REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202410201748
Beatriz Ferreira dos Santos1
Helen Catarina Lemoine2
Luana Gomes Silva3
Luiza Vieira Carvalho4
Marina Marino5
Silvio Luis Pereira de Souza6
RESUMO
A infecção pelo herpes-vírus felino tipo 1 (FHV-1) é uma das principais doenças respiratórias em gatos, sendo frequentemente associada a outros patógenos. O vírus, que possui DNA de fita dupla e é sensível a desinfetantes e condições adversas, prolifera em ambientes de alta densidade populacional, como abrigos, onde o estresse compromete a imunidade dos felinos. Sua transmissão ocorre principalmente por contato com secreções de gatos infectados, levando à inflamação e necrose celular. Os sintomas clínicos variam conforme a carga viral, via de exposição e estado imunológico do gato. Após uma incubação de 2 a 6 dias, surgem sinais como depressão, espirros, febre e perda de apetite, seguidos de corrimento nasal e ocular, que pode evoluir para infecção bacteriana secundária. Nos casos graves, especialmente em gatos jovens ou debilitados, pode ocorrer pneumonia viral. O diagnóstico do complexo respiratório felino (CRF) envolve exames clínicos e laboratoriais, como PCR e radiografias, sendo a triagem de novos gatos fundamental para o controle da infecção. O manejo clínico foca na redução de estresse, hidratação, nebulização e suporte nutricional. O tratamento inclui antivirais para reduzir a replicação viral, além de antibióticos para infecções secundárias. A vacinação com vírus vivo atenuado, iniciada às nove semanas de vida, é crucial, embora não garanta proteção total. Medidas como quarentena, isolamento e desinfecção são essenciais para controlar a propagação do FHV-1. A colaboração entre abrigos, veterinários e organizações de proteção animal é vital para implementar medidas eficazes e garantir o bem-estar dos gatos, reconhecendo a importância da detecção precoce e do manejo adequado.
Palavras-chave: Herpes-vírus felino tipo 1, Complexo Respiratório Felino, Manejo do Herpes-vírus felino tipo 1.
ABSTRACT
Infection by feline herpesvirus type 1 (FHV-1) is one of the main respiratory diseases in cats, often associated with other pathogens. The virus, which has double-stranded DNA and is sensitive to disinfectants and adverse conditions, proliferates in high-density environments, such as shelters, where stress compromises the immunity of the felines. Transmission mainly occurs through contact with secretions from infected cats, leading to inflammation and cellular necrosis. Clinical symptoms vary depending on the viral load, route of exposure, and the cat’s immune status. After an incubation period of 2 to 6 days, symptoms such as depression, sneezing, fever, and loss of appetite appear, followed by nasal and ocular discharge, which may progress to secondary bacterial infection. In severe cases, especially in young or debilitated cats, viral pneumonia may occur. Diagnosis of the feline respiratory complex (FRC) involves clinical and laboratory tests, such as PCR and X-rays, and screening of new cats is fundamental for controlling the infection. Clinical management focuses on stress reduction, hydration, nebulization, and nutritional support. Treatment includes antivirals to reduce viral replication, as well as antibiotics for secondary infections. Vaccination with live attenuated virus, starting at nine weeks of age, is crucial, although it does not provide full protection. Measures such as quarantine, isolation, and disinfection are essential to control the spread of FHV-1. Collaboration between shelters, veterinarians, and animal protection organizations is vital for implementing effective measures and ensuring the welfare of cats, recognizing the importance of early detection and proper management.
Keywords: Feline herpesvirus type 1, Feline Respiratory Complex, Feline herpesvirus type 1 management.
INTRODUÇÃO
A infecção pelo herpes-vírus felino tipo 1 (FHV-1) é uma das mais comuns das doenças do trato respiratório superior em gatos. Está correlacionada com outros patógenos que são responsáveis por desenvolver o complexo respiratório felino, pode-se citar a calicivirose felina tipo 1 (FCV-1), Bordetella bronchiseptica, Mycoplasma sp, Moraxela sp, Chlamydophila felis, Staphylococcus sp., Escherichia coli e Pasteurella sp. O FHV-1 apresenta DNA de dupla fita e envelope lipoproteico e glicoproteico, o qual confere maior fragilidade em relação ao meio externo, como ao calor, desinfetantes, antissépticos e detergentes comuns. Inclusive pode ser inativada a temperatura ambiente por 24 horas, ou em 18 horas com a presença de matéria orgânica e umidade. (JERICÓ et al., 2023)
Os abrigos e gatis são os locais em que o FHV-1 tem maior capacidade de proliferação, devido à falha de gerenciamento e de manejo ambiental. Os felinos domésticos apresentam comportamento predatório, territorialista e solitários, portanto, costumam rejeitar ambientes com alta densidade populacional e, com isso, acarretar estresse e diminuição da capacidade do sistema imunológico (FERRAZ et al., 2020).
