Carta de Belgrado[6] (1975) e da Declaração de Tblisi[7] (1977), tanto que seu texto traz muito do que é enunciado nestes documentos. Vejamos:
Art. 1o – Entendem-se por Educação Ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade (BRASIL, 1999, grifo nosso).
Dentre as muitas concepções inovadoras trazidas pela PNEA estão princípios[8] baseados no enfoque humanista, holístico, democrático e participativo; no reconhecimento e no respeito ao pluralismo de ideias e à diversidade individual e cultural, e na pluralidade de concepções pedagógicas, na perspectiva da inter, multi e transdisciplinaridade (BRASIL, 1999).
A PNEA também compreende a defesa da qualidade ambiental como um valor inseparável do exercício da cidadania e seus objetivos[9] visam estimular o fortalecimento de uma consciência crítica sobre a problemática ambiental e social; incentivar a participação individual e coletiva, permanente e responsável, na preservação do equilíbrio do meio ambiente, e promover uma compreensão integrada do meio ambiente, envolvendo aspectos ecológicos, psicológicos, legais, políticos, sociais, econômicos, científicos, culturais e éticos, além de fortalecer a cidadania, a autodeterminação dos povos e a solidariedade como fundamentos para o futuro da humanidade (BRASIL, 1999). Tais aspectos estão fortemente relacionados com o princípio da dignidade humana e tornam, atualmente, a Educação Ambiental um mecanismo indispensável na promoção e defesa dos direitos humanos.
Um conceito que também merece destaque, tendo em vista sua relevância nos mais diferentes âmbitos do conhecimento é o de Desenvolvimento Sustentável, o qual se popularizou através do Relatório Brundtland[10] (1988), que assim o definiu: “desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atenderem as suas próprias necessidades” (CMMAD, 1988, p. 46). Embora pareça extremamente simples, seu texto foi o mais próximo que se chegou de um consenso na época.
À medida que as discussões foram avançando nas diferentes esferas sociais, novas concepções foram surgindo e ampliando o contexto do texto original; dentre elas, citamos o modelo de mudança social fundamentado no tripé da sustentabilidade[11] proposto pelo sociólogo inglês John Elkington, o qual prevê uma integração entre as dimensões econômica, social e ambiental. De acordo com Elkington (1999, 397) “Os negócios precisam ser gerenciados não apenas do ponto de vista financeiro, mas também considerando os aspectos sociais e ambientais”. Apesar de parecer extremamente óbvio aos olhos de hoje, na época, a ideia de atrelar este tripé[12] ao conceito de Desenvolvimento Sustentável pareceu bastante inovadora.
A Educação Ambiental conservadora se apoia com maior frequência nos três pilares propostos por Elkington (1999). A Ecopedagogia[13], por sua vez, acrescenta um quarto pilar ao contexto. Segundo Gutiérrez e Prado (1999) o Desenvolvimento Sustentável deve ser: 1 – economicamente factível; 2 – ecologicamente apropriado; 3 – socialmente justo; 4 – culturalmente: eqüitativo, respeitoso e sem discriminação de gênero.
Tanto a Educação Ambiental como a Ecopedagogia são esferas da Educação voltadas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento Sustentável; entretanto, da mesma forma que percebemos inegáveis traços em comum entre elas, também é possível deduzir sobre a existência de divergências metodológicas entre ambas. Basta observar quais são os pilares do Desenvolvimento Sustentável em cada contexto: na Ecopedagogia, o viés social e político se destaca bem mais do que na Educação Ambiental conservadora, a qual tem foco maior nas questões relacionadas com o Meio Ambiente. Atualmente, a Educação Ambiental Crítica tem se destacado bastante pelo viés mais alinhado com as questões socioambientais e vem predominando no cenário nacional em relação à demais correntes, muitas vezes confundindo-se com a própria Ecopedagogia, como bem explanado por Loureiro (2007, p. 66):
Concretamente, a educação ambiental crítica se insere no mesmo bloco ou é vista como sinônimo de outras denominações que aparecem com frequência em textos e discursos (transformadora, popular, emancipatória e dialógica), estando muito próxima também de certas abordagens da denominada ecopedagogia. A sua marca principal está em afirmar que, por ser uma prática social como tudo aquilo que se refere à criação humana na história, a educação ambiental necessita vincular os processos ecológicos aos sociais na leitura de mundo, na forma de intervir na realidade e de existir na natureza. Reconhece, portanto, que nos relacionamos na natureza por mediações que são sociais, ou seja, por meio de dimensões que criamos na própria dinâmica de nossa espécie e que nos formam ao longo da vida (cultura, educação, classe social, instituições, família, gênero, etnia, nacionalidade etc.). Somos sínteses singulares de relações, unidade complexa que envolve estrutura biológica, criação simbólica e ação transformadora da natureza.
