LASER GENITAL NA SÍNDROME GENITURINÁRIA DA MENOPAUSA: RESULTADOS E LIMITES

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202407312018


Vanessa Nunes Alves Martins1
Gabriel Nunes Martins2


Resumo

Objetivo: conhecer os benefícios e a segurança do tratamento genital com Laser em mulheres com Síndrome Geniturinária da Menopausa. Métodos: revisão bibliográfica realizada na base de dado Pubmed, nos últimos 4 anos (2021 a 2024). Foram analisados 10 ensaios clínicos que compararam o Laser com outros tratamentos tradicionais ou com placebo para avaliar os benefícios do uso do Laser em mulheres com atrofia vaginal, disfunção sexual, dispareunia, incontinência urinária, prolapso e cistite associada a menopausa. Resultados: alguns estudos demonstraram resultados positivos e identificaram eventos adversos como corrimento vaginal, manchas vaginais, vaginose bacteriana, infecção do trato urinário, leve desconforto, cicatrizes e queimaduras. Eventos adversos graves não foram encontrados. Conclusão: Os Lasers ablativos vaginais foram introduzidos no mercado sem pesquisas prospectivas suficientes, entretanto, dados mais recentes confirmam que, quando usados adequadamente, são geralmente seguros e considerados uma ferramenta poderosa no campo da medicina estética e terapêutica. Eles se mostram promissores no tratamento da síndrome geniturinária, no entanto, ainda não existem dados suficientes para tirar uma conclusão sobre a eficácia a longo prazo.

Descritores: Laser ablativos, atrofia genital, função sexual, síndrome geniturinária.

Introdução

A atrofia vulvovaginal resultante da perda de estrogênio é frequentemente associada a queixas vulvovaginais como secura, queimação, corrimento, sangramentos e dispareunia em pacientes na menopausa1.

O epitélio vaginal fica mais fino, facilmente susceptível a lesões. Frouxidão vaginal, atrofia e perda da rugosidade podem ocorrer devido `a diminuição da produção do colágeno e elastina. Além disso, a destruição das glândulas sebáceas e a involução das membranas mucosas resultam em diminuição da lubrificação e aumento do pH vaginal2.

Em 2014, o novo termo Síndrome Geniturinária da Menopausa (GSM) foi introduzido pela Sociedade Internacional de Ginecologia Para o Estudo da Saúde da Mulher para englobar todos os sintomas atróficos que as pacientes podem ter nas áreas vulvovaginais e da bexiga uretral resultantes da perda de estrogênio que ocorre com a menopausa ou por outras etiologias. É uma condição progressiva e crônica, que se manifesta como involução das mucosas vulvo-vaginais e tecidos devido à diminuição dos níveis de estrogênio1.

Além dos sintomas vulvovaginais, a GSM apresenta sintomas do trato urinário como disúria, frequência urinária, desconforto uretral ou hematúria. O espectro de consequências adversas torna o tratamento essencial para alívio dos sintomas, disfunção sexual, sangramento pós coito e infecções urinárias recorrentes3.

Atualmente, a terapia com estrógeno vaginal é o tratamento padrão para atrofia genital. No entanto, deve-se ter cautela em sobreviventes de câncer sensíveis a hormônios. Além disso, várias pacientes não desejam o tratamento hormonal ou não obtêm os resultados desejados.   Assim, tratamentos não hormonais, incluindo o Laser vaginal de Er:YAG (Érbio), têm sido considerados1.

A incontinência urinária de esforço feminina é considerada um importante problema de saúde pública. A fisioterapia é um importante tratamento conservador; no entanto, é principalmente limitado pela fraca adesão a longo prazo. Além disso, o tratamento cirúrgico acarreta riscos significativos. Portanto, novas técnicas de tratamento, incluindo o Laser genital estão sendo estudadas4.

O termo Laser é acrônimo da expressão Light Amplification by Stimulated Emission Radion que se refere à luz produzida através de um processo de amplificação óptica baseado na emissão estimulada de radiação eletromagnética. A luz Laser pode ser ajustada em termos de comprimento de onda, potência e duração do pulso para atingir efeitos específicos nos diversos tecidos5.