O desenvolvimento de um protocolo de manejo da proliferação de FHV-1 em ambientes de abrigo precisa ter como base três metas fundamentais de um programa de medicina preventiva: medidas de prevenção ambiental, cuidados com o hospedeiro para aumentar a sua capacidade imunológica e entendimento da virulência do agente. Essas medidas são mais eficazes em longo prazo para o bem-estar felino, como também em questão de custo-benefício, ao diminuir os gastos em tratamentos mais caros pela progressão da doença (LOPES, 2013).
OBJETIVOS
Este estudo visa avaliar a eficácia das medidas de controle de infecção implementadas em abrigos para gatos na redução da prevalência e gravidade das infecções por FHV-1 em abrigos para gatos.
A partir dessa revisão de literatura, um dos principais focos de discussão é a implementação de estratégias eficazes de prevenção para reduzir a incidência e a propagação do FHV-1 entre os gatos residentes no abrigo.
MÉTODOS
Foram realizadas pesquisas sistemáticas com base em revisão literária, utilizando dados científicos para pesquisas acadêmicas com as seguintes palavras-chaves: Complexo respiratório felino, medicina de abrigo, herpes-vírus felino.
DESENVOLVIMENTO
AGENTE ETIOLÓGICO
Composto por DNA de fita dupla e envelope glicoproteico-lipídico, o herpesvírus felino tipo 1 (FHV-1) pertence a ordem Herpesvirales, família Herpesviridae, subfamília Alphaherpesvirinae e espécie Felid alphaherpesvirus 1, esse patógeno é comumente encontrado em doenças de trato respiratório superior e ocular de gatos domésticos e outros membros da família felidae (ROCHA, 2021).
O patógeno pode ser observado 24 horas após a infecção através do esfregaço orofaríngeo (ROCHA, 2021). Pode acometer animais entre 4 meses e 16 anos sem predileção sexual, entretanto animais portadores de doenças imunossupressoras, como, por exemplo o vírus da imunodeficiência felina (FIV), podem se tornar mais suscetíveis (SPENCER & MARQUEL, 1993).
Possui rápida disseminação e ciclo replicativo principalmente em septo nasal, cornetos, nasofaringe, amígdalas, conjuntiva, mandíbula, gânglios linfáticos, tranqueia superior e até mesmo nos neurônios (GASKELL et al., 2007).
Teoricamente o vírus segue os nervos sensoriais na intenção de alcançar os neurônios, tendo os gânglios trigêmeos prioritariamente propensos a abrigar o vírus. Ainda que os gatos se recuperem em 2 a 3 semanas, grande parte mantém-se infectado por toda a vida e pode ocorrer reativação viral de tempos em tempos com agravamento durante períodos de estresse ou imunossupressão (PEDERSEN, 2004). Quando não ocorre recrudescência, alguns gatos podem desenvolver patologia ocular crônica, incluindo úlceras de córnea e ceratite estromal.
Por possuir envelope glicoproteico-lipídico é rapidamente eliminado do ambiente externo, devido à alta susceptibilidade aos efeitos desinfetantes, podendo persistir até 18 horas em ambiente úmido. Os animais infectados sintomáticos e assintomáticos são uma das principais fontes de infecção (GASKELL et al., 2007).
