MECANISMOS LEGAIS EFICAZES PARA A PRESERVAÇÃO DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

EFFECTIVE LEGAL MECHANISMS FOR THE PRESERVATION OF PERMANENT PRESERVATION AREAS

10.5281/zenodo.7303898


Maria Luiza Ribeiro Ferreira1
Lara Jorranny Alves Pinho1
Ana Cláudia Barroso2


RESUMO

O presente artigo aborda da perspectiva jurídica as Áreas de Preservação Permanente, desde a sua origem e conceito até a sua forma de aplicação, ressaltando a importância da criação de tais áreas. O objetivo do estudo é analisar o funcionamento e a importância das áreas de preservação permanente, para analisar a sua aplicação nos termos do ordenamento jurídico brasileiro. A pesquisa se caracteriza como sendo teórica, qualitativa e bibliográfica e o método de procedimento é o dedutivo. Pretendeu-se neste trabalho proporcionar, de forma sintética e objetiva uma familiarização sobre os mecanismos legais que acreditamos ser eficazes para que as Áreas de Preservação Permanente sejam efetivamente amparadas. Provida de um regime diferenciado para sua tutela, é fonte de bens e serviços ambientais essenciais à sobrevivência humana. Nesta senda, o estudo tem por finalidade explorar os mecanismos de aplicação das normas de proteção das áreas assim qualificadas, buscando se contribuir para a manutenção dos mananciais.

Palavras-chave: Áreas de Preservação Permanente; Mecanismos Legais de Preservação; Legislação Ambiental. 

ABSTRACT

This article addresses the Permanent Preservation Areas from a legal perspective, from their origin and concept to their form of application, emphasizing the importance of creating such areas. The objective of the study is to analyze the functioning and the importance of permanent preservation areas, to analyze their application in terms of the Brazilian legal system. The research is characterized as being theoretical, qualitative and bibliographical and the procedure method is deductive. The aim of this work was to provide, in a synthetic and objective way, a familiarization about the legal mechanisms that we believe to be effective so that the Permanent Preservation Areas are effectively supported. Provided with a differentiated regime for its protection, it is a source of environmental goods and services essential to human survival. In this way, the study aims to explore the mechanisms of application of the protection norms of the areas thus qualified, seeking to contribute to the maintenance of springs.

Keywords: Permanent Preservation Areas; Legal Preservation Mechanisms; Environmental legislation.

1. INTRODUÇÃO

O sistema evolutivo adotado pela raça humana que possibilitou  o surgimento de cidades, da indústria e da tecnologia, vislumbrando o acúmulo de riquezas, tem por consequência o abuso e exploração exacerbada dos recursos naturais. Apesar de necessário, este desenvolvimento deveria, em tese, ocorrer de forma conjunta com a sustentabilidade, sem que haja o comprometimento da qualidade de vida de nenhuma espécie, como também, o futuro das próximas gerações.

A grande biodiversidade brasileira é um grande atrativo exploratório para os europeus desde a colonização, sendo a maior parte dela concentrada na Amazônia. No entanto, ainda que considerada a maior do país, a vegetação amazônica sofreu e ainda sofre com a exploração insustentável. 

A presente tese aborda a tutela jurídica das áreas de preservação permanente – Apps e os mecanismos legais para sua preservação. Estas áreas representam um papel de suma importância na preservação de com as funções ambientais de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade e o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas (Agência Senado,2009). Portanto, esta engloba a proteção da biodiversidade como um todo, e de forma mais rígida quanto a inviabilidade de exploração nestas áreas. 

A pesquisa tem como finalidade a análise dos benefícios, da atuação e dos mecanismos de execução que tornem as áreas de preservação permanente mais eficazes no combate ao uso insustentável dos recursos naturais. O fator que corrobora para a justificativa da presente tese é que atualmente ainda há um grande número de ocorrências de exploração de áreas de preservação permanente.

