MANEJO TERAPÊUTICO DA EPILEPSIA EM IDOSOS: UMA REVISÃO DA LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12549852


Amanda Maravilha Leite de França¹
Analicy Silva Souza¹
Bárbara Maria Andrade Barbosa¹
Camila Lopes Franklin Bezerra¹
João Pedro Palhano Leandro¹
Jordânia Souza Lins de Vasconcelos¹
Lóide Ferreira Miranda¹
Karen Natyara Palitot Bandeira¹
MariaEduarda Silva de Aguiar¹
Maria Edwarda Valdevino Bezerra Martins¹
Marianne Adelina Seixas de França Lavor¹
Rita de Cássia Aranha da Silva¹
Radif albino torreão motta¹
Fernando de Paiva Melo Neto²
Bianca Etelvina Santos de Oliveira³


RESUMO

A epilepsia é a terceira condição neurológica crônica mais comum em idosos, sendo as crises epilépticas frequentemente associadas a desordens neurológicas como doenças cerebrovasculares, doenças neurodegenerativas, tumores associados ao sistema nervoso central e transtornos metabólicos. Este estudo consiste em uma revisão bibliográfica de caráter exploratório e descritivo, visando compilar e analisar as informações mais relevantes sobre o manejo terapêutico da epilepsia em idosos. Realizado através de artigos publicados nas bases de dados PubMed e SciELO, além das diretrizes atuais do Ministério da Saúde do Brasil sobre o manejo da epilepsia em idosos. Alguns dos principais fatores encontrados que favorecem a ocorrência da epilepsia em idosos são a presença de condições patológicas cerebrovasculares, como AVCs ou isquemias transitórias. Esses eventos podem causar danos às células cerebrais e desencadear alterações na excitabilidade neuronal, tornando certas regiões do cérebro mais suscetíveis à atividade epiléptica descontrolada. A epilepsia é uma condição relevante entre os idosos, podendo comprometer as capacidades cognitivas e motoras dos acometidos, alterando sua qualidade de vida e aumentando os custos com a saúde. Dessa forma, faz-se mister um esforço conjunto entre pesquisadores e profissionais da área da saúde, bem como, com o suporte de formuladores de políticas, visando promover o desenvolvimento de estratégias terapêuticas inovadoras e acessíveis, garantindo que todos os pacientes recebam o melhor cuidado possível.

Palavras-Chave: Epilepsia; Idoso; Terapêutica; Sistema Nervoso Central.

ABSTRACT

Epilepsy is the third most common chronic neurological condition present in elderly people, with epileptic seizures often associated with neurological disorders such as cerebrovascular diseases, neurodegenerative diseases, tumors associated with the central nervous system and metabolic disorders. This study consists of a bibliographical review of an exploratory and descriptive nature, aiming to compile and analyze the most relevant information on the therapeutic management of epilepsy in the elderly. In our research health databases were consulted, including Pubmed and SciELO, in addition to current guidelines from the Brazilian Ministry of Health on the management of epilepsy therapy in the elderly. Some of the main factors found to favor the occurrence of epilepsy in the elderly are the presence of pathological cerebrovascular conditions, such as strokes or transient ischemia. These events can cause damage to brain cells and trigger changes in neuronal excitability, making certain regions of the brain more susceptible to uncontrolled epileptic activity. Epilepsy is a relevant condition among the elderly, which can compromise the cognitive and motor capabilities of those affected, altering their quality of life and increasing healthcare costs. In this way, a joint effort is needed between researchers and health professionals, as well as, with the support of policy makers, aiming to promote the development of innovative and accessible therapeutic strategies, ensuring that all patients receive the best possible care.

Keywords: Epilepsy; Elderly; Therapeutics; Central Nervous System.