TRANSMISSÃO
A transmissão ocorre através do contato direto com secreções oral, ocular e nasal de gatos infectados, além de disseminação por gotículas de aerossóis de 1-2m e fômites (BURIOL, 2019). Em gatis e ONGs, a transmissão também pode ocorrer de forma indireta através de contaminação do alojamento, alimentação, fômites e pessoal (GASKELL et al., 2007). Felinos acometidos depois de recuperados tornam-se portadores latentes, com períodos esporádicos de reativação viral, sendo possivelmente à razão pela qual o vírus se dissemina tão facilmente, mesmo com a vacinação (FRANCO & ROEHE, 2017; MAGGS, 2005; QUINN, 2005; THIRY, 2009). Comumente essa reativação pode ocorrer espontaneamente ou após situações estressantes como nos casos de transferência de alojamento, parto, lactação e introdução de novos animais (GASKELL et al., 2007).
Fêmeas com infecções latentes podem transmitir o HVF-1 para suas crias, por via transplacentária ou na fase de lactação, onde a mãe pode infectar seus filhotes à medida que fazem a higiene, isto se deve ao fato que o parto e a fase de lactação são considerados fatores indutores de grande estresse, ocasionando uma reativação viral devido à queda da imunidade (SOUSA & CALIXTO, 2003). Enquanto os filhotes tiverem anticorpos materno, eles estarão protegidos da doença, porém desenvolvem infecção subclínica, levando ao estado de latência em que, ao ocorrer uma queda no número desses anticorpos haverá manifestação da doença clínica (GASKELL & POVEY, 1997).
PATOGENIA
O vírus é eliminado através das secreções lacrimais, nasais e saliva pelos animais doentes (BEER, 1999). O agente penetra por via oral, conjuntiva e nasal, causando infecção primária no epitélio nasal e consequentemente pode se disseminar para o saco conjuntival, faringe, traqueia, brônquio e bronquíolos. As características das lesões são inflamação, infiltração neutrofílica e necrose multifocal do epitélio (BINNS et al., 2000).
A replicação viral levará a citólise devido a dano celular agudo (GOULD, 2011), e também a lesões necrozantes (GASKEL, 2007), promovendo erosões na superfície do epitélio e inflamação (STILES, 2003). O agente poderá se replicar tanto nas células epiteliais da conjuntiva, como também nos neurônios. Quando há infecção neural o vírus pode estabelecer um longo estado de latência após a infecção primária (GASKELL et al., 2007).
Devido os anticorpos maternos diminuir em torno da oitava semana de vida a infecção primária ocorre em filhotes e jovens. Embora os gatos jovens sejam frequentemente infectados, o vírus pode causar problemas por toda vida do animal, devido a latência e a reativação da infecção (HUBNER et al., 2005). Até mesmo os animais vacinados estão suscetíveis porque as vacinas de FHV-1, tanto parenterais como intranasais conferem imunidade parcial contra os possíveis sinais clínicos e proteção nenhuma contra reativação e eliminação viral (STILLES, 2007).
O vírus pode ser reativado devido á excreção viral, que pode ocorrer devido à queda de imunidade, administração sistêmica de corticoides, coinfecções com outros agentes, cirurgias e lactação (STILLES, 2003). Os sinais clínicos da reativação viral podem ser similares ao da infecção primária, porém, geralmente são menos graves (GOULD, 2011). No geral os animais que foram expostos a uma infecção primária, irão se tornar portadores assintomáticos para o resto da vida (BINNS et al, 2000).
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
A severidade dos sinais clínicos varia conforme a via de exposição, a presença de infecções concomitantes, faixa etária, carga viral e o estado imunológico do hospedeiro, incluindo seu histórico de vacinação (RADFORD et al., 2009). Depois de um período de incubação de dois a seis dias, os sinais clínicos iniciais incluem depressão, espirros, perda de apetite e febre.
Em seguida, aparece corrimento nasal e ocular seroso, indicando rinite e conjuntivite. (BINNS et al., 2000; SOUZA; CALIXTO, 2003; STILES, 2003). Subsequentemente, devido a uma infecção bacteriana secundária, o corrimento oculonasal torna-se purulento, e pode ocorrer o acúmulo de exsudato seco ao redor das narinas e pálpebras. (GLAZE, 2002). Nos casos mais graves, aparecem tosse e dificuldade respiratória. Em alguns casos, animais muito jovens ou debilitados podem desenvolver pneumonia viral. A ulceração da cavidade oral é pouco comum (LOW et al., 2007; NELSON; COUTO, 2006). Em certos casos, a infecção aguda pode causar danos permanentes à mucosa e aos turbinados, resultando em formas crônicas de rinite bacteriana, osteomielite dos turbinados, sinusite e conjuntivite. As raças braquicefálicas têm uma predisposição maior a essas complicações. (GASKELL et al., 2007; SOUZA; CALIXTO, 2003).