A metodologia aplicada consiste numa pesquisa teórica, qualitativa e bibliográfica, bem como método de pesquisa dedutivo. Para melhor compreensão acerca da matéria,o estudo abordará o conceito e a dinâmica de funcionamento das áreas de preservação permanente, bem como o histórico que aduziu a sua necessidade de implementação no Novo Código Florestal Brasileiro, Lei nº 12.727/12. Um vez elucidado conceito e sua importância, a pesquisa tem o objetivo principal de explanar mecanismos que possam torná-las mais eficazes, de modo que ainda permita o desenvolvimento econômico e tecnológico,porém em ação conjunta com a preservação dos recursos naturais que são finitos e imprescindíveis para as gerações futuras. 

2. DESENVOLVIMENTO 

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA E CONTEXTUALIZAÇÃO DA ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NO ORDENAMENTO JURÍDICO NACIONAL

A Área de Preservação Permanente é caracterizada especialmente pelo papel de resguardar os recursos hídricos, a vegetação, a biodiversidade e a estabilidade do solo, que são fontes de bens e serviços ambientais inerentes à sobrevivência humana. Para a legislação brasileira, uma área de preservação permanente é definida como  área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas. (BRASIL,2012) 

Segundo SANCHES (2008, p.21), as áreas de preservação permanente são constituídas basicamente como espaços indispensáveis para a preservação dos ecossistemas e do clima. Entretanto, é labiríntico conceituar o termo “”ambiente , uma vez que diversos pesquisadores e redatores de leis buscam a melhor maneira de conceituá-lo. Tal fato decorre ao fato da acepção de agrupar diferentes vertentes, incumbido do provimento da matéria-prima imprescindível ao desenvolvimento socioeconômico e, em contrapartida, exercendo as funções ecológicas essenciais à vida, provindo desta forma, a obrigação de manter a sua integridade. (SANCHES, 2008, p.21).  Para fins de compreensão da presente tese, o ambiente compreende na fauna, flora, solo, recursos hídricos e ar atmosférico. São áreas extremamente suscetíveis à ação antrópica.

2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Considerando a incontestável ascensão do capitalismo no mundo atual, retratado na produção e comercialização de mercadorias nocivas às áreas naturais, como exemplo os materiais descartáveis como canudos, garrafas pets, sacos plásticos, entre outros. Tal fato emergiu da necessidade da criação de medidas mais efetivas de proteção aos recursos naturais. 

Com objetivo de erradicar ou pelo menos atenuar a poluição e o desmatamento em pontos estratégicos, criou-se o termo “áreas de preservação permanente”. 

No âmbito jurídico , a primeira ideia de áreas de preservação permanente foi instituída  no Brasil pela Lei nº. 4.771 que fundou o novo Código Florestal, promulgada pelo Presidente H. Castello Branco 3, em 16 de setembro de 1965, conforme consta no Diário Oficial dos Estados Unidos do Brasil n°. 117, ano CIII, Seção I, Parte I. Esta lei modificou e detalhou o Decreto nº. 23.793 de 1934, até então vigente, onde fora aprovado o Código Florestal, no decurso do  primeiro governo de Getúlio Vargas. A lei proibia práticas exploratórias de recursos florestais em áreas indígenas, com exceção do manejo florestal sustentável. Entretanto, o conceito surgiu de forma mais explícita no novo Código Florestal, onde  oficialmente surge o termo área de preservação permanente. O código florestal atualmente vigente, em seu parágrafo único do art. 3º, ampliou às terras indígenas demarcadas e às demais áreas tituladas de povos e comunidades tradicionais, que utilizam coletivo do território, o tratamento dispensado à pequena propriedade ou posse rural familiar, ou seja, à população tem o aval para utilizar aquelas áreas apenas para subsistência.3.

No que tange à indenização pelas áreas de preservação permanente, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região já decidira que o “direito do expropriado à ­indenização pelas referidas matas está condicionado à demonstração de que o ­desapossamento concernente à desapropriação gerou para ele inegável prejuízo. Por sua vez, o dano deve ser aferido segundo a possibilidade de exploração econômica da área expropriada, haja vista que áreas inaproveitáveis ou incapazes de proporcionar repercussão de cunho econômico não podem, em consequência, ser valoradas economicamente. De fato, o próprio conceito de desapropriação aponta nessa direção. Assim, indenizar significa restituir ao proprietário o mesmo valor econômico do qual ele é privado pelo ato expropriatório” (grifo nosso).