De forma geral, são três os tipos de Laser utilizados: Laser de CO2 (Dióxido de Carbono) utilizado para remoção de tecidos, vaporização e resurfacing (remoção da camada superficial da pele, de modo a estimular a formação de novo tecido cutâneo); Laser Er:YAG (Érbio:YAG) utilizado para ablação de tecidos com menor penetração e maior precisão; Laser Nd:YAG (Neodímio:YAG) que  penetra mais profundamente e é utilizado para coagulação e tratamento de vasos sanguíneos5.

Os Lasers Er:YAG e Laseres de CO2, denominados ablativos, são fortemente absorvidos pela água resultando no aquecimento e destruição dos tecidos. Já os Lasers que emitem comprimentos de onda que são mal absorvidos pela água são considerados não ablativos5.

As aplicações ginecológicas podem ser clínicas e estéticas. Dentre as aplicações estéticas, podemos citar o rejuvenescimento vaginal com Lasers de CO2 ou Er:YAG, que estimula a produção de colágeno, ou aplicações para remoção de pelos com Lasers Nd:YAG. As principais aplicações clínicas são a remoção de condilomas acuminados (papilomavírus humano – HPV), remoção de liquens escleroatróficos e para o ressecamento vaginal e atrofia vaginal pós menopausa com Lasers de CO2 ou Er:YAG5.

Os mecanismos de ação do Laser são a fotodermólise seletiva e a estimulação do colágeno. A fototermólise se deve à capacidade de o Laser alcançar seletivamente os cromóforos (substâncias que absorvem luz) permitindo a destruição precisa do tecido alvo como mínima lesão aos tecidos circundantes. São exemplos de cromóforos humanos a melanina, hemoglobina de glóbulos vermelhos e as moléculas de água. Para entregar energia eletromagnética a um dado órgão a fim de exercer um efeito terapêutico, esse órgão deve ter um cromóforo para absorver essa energia5.

A estimulação de colágeno ocorre quando a luz Laser aquece as camadas mais profundas da pele, desencadeando uma resposta de cicatrização que inclui a produção de novo colágeno e elastina, melhorando a firmeza e elasticidade do tecido5.

Ademais, o Laser também age aumentando as células do epitélio vaginal que são células ricas em glicogênio, assim, espera-se que os lactobacilos vaginais usem o glicogênio como nutriente, produzam o ácido láctico e melhorem o pH vaginal2.

Alcançar um resultado terapêutico com o Laser depende da patologia, do efeito de um determinado comprimento de luz sobre tal patologia e da dose correta de energia a atingir o tecido alvo. A dosagem do Laser é descrita pela irradiância (densidade de potência) e fluência (potência x tempo)5.

Os Lasers utilizados no tratamento dos sintomas vaginais associados à GSM são os de CO2 ablativos fracionados (Mona Lisa Touch, FemiLift) e os Lasers de Er:YAG (diva). Em alguns casos, estes Lasers estão sendo usados para tratar uma frouxidão vaginal através de um controverso procedimento estético chamado de rejuvenescimento vaginal2.

Os Lasers vêm sendo utilizados amplamente pelos ginecologistas devido a facilidade de seu uso: os tratamentos são curtos (5 a 10 minutos em intervalos de 4 a 6 semanas) com poucos eventos adversos relatados (queimaduras, infecções, hiperpigmentação e cicatrizes), mas os procedimentos são caros e não são cobertos pelo seguro médico2.

O objetivo deste trabalho é conhecer os benefícios e a segurança do tratamento genital com Laser em mulheres com GSM.

Método

Trata-se de estudo de revisão bibliográfica da literatura em âmbito nacional e internacional. Foram utilizados os descritores: Laser ablativos, atrofia genital, função sexual, síndrome geniturinária.

A pesquisa foi realizada na base de dados Pubmed. Foram selecionados artigos publicados nos últimos 3 anos (2021 a 2023), em língua portuguesa e inglesa, voltados para a saúde da mulher e tratamento médico com uso de Laser vaginal.

