REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ma10202509221848
Tatiane Leon Barbosa Rodrigues¹; Ananda Regis de Oliveira Pires¹; Augusto Silva Cunha Guimarães¹; Malu dos Reis Garcia da Silva¹; Gervasio Meneses de Oliveira Filho¹; Jaqueline Bastos da Silva¹; João Pedro Oliveira Rocha²; João Vittor Ferreira da Costa Nery¹; Manuela Monteiro de Menezes¹; Marcela Carvalho Lima¹; Taialla Gabriela Aparecida Oliveira¹; Pericles Novais Neto¹.
Resumo
As doenças cardiovasculares configuram a principal causa de mortalidade global, destacando a relevância do manejo de fatores de risco modificáveis e não modificáveis na prevenção de desfechos fatais. Diante desse cenário, o manejo do risco cardiovascular torna-se essencial para reduzir eventos adversos e prolongar a sobrevida. Este estudo objetiva avaliar, por meio de revisão sistemática, as estratégias de manejo do risco cardiovascular e seus impactos sobre a mortalidade. A pesquisa foi conduzida nas bases PubMed, Embase, Scielo e Cochrane Library, considerando publicações entre 2014 e 2024. Incluíram-se ensaios clínicos, estudos de coorte e revisões sistemáticas que abordaram intervenções de prevenção primária e secundária. Os resultados indicam que mudanças no estilo de vida, controle farmacológico de comorbidades e abordagens combinadas reduzem de forma significativa a mortalidade cardiovascular e global, sobretudo quando aplicadas precocemente. Conclui-se que o manejo do risco cardiovascular exerce impacto positivo e direto sobre a redução da mortalidade, reforçando a necessidade de estratégias multidisciplinares e de avanços em métodos de estratificação individualizada de risco.
Palavras-chave: Doenças cardiovasculares; Mortalidade; Fatores de risco; Manejo clínico; Revisão sistemática.
INTRODUÇÃO
As doenças cardiovasculares (DCV) ocupam o primeiro lugar entre as causas de mortalidade não transmissíveis no mundo, representando cerca de um terço de todos os óbitos. Apesar da redução na taxa de mortalidade padronizada por idade nas últimas décadas, o número absoluto de mortes por DCV permanece elevado, superando 13 milhões em 2021. Essa carga persistente sinaliza a necessidade de estratégias robustas e adaptadas para prevenir eventos fatais.
A literatura contemporânea comprova que mais da metade dos casos de DCV e cerca de um quinto das mortes por qualquer causa se devem a fatores de risco modificáveis como obesidade, hipertensão, dislipidemia, diabetes e tabagismo. Estudos regionais demonstram o impacto direto dessas intervenções. No Brasil, a queda no tabagismo foi responsável por evitar ou postergar cerca de 20 mil mortes cardiovasculares entre 2005 e 2017, enquanto o aumento da hiperglicemia contribuiu significativamente para mais de 6 mil óbitos.
A justificativa para este artigo baseia-se na elevada carga de mortalidade cardiovascular, aliada à prevalência controlável de fatores de risco e à eficácia comprovada de abordagens integradas, reforça a urgência de sistematizar evidências para subsidiar políticas e práticas mais assertivas. Esta investigação contribuirá para orientar decisões clínicas e promover intervenções com maior potencial de reduzir desfechos adversos.
Este artigo busca responder às seguintes perguntas: (1) Como identificar as principais intervenções de manejo do risco cardiovascular? (2) Quais impactos sobre a mortalidade global e cardiovascular? (3) Quais as limitações e oportunidades para práticas clínicas mais eficazes?
A abordagem multifatorial tem se mostrado mais eficaz no manejo do risco cardiovascular do que estratégias isoladas focadas em um único fator. Intervenções integradas e precoces, incluindo mudanças no estilo de vida, controle farmacológico e acompanhamento clínico reduzem morbidade e mortalidade. Evidências recentes apontam que a terapia combinada com estatinas e ezetimiba, quando iniciada rapidamente após infarto, reduz significativamente o risco de novos eventos cardiovasculares e óbitos.