        1.   INTRODUÇÃO

Segundo Hoeller et al. (2016), o conceito de epilepsia engloba descargas elétricas encefálicas anormais e a ocorrência de sincronização de circuitos neurais. Já com relação às causas, são inúmeras, podendo ser genéticas, estruturais ou metabólicas, congênitas ou idiopáticas. Além disso, Pereira et al. (2022), cita que esse distúrbio pode acometer pessoas de qualquer raça, sexo e idade, atingindo cerca de 65 milhões de pessoas no mundo, sendo considerado um problema de saúde pública.

Sobre a população idosa especificamente, Leppik e Bimbaum (2010) e Kluber et al. (2023), definem como sendo aquela com 65 anos ou mais, e afirmam estar experimentando o maior crescimento anual. Por sua vez, Kluber et al. (2023), cita o fato de que em várias nações desenvolvidas, os idosos representam cerca de 30% da população total, com previsões demográficas vislumbrando um aumento de cerca de quase duas vezes entre 2010 e 2030.

De acordo com o Centers for Disease (2010, apud ASSIS, 2020), o aumento da população idosa refletiu também em mudanças globais na epidemiologia das doenças neurológicas. Estima-se que a epilepsia afeta aproximadamente 50 milhões de pessoas em todo o mundo, sendo, conforme afirma Leppik e Bimbaum (2010) e Kluber et al. (2023), a incidência de epilepsia entre os idosos é de 100 casos por 100.000 habitantes por ano, embora essa cifra, provavelmente, seja subestimada devido ao subdiagnóstico preciso de epilepsia, visto que há uma apresentação atípica dos sintomas neste grupo etário.

Dessa forma, conforme traz Carpio (2009, apud ASSIS, 2020), a epilepsia é a terceira condição neurológica crônica mais comum no idoso, precedida pelas doenças cerebrovasculares e pelas doenças neurodegenerativas. Como principais causas da epilepsia nessa faixa etária, Sudhir (2013, apud KLUBER, 2023) elenca os acidentes vasculares cerebrais (AVCs), demência isolada, traumatismo cranioencefálico (TCE), tumores cerebrais e encefalopatia metabólica. Segundo Beghi (2018, apud ASSIS, 2020), as doenças com potencial epileptogênico, como as doenças cerebrovasculares e as demências, e os efeitos do próprio envelhecimento comprometendo as redes neuronais podem explicar a associação da epilepsia com a idade. Todavia, conforme destaca Assis (2020), é possível que diferentes países apresentem diferentes tendências devido a aspectos particulares sociais ou físicos.

Ainda de acordo com Leppik e Bimbaum (2010) e Kluber et al. (2023), o aumento no número de idosos e a sua propensão para desenvolver epilepsia, representarão um grupo cada vez maior de pacientes que necessitam de cuidados especializados relativos a esta doença. Tendo em vista que, conforme Bruscky (2016), a apresentação atípica dos sintomas resulta em um erro de diagnóstico de 25% no momento da avaliação clínica inicial. Dessa forma, compreender a fisiopatologia da doença é crucial para estabelecer um diagnóstico preciso e implementar o tratamento adequado.

        2.   MATERIAIS E MÉTODOS

Este estudo consiste em uma revisão da literatura, de caráter exploratório e descritivo, com o objetivo de compilar e analisar informações relevantes sobre o manejo terapêutico da epilepsia em idosos. Foram consultadas bases de dados em saúde, incluindo United States National Library of Medicine (PubMed) e Scientific Electronic Library Online (SciELO), e as diretrizes atuais do Ministério da Saúde brasileiro sobre o manejo da terapia da epilepsia em idosos.

Como critérios de inclusão, foram consideradas estudos que abordassem o manejo terapêutico da epilepsia em idosos, preferenciando-se trabalhos em formato do Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA), que garantem rigor metodológico e transparência, bem como diretrizes e recomendações atuais do Ministério da Saúde brasileiro. Nos idiomas inglês, português e espanhol, e disponibilizados de forma gratuita e na íntegra. Bem como, estudos que contivessem os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS/MeSH), “therapeutic management”, “elderly”, “anticonvulsant therapies”, “epilepsy”, utilizados de forma isolada ou de forma combinada através dos operadores booleanos OR e AND. Sendo excluídos estudos duplicados e que estivessem de acordo com a temática proposta.