Continua o relator, asseverando que as florestas de preservação permanente não são suscetíveis de exploração ou supressão, exceto em caso de utilidade pública ou de interesse social, na forma da lei. A impossibilidade de valoração econômica das áreas florestais de preservação permanente é ainda constatada pela redação do art. 18, do mesmo diploma legal acima citado […] Por fim, a Lei n. 8.629, de 25.2-1993, enumera, como área não aproveitável, ‘as áreas de efetiva preservação permanente e demais áreas protegidas por legislação relativa à conservação dos recursos naturais e à preservação do meio ambiente”’ (grifo nosso) (TRF 5ª Região, Ap. Cív. 333.268/PE).

2.3 PREVISÃO LEGAL

Para fins de preservação dos recursos hídricos a legislação abrange as seguintes áreas, no âmbito urbano ou rural:

As áreas de preservação permanente (APP) são aquelas elencadas nos arts. 4º e 6º da Lei n. 12.727/2012, cobertas ou não por vegetação nativa, sendo as primeiras assim consideradas pelo simples efeito da norma e as segundas por ato declaratório do Poder Executivo. Tais áreas objetivam preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.

Assim, consideram-se APP, por disposição legal, as seguintes áreas:

I – as faixas marginais de qualquer curso d’água natural, desde a borda da calha do leito regular;

(…)

II – as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com largura mínima;

(…)

III – as áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento, observado o disposto nos §§ 1º e 2º;

IV – as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros; (Redação dada pela Lei n. 12.727, de 2012). (Vide ADIN n. 4.903)

V – as encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% (cem por cento) na linha de maior declive;

VI – as restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;

VII – os manguezais, em toda a sua extensão;

VIII – as bordas dos tabuleiros ou chapadas, até a linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais;

IX – no topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 (cem) metros e inclinação média maior que 25°, as áreas delimitadas a partir da curva de nível correspondente a 2/3 (dois terços) da altura mínima da elevação sempre em relação à base, sendo esta definida pelo plano horizontal determinado por planície ou espelho d’água adjacente ou, nos relevos ondulados, pela cota do ponto de sela mais próximo da elevação;

X – as áreas em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação;

XI – em veredas, a faixa marginal, em projeção horizontal, com largura mínima de 50 (cinquenta) metros, a partir do limite do espaço brejoso e encharcado.

Uma das principais mudanças trazidas pelo novo código (TRENNEPOHLA, 2022) é que a Lei n. 4.771/65 que antecedeu a lei atual, proibia a exploração de recursos florestais em áreas indígenas, acautelando o manejo florestal sustentável. Já o novo código, em seu parágrafo único do art. 3º, expandiu para às terras indígenas demarcadas e às demais áreas tituladas de povos e comunidades tradicionais, que realizam o uso coletivo do território, o tratamento dispensado à pequena propriedade ou posse rural familiar.

2.4 PRINCÍPIOS NORTEADORES E A IMPORTÂNCIA DAS APPS

– PRINCÍPIO DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO 

O direito ao meio ambiente é um direito fundamental, sendo inclusive uma extensão do direito à vida.

É perceptível que o direito à vida está intimamente ligado ao direito ambiental, não se restringindo somente a vida humana, mas também na sadia qualidade de vida de todas as formas. Segundo Machado “não basta viver ou consagrar a vida, é justo buscar e conseguir a qualidade de vida”. (MACHADO, 2002, p.46). 

O art. 225 da CF é o aparato que reforça maior proteção legal e assim dispõe seu caput:  

Art.225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (BRASIL, 1988). 

E se tratando do direito ecologicamente equilibrado, é recente este reconhecimento.

A principal fonte formal do direito ambiental é a Constituição da República. Aliás, a existência do artigo 225, no ápice, e todas as demais menções constitucionais ao meio ambiente e à sua proteção demonstram que o Direito Ambiental é essencialmente um direito constitucional, visto que emanado diretamente da Lei Fundamental. Essa é uma realidade nova e inovadora em nossa ordem jurídica (ANTUNES, 2014, p. 61).