A infecções durante a gestação podem levar a problemas reprodutivos, como reabsorção fetal e aborto. Embora os abortos possam aparecer como sinais clínicos secundários, ao contrário de outros tipos de herpes-vírus, eles não resultam diretamente da replicação viral. Quando a infecção latente é reativada em animais adultos, alguns apresentam sinais clínicos, sendo a ceratoconjuntivite a mais comum. Durante essa fase, sintomas respiratórios são menos comuns (HERRERA, 2008; THIRY et al., 2009). É importante destacar que os animais cronicamente ou recorrentemente afetados pelo HVF-1 representam, na verdade, uma pequena minoria dentro da população infectada. Esses indivíduos provavelmente apresentam respostas imunológicas reduzidas na presença do vírus (MAGGS, 2005).
O HVF-1 é um agente patogênico ocular significativo, podendo causar doenças na córnea, na conjuntiva ou em ambas as estruturas (ANDREW, 2001; BINNS et al., 2000). As manifestações oculares mais frequentemente observadas em animais infectados incluem conjuntivite severa, ceratoconjuntivite seca e ceratites (GOULD, 2011; HERRERA, 2008; SLATTER, 2005).
A conjuntivite é a manifestação ocular mais comum em gatos com sintomas agudos de infecção viral (GLAZE, 2002; NASISSE et al., 1989; STILES, 2003). Na infecção primária, após um período de incubação de dois a seis dias, ocorre conjuntivite aguda. Os sinais clínicos incluem conjuntivite unilateral ou bilateral, com vermelhidão da conjuntiva, quemose, blefarospasmo e secreção ocular serosa que pode evoluir para mucopurulenta, mesmo sem infecção bacteriana secundária; além de corrimento nasal, tosse e espirros (HERRERA, 2008; STILES, 2003; TURNER, 2010). A duração da doença varia de 10 a 14 dias, mas tanto o tempo de incubação quanto o período de duração dependem da quantidade de vírus inoculado (GLAZE, 2002; THIRY et al., 2009). Essa condição pode levar a outros problemas oculares significativos, como incapacidade de piscar, obstrução ou destruição dos ductos lacrimais (resultando em ceratoconjuntivite seca) e conjuntivalização da córnea, causando déficit visual (GOULD, 2011; STILES; PROGRANICHNIY, 2008).
A ceratite ulcerativa felina é uma razão comum para consultas veterinárias, sendo a infecção pelo HVF-1 provavelmente sua principal causa (GELATT, 2003; HARTLEY, 2010a; SLATTER, 2005). Sugere-se que, em gatos, todas as úlceras de córneas sejam atribuídas a esse vírus até prova em contrário (HARTLEY, 2010; MAGGS, 2005). A ceratite herpética ocorre principalmente em gatos adultos, geralmente resultantes da reativação viral (ANDREW, 2001; SLATTER, 2005), embora também possa surgir durante a infecção viral aguda (GELATT, 2003). A presença de úlceras corneais dendríticas é considerada patognomônica para a infecção pelo HVF-1 (GELATT, 2003; HERRERA, 2008; NASISSE et al., 1989; ORIÁ et al., 2012; SLATTER, 2005). A infecção das células epiteliais pelo HVF-1 na infecção primária aguda resulta em lesões corneais lineares. Várias úlceras dendríticas podem aumentar de tamanho e coalescer, formando úlceras geográficas (MITCHEL, 2006; ROZE, 2005; SLATTER, 2005).
A causa de ceratoconjuntivite Seca (CCS) em gatos não é totalmente compreendida, mas acredita-se que uma conjuntivite intensa, muitas vezes associada ao HVF-1, pode causar a obstrução do ducto excretor ou inflamação intensa da glândula lacrimal, resultando na diminuição da produção da parte aquosa do filme lacrimal pré-corneal (LIM; CULLEN, 2005; NASISSE et al., 1989; SLATTER, 2005).