Os estudos identificados foram inicialmente selecionados com base nos títulos e resumos e, em seguida, aqueles que atenderam aos critérios de inclusão foram analisados em texto completo. A seleção final considerou a relevância, qualidade metodológica e pertinência ao tema da pesquisa.

Os dados extraídos dos estudos selecionados foram organizados e analisados de forma descritiva, destacando os principais achados sobre o manejo terapêutico da epilepsia em idosos, incluindo opções de tratamento farmacológico, eficácia das intervenções, efeitos adversos e recomendações de manejo conforme as diretrizes consultadas.

Este estudo seguiu as diretrizes éticas para revisões bibliográficas, respeitando os direitos autorais e a integridade das fontes consultadas. As informações foram apresentadas de forma a garantir a precisão e a fidelidade aos dados originais.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 A Epilepsia nos Dias Atuais

A epilepsia é um distúrbio cerebral crônico provocado por descargas elétricas anormais, possuindo como característica principal a reincidência de crises convulsivas, podendo variar sua característica fisiopatológica de acordo com a área do cérebro afetada. O fenômeno epiléptico pode ser originado em um ponto dos hemisférios cerebrais (crises focais), ou ter origem em uma parte que abrange os dois hemisférios do cérebro (crises generalizadas). As crises focais iniciam em um foco com as descargas neuronais excessivas e podem partir para ambos os hemisférios, evoluindo para crises generalizadas (COSTA et al., 2020; PEREIRA et al., 2022).

Cerca de 65 milhões de pessoas em todo o mundo têm epilepsia. No Brasil, segundo estimativas do Ministério da Saúde, através do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), surgem pelo menos 150 mil novos casos ao ano. Nos países desenvolvidos, acomete crianças e idosos em maior proporção, mas 80% dos indivíduos com epilepsia vivem em países de renda média a baixa, isso pode ser explicado pela estrutura diferente das populações em risco e pela maior exposição a fatores de risco perinatais, taxas mais altas de infecções do Sistema Nervoso Central e traumatismo cranioencefálico nesses países (BEGHI, 2019; PEREIRA et al., 2022).

A manifestação dessa condição interfere na rotina do indivíduo, uma vez que há o comprometimento transitório da consciência e consequente possibilidade de lesões físicas, problemas sociais e psicológicos. O controle completo das crises é o principal objetivo da terapia farmacológica, no entanto, existe uma parcela de pacientes que não consegue controle total, em torno de 20% a 30%. Esses pacientes podem até apresentar um controle parcial, mas não obtêm remissão completa das crises, nestes casos a cirurgia é indicada quando avaliada a possibilidade (COSTA et al., 2020; PEREIRA et al., 2022).

Vários medicamentos já foram aprovados pela United States Food and Drug Administration (FDA) por possuírem eficácia na contenção das crises epilépticas, entretanto, muitos destes também apresentam reações adversas que podem prejudicar o paciente. Atualmente, apesar de ainda ser caro, existe o tratamento cirúrgico, o qual é apontado como seguro e eficaz, além de ser uma ótima opção para o controle das crises epilépticas, utilizada principalmente em caso de epilepsia refratária a medicamentos (PEREIRA et al., 2022).

A refratariedade não pode ser facilmente definida, as considerações mais aceitas apontam como epilepsia refratária quando não houver controle apropriado das crises com o uso de no mínimo duas ou três drogas antiepilépticas, estando na dose máxima tolerada pelo período de 18 a 24 meses, ou, se apresentar controle das crises epilépticas com efeito colateral inaceitável (COSTA et al., 2020).

O conhecimento sobre epilepsia e o reconhecimento das crises são essenciais para o profissional que destina o cuidado para pacientes epilépticos. Cuidados como administração de anticonvulsivantes, manter vias aéreas pérvias, lateralização da cabeça, administração de oxigênio se necessário, medidas de manutenção e prevenção de danos, são importantíssimos (COSTA et al., 2020).