A conferência de Estocolmo de 1972 é considerada um marco histórico para essa temática, pois refletiu na importância para a nossa Constituição.

Para Édis Milaré, é o “princípio transcendental de todo o ordenamento jurídico ambiental, ostentando o status de verdadeira cláusula pétrea”, sendo assim irrevogável.

Pois se afigura como um direito constitucional e fundamental, no art. 225  da CF e também um direito de terceira geração e que corresponde ao direito individual e da coletividade, sendo de natureza indivisível, como se concluiu no julgado (Ms 22.164/sP, relator Ministro Celso de Mello, j. 30-10-1995, tribunal Pleno, DJ, 17-11-1995).

Alexandre de Moraes acerca da terceira geração disciplina que: 

Por fim, modernamente, protege-se, constitucionalmente, como direitos de terceira geração os chamados direitos de solidariedade e fraternidade, que englobam o direito a um meio ambiente equilibrado, uma saudável qualidade de vida, ao progresso, à paz, à autodeterminação dos povos e a outros direitos. (MORAES, 2006).

– PRINCÍPIO DO DIREITO À SADIA QUALIDADE DE VIDA 

Para ser alcançada a sadia qualidade de vida é preciso ter um ambiente ecologicamente equilibrado. 

Seguindo ainda, o texto do art. 225 da CF, fica claro e explícito que o meio ambiente é essencial para o desenvolvimento humano, refletindo na dignidade da pessoa humana e garantindo uma melhor qualidade de vida.

Fernando López Ramón, pontua que “é importante ressaltar que a qualidade de vida é um elemento finalista do Poder Público, onde se unem a felicidade do indivíduo e o bem comum, com o fim de superar a estreita visão quantitativa, antes expressa no conceito de nível de vida”. 

Nesse sentido, o STJ já sufragou entendimento que:

Ementa: Ambiental e processual civil. Preservação arquitetônica do Parque Lage (RJ). Associação de moradores. Legitimidade ativa. Pertinência temática caracterizada. Conceito legal de “meio ambiente” que abrange ideais de estética e paisagismo (arts. 225, caput, da CR/88 e 3º, inc. III, alíneas “a” e “d” da lei n. 6.938/81). […] 3. Em primeiro lugar, a Constituição da República vigente expressamente vincula o meio ambiente à sadia qualidade de vida (art. 225, caput), daí porque é válido concluir que a proteção ambiental tem correlação direta com a manutenção e melhoria da qualidade de vida dos moradores do Jardim Botânico (RJ). 4. Em segundo lugar, a legislação federal brasileira que trata da problemática da preservação do meio ambiente é expressa, clara e precisa quanto à relação de continência existente entre os conceitos de loteamento, paisagismo e estética urbana e o conceito de meio ambiente, sendo que este último abrange os primeiros. […] Recurso especial provido. (Superior Tribunal de Justiça – Segunda Turma/ REsp 876.931/RJ/ Relator: Ministro Mauro Campbell Marques/ Julgado em 10.08.2010/ Publicado no DJe em 10.09.2010).

A Conferência das Nações Unidas sobre Meio ambiente e Desenvolvimento, na Declaração do Rio de Janeiro/92 no seu primeiro artigo diz que:

“Os seres humanos constituem o centro das preocupações relacionadas com o desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia com a natureza”.

Já o Decreto 3.321, de 30.12.99, promulga o Protocolo Adicional à Convenção Americana de Direitos Humanos prevê, em seu art.11 que: “1. Toda pessoa tem direito a viver em meio ambiente sadio e a dispor dos serviços públicos básicos. 2. Os Estados-Partes promoverão a proteção, preservação e melhoramento do meio ambiente.”

2.5 IMPORTÂNCIA

Essas áreas atuam na diminuição dos impactos que são causados pela ação natural e  do homem sobre a natureza. Conforme o art.3°, II da lei 12.727/2012, essas áreas têm “ a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas;”

Tem importância ainda  na economia, pois conforme a lei é permitido o desenvolvimento de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural (art. 61-A, caput), mas é obrigatório que se faça a recomposição de faixas entre 5 a 15 metros de acordo com a extensão do imóvel rural, sendo igual ou inferior a 4ha (art. 61-A, §§ 1º a 4º), e de até 100 metros para os demais casos (art. 61-A, § 4º, II). 