A apreensão do meio ambiente pelo ser humano, bem como as relações entre o sujeito e o local onde se encontra, se devem às características biológicas da espécie e às vivências próprias do indivíduo e do grupo no qual está inserido (ELALI, 2003). A ausência de um meio ambiente equilibrado tem consequências não apenas na saúde física, mas também e, especialmente, na saúde psíquica do ser humano, podendo levar a problemas de desenvolvimento (KARAN, 2021).
Já faz algum tempo que os estudos sobre comportamento e desenvolvimento de seres humanos e sua estreita relação com o ambiente em que estes habitam, socializam e aprendem, tem chamado a atenção de pesquisadores (FEDRIZZI, 2002; ELALI, 2003; Faber Taylor e Kuo, 2009). A abordagem tem como objeto de estudo a experiência espacial humana, mas traz um enfoque interessante sobre o ambiente natural e o contexto ecológico em que os indivíduos estão inseridos. O teor de tais estudos permeia as áreas da ecologia do desenvolvimento humano, da ecopsicologia, e da psicologia ambiental (KARAN, 2021). Tais esferas do conhecimento são distintas, mas se complementam, além de possibilitar uma interface interessante com a Educação, principalmente a Ambiental e a Ecopedagogia.
Tendo em vista as implicações simbólicas, subjetivas e imateriais da experiência espacial humana, as pesquisas ligadas à ecologia do desenvolvimento humano (Bronfenbrenner, 1975), e à psicologia ecológica (Barker, 1968) são ainda pouco conhecidas, mas muito promissoras, especialmente em sociedades desiguais do ponto de vista socioeconômico e territorial.
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
De acordo com Amato-Lourenço (2016), as áreas verdes trazem inúmeros benefícios tanto para o meio ambiente, como para a saúde. Dentre os benefícios para o meio ambiente estão: a) redução da temperatura, b) escoamento das águas das chuvas, c) qualidade do ar, d) redução de ruído, e) mitigação do impacto dos ventos, f) redução da incidência solar, g) estoque de carbono. Dentre os benefícios para a saúde estão: a) funções estéticas e recreativas, b) aumento da atividade física, c) aumento de interação social, d) redução do estresse, e) desenvolvimento cognitivo. Além disso, a proximidade de áreas verdes também resulta em maior valorização imobiliária (AMATO-LOURENÇO et al., 2016). Ximenes et al. (2020) afirmam que as áreas verdes cumprem papéis e funções ambientais fundamentais na ampliação da resiliência urbana, servindo a inúmeros propósitos como lazer, saúde e cultura, mas também observam que as cidades estão se tornando cada vez mais segregadoras, com espaços públicos muitas vezes mal concebidos ou mal aproveitados.
Mesmo em países ricos em biodiversidade como o Brasil a divisão das áreas verdes com vegetação natural é desigual e elitizada. Esta exclusão ambiental é mais acentuada nas grandes metrópoles, onde a aridez das favelas, contrasta com os jardins bem planejados dos condomínios de luxo. Da mesma forma, o acesso a parques arborizados e demais áreas verdes urbanas está geralmente distante dos bairros que mais precisariam deles. Em seu estudo sobre as áreas verdes da cidade de São Paulo (SP), Amato-Lourenço et al. (2016, 123) constataram que as áreas de baixíssima vulnerabilidade social também eram aquelas com a maior cobertura arbórea (localizadas nos bairros jardins). Por outro lado, as regiões periféricas de alta vulnerabilidade tinham um percentual de cobertura arbórea mais baixo, geralmente em virtude do tipo de ocupação, “caracterizada pela autoconstrução em núcleos urbanos com intensa ocupação e carentes de infraestrutura urbana” (AMATO-LOURENÇO, 2016, 123). É importante pontuar aqui que, quando falamos na carência de áreas verdes, a abordagem vai além da questão “estética”. As pessoas que vivem em áreas desmatadas, estão frequentemente sujeitas a riscos ambientais, perda da fertilidade e da estabilidade do solo, desmoronamento de encostas, enchentes muito fortes, ou até mesmo secas prolongadas.
Ximenes et al. (2020) relataram os resultados de uma pesquisa feita pelo Instituto de Estudos Avançados da USP, em que 86% das pessoas indicaram estar sentido falta das áreas verdes urbanas durante o período de isolamento social que ocorreu na pandemia de COVID-19. Entretanto, os autores também constataram a desigualdade na distribuição das áreas verdes da cidade de São Paulo e recomendaram a adoção de medidas que promovessem a descentralização e a equidade no uso dos parques urbanos. Ximenes et al. (2020) também perceberam que, embora existam áreas verdes relativamente próximas de algumas regiões carentes, estas não estão abertas a visitação, ou não possuem vias de acesso, ou não oferecem transporte público que leve até elas, o que inviabiliza seu acesso, principalmente por parte da população mais carente (XIMENES, et al., 2019).