Critério de exclusão: Lasers para outras finalidades.

A pesquisa recuperou inicialmente 16 artigos dos quais 11 foram selecionados pelos critérios de inclusão e exclusão.

Resultados

Em 2021, foi realizado um estudo clínico, randomizado e controlado pela Universidade de São Paulo para comparar a eficácia da terapia do Laser de CO2 fracionado com a terapia com estrogênio tópico no tratamento da síndrome geniturinária pós menopausa. Foram selecionadas 25 mulheres   com pelo menos 1 ano de amenorreia e FSH > 40, as quais foram divididas em 2 grupos, um recebendo o tratamento com Laser e outro com estrogênio tópico. Após 6 meses, foram realizadas análises histológicas do epitélio vaginal que mostrou um aumento significativo na sua espessura nos 2 grupos, sendo que o grupo da terapia com estrogênio tópico apresentou maior índice de maturação epitelial. Apesar da não equivalência com terapia tópica com estrogênio, os dados sugerem que a terapia a Laser é um método eficaz para o tratamento da atrofia vulvovaginal.6

Resultados diferentes foram encontrados em um ensaio clínico, randomizado, duplo cego, controlado por simulação, conduzido em um hospital terciário em Sydney na Austrália. Nesse estudo, 49 mulheres que apresentavam pelo menos 1 dos sintomas de secura vaginal, ardor, coceira ou  dispareunia receberam tratamento com Laser de CO2 ou placebo. No estudo da histologia epitelial vaginal não foram encontradas diferenças significativas nas características microscópicas do epitélio vaginal antes e após tratamento com Laser ou placebo.7

Em 2021, foi publicado por Athanasiou um estudo comparativo com 30 mulheres sintomáticas na pós menopausa e que apresentavam prolapso genital com cistocele  e ou retocele as quais receberam tratamento com laser de ER;YAG e outro grupo de 30 mulheres com a mesma patologia e com os mesmos sintomas que não receberam o tratamento com Laser e optaram por aguardar a cirurgia. Foi observado que 0% das mulheres apresentaram melhoras dos sintomas após 3 tratamentos mensais com Laser e que seu uso para tratamento da parede vaginal anterior/posterior não foi tolerado por nenhuma delas.8

Em 2022, Roy Lauterbach et al publicaram um estudo prospectivo, duplo-cego, randomizado e controlado, que incluiu 119 mulheres menopausadas apresentando frouxidão vaginal e disfunção sexual as quais receberam um único tratamento com CO2 ou um único tratamento simulado. O estudo concluiu que um único tratamento com Laser é um procedimento eficaz, bem tolerado e seguro para tratar sintomas de frouxidão vaginal e disfunção sexual, embora os efeitos sejam temporários. No grupo de estudo, houve recrudescimento dos sintomas após 6 meses do tratamento.9

Um estudo randomizado e controlado, foi realizado entre julho de 2019 e agosto de 2022, com 50 mulheres tailandesas nos pós menopausa com diagnóstico de bexiga hiperativa e que se queixaram de um ou mais sintomas de atrofia vaginal. As participantes receberam um tratamento com Laser de Er:YAG vaginal ou procedimento simulado.  No acompanhamento de 12 semanas, as mulheres que receberam o tratamento com Laser apresentaram naquele momento melhora dos sintomas de bexiga hiperativa em comparação as mulheres sem tratamento.10

Aesthetic Surgery Journal publicou, em 2022, um ensaio randomizado e controlado, que avaliou a eficácia do Laser para sintomas vulvovaginais da menopausa. Trinta e uma mulheres estavam no estudo e foram acompanhadas por 6 meses e os resultados das biópsias do epitélio vaginal não apresentaram estimulação de matriz extracelular.2