Nas áreas que apresentam vegetação, elas têm papel ecológico de proteger o solo, principalmente as matas ciliares e proteger e manter os recursos hídricos. Este tipo de vegetação cumpre a função de proteger os rios e reservatórios de assoreamentos, evitar transformações negativas nos leitos, garantir o abastecimento dos lençóis freáticos e a preservação da vida aquática.

De acordo com a nossa Constituição, a água é um bem público inalienável, não podendo ser privada, pois é um bem de todos. O art.1°, inciso I da Lei 9.433/97, afirma que “a água é um bem de domínio público”, sendo um bem ambiental difuso e indisponível, de uso comum do povo. Portanto, o Poder Público tem o papel de gerenciar sua utilização e a proteção.

Outro importante fundamento da PNRH que o legislador prevê é de que “a água é um recurso natural limitado dotado de valor econômico” (inciso II do mesmo artigo), inspirando a utilização de instrumentos econômicos para política ambiental, na qual tem o intuito de racionalizar seu uso e evitar desperdícios. 

As APPS de recursos hídricos representam, de acordo com o art. 4°da Lei 12.727 as:

I) As faixas marginais de cursos d’água perene e intermitente, desde a borda da calha do leito.

A largura mínima da APP varia de acordo com a largura do curso d’água.

Largura do curso d’água (metros) Largura da APP (metros) 
Inferior a 10 m 30 m
Entre 10 e 50 m 50 m
Entre 50 e 200 m 100 m
Entre 200 e 600 m 200 m
Superior a 600 m 500 m

II) As áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais.

Área da superfície do espelho d’água (hectares) Largura da APP (metros) 

Zona rural
Até 20 ha 50 m
Superior a 20 ha 100 m
Zona urbana Qualquer dimensão 30 m

III) Áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, exclusivamente decorrentes de barramento ou represamento de cursos d’água naturais. 

Quando o reservatório d’água artificial for destinado a geração ou abastecimento público, além das obrigações previstas no Art. 5° da Lei 12651, deve ser obedecido as seguintes faixas mínimas e máximas da APP para zona rural e zona urbana:

Faixa Mínima de APP (metros) Faixa Máxima de APP (metros) 
Zona Rural30 m 100 m
Zona Urbana 15 m30 m 

Obs.: Para as acumulações naturais (lagos e lagoas) ou artificiais de água com superfície inferior a 1 hectare, fica dispensada a faixa de proteção, no entanto não é permitida nova supressão da vegetação nativa, exceto quando autorizada por órgão ambiental competente (Art. 4°  da Lei 12651).

IV) Áreas no entorno de nascentes e de olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação topográfica. O raio mínimo da APP é de 50 m.

As Apps ainda promovem a função ambiental de assegurar o bem-estar das populações humanas e conforme o art. 225 da CF, tanto a coletividade quanto o Poder Público tem que defender e preservar para as presentes e futuras gerações.

Assim como a Conferência de Estocolmo sobre o Meio Ambiente, a ONU criou uma Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e que ao decorrer do tempo foi apresentado em 1987 uma conclusão de suas atividade, na qual se tratava de diversas discussões e audiências sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, chamado de Relatório Nosso Futuro Comum, também conhecido como “Relatório Brundtland”. 

Esse relatório foi responsável por demarcar um conceito sobre desenvolvimento sustentável, como aquele “que atende às necessidades das gerações atuais sem comprometer a capacidade de as futuras gerações terem suas próprias necessidades atendidas”. 

Cabe a nossa geração, utilizar os recursos naturais sem comprometer a manutenção e desenvolvimento da qualidade de vida das gerações futuras, por isso devemos repensar sobre o consumo e produção insustentáveis  nos dias de hoje.

2.6 MECANISMOS LEGAIS DE PREVENÇÃO 

– FISCALIZAÇÃO

O ente estatal desempenha o poder de polícia para limitar ou disciplinar o direito fundamental ao meio ambiente equilibrado. 