Uma das vantagens de viabilizar o acesso da população às áreas verdes nos grandes centros urbanos é que elas têm um grande potencial para o desenvolvimento de atividades de Educação Ambiental, seja por estarem perto das pessoas, ou por estarem perto da natureza (FIGUEIREDO e OLIVEIRA, 2020). De acordo com Figueiredo e Oliveira (2020) várias são as atividades que podem vir a ser desenvolvidas, muitas delas visando proporcionar novas vivências, estimular a reflexão, incentivar o diálogo, desenvolver o pensamento individual e coletivo, e promover o acolhimento.
Vários autores já discutiram sobre as questões ligadas à desigualdade ambiental, seja sob o ponto de vista dos Direitos Humanos e da Ética (FURTADO, 2003) ou de uma Justiça Ambiental propriamente dita (ACSERALD, 2009). Rattner (2009) aponta que os excluídos ambientais não nascem apenas “deserdados” de áreas verdes, mas de inúmeros outros bens imateriais e simbólicos relacionados com a presença de “natureza” em suas vidas. Mais recentemente, Silvestre-Filho e Ferreira (2019) adicionam temas relacionados à globalização para problematizar questões relativas aos Direitos Humanos e ao meio ambiente. Sem dúvida, no mundo todo, comunidades carentes são as que mais sofrem com as mudanças climáticas que estão acontecendo a nível global (ONU, 2015). Phillipi-Junior (2017) também discute Direitos Humanos sob o ponto de vista das minorias ambientais, tendo como pano de fundo a desigualdade não só econômica, mas também ambiental das comunidades marginalizadas. A exclusão ambiental se relaciona diretamente com a precarização do saneamento básico que atinge tais minorias. De acordo com um estudo feito por Raupp et al. (2019), utilizando como parâmetros abastecimento de água, esgotamento sanitário e coleta de lixo, as menores frequências desses serviços foram encontradas para os domicílios indígenas na região sul do país. Chamou a atenção dos autores que a maior desigualdade entre domicílios indígenas e não-indígenas ocorreu justamente na Região Sul, que se destaca do ponto de vista socioeconômico. O estudo foi conduzido somente em áreas urbanas e metropolitanas e o serviço mais precário observado foi o esgotamento sanitário (RAUPP et al, 2019, p. 10). Dentre os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU), o nº. 6 é aquele que se refere ao saneamento básico e à água potável. Dentre os muitos dados alarmantes associados a este objetivo consta que 2,5 bilhões de pessoas no mundo não tem acesso a serviço de saneamento como banheiro ou latrina; a maior parte dessas pessoas estão em países pobres, onde doenças associadas a esse tipo de precarização ambiental são muito comuns (ONU, 2015). Para garantir a sadia qualidade de vida, o meio ambiente precisa estar equilibrado, incluindo o meio ambiente onde a pessoa vive. Serviços essenciais como saneamento básico garantem a qualidade ambiental, evitando que dejetos, resíduos e rejeitos entrem indevidamente em contato com as pessoas, causando-lhes doenças, e com o meio ambiente, poluindo-o ainda mais.
A Exclusão Ambiental pode ser definida por todos aqueles problemas ambientais que geram problemas sociais e econômicos, que causam ainda mais desigualdade nos países em desenvolvimento (Young, 2020, p. 258). Isso pode ser percebido não somente na distribuição desigual das áreas verdes, mas também na divisão assimétrica de vários outros bens ambientais, essenciais à sadia qualidade de vida. O desenvolvimento sustentável busca o equilíbrio econômico, ambiental e social, enquanto a educação ambiental desempenha um papel de conscientização transformadora. Ambos são essenciais na abordagem da exclusão ambiental, porque promovem uma distribuição mais justa e equitativa dos bens ambientais, bem como um acesso mais igualitário aos benefícios do desenvolvimento (YOUNG, 2020).
A partir do que foi exposto, é possível depreender que a dignidade humana está intimamente associada à existência de um meio ambiente equilibrado, pois apenas este último proporciona a sadia qualidade de vida que todo ser humano almeja e tem direito. Logo, é possível conceber que, tudo aquilo que viola a integridade do meio ambiente também viola os direitos humanos. Neste entremeio, a educação ambiental e o desenvolvimento sustentável – num processo de interação e interdependência constante – viabilizarão o caminho que dará o acesso e garantirá esses direitos a todos os cidadãos.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho foi constituído por uma pesquisa de revisão bibliográfica focada nas áreas de meio ambiente, educação ambiental e direitos humanos. O Referencial Teórico contribuiu com a estruturação conceitual dos assuntos abordados e com a sua revisão temporal de modo mais abrangente.