DIAGNÓSTICO
Complexo respiratório felino (CRF) é uma condição prevalente em abrigos de animais, onde fatores como alta densidade populacional e estresse aumentam a susceptibilidade dos gatos. O diagnóstico do CRF é multifacetado e requer uma combinação de exames clínicos e laboratoriais para identificar os agentes causadores, que incluem: herpes-vírus felino tipo 1 (FHV-1) e ocalicivírus felino (FCV), bem como bactérias como Chlamydophila felis e Mycoplasma spp.
O exame físico é essencial para a identificação dos sintomas clínicos do CRF, que incluem espirros, secreção nasal e ocular, febre, tosse e letargia. Durante o exame, deve-se avaliar a presença de úlceras orais e oculares, linfadenopatia e sinais de pneumonia. A citologia de amostras de secreção nasal e ocular pode fornecer informações preliminares sobre a presença de células inflamatórias e agentes infecciosos.
Para a confirmação do diagnóstico, testes laboratoriais específicos são necessários. A reação em cadeia da polimerase (PCR) é amplamente utilizada para detectar DNA viral e bacteriano nas amostras coletadas (Richards et al., 2020). Este método é altamente sensível e específico, permitindo a identificação precisa dos agentes patogênicos envolvidos no CRF. Além disso, culturas bacterianas podem ser realizadas para isolar e identificar bactérias específicas, o que é crucial para a seleção adequada de antibióticos.
Radiografias torácicas são indicadas em casos suspeitos de pneumonia ou quando há dificuldade respiratória significativa. Estas imagens podem revelar opacidades pulmonares e ajudar na avaliação da gravidade da infecção respiratória. Como afirmam BROWN et al., (2021), radiografias torácicas podem revelar opacidades pulmonares e ajudar na avaliação da gravidade da infecção respiratória. Testes sorológicos também podem ser empregados para detectar anticorpos contra FHV-1 e FCV, embora sua utilidade seja limitada em ambientes de abrigo devido à prevalência de infecções subclínicas e à resposta imune vacinal.
MEDIDAS DE PREVENÇÃO E MANEJO
MANEJO CLÍNICO
Os cuidados realizados diariamente em ambientes com alto número de felinos demonstra grande importância no tratamento. O estresse é um dos principais fatores que interfere na imunidade, podendo ser reduzido evitando superlotação, gaiolas apertadas e falta de enriquecimento ambiental, juntamente aos pontos citados anteriormente, as medidas sanitárias adequadas para prevenir a propagação de doenças por intermédio de gaiolas, fomitês ou até mesmo funcionários que realizam manejo nos animais (REES; LUBINSKI, 2020).
A realização de triagem em felinos recém-chegados é fundamental para coletar informações sobre o estado de saúde desses animais, é necessário coleta de exames, vermifugação, controle de ectoparasitas, e vacinação se saudáveis, indivíduos com alterações clínicas é utilizados o protocolo de vacinação contendo VVM (vírus vivo atenuado), pois ocasionam uma precoce proteção. Em caso de surtos agudos diferenciarem herpes-vírus (FHV) e cálicevírus (FCV), pois a identificação do patógeno direciona para um melhor protocolo de medidas preventivas (ABCD, 2021).
O manejo clínico do CRF é primariamente sintomático. A hidratação é fundamental, especialmente em gatos que apresentam desidratação devido à febre e à falta de apetite. A administração de fluidos subcutâneos ou intravenosos, internação do animal e analgésicos mais enfáticos pode ser necessária em casos mais graves (GREENE & SCHULTZ, 2021).
Além disso, a nebulização com soluções salinas de duas a três vezes ao dia e a utilização de descongestionantes nasais podem ajudar a aliviar a obstrução nasal e melhorar a respiração dos gatos afetados, as secreções nasais e ou ocular deve ser limpa com solução fisiológica (THIRY, 2009). A suplementação com L-lisina, embora controversa, é às vezes usada com o intuito de inibir a replicação do herpes-vírus, apesar de sua eficácia não ser amplamente comprovada (SYKES, 2019).
O tratamento de suporte é de suma importância e deve proporcionar ao animal todas suas necessidades (NELSON; COUTO, 2015), a ingestão de alimentos é extremamente importante, a maioria dos pacientes apresentam inapetência devido perda de seu olfato ou até mesmo devido úlceras na cavidade oral, o indicado é oferecer alimentos altamente palatáveis, que podem ser administrados aquecidos ou misturados visando aumento de palatabilidade. O indicado é caso o animal apresente anorexia há mais de três dias é passagem de tubo esofágico.