3.2 Epilepsia em Idosos

A epilepsia é a terceira condição neurológica crônica mais comum no idoso, precedida pelas doenças cerebrovasculares e pelas doenças neurodegenerativas. As crises epilépticas são comuns na população de idosos e são frequentemente associadas a desordens neurológicas tais como as doenças cerebrovasculares, as doenças neurodegenerativas, aos tumores do sistema nervoso central (SNC) e aos transtornos metabólicos (CARPIO, HAUSER, 2009 apud ASSIS, 2020; NGUYEN et al., 2013; TANG et al., 2015 apud ASSIS, 2020).

A fisiopatologia da epilepsia em idosos é um processo complexo e, frequentemente, é influenciada por mudanças neurobiológicas e fisiológicas relacionadas ao envelhecimento. Embora muitos dos mecanismos fundamentais da epilepsia se apliquem a todas as faixas etárias, há características distintas que merecem destaque quando se trata da população idosa (HIYOSHI, YAGI, 2000 apud KLUBER et al., 2023).

Uma das principais causas subjacentes da epilepsia em idosos é a presença de condições cerebrovasculares, como AVCs ou isquemias transitórias. Esses eventos podem causar danos às células cerebrais e desencadear alterações na excitabilidade neuronal, tornando regiões do cérebro mais suscetíveis a atividade epiléptica descontrolada (KRÄMER, 2001 apud KLUBER el al., 2023).

Dessa forma, as doenças com alto potencial epileptogênico, como as doenças cerebrovasculares e as demências, somado aos efeitos do próprio envelhecimento, como mudanças estruturais no cérebro, perda neuronal, diminuição da densidade sináptica e alterações na conectividade neural, comprometem as redes neuronais e podem explicar a associação da epilepsia com a idade (BEGHI, GIUSSANI, 2018 apud ASSIS, 2020).

Outrossim, o processo de envelhecimento muitas vezes cursa com a presença de comorbidades e essa característica pode dificultar o diagnóstico e o tratamento da epilepsia, devido a possibilidade de ocorrer a interação de outras doenças com a epilepsia e associação com a resposta de medicamentos que estejam sendo utilizados pelo paciente (BRODIE et al., 2009 apud KLUBER et al., 2023).

A grande maioria dos idosos vivencia crises focais (60%), com as crises que afetam a consciência sendo as mais predominantes. Frequentemente, os idosos não manifestam os sintomas clássicos das crises focais que afetam a consciência, como uma aura antes da perda de consciência ou automatismos manuais ou orofaciais. Em vez disso, eles tendem a apresentar sonolência ou confusão mental, ao contrário do que ocorre com os indivíduos mais jovens. O período de sonolência após uma crise, chamado estado pós-ictal, também difere nos idosos, podendo se estender por vários dias (BRODIE et al., 2009 apud KLUBER et al.,2023).

Pacientes com crises agudas sintomáticas apresentam maior mortalidade e morbidade que pacientes sem crises, e maior mortalidade que pacientes com epilepsia, especialmente quando essas crises são secundárias a AVC, TCE ou infecção do SNC. Em pacientes idosos, tanto acompanhados em ambulatório como os que são atendidos em ambiente hospitalar, são comuns as crises agudas sintomáticas secundárias a transtornos metabólicos (HESDORFFER et al., 1998 apud ASSIS, 2020; VU et al., 2018 apud ASSIS, 2020).

O Estado de mal epiléptico (EME) é um evento neurológico comum no idoso, tem uma incidência cerca de duas a cinco vezes maior nessa população do que na população geral e essa incidência é ainda maior naqueles indivíduos acima dos 70 anos (DELORENZO et al., 1996; TOWNE, 2007; BEGHI et al., 1993 apud ASSIS, 2020).

A taxa de mortalidade nos idosos com epilepsia, em países desenvolvidos, é duas a três vezes maior que na população geral, particularmente naqueles indivíduos acima de 75 anos (FORSGREN et al., 2005 apud ASSIS, 2020).