A questão norteadora indagou se o meio ambiente equilibrado interferia com a sadia qualidade de vida e dessa forma, com a dignidade humana. A discussão do trabalho respondeu essa questão coerentemente, de diversas formas, e com inúmeros exemplos, demonstrando as consequências desastrosas que o desequilíbrio ambiental pode acarretar na qualidade de vida das pessoas.
A hipótese postulava que a interação com a natureza era benéfica para o desenvolvimento humano e que a privação dessa experiência teria consequências pouco satisfatórias para uma vida saudável. Vários exemplos utilizados na discussão foram capazes de sustentar essa afirmação, desde a carência estética relacionada com a falta de áreas verdes até problemas mais graves associados ao desmatamento como instabilidade do solo, desmoronamentos de encostas, enchentes, secas, entre outros.
O objetivo central do estudo foi demonstrar que o meio ambiente equilibrado está intimamente associado à sadia qualidade de vida e, consequentemente, à dignidade humana. Neste trabalho de revisão, utilizamos as áreas verdes como ponto de partida para falarmos dos estudos sobre bem estar junto da natureza, mas não nos limitamos a isso. Se a desigualdade ambiental é verdadeira no que diz respeito às áreas verdes, ela é muito maior em outros quesitos fundamentais como saneamento básico, por exemplo. Essa exclusão é ainda pior quando nos referimos a minorias étnicas e com pouca representatividade política. Dessa forma, é possível depreender que o princípio da dignidade humana, quando se trata de meio ambiente, parece ser desconsiderado como um direito humano.
Por fim, salientamos sobre a importância da Educação Ambiental e do Desenvolvimento Sustentável neste cenário, uma vez que ambos são essenciais para a abordagem da desigualdade ambiental, já que promovem a distribuição mais justa e equitativa dos bens ambientais, bem como um acesso mais igualitário aos benefícios do desenvolvimento.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao Programa de Bolsas de Iniciação à Pesquisa (PROBIP), coordenado pela Pró Reitoria de Pesquisa da Instituição, pela concessão de uma bolsa na modalidade INICIE-UERGS para o Projeto nº 12643.
REFERÊNCIAS
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[1] Discente do bacharelado em Ciências Biológicas – ênfase em gestão ambiental costeira, UERGS Litoral Norte; Bolsista de Pesquisa (PROBIP/INICIE/UERGS); E-mail: naimah-mahfuz@uergs.edu.br.
[2] Discente do Mestrado Profissional em Educação (PPGED-MP), UERGS Litoral Norte. E-mail: cisara-muniz@uergs.edu.br
[3] Docente dos cursos de Graduação e Mestrado (PPGED-MP) da Unidade da UERGS Litoral Norte; Mestre em Geociências e Doutora em Ciências. E-mail: gabrielli-marcon@uergs.edu.br.
[4] Durante a Primeira Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano (CNUMAH).
[5] A Eco 92 foi a Segunda Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD).
[6] Documento resultante do Seminário Internacional sobre Educação Ambiental, Belgrado (Sérvia).
[7] Documento resultante da Primeira Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental, Tblisi (Geórgia).
[8] Artigo 4º da PNEA
[9] Artigo 5º da PNEA
[10] Elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD) das Nações Unidas. O nome original do relatório era “Nosso Futuro Comum”, enquanto “Brundtland” era o sobrenome da primeira-ministra da Noruega, que chefiava a Comissão.
[11] Mais conhecido em inglês como triple bottom line.
[12] Frequentemente denominado também de “três pilares” do Desenvolvimento Sustentável.
[13] Ecopedagogia é um termo criado por Francisco Gutiérrez, na década de 1990, quando ele era presidente do Instituto Latino-Americano de Pedagogia da Comunicação – ILPEC, em San José, na Costa Rica.
[1] Discente do bacharelado em Ciências Biológicas – ênfase em gestão ambiental costeira, UERGS Litoral Norte; Bolsista de Pesquisa (PROBIP/INICIE/UERGS); E-mail: naimah-mahfuz@uergs.edu.br.
[2] Discente do Mestrado Profissional em Educação (PPGED-MP), UERGS Litoral Norte. E-mail: cisara-muniz@uergs.edu.br
[3] Docente dos cursos de Graduação e Mestrado (PPGED-MP) da Unidade da UERGS Litoral Norte; Mestre em Geociências e Doutora em Ciências. E-mail: gabrielli-marcon@uergs.edu.br.