Em 2022, foi realizado um ensaio randomizado e controlado, em mulheres de 18 a 80 anos com incontinência urinária de esforço, avaliadas 3 meses após tratamento com Laser de CO2, a fim de verificar resultados subjetivos de proporção de vazamento com tosse, espirro ou riso. Os resultados demonstraram que não houve nenhuma melhora na incontinência urinária de esforço após a terapia com Laser vaginal de CO2 em comparação com o tratamento simulado.3

Um estudo randomizado controlado de 2023, com 44 mulheres na pós menopausa, apresentando atrofia vaginal, avaliou o número de lactobacilos vaginais, o PH vaginal e os sintomas de atrofia genital, após 1 mês de tratamento com Laser de Er:YAG. Este estudo mostrou aumento das células superficiais do epitélio vaginal e melhora dos sintomas de secura genital mas não foi demostrado alteração do pH vaginal.4

A Universidade Federal de São Paulo conduziu um estudo randomizado com 70 mulheres menopausadas, sobreviventes com câncer de mama, que apresentavam sintomas geniturinários, as quais foram submetidas separadamente ao tratamento de Laser CO2, radiofrequência e uso de promestrieno vaginal. Após 30 dias de tratamento, foi observado que tanto o Laser como a radiofrequência e o promestrieno proporcionaram melhoras significativas nos sintomas naquele momento.11

Em julho de 2023, Lucília C. da Fonseca publicou um estudo randomizado comparando a terapia a Laser vaginal e a fisioterapia do assoalho pélvico no tratamento de mulheres com incontinência urinária de esforço (IUE). Foram acompanhadas 40 mulheres com diagnóstico clínico e urodinâmico de IUE as quais foram alocadas randomicamente em 2 grupos: aquelas que receberam terapia com Laser de Er:YAG em 3 sessões com intervalo de 1 mês e aquelas que receberam fisioterapia por 3 meses, duas vezes por semana. Ambos os tratamentos influenciaram positivamente na redução da perda urinária observada aos 6 e 12 meses após o tratamento.4

Discussão

Dos 10 ensaios clínicos analisados, três avaliaram o resultado da terapia com Laser por meio do estudo histopatológico e dois deles detectaram melhorada condição do epitélio vaginal. Dos seis ensaios que analisaram o efeito de forma subjetiva, cinco demostraram alívio de sintomas. O estudo que avaliou o resultado na flora de lactobacilos identificou o aumento das células superficiais do epitélio vaginal com melhora dos sintomas de atrofia vaginal, mas não mostrou diferença estatisticamente significativa do pH vaginal antes de depois das aplicações vaginais de Laser.5

É importante ressaltar que as considerações de risco-benefício não são as mesmas para as pacientes submetidas a terapia a Laser para rejuvenescimento genital e para pacientes em condições que prejudicam significativamente a qualidade de vida como atrofia, secura e dor.5

As recomendações recentes da American Urogynecologic sobre os Lasers ablativos são de prudência; os clínicos podem continuar a usar essas tecnologias com cautela e seguindo amplo aconselhamento ao paciente sobre custo e o conhecimento limitado de eficácia e segurança, principalmente a longo prazo.5

Conclusão

Os Lasers ablativos vaginais foram introduzidos no mercado sem pesquisas prospectivas suficientes, entretanto, dados mais recentes confirmam que eles se mostram promissores no tratamento da síndrome geniturinária, no entanto, ainda não existem dados suficientes para tirar uma conclusão sobre a eficácia a longo prazo.

Mais pesquisas são necessárias para determinar a duração e magnitude do efeito, bem como qual a dosagem mais adequada para cada condição. Até então, os médicos devem considerar os dispositivos ablativos com cautela, após uma seleção cuidadosa dos pacientes e uma extensa discussão sobre riscos e benefícios, especialmente resultados a longo prazo, que são ainda em grande parte desconhecidos.

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1Ginecologista e Obstetra pela.Maternidade Odete Valadares – FHEMIG, Minas Gerais (MG), Brasil, médica Supervisora Hospitalar da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte – SMSA, Belo Horizonte (MG), Brasil.

2Acadêmico da Faculdade.de Ciências Médicas de Minas Gerais (MG), Brasil