No conceito oferecido por Di Pietro (2017) o poder de polícia “é a atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público”. Nesse contexto, cabe aos órgãos da administração pública, nos limites legais, exercer o poder de polícia, conforme mandamento contido no artigo 78 do Código Tributário Nacional (BRASIL, 1966b).

O Direito Administrativo irá dizer de que forma os recursos naturais devem ser usados, o limite de poluição, além de dispor sobre o monitoramento e a fiscalização. 

De acordo com o Ibama, o poder de polícia é a faculdade que que dispõe o Estado, ou a Administração Pública, para condicionar e limitar o exercício de direitos individuais em prol do bem comum, sendo assim, caracterizado por três atributos: discricionariedade, autoexecutoriedade e coercibilidade.

Através do poder de polícia o Estado deve agir positivamente, este agir está previsto na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n° 6.938, de 31/08/1981) no inciso VII do art.2°,  ao firmar com princípio o “acompanhamento do estado da qualidade ambiental”, remetendo à importante ação de fiscalizar. A polícia do Meio Ambiente serve para assegurar a obediência às normas ambientais podendo ser preventiva ou repressiva. 

A fiscalização se faz necessária por diversos motivos e ainda aplica medidas para que essas condutas lesivas deixem menos de acontecer, além de ajudar na prevenção pois evita futuras infrações ambientais.

A fiscalização é uma espécie de instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente, que as vezes acaba se destacando para que órgãos sem licença para tal atribuição atuem “em defesa” do  meio ambiente, o ponto negativo desse fato é, as más interpretações feitas o que dá margem à corrupção e práticas questionáveis, causando assim uma insegurança e incerteza para o cidadão que fica sem saber qual é o verdadeiramente órgão responsável. Há uma sustentação para essa proposição, o STJ (AGRESP 200401790140, Ministro Humberto Martins, DJE: 15/5/2009), dava sustentação a tal tese, fazendo com que a fiscalização ambiental fosse realizada de forma “lotérica”.

Porém, a LC nº 140/2011 abordou de forma racional à questão ao considerar  que a competência fiscalizatória corresponde à competência para licenciamento, como determinado pelo artigo 17 da LC.

Qualquer atividade administrativa está submetida aos princípios e preceitos constitucionais, não podendo ser exercida ao arrepio da CF. Para tal, há que se observar precipuamente o caput do artigo 37 da CF, em especial os princípios de legalidade, publicidade (STJ – MS 9744/DF. Ministro José Delgado. 1ª Seção. DJU: 4/4/2005, p. 158) e impessoalidade.

O Ibama é o responsável pela fiscalização das APP’s , que é regida pelas normas contidas no Regulamento Interno da Fiscalização (RIF) do Ibama aprovado pela Portaria nº 24 de 16 de agosto de 2016, com nova redação dada pela Portaria nº 3.326, de 12 de setembro de 2019 e tem como objetivo a prevenção da prática de ilícitos administrativos ambientais, “induzindo o comportamento social de conformidade com a legislação ambiental pela aplicação de sanções administrativas e das medidas judiciais cabíveis” (artigo 3º), cabendo-lhe, ainda, a apuração administrativa dos atos infracionais. 

Ela é feita de forma descentralizada, por setores, sendo monitorada e avaliada pela Coordenação-Geral de Fiscalização Ambiental (CGFIS), dentro do planejamento estratégico formulado pela Diretoria de Proteção Ambiental (Diproem) em consonância com as diretrizes gerais do Ibama.

E quem possui autoridade legal para emitir autos de infração e documentos, além de exercer seu poder de polícia é o servidor público especialmente designado. Para que possa simplificar a ação administrativa do Ibama há um Regulamento Interno de Fiscalização, nela estão organizadas as atribuições e deveres, porém somente a lei quem dá essas atribuições e competências para a fiscalização.

A fiscalização ambiental está subordinada à Diretoria de Proteção Ambiental, à qual compete (Portaria nº 11/2009 do Ibama), junto à ela funciona a Coordenação-Geral de Fiscalização (CGFIS) e também junto aos órgãos descentralizados do Ibama funcionam as Coordenações de Fiscalização e Operações (COFIS). Nas Superintendências Estaduais existe um Coordenador do setor de fiscalização.