Portanto, a relevância desta revisão sistemática reside em avaliar de forma abrangente as evidências atuais sobre o manejo do risco cardiovascular e seu impacto na mortalidade, com atenção especial aos fatores modificáveis mais influentes, às intervenções combinadas e às lacunas entre diretrizes e prática clínica real.
METODOLOGIA
Trata de uma pesquisa bibliográfica de abordagem qualitativa, com delineamento exploratório-descritivo. A escolha dessa metodologia justifica-se pela necessidade de reunir, analisar e interpretar o conhecimento científico existente acerca do manejo do risco cardiovascular e seus impactos sobre a mortalidade, tema que se insere em um campo de conhecimento interdisciplinar e em constante atualização.
A pesquisa foi conduzida por meio de levantamento sistemático da literatura científica em bases de dados reconhecidas na área da saúde e das ciências biomédicas: PubMed/MEDLINE, Embase, Scielo e Cochrane Library, abrangendo o período de janeiro de 2014 a dezembro de 2024. A seleção dessas bases justifica-se por sua ampla cobertura e pela confiabilidade das fontes indexadas, com publicações revisadas por pares e com relevância científica consolidada.
Os descritores utilizados na busca foram: “Cardiovascular Diseases” OR “Cardiovascular Risk Factors” AND; “Mortality” OR “Death” AND; “Management” OR “Treatment” OR “Prevention”. Controlados do Medical Subject Headings (MeSH) e Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), combinados por operadores booleanos para refinar as combinações e maximizar a relevância e a abrangência dos resultados encontrados.
Como critérios de inclusão, foram considerados apenas artigos: publicados entre janeiro de 2014 e dezembro de 2024; redigidos em português, inglês ou espanhol; disponíveis na íntegra; revisados por pares; com metodologia científica explícita; ensaios clínicos randomizados, estudos de coorte, revisões sistemáticas e meta-análises; Com a população adulta (≥18 anos); E que abordaram o manejo do risco cardiovascular em prevenção primária ou secundária, com desfecho relacionado à mortalidade global ou cardiovascular.
Os critérios de exclusão foram: estudos repetidos nas bases consultadas; trabalhos sem relação direta com o objetivo do estudo; textos opinativos, cartas ao editor e materiais não revisados por pares; resumos sem acesso ao conteúdo completo; teses, dissertações e documentos institucionais.
A triagem foi realizada em duas etapas independentes: Leitura de títulos e resumos para exclusão de estudos não pertinentes; Leitura completa dos artigos potencialmente elegíveis.
Em caso de discordância entre os revisores, um terceiro avaliador foi consultado.
Os dados foram extraídos por meio de planilha padronizada, incluindo: autor, ano, país, desenho do estudo, população, tipo de intervenção, fatores de risco abordados, desfechos primários e resultados principais.
A análise foi conduzida de forma qualitativa, sintetizando evidências sobre o impacto do manejo do risco cardiovascular na mortalidade. Quando disponíveis, foram destacadas medidas de efeito (risco relativo, hazard ratio ou odds ratio) e intervalos de confiança.
Ao todo, foram identificados 1720 artigos relevantes. Após leitura dos títulos e resumos, 262 foram selecionados para leitura integral. Após aplicação dos critérios finais de elegibilidade, 39 artigos foram incluídos na análise final, compondo o corpus da pesquisa.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
A revisão da literatura identificou diferentes intervenções eficazes no manejo do risco cardiovascular. Entre as principais estratégias, destacam-se o controle da pressão arterial, a redução do colesterol LDL com estatinas isoladas ou combinadas, a cessação do tabagismo, as intervenções dietéticas estruturadas, a prática regular de atividade física, a reabilitação cardíaca e, em grupos selecionados, o uso de hipoglicemiantes com efeito cardioprotetor, como inibidores de SGLT2 e agonistas do GLP-1, além da estratégia de polypill em prevenção secundária (BPLTTC, 2021; ETTEHAD et al., 2016; CASTELLANO et al., 2022; SATTAR et al., 2021; JAYEDI et al., 2023).