A epilepsia é uma condição relevante entre os idosos, essa condição pode potencialmente comprometer a capacidade funcional e cognitiva, a qualidade de vida e aumentar os custos com a saúde, além de aumentar a demanda social (ASSIS, 2020). Embora o aumento do número de pessoas idosas com epilepsia seja um problema de saúde pública, a identificação dos mecanismos que levam a essa desordem é limitada, e o impacto dos desfechos das crises nessa população é subestimado (SPONG et al., 2028 apud ASSIS, 2020).

3.3 Diretrizes Acerca da Epilepsia

De acordo com Brasil (2023), o objetivo do tratamento da epilepsia é propiciar a melhor qualidade de vida possível para o paciente, pelo alcance de um adequado controle de crises, com um mínimo de efeitos adversos, buscando, idealmente, uma remissão total das crises.

A escolha adequada das drogas antiepilépticas (DAES) é baseada nas informações colhidas sobre o tipo de crise e ou síndrome epiléptica, idade, tolerabilidade, segurança e eficácia das DAES. Deve-se buscar uma DAES com um mecanismo de ação eficaz sobre os mecanismos de geração e propagação, específicos das crises do paciente, individualmente. Os principais mecanismos de ação dos fármacos antiepilépticos são: bloqueio dos canais de sódio, aumento da inibição GABAérgica, bloqueio dos canais de cálcio e ligação à proteína SV2A da vesícula sináptica (FRENCH, 2004 apud COSTA, 2020; ROGAWSKI, 2004; PERUCCA, 2005 apud BRASIL, 2023).

A decisão de iniciar um tratamento antiepiléptico baseia-se fundamentalmente em três critérios: risco de recorrência de crises, consequências da continuação das crises para o paciente e eficácia e efeitos adversos do fármaco escolhido para o tratamento (BRASIL, 2019).

Segundo Costa (2020) a primeira indicação de tratamento para a epilepsia em geral é o uso de monoterapia, se não apresentar resposta satisfatória, realizar mais duas tentativas de monoterapia seguida de combinação, se ainda sim persistir as crises e novas combinações falharem, avaliar intervenção cirúrgica. Nos casos em que é necessário utilizar politerapia, a chance é de aproximadamente 10% de eficácia no tratamento quando a monoterapia falhou (GARZON, 2002 apud COSTA, 2020).

O Ministério da Saúde possui um Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) com orientações sobre o diagnóstico, tratamento e monitorização da epilepsia. Para o tratamento da epilepsia, o PCDT preconiza os seguintes fármacos: carbamazepina, clobazam, etossuximida, fenitoína, fenobarbital, primidona, gabapentina, topiramato, lamotrigina, vigabatrina, os quais constam na lista de medicamentos disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS), na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME) de 2020, estes e outros fármacos como ácido valpróico e levetiracetam (BRASIL, 2020 apud COSTA, 2020).

Os fármacos antiepilépticos de 1ª (ditos tradicionais), 2ª (ditos recentes) e 3ª (ditos novos) linhas têm eficácia equivalente, porém o perfil de efeitos adversos e de interações medicamentosas é mais favorável aos fármacos antiepilépticos mais recentes. Por outro lado, por serem recentes, não se conhecem os eventuais efeitos adversos do uso destes fármacos por cerca de 20 a 30 anos (BRASIL, 2023).

Um ensaio aberto randomizado comparou carbamazepina, gabapentina, lamotrigina, oxcarbazepina e topiramato em epilepsias focais, bem como ácido valproico, lamotrigina e topiramato em epilepsias generalizadas e inclassificáveis. O estudo concluiu que a lamotrigina é mais efetiva do que a carbamazepina, gabapentina e topiramato como monoterapia de primeira linha para epilepsia focal, e o ácido valproico é mais efetivo (eficácia + tolerabilidade) do que o topiramato e mais eficaz do que a lamotrigina nas epilepsias generalizadas e inclassificáveis. Entretanto, a revisão sistemática da Cochrane conclui pela igualdade de eficácia (MATTSON, 1992; BRODIE, 1999 apud BRASIL, 2023).