MANEJO TERAPÊUTICO
Gatos são animais sensíveis a situações de estresse, o que se torna um desafio no tratamento da doença do FHV-1, uma vez que, apenas a manipulação dos animais para a administração dos medicamentos pode se tornar estressante e agravar mais ainda a enfermidade.
O manejo terapêutico atual para FHV-1 é fundamentado em agentes virostáticos, sobretudo antivirais análogos de nucleosídeos (NA) (ROCHA, 2021). Antibióticos são frequentemente prescritos para tratar infecções bacterianas secundárias que podem complicar o CRF. A doxiciclina é um antibiótico de escolha devido à sua eficácia contra Mycoplasma spp. e Chlamydophila felis (Hartmann et al., 2020).
O uso de antibióticos é interessante, como a amoxicilina por V.O (via oral) e S.C (subcutâneo) na fase aguda da FHV-1 com dose de 20 mg/kg de 8 em 8 horas ou doxiciclina por V.O (via oral) com dose de 5 à 10 mg/kg de 12 em 12 horas, assim como vitaminas, colírios em animais com sinais clínicos oculares, expectorantes em pacientes com acometimento respiratório, além de estimulador de apetite e nebulização (ROCHA, 2021).
O uso de expectorantes pode ser benéfico para liberar o muco espesso e um fármaco constantemente utilizado é a bromexina com dose de 0,5 à 1 mg/kg a cada 8-12 horas por V.O ou S.C, que apresenta uma possibilidade no lugar da acetilcisteína que é muito recusado pelos gatos por via oral e por via inalatória é contraindicado por causar broncoconstrição (ROCHA, 2021).
Atualmente o protocolo mais comum é o uso do tratamento suporte, principalmente com o antibiótico, para combater a sintomatologia clínica e melhorar a condição do animal a fim de sanar a doença. Porém, durante esse período o paciente dissemina o vírus e tem a possibilidade de ter a expressão da latência. Por isso é importante o uso concomitante dos antivirais, acelerando a melhora do animal e diminuindo a infecção para outros. Os antivirais de uso rotineiro são o fanciclovir e cidofovir devido a comprovação de eficácia, já que os outros antivirais são tóxicos e muitas vezes, ineficientes.
MANEJO IMUNOLÓGICO
Sabe-se que a infecção por HVF-1 é altamente prevalente, facilmente transmissível e que a doença pode se apresentar de maneira severa, por isso a vacinação de todos os felinos é recomendada (GASKELL et al., 2008).
O uso de vacina viva modificada pode induzir sinais clínicos em alguns felinos, a vacina intranasal viva modificada induz rapidamente o começo da proteção em dois a quatro dias, quando comparada com a vacina injetável, mas existe um pequeno risco de produzir doença respiratória contagiosa. A instilação da vacina no saco conjuntival desenvolve uma grande probabilidade de ocasionar doença ocular (STILES, 2000).
Dessa forma, no Brasil a única forma de prevenção atualmente são as vacinas de vírus vivo atenuados, as quais conferem imunidade adequada diante de protocolos de imunização estabelecidos. Sugere-se a primeira vacinação contra HVF-1 com nove a dez semanas de vida, com repetição da dose entre a 12º e 14ª semanas de vida e reforço a cada três anos (BICHARD; SCHERING, 2008).
No entanto, sabe-se que a vacinação não necessariamente evita a infecção e provavelmente tem pouco efeito no gato que já está infectado ou é um carreador latente do HVF-1 (GELLAT, 2003).
MANEJO AMBIENTAL E EPIDEMIOLÓGICO
As medidas de controle ambiental em abrigos são cruciais para minimizar a propagação do CRF. A quarentena de novos animais é essencial para evitar a introdução de novos agentes patogênicos. Melhorias na ventilação e a redução da densidade populacional podem reduzir o estresse e a transmissão de patógenos. A limpeza rigorosa das instalações e a desinfecção regular são práticas recomendadas para eliminar os agentes infecciosos do ambiente (Stella et al., 2020).
Redução nos níveis de estresse através de enriquecimento ambiental com brinquedos interativos, tocas, área para repouso, mais de uma caixa sanitária, poucos animais por gatil e compatibilidade social (ABCD, 2021).