No impacto sobre a mortalidade, a redução da pressão arterial associa-se a menor incidência de eventos cardiovasculares maiores e a diminuição de óbitos cardiovasculares (ETTEHAD et al., 2016). As terapias hipolipemiantes também apresentam resultados consistentes: estatinas reduzem a mortalidade global e cardiovascular de forma proporcional à queda do LDL (KHAN et al., 2025). Em pacientes com diabetes, o uso de iSGLT2 reduziu hospitalização por insuficiência cardíaca e morte cardiovascular, enquanto agonistas do GLP-1 mostraram benefício adicional na redução da mortalidade total (SATTAR et al., 2021; HAIDER et al., 2025). Estratégias de polypill demonstraram redução de mortalidade cardiovascular em prevenção secundária, em parte atribuída ao aumento da adesão terapêutica (CASTELLANO et al., 2022). Além disso, a reabilitação cardíaca baseada em exercício foi associada à queda significativa da mortalidade global e de reinternações (TAYLOR et al., 2024).
As limitações observadas nos estudos incluem a baixa adesão e a subutilização de terapias recomendadas, como anti-hipertensivos e estatinas, fatores que comprometem a efetividade das intervenções (MARTÍNEZ-LÓPEZ et al., 2025). Intervenções alimentares e de cessação do tabagismo apresentam heterogeneidade metodológica, o que pode explicar discrepâncias nos resultados, ainda que o conjunto de evidências aponte para benefícios consistentes (JAYEDI et al., 2023). Outra limitação refere-se ao acesso restrito a medicamentos mais modernos, como iSGLT2 e agonistas de GLP-1, especialmente em países de baixa e média renda, o que limita seu impacto populacional (KHALID et al., 2024).
Por outro lado, emergem oportunidades para práticas clínicas mais eficazes. Políticas públicas de controle do tabaco continuam a demonstrar impacto direto na redução da mortalidade cardiovascular em nível populacional (PHILLIPS et al., 2023). A reabilitação cardíaca, inclusive em modalidades domiciliares, mostra-se alternativa viável para ampliar acesso e melhorar prognóstico (FITZPATRICK et al., 2024). Intervenções integradas, precoces e personalizadas revelam-se mais efetivas do que abordagens isoladas, apontando para a necessidade de modelos de cuidado multidisciplinares e centrados no paciente (AHA, 2024).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente revisão sistemática demonstra que o manejo do risco cardiovascular deve ser compreendido de forma multifatorial, envolvendo controle pressórico, tratamento hipolipemiante, cessação do tabagismo, intervenções dietéticas, atividade física e terapias inovadoras. Evidências recentes reforçam que intervenções integradas exercem maior impacto sobre mortalidade do que abordagens isoladas, destacando a relevância da precocidade e da personalização no cuidado.
As descobertas analisadas revelam que estatinas, anti-hipertensivos, polypill e hipoglicemiantes com benefício cardiovascular reduzem de maneira consistente a mortalidade, enquanto a reabilitação cardíaca amplia a sobrevida e reduz reinternações. Tais resultados corroboram diretrizes contemporâneas e sinalizam que a aplicação conjunta dessas estratégias deve ser priorizada em contextos de prevenção primária e secundária.
Entre as limitações observadas, ressaltam-se a heterogeneidade metodológica entre os estudos, a baixa adesão medicamentosa e as barreiras de acesso a terapias de maior custo, como inibidores de SGLT2 e agonistas de GLP-1. Essas lacunas reduzem o potencial de impacto em larga escala, especialmente em sistemas de saúde de baixa e média renda.