Sobre as ações dos órgãos, está disciplinada na portaria n° 14/2017 que foram alteradas pelas portarias 2.864/2019 e a 3.326/2019. Existem vários tipos de fiscalizações, elas podem ser  programadas;  emergenciais; resultantes de denúncia; decorrentes de determinação judicial; ocasionadas por requisição do Ministério Público; solicitadas por autoridade policial; determinadas por decisão superior; ou de iniciativa própria do AAF.

Pelo fato da fiscalização ser um ato administrativo formal e complexo, tudo deve ser devidamente documentado para que o autuado possa exercer seu direito de defesa e que a administração possa ter controle de legalidade das atividades, por isso é obrigatório a parte da documentação no processo, citarei alguns dos principais documentos, são eles auto de infração, os termos de embargo, suspensão e apreensão.

Ainda que a fiscalização tenha natureza eminentemente preventiva, necessita produzir provas para que os autos possam ter uma consistência jurídica e para que as penalidades sejam aplicadas corretamente e efetivamente.

Durante a ação fiscalizatória todos os elementos de informação que forem reunidos deverão constar  em um relatório próprio, de  acordo com as normas e reforçada com pareceres técnicos. O laudo técnico é essencial, pois dele sucederá a prova cabal da materialidade da ação nociva. 

– EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Esteve presente de início na Declaração de Estocolmo (1972) no princípio 19: 

“é indispensável um esforço para a educação em questões ambientais, dirigida tanto às gerações jovens como aos adultos e que preste a devida atenção ao setor da população menos privilegiado, para fundamentar as bases de uma opinião pública bem informada, e de uma conduta dos indivíduos, das empresas e das coletividades inspirada no sentido de sua responsabilidade sobre a proteção e melhoramento do meio ambiente em toda sua dimensão humana. É igualmente essencial que os meios de comunicação de massas evitem contribuir para a deterioração do meio ambiente humano e, ao contrário, (difundam)* informação de caráter educativo sobre a necessidade de protegê-lo e melhorá-lo, a fim de que o homem possa desenvolver-se em todos os aspectos”. Além disso, a educação ambiental apresenta relação direta com o princípio da participação pública, como na participação na tomada de decisão, acesso à informação e acesso à justiça, sendo compreendido no âmbito constitucional conforme o art. 225, inciso VI, § 1º, a qual estabelece o dever estatal de “promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente”.

De acordo com o artigo e inciso, é obrigação do Poder Público promover esse instrumento que é tão fundamental, pois através dele que se alcança pessoas para que essas compreendem a importância de se ter um ambiente ecologicamente equilibrado. 

A educação vai estabelecer conexões com todas as pessoas, fazendo com elas tomem consciência do dever de preservar e cuidar do meio ambiente. Facilitando assim, o papel que cada indivíduo deve tomar frente aos problemas ambientais contemporâneos.

A lei Lei nº 9.795/99 regula sobre esse tema que logo no seu primeiro artigo conceitua educação ambiental, vejamos: 

Art. 1o Entendem-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade.

Essa lei ainda garante que é um direito de todos e que seja permanente na educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-formal (art.2° da lei 9.795/99).

Ao estimular a conscientização pública para a preservação do meio ambiente, haverá muitas melhorias, benefícios como, construir uma cultura mais sustentável e integrar uma comunidade em prol do meio ambiente. De acordo com o art. 4, V da Lei  6.938/81, estabelecendo como um dos objetivos, a formação de uma consciência pública sobre a necessidade de preservação da qualidade ambiental e do equilíbrio ecológico.

Há princípios básicos na educação ambiental, no art.4° da Lei 9.795/99, que servem como pilares normativos, são eles: 

I – o enfoque humanista, holístico, democrático e participativo;

II – a concepção do meio ambiente em sua totalidade, considerando a interdependência entre o meio natural, o sócio-econômico e o cultural, sob o enfoque da sustentabilidade;

III – o pluralismo de idéias e concepções pedagógicas, na perspectiva da inter, multi e transdisciplinaridade;

IV – a vinculação entre a ética, a educação, o trabalho e as práticas sociais;

V – a garantia de continuidade e permanência do processo educativo;

VI – a permanente avaliação crítica do processo educativo;

VII – a abordagem articulada das questões ambientais locais, regionais, nacionais e globais;

VIII – o reconhecimento e o respeito à pluralidade e à diversidade individual e cultural.