Desinfecções errôneas contribuem para propagação de agentes infecciosos. A limpeza deve ser realizada de forma sistêmica e a escolha dos produtos deve refletir sobre os patógenos com maior potencial de estarem presentes, e no tipo de superfície, além dos custos, e praticidade (DHARAN, 1999).
Redução dos níveis de estresse se tornam interligadas a imunidade, facilitando infecções latentes ao FHV-1 (GASKELL; POVEY, 1977). Limpeza diária das caixas sanitárias, fômites e ambiente em que os animais vivem e uso de epi’s, são necessários para um eficiente e recorrente controle da infecção.
O manejo epidemiológico para o controle do complexo respiratório felino em abrigos é uma prática essencial para prevenir a disseminação de doenças infecciosas altamente contagiosas, como a herpes-vírus felina (FeHV-1) e o calicivírus felino (FCV). Essas infecções são comuns em ambientes de alta densidade populacional e podem ser exacerbadas por fatores como estresse e baixa imunidade (LUME, 2024).
Medidas importantes incluem:
1. Quarentena: Gatos recém-chegados devem ser isolados em uma área específica de quarentena por um período adequado (geralmente 14 dias) para observar sinais clínicos antes de serem introduzidos à população geral. Isso ajuda a evitar a introdução de novas infecções no grupo (LUME, 2024).
2. Isolamento de animais doentes: Felinos que apresentam sinais de infecção respiratória devem ser separados imediatamente em áreas de isolamento. Isso minimiza o risco de transmissão, que pode ocorrer por contato direto ou indireto, como por aerossóis e objetos contaminados (LUME, 2024; LARA, 2012).
3. Desinfecção e ventilação: Manter um ambiente limpo e bem ventilado é crucial. A higienização regular de superfícies e a implementação de sistemas de ventilação adequados ajudam a reduzir a carga viral no ambiente (LUME, 2024).
4. Controle de estresse e superlotação: O estresse pode suprimir o sistema imunológico dos animais, aumentando sua suscetibilidade a infecções. Minimizar a superlotação e proporcionar um ambiente tranquilo pode melhorar a resistência dos gatos às doenças (LUME, 2024; LARA, 2012).
Essas práticas são fundamentais para a contenção de surtos em abrigos e devem ser ajustadas conforme as necessidades e recursos de cada instituição.
CONCLUSÃO
Embora muitos abrigos tenham adotado medidas como protocolos de higiene, isolamento de animais doentes, vacinação e manejo ambiental, ainda existem desafios na manutenção consistente dessas práticas devido às limitações de recursos e adesão dos cuidadores. A colaboração entre abrigos, profissionais veterinários e organizações de proteção animal é fundamental para melhorar a eficácia das medidas de controle de infecção e garantir o bem-estar dos gatos em ambientes de abrigo.
A vacinação desempenha um papel fundamental nesse contexto, sendo recomendada para todos os gatos assim que entram no abrigo e como parte do protocolo de manejo de rotina. No entanto, é importante reconhecer que a eficácia da vacinação pode ser limitada em ambientes de alta densidade populacional, onde o estresse e as condições de vida podem comprometer a resposta imune dos gatos.
No entanto, mesmo com medidas preventivas robustas, é inevitável que alguns gatos desenvolvam infecções por FHV-1. Portanto, a detecção precoce e o manejo adequado dos casos são essenciais para minimizar o impacto do vírus no abrigo. Isso pode envolver a implementação de protocolos de triagem regulares para identificar gatos infectados, o isolamento imediato de indivíduos sintomáticos, e o fornecimento de cuidados veterinários adequados, incluindo tratamento antiviral, terapia de suporte e controle de sintomas.
Pois os felinos infectados mesmo após se recuperar, podem permanecer em latência por toda a vida e ocorrer reativação viral por diversos fatores, inclusive o estresse, sendo responsável pela disseminação do agente para demais indivíduos predispostos mesmo sem sinais clínicos.
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1Aluno do curso de Medicina Veterinária
2Aluno do curso de Medicina Veterinária
3Aluno do curso de Medicina Veterinária
4Aluno do curso de Medicina Veterinária
5Aluno do curso de Medicina Veterinária
6 Professor(a) orientador(a) do curso de Medicina Veterinária