As recomendações da ILAE (International League Against Epilepsy)), baseadas apenas em evidências de eficácia e efetividade para escolha de fármacos antiepilépticos, são as seguintes para epilepsia focal: adultos – carbamazepina, fenitoína e ácido valproico; crianças- carbamazepina e idosos- lamotrigina e gabapentina (GLAUSER, 2013 apud BRASIL, 2023).

3.4 Diagnóstico da Epilepsia em Idosos

Em comparação com pessoas de outras faixas etárias, os idosos que apresentam epilepsia possuem características distintas devido às alterações fisiológicas e neurológicas particulares do processo de envelhecimento e essas características distintas implicam significativamente no diagnóstico da doença (ASSIS, 2020).

Uma das características notáveis da epilepsia em idosos é a apresentação clínica atípica das crises. Com frequência, os sintomas convulsivos tradicionais podem não estar presentes e as crises podem se manifestar de forma mais sutil, como desorientação, confusão ou breves períodos de ausência. Essa atipicidade pode tornar o diagnóstico preciso mais desafiador, uma vez que as crises podem ser confundidas com outros distúrbios cognitivos relacionados à idade (KAUR, 2019 apud KLÜBER et al., 2023).

Sendo assim, é necessário que o diagnóstico seja feito em duas etapas: clínico e complementar. Assim, como afirma Leppik e Bimbaum (2010), em se tratando do diagnóstico clínico, se faz necessário iniciar a investigação pela anamnese, sendo esta a mais detalhada possível, trazendo informações sobre crises epilépticas anteriores e atuais, histórico médico pregresso, como histórico de AVCs, lesões traumáticas e doenças neurodegenerativas, assim como, os medicamentos que o paciente está fazendo uso, pois isso proporciona uma visão completa da saúde do paciente.

Além disso, é importante realizar um exame físico geral, com ênfase nas áreas neurológica e psiquiátrica. Muitas vezes, o auxílio de uma testemunha ocular é importante para que a crise seja descrita em detalhes. A ocorrência de uma aura (manifestação sensorial inicial de uma crise), bem como, fatores precipitantes da crise, deve ser registrada. Idade de início, frequência de ocorrência das crises, e intervalos entre as crises (o mais curto e o mais longo obtido na história do paciente) devem ser caracterizados, muitas vezes com o auxílio de um diário de crises. A história deve cobrir ainda a existência de eventos pré e perinatais, crises no período neonatal, crises febris, qualquer crise não provocada e história de epilepsia na família (BRASIL, 2019).

Sobre os exames complementares, os quais devem ser orientados pelos achados na história do paciente e pelo exame físico realizado, o principal exame é o eletroencefalograma (EEG), cujo papel é auxiliar o médico a estabelecer um diagnóstico acurado. O EEG é capaz de, quando alterado, identificar o tipo e a localização da atividade epileptiforme e orientar na classificação da síndrome epiléptica e na escolha das DAES (SIRVEN, 2015 apud BRASIL, 2019).

De acordo com Brasil (2019), outros exames de imagem, tais como tomografia computadorizada de crânio e ressonância magnética do encéfalo, devem ser solicitados na suspeita de causas estruturais, que podem estar presentes nos pacientes com epilepsia focal.

Ante o exposto, pode-se observar que, dadas as características peculiares da epilepsia que acomete as pessoas idosas, que diverge em certos aspectos daquela vista no restante da população adulta, o diagnóstico da patologia deve ser realizado através de uma gama de exames clínicos e complementares, que deve auxiliar o profissional da saúde na constatação da epilepsia, sobretudo nos casos em que sua sintomatologia se dá de maneira atípica.