A lei também enumera os objetivos fundamentais da Educação Ambiental, conforme o art.5°:

I – o desenvolvimento de uma compreensão integrada do meio ambiente em suas múltiplas e complexas relações, envolvendo aspectos ecológicos, psicológicos, legais, políticos, sociais, econômicos, científicos, culturais e éticos;

II – a garantia de democratização das informações ambientais;

III – o estímulo e o fortalecimento de uma consciência crítica sobre a problemática ambiental e social;

IV – o incentivo à participação individual e coletiva, permanente e responsável, na preservação do equilíbrio do meio ambiente, entendendo-se a defesa da qualidade ambiental como um valor inseparável do exercício da cidadania;

V – o estímulo à cooperação entre as diversas regiões do País, em níveis micro e macrorregionais, com vistas à construção de uma sociedade ambientalmente equilibrada, fundada nos princípios da liberdade, igualdade, solidariedade, democracia, justiça social, responsabilidade e sustentabilidade;

VI – o fomento e o fortalecimento da integração com a ciência e a tecnologia;

VII – o fortalecimento da cidadania, autodeterminação dos povos e solidariedade como fundamentos para o futuro da humanidade.

Dessa forma, a transformação social por meio da educação ambiental irá se solidificar e estará presente na vida de todas as pessoas, pois mesmo que seja uma obrigação do Estado em todos os níveis federativos, a norma também incumbe deveres a agentes não estatais (art.3° da Lei 9.795/99) , o que só mostra a amplitude e relevância da política nacional de educação ambiental. 

É instituída uma Política Nacional de educação ambiental (art. 6° da lei (9.795/99), o que concretiza o dever de proteção ambiental, conforme art. 225 da CF/88 (caput e § 1°), já na disposição expressa do art. 7° da mesma lei, “a Política Nacional de Educação Ambiental envolve em sua esfera de ação, além dos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente – Sisnama, instituições educacionais públicas e privadas dos sistemas de ensino, os órgãos públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e organizações não-governamentais com atuação em educação ambiental”.

De acordo com Gadott Moacir (Pedagogia da terra…, p. 42), “reorientar a educação a partir do princípio da sustentabilidade significa retomar nossa educação em sua totalidade, implicando uma revisão de currículos e programas, sistemas educacionais, do papel da escola e dos professores, da organização do trabalho escolar”.

CONCLUSÃO 

Pretendeu-se neste trabalho proporcionar, de forma sintética e objetiva uma familiarização sobre o conceito de Área de Preservação Permanente, seus dispositivos legais e os mecanismos que acreditamos serem eficazes para que essas áreas sejam protegidas tanto pelo Poder Público quanto pela coletividade. Percebe-se ainda o quanto essas áreas são importantes e tem um alto valor social não só para a nossa geração mas como para as futuras também.

Proteger o meio ambiente, é proteger a vida e ter dignidade e para que seja alcançado depende desses mecanismos de proteção, desse modo entendemos que o Estado deve dispor do poder de polícia para garantir a preservação dessas áreas, fiscalizando para que seja prevenido ações  poluidoras e que prejudiquem o meio ambiente. Outro importante mecanismo  foi a educação  ambiental e o acesso à informação, ajudando assim a comunidade na participação e na colaboração com o meio ambiente.

O meio ambiente se configura como bem coletivo, podendo ser geral e também individual. Desse modo, o direito ao meio ambiente pertence a cada pessoa, mas apresentando proporção transindividual, isso significa que todos têm a responsabilidade de cuidar e o dever de proteger.

REFERÊNCIAS

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1Acadêmicas do décimo período de Direito,  pelo Centro Universitário São Lucas, campus Porto Velho, RO.
2Professora Orientadora. Economista e Cientista Política, Mestre em Desenvolvimento Regional e Agronegócio