MECANISMOS MOLECULARES E PATOGENICOS DO HPV: UMA REVISÃO NARRATIVA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12659019


Lara Beatriz Sousa Maranhão1
Ana Gabriela Da Silva Nascimento1
Ana Letícia Alencar De Araujo1
Carolayne Bonfim Santos1
Monica Nascimento Ferreira1
Samyrah Maria Fialho De Araujo1
Bárbara Laurice Araújo Verçosa1
Bruno De Almeida Nunes1
Emmanueli Iracema Farah 1,4
Larissa Mayra De Lima Santos2
Monika Machado De Carvalho3
Silvio Gomes Monteiro4
Pedro Agnel Dias Miranda Neto 1,4


RESUMO

Compreender a relação entre as características oncogênicas com a patogenicidade e a biologia do HPV. Este é um estudo de revisão integrativa da literatura, na qual os dados foram buscados na National Library of Medicine, através do buscar PubMed, guiado por descritores (DeCS): “HPV” and “Biology” and “Pathogenesis” and “Uterine Cervical Neoplasms”, combinados com o operador booleano “and”. Os dados foram filtrados para o último ano, sendo selecionados ensaios clínicos, metanálises, testes aleatórios randomizados e revisões sistemáticas, sendo documentos e livros descartados da análise. Foi encontrado o total de 10 publicações, sendo analisadas na integra para formatar os achados desta revisão. A infecção pelo HPV causa a produção de genes virais nas células basais, o que auxilia na replicação viral. Para que a replicação comece, as primeiras proteínas E1 e E2 são necessárias. O repressor transcricional das proteínas E6 e E7, E2, regula a expressão desses genes. O vírus integra-se no genoma humano através de um processo de círculo rolante que serve como modo de reprodução. Conclui-se que a infecção por papilomavírus humano e o desenvolvimento de tumores têm sido objeto importante de pesquisa de vários grupos de pesquisa. Além disso, ainda existem grandes lacunas no nosso conhecimento sobre a patogênese mediada pelos HPVs, as proteínas E6 e E7 expressas desempenharam um papel significativo no desenvolvimento e progressão do tumor, e a regulação negativa destas duas proteínas pode ser útil para reduzir o desenvolvimento do cancro. Os HPVs afetam diferentes regiões do corpo, incluindo cervical, pulmões, cérebro, cabeça e pescoço. A determinação do desenvolvimento de câncer associado ao HPV nos tecidos será uma chave para o desenvolvimento e alívio de infecções associadas em seres humanos.

Palavras-chave: HPV; Biologia do HPV; Patogenia; Neoplasias do Colo do Útero.

INTRODUÇÃO

Os papilomavírus humanos (HPVs) são vírus de ácido desoxirribonucléico (DNA), sem envelope encontrado não apenas no trato urinário e na vagina, como na boca e garganta, pertencendo à família Papillomaviridae (Simonetti; Oliveira, 2012). São caracterizados cerca de 200 tipos e a maioria afeta os seres humanos. Eles são especificamente adaptados aos organismos hospedeiros, com a capacidade de se mascararem das respostas imunológicas (Oyounil, 2023).

O HPV tem como alvo o epitélio escamoso diferenciado, estando associados principalmente a diversas infecções cutâneas, predominantes as infecções de pele e mucosas, em mulheres as infecções estão associadas ao câncer do colo uterino, é um vírus sexualmente transmissível, por isso é mais comum a infecção do trato reprodutivo. Embora a grande maioria das infecções por HPV sejam assintomáticas ou resultem em lesões benignas, um pequeno número de HPVs de alto risco pode causar malignidades cervicais, vulvovaginais, anais, orofaríngeas e penianas (Zebardast et al., 2022; Oyounil, 2023).

O HPV foi classificado como carcinógeno do grupo 1, segundo classificação da IARC, incluindo 12 formas oncogênicas. O DNA do HPV é detectado em 99,7% dos carcinomas cervicais, sendo os tipos oncogênicos 16 e 18 do HPV responsáveis por quase 70% de todos os casos (Pohlmann, 2002; Zebardast et al., 2022). Nos últimos anos, vários estudos foram realizados enfatizando a importância da persistência do vírus no desenvolvimento do cancro invasivo do colo do útero.

Geralmente, a morfologia do genoma e o capsídeo dos HPVs são semelhantes dentro da família Papillomaviridae, além disso, variações nas sequências e organizações do genoma, bem como variações nos aminoácidos, resultaram em vários grupos de papilomavírus. Em termos gerais, os HPVs são classificados em HPVs de baixo risco e alto risco. Os de baixo risco são altamente responsáveis pelas verrugas cutâneas e anogenitais, e posteriormente responsáveis pelos cânceres orofaríngeos, cânceres anogenitais, incluindo câncer anal, cervical, vaginal, vulvar e peniano (Oyouni, 2023).