3.5 Manejo da Epilepsia em Idosos

A adequada abordagem terapêutica da epilepsia em idosos está intrinsecamente relacionada ao conhecimento das particularidades da fisiopatologia da epilepsia nessa faixa etária, o que se torna complexo devido às alterações fisiológicas existentes pelo processo de envelhecimento em si. Assim, devido às características individuais dessa população, esse tratamento merece um destaque e atenção da comunidade médica, pois suas particularidades afetam diretamente à resposta às medicações, além da lentificação do metabolismo e facilidade de acúmulo da medicação no organismo, causando uma janela terapêutica mais estreita (KLÜBER et al., 2023; CARVALHO et al., 2022).

O tratamento deve objetivar o controle das convulsões, reduzir os efeitos colaterais das medicações e manter a qualidade de vida do paciente. Para a escolha da medicação antiepiléptica, vários pontos devem ser levados em consideração, como comorbidades existentes, tipo de crise e a possibilidade de interação medicamentosa, buscando sempre individualizar a escolha da medicação anticonvulsivante de cada idoso. Tão importante quanto a busca pela eficácia geral do tratamento está a tolerabilidade dos efeitos colaterais das drogas, os quais devem ser particularmente relevantes na faixa etária estudada, uma vez que esses pacientes são mais sensíveis a esses efeitos (KLÜBER et al., 2023; CARVALHO et al., 2022).

Os indutores enzimáticos clássicos (carbamazepina, fenitoína, fenobarbital) apresentam perfil farmacocinético mais desfavorável, devido ocasionarem diversas interações medicamentosas e estarem relacionados ao aumento de osteoporose, sendo indicado evitar o uso desses fármacos. O uso de Lamotrigina e Gabapentina foram consideradas mais eficazes no tratamento de epilepsia focal em idosos do que a Carbamazepina. No entanto, não existe uma única medicação ideal para todos os pacientes, sendo fundamental o acompanhamento médico regular minucioso, a fim de evitar ou reduzir complicações possíveis (KLÜBER et al, 2023; BRASIL, 2019).

A monoterapia deve ser preferível, associada sempre a informação e orientação da família do paciente sobre o caso, facilitando a adesão ao tratamento, redução do custo terapêutico, assim como, reduzindo as chances de efeitos adversos e interações medicamentosas. As crises epilépticas em pacientes acima dos 60 anos de idade referem uma boa resposta terapêutica à monoterapia. Assim como, diversos trabalhos orientam o uso de medicação antiepiléptica após a primeira crise por tempo indeterminado no idoso, devido ao alto risco de recorrência das crises, podendo ter até 90% de recorrência caso haja a suspensão da medicação (BRUSCKY et al., 2016).

Para epilepsias refratárias ao tratamento medicamentoso convencional, pode-se avaliar a possibilidade de cirurgia de epilepsia ou a estimulação do nervo vago para esses pacientes. Diante disso, para um melhor controle da epilepsia em idosos deve-se buscar uma individualização do tratamento e vigilância médica regular, além de fazer uso de monoterapia, buscando um escalonamento de dose lentificado e doses máximas menores que as usuais (KLÜBER et al., 2023; BRASIL, 2019).

Outro aspecto importante a ser considerado é a educação e o suporte aos cuidadores e familiares dos pacientes idosos com epilepsia. Eles desempenham um papel crucial no manejo diário da condição, ajudando na administração dos medicamentos, na observação e relato de crises, e no apoio emocional ao paciente. Programas educativos podem melhorar significativamente a qualidade de vida dos pacientes e reduzir a carga sobre os sistemas de saúde.

3.6 Perspectiva Futura dos Tratamentos

A epilepsia traz uma responsabilidade quando o assunto é determinar a qualidade de vida dos pacientes que têm esse diagnóstico, principalmente aqueles que por muitas vezes não tem uma resposta significativa aos tratamentos convencionais que lhe são propostos. Entender essa patologia de forma integral, como sua etiologia e a sua fisiopatologia é importante, especialmente nos idosos que precisam de uma atenção maior, já que muitos são debilitados e precisam de um olhar mais fidedigno para conseguirem identificar novos propósitos terapêuticos mais eficazes, que tenham menos efeitos colaterais e menos repercussão nas comorbidades associadas à doença (LEVADA et al., 2023).