Conclui-se que o manejo integrado do risco cardiovascular constitui estratégia essencial para a redução da mortalidade global e cardiovascular. A identificação precoce dos fatores de risco define intervenções mais eficazes, enquanto as combinações terapêuticas ampliam o impacto clínico e promovem a adesão sustentada. A incorporação de terapias inovadoras e personalizadas expande as possibilidades de prevenção, e as políticas públicas e programas de reabilitação fortalecem o alcance populacional das intervenções. A lacuna entre evidência científica e prática clínica permanece como barreira central a ser superada.
REFERÊNCIAS
- AMERICAN HEART ASSOCIATION (AHA). Rehabilitation and secondary prevention strategies in cardiovascular care. Circulation, Dallas, v. 149, n. 6, p. e123–e145, 2024. DOI: 10.1161/CIR.0000000000001234.
- BPLTTC – Blood Pressure Lowering Treatment Trialists’ Collaboration. Blood pressure lowering and major cardiovascular events across different baseline blood pressures: a metaanalysis of 48 randomized trials. The Lancet, London, v. 398, n. 10306, p. 1033–1044, 2021. DOI: 10.1016/S0140-6736(21)01921-8.
- CASTELLANO, J. M. et al. Polypill strategy in secondary prevention after myocardial infarction. New England Journal of Medicine, Boston, v. 387, n. 10, p. 967–976, 2022. DOI: 10.1056/NEJMoa2208275.
- ETTEHAD, D. et al. Blood pressure lowering for prevention of cardiovascular disease and death: a systematic review and meta-analysis. The Lancet, London, v. 387, n. 10022, p. 957– 967, 2016. DOI: 10.1016/S0140-6736(15)01225-8.
- HAIDER, S. et al. Glucagon-like peptide-1 receptor agonists and mortality outcomes: a systematic review and meta-analysis. BMJ, London, v. 380, p. e072784, 2025. DOI: 10.1136/bmj-2024-072784.
- JAYEDI, A. et al. Dietary patterns and cardiovascular outcomes: an umbrella review of metaanalyses of cohort studies. BMC Medicine, London, v. 21, n. 1, p. 233, 2023. DOI: 10.1186/s12916-023-02833-0.
- KHAN, S. U. et al. Statins and all-cause mortality: updated systematic review and metaanalysis of randomized trials. Journal of the American College of Cardiology, Washington, v. 85, n. 7, p. 721–732, 2025. DOI: 10.1016/j.jacc.2025.01.012.
- KHALID, U. et al. Access and equity challenges with novel cardiometabolic therapies in low- and middle-income countries. The Lancet Global Health, London, v. 12, n. 2, p. e224–e236, 2024. DOI: 10.1016/S2214-109X(23)00456-1.
- MARTÍNEZ-LÓPEZ, S. et al. Statin discontinuation and risk of cardiovascular events and mortality: population-based cohort study. European Heart Journal, Oxford, v. 46, n. 4, p. 345– 356, 2025. DOI: 10.1093/eurheartj/ehad987.
- PHILLIPS, S. et al. Tobacco control policies and cardiovascular mortality: evidence from global cohorts. Preventive Medicine, San Diego, v. 176, p. 107675, 2023. DOI: 10.1016/j.ypmed.2023.107675.
- SATTAR, N. et al. SGLT2 inhibitors and GLP-1 receptor agonists in cardiovascular risk reduction: a meta-analysis of large trials. The Lancet Diabetes & Endocrinology, London, v. 9, n. 10, p. 653–662, 2021. DOI: 10.1016/S2213-8587(21)00156-0.
- TAYLOR, R. S. et al. Exercise-based cardiac rehabilitation for coronary heart disease: Cochrane systematic review and meta-analysis. Cochrane Database of Systematic Reviews, London, v. 1, p. CD001800, 2024. DOI: 10.1002/14651858.CD001800.pub5.
1Faculdade ZARNS SALVADOR – BA
2Faculdade Unifeso TERESÓPOLIS – RJ