O HPV é necessário para desenvolver funções genéticas virais distintas e regulação da expressão genética viral durante a adaptação aos locais de infecção, que devem ter biologia diferente. Como consequência, isto resultou na diversidade de patogenicidade, a patogenicidade específica do genótipo do HPV (Egawa, 2023). Assim, continua a ser importante compreender a base genética da oncogenicidade do HPV, particularmente aquela do tipo HPV16 exclusivamente cancerígeno (Nelson; Mirabello, 2023). O objetivo desse estudo foi compreender os mecanismos moleculares e a patogenicidade do HPV, principalmente no câncer do colo uterino.

METODOLOGIA

Este é um estudo de revisão integrativa da literatura, na qual os dados foram buscados na National Library of Medicine, através do buscar PubMed, guiado por descritores em ciências da saúde (DeCS): PubMed “HPV” and “Biology” and “Pathogenesis” and “Cervical Neoplasms”, combinados com o operador booleano “and”. Os dados foram filtrados para os últimos 5 anos, sendo selecionados ensaios clínicos, metanálises, testes aleatórios randomizados e revisões sistemáticas, sendo revisões simples, bem como, outros documentos e livros descartados na análise. Foi encontrado o total de 10 publicações, sendo analisadas na integra para formatar os achados desta revisão. A coleta de dados se deu no mês de novembro de 2023.

Os critérios de inclusão de artigos inicialmente definidos para esta revisão foram: artigos publicados em português e inglês, com resumos disponíveis nas bases de dados selecionadas, ordenados por data sendo escolhidos artigos publicados nos últimos anos; artigos publicados cuja metodologia adotada permitisse obter evidências fortes e foram excluídos artigo que não possuíam no seu corpo de pesquisa informações sobre a biologia, patogenia e neoplasias cervicais do HPV.

A busca foi realizada pelo acesso on-line e, utilizando os critérios de inclusão, a amostra final desta revisão foi constituída de 10 estudos.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com a utilização dos termos em combinados foram encontradas 10 publicações na National Library of Medicine, através do buscar PubMed, segundo os critérios de inclusão e exclusão, apresentamos no Quadro 1, as características dos trabalhos incluídos para discussão na pesquisa, por ordem cronológica de publicação.

Quadro 1 – Características dos estudos incluídos na pesquisa, por ordem cronológica decrescente de publicação.
ANOAUTORTÍTULOOBJETIVO
2023Bowden et al.Risk factors for human papillomavirus infection, cervical intraepithelial neoplasia and cervical cancer: an umbrella review and follow-up Mendelian randomisation studies.A análise principal apoiou a associação de imunossupressão sistêmica (infecção pelo HIV, medicamentos imunossupressores) e local (microbiota vaginal alterada) com risco aumentado de piores resultados de HPV e doenças cervicais.
2023Chao et al.Small cell neuroendocrine carcinoma of the cervix: From molecular basis to therapeutic advances.Avanços futuros na nossa compreensão da biologia do SCNECC – associados ao estudo das suas aberrações genómicas e moleculares, bem como ao conhecimento do SCNE do pulmão e de outros locais extrapulmonares – seriam úteis na descoberta de novos alvos moleculares para o desenvolvimento de medicamentos.
2023EgawaPapillomaviruses and cancer: commonalities and differences in HPV carcinogenesis at different sites of the body.Provavelmente, grande parte da responsabilidade recai sobre as contribuições de células epiteliais específicas e do microambiente celular em locais infectados para o processo de transformação maligna, os quais afetam a regulação da expressão gênica viral e o ciclo de vida viral. Ao compreender a biologia destes locais epiteliais, será fornecido um melhor diagnóstico/tratamento/gestão do cancro associado ao HPV e/ou lesões pré-cancerígenas.
2023Mei et al.Association between the infections of Trichomonas vaginalis and uterine cervical human papillomavirus: a meta-analysis.Esta meta-análise revelou uma associação positiva entre TV e infecção cervical por HPV.  
2023Nelson; MirabelloHuman papillomavirus genomics: Understanding carcinogenicity  Dada a elevada carga contínua de cancros associados ao HPV, a compreensão da carcinogenicidade do HPV continua a ser importante para uma melhor compreensão, prevenção e tratamento dos cancros atribuíveis à infecção.
2023Oubaddou et al.The Tumor Suppressor BRCA1/2, Cancer Susceptibility and Genome Instability in Gynecological and Mammary Cancers.Decifrar a relação entre alterações BRCA1/2 e instabilidade genômica que leva a cânceres ginecomamários por meio de resultados de pacientes, camundongos e linhagens celulares.  
2023OyounilHuman papillomavirus in cancer: Infection, disease transmission, and progress in vaccinesEsta revisão conclui o conhecimento atual sobre a infecção por HPV, cepas de virulência, significado clínico dos HPVs, modo de transmissão e estratégias de vacinação.  
2023Salta et al.DNA methylation as a triage marker for colposcopy referral in HPV-based cervical cancer screening: a systematic review and meta-analysis.Esta meta-análise confirmou o grande potencial dos biomarcadores baseados na metilação do DNA como ferramenta de triagem para mulheres hrHPV positivas no rastreio do cancro do colo do útero.  
2023Yusuf; Sampath; Umar.Bacterial Infections and Cancer: Exploring This Association And Its Implications for Cancer Patients.A infecção se apresenta como uretrite nos homens e endocervicite nas mulheres. Infecções persistentes por Chlamydia também foram identificadas como um fator de risco para o desenvolvimento de carcinoma cervical, especialmente em pacientes com coinfecção pelo HPV.
2022Zebardast et al.Critical involvement of circular RNAs in virus-associated cancers.Concentre-se nos papéis emergentes dos circRNAs codificados por vírus em vários tipos de câncer, incluindo câncer cervical, câncer gástrico, carcinoma de células de Merkel, carcinoma nasofaríngeo, câncer de Kaposi e câncer de fígado.
Fonte: próprios autores.

O câncer cervical é uma das doenças malignas comuns entre mulheres em todo o mundo e cerca de 0,00035% das mulheres foram afetadas. O HPV tipo 18 e tipo 16 foram associados a cânceres cervicais, lesões e displasia pré-neoplásica e mediam malignidade do colo uterino. O HPV 16 causa cerca de 50% da infecção, enquanto o HPV 16 e 18 contribuiu com> 70% do câncer cervical em todo o mundo (Oyouni, 2023).

Os HPVs têm genomas circulares de DNA de fita dupla de ∼ 7,9 kb que consistem em uma região regulatória a montante (URR), uma região intergênica não codificadora (NCR) com repetições simples (AT) n e poli-T e oito principais leituras abertas codificadoras de proteínas expressas quadros (ORFs). As ORFs são nomeadas de acordo com seu tempo aproximado de expressão durante o ciclo de vida viral, onde ‘E’ denota precoce e ‘L’ denota tarde: E6, E7, E1, E2, E4, E5, L2 e L1 (listados 5′ –3′). Além das ORFs principais, E8 – uma sequência frequentemente com 12 ⅔ códons de comprimento – é unida a E2 para formar E8^E2 em certos estágios da infecção. Todas as ORFs ocupam a cadeia sense (forward) e são expressas como mRNAs policistrônicos (multi-ORF) (Nelson; Mirabello, 2023).

Ao comparar o HPV de alto e baixo risco, um papel significativo na transformação maligna é atribuído aos genes E6 e E7 – frequentemente referidos como oncogenes virais – e à função das suas respectivas proteínas. E6 e E7 são eficientemente capazes de imortalizar vários tipos de células humanas in vitro quando são expressos juntos (Yusuf; Sampath; Umar, 2023). Os únicos genes virais expressos em tecido canceroso e maligno infectado por HPV são E6 e E7, e a proliferação de células cancerígenas cervicais por si só depende da expressão de E6 e E7. Em termos de carcinogenicidade, foi demonstrado que E6 e E7 de HPVs de alto risco têm várias funções que não estão presentes em E6 e E7 de HPVs de baixo risco. Como tal, E6 e E7 dos HPVs da mucosa de alto risco, se expressos, podem realizar muitas das etapas necessárias para a oncogênese em contraste, foi demonstrado que E6 e E7 de HPVs de baixo risco ou outros tipos de HPV não apresentam nenhuma ou apenas formas inadequadas de tais funções. Esta diferença na função explica bem porque é que os HPV de alto risco causam cancro e os HPV de baixo risco não (Yusuf, 2023).

O vírus HPV integra-se ao DNA do núcleo da célula hospedeira e desregula a expressão das oncoproteínas (E6 e E7). A proteína E6 causa a degradação do p53, o que resulta na perda da atividade do p53. Um complexo entre p53, E6 e E6AP é formado para degradá-lo. No estado saudável, o p53 impede que as células progridam através da fase G1 do ciclo celular e desencadeia a apoptose para permitir o reparo do DNA do hospedeiro. Além disso, o E7 se liga ao inibidor da quinase dependente de ciclina, o que leva à perda do controle do ciclo celular. A infecção pelo HPV causa a produção de genes virais nas células basais, o que auxilia na replicação viral. Para que a replicação comece, as primeiras proteínas E1 e E2 são necessárias. O repressor transcricional das proteínas E6 e E7, E2, regula a expressão desses genes. O vírus integra-se no genoma humano através de um processo de círculo rolante que serve como modo de reprodução (Oyouni, 2023).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se que a infecção por papilomavírus humano e o desenvolvimento de tumores têm sido objeto importante de pesquisa de vários grupos de pesquisa. Além disso, ainda existem grandes lacunas no nosso conhecimento sobre a patogênese mediada pelos HPVs. As proteínas E6 e E7 expressas desempenharam um papel significativo no desenvolvimento e progressão do tumor. A regulação negativa destas duas proteínas pode ser útil para reduzir o desenvolvimento do cancro. Os HPVs afetam diferentes regiões do corpo, incluindo cervical, pulmões, cérebro, cabeça e pescoço. A transmissão de doenças e o modo de ação dos HPVs são pouco compreendidos. A determinação do desenvolvimento de câncer associado ao HPV nos tecidos será uma chave para o desenvolvimento e alívio de infecções associadas ao HPV em humanos.

AGRADECIMENTOS

Fundação Nacional de Desenvolvimento do Ensino Superior Particular (Funadesp) pelo apoio e incentivo ao aprimoramento cientifico e acadêmico, por meio do programa de bolsa de Iniciação Científica as acadêmicas de Medicina da Faculdade de Ciências da Saúde Pitágoras Codó (FCSPC). E o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001, com bolsa de pós-graduação.

REFERÊNCIAS

BOWDEN, Sarah J. et al. Risk factors for human papillomavirus infection, cervical intraepithelial neoplasia and cervical cancer: an umbrella review and follow-up Mendelian randomisation studies. BMC medicine, v. 21, n. 1, p. 274, 2023.

CHAO, Angel et al. Small cell neuroendocrine carcinoma of the cervix: From molecular basis to therapeutic advances. biomedical journal, p. 100633, 2023.

EGAWA, Nagayasu. Papillomaviruses and cancer: commonalities and differences in HPV carcinogenesis at different sites of the body. International Journal of Clinical Oncology, p. 1-9, 2023.

MEI, Xuefang et al. Association between the infections of Trichomonas vaginalis and uterine cervical human papillomavirus: a meta-analysis. Journal of Obstetrics and Gynaecology, v. 43, n. 1, p. 2194986, 2023.

NELSON, Chase W.; MIRABELLO, Lisa. Human papillomavirus genomics: Understanding carcinogenicity. Tumour Virus Research, p. 200258, 2023.

OUBADDOU, Yassire et al. The Tumor Suppressor BRCA1/2, Cancer Susceptibility and Genome Instability in Gynecological and Mammary Cancers. Asian Pacific Journal of Cancer Prevention, v. 24, n. 9, p. 3139-3153, 2023.

OYOUNI, Atif Abdulwahab A. Human papillomavirus in cancer: Infection, disease transmission, and progress in vaccines. Journal of infection and public health, v. 16, n. 4, p. 626-631, 2023.

POHLMANN, Paula Raffin. Prevalência de infeção pelo Papiloma vírus humano de alto risco e de lesões associadas no colo uterino através da citologia convencional e do método de captura híbrida de segunda geração. 2002.

SALTA, Sofia et al. DNA methylation as a triage marker for colposcopy referral in HPV-based cervical cancer screening: a systematic review and meta-analysis. Clinical Epigenetics, v. 15, n. 1, p. 125, 2023.

SIMONETTI, Ana Catarina; OLIVEIRA, Sibele Ribeiro de. III Congresso de Biomedicina e Farmácia. 2012.

YUSUF, Kafayat; SAMPATH, Venkatesh; UMAR, Shahid. Bacterial Infections and Cancer: Exploring This Association And Its Implications for Cancer Patients. International Journal of Molecular Sciences, v. 24, n. 4, p. 3110, 2023.

ZEBARDAST, Arghavan et al. Critical involvement of circular RNAs in virus-associated cancers. Genes & Diseases, 2022.


1Faculdade de Ciências da Saúde Pitágoras Codó – MA;

2 Hemope – Fundação de Hematologia e Hemoterapia de Pernambuco;

3 Hospital Universitário – Universidade Federal do Maranhão – HUUFMA;

4 Universidade Federal do Maranhão – UFMA.