As pesquisas para que se alcance novas abordagens terapêuticas na epilepsia, é um assunto que muito se discute e é levado a sério na farmacologia, principalmente, em pacientes que se mantêm tendo convulsões ainda que utilizem um tratamento otimizado com DAEs. Existem estudos que mostram resultados positivos com a possibilidade de rever os horários de administração das DAEs, onde observou-se uma diminuição importante na duração das convulsões e significativa queda dos efeitos adversos (GHOSH et al., 2023).

Ademais, foram vistos o uso favorável de melatonina, terapia hormonal para a epilepsia catamenial e instrumentos que preveem a convulsão que estão sendo analisados. Porém, é necessário que possa haver mais estudos clínicos para comprovar o êxito e a segurança dessas intervenções e identificar os pacientes que são favorecidos com os mesmos (LEVADA et al., 2023).

Diante disso, dois novos fármacos que estão entre as mais recentes inclusões na lista de anticonvulsivantes, foram implementados recentemente na indústria farmacêutica, que é o Cenobamato, que age no sistema GABA e tem ação positiva para a epilepsia focal refratária. Por outro lado, a Ganaxolona age através da modulação alostérica dos receptores GABA (PERUCCA et al., 2023).

Nos últimos tempos, os progressos na terapêutica da epilepsia pareceram ser bem eficazes, englobando desde a neuroestimulação e neuromodulação que respondem ao tratamento, até a análise do CBD como medicamento anticonvulsivante, e as terapias genéticas e optogenéticas. Permanecer informado é fundamental, visto que atualizações são feitas constantemente, e contribuem na esperança de que esses pacientes que têm resistência ao medicamento possam ter tratamentos mais direcionados e com maior eficácia (PERUCCA et al., 2023).

As pesquisas futuras irão determinar a diminuição das terapias já existentes, investigar terapias combinadas e empregar a inteligência artificial com finalidade de aperfeiçoar a gestão da epilepsia. A finalidade desses tratamentos será sempre a fim de viabilizar um melhor domínio das crises e proporcionar uma qualidade de vida para esses pacientes (GHOSH et al., 2023).

        4.   CONSIDERAÇÕES FINAIS

A epilepsia em idosos é um distúrbio neurológico complexo que exige uma abordagem terapêutica cuidadosa e individualizada devido às particularidades fisiológicas e neurológicas associadas ao envelhecimento. Diante dessa perspectiva, este trabalho revisou a literatura disponível sobre o manejo terapêutico da epilepsia em idosos, destacando a necessidade de estratégias específicas para essa faixa etária.

A revisão evidenciou que, apesar dos avanços no tratamento da epilepsia, ainda há uma necessidade significativa de mais pesquisas para otimizar as terapias existentes e desenvolver novas abordagens. Terapias emergentes, como o uso de novos fármacos e a cronofarmacologia, mostram-se promissoras, mas requerem estudos adicionais para confirmar sua eficácia e segurança. Tecnologias inovadoras, como a inteligência artificial e as terapias genéticas, também estão sendo exploradas e têm o potencial de transformar o manejo da epilepsia. A neuroestimulação e a neuromodulação são áreas promissoras que estão sendo intensamente estudadas para proporcionar alternativas aos pacientes que não respondem aos tratamentos convencionais.

A integração de cuidados multidisciplinares é crucial para abordar de maneira eficaz os múltiplos aspectos do manejo da epilepsia em idosos. A personalização do tratamento, combinada com um suporte adequado e contínuo, é essencial para garantir que os idosos possam viver com dignidade e qualidade de vida, apesar dos desafios impostos pela epilepsia. Por fim, é necessário um esforço conjunto entre pesquisadores, profissionais de saúde e formuladores de políticas para promover o desenvolvimento de estratégias terapêuticas inovadoras e acessíveis, garantindo que todos os pacientes recebam o melhor cuidado possível.

REFERÊNCIAS

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¹ Discente do Curso de Medicina do Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ);

² Médico pelo Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ);

³ Neurologista e Docente do Curso de Medicina do Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ).