JEJUM PRÉ-OPERATÓRIO: BENEFÍCIOS E MALEFÍCIOS DURANTE A ANESTESIA BASEADOS NO PROTOCOLO ACERTO

PREOPERATIVE FASTING: BENEFITS AND HARMS DURING ANESTHESIA BASED ON ACERTO PROTOCOL

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202506071754


Adria Lohana dos Santos Ferreira1
Paulo Victor Santos Silva1
Gilson Dorian de Lucena Junior2


RESUMO

O jejum pré-operatório é uma prática tradicional com o objetivo de prevenir complicações como a broncoaspiração pulmonar durante a anestesia. No entanto, evidências científicas recentes têm questionado os benefícios do jejum prolongado, apontando seus potenciais malefícios, como desidratação, hipoglicemia e aumento do desconforto do paciente. Este artigo revisa as práticas atuais de jejum pré-operatório, com base em diretrizes internacionais e no Protocolo ACERTO, que propõe estratégias de jejum abreviado, como a ingestão de líquidos claros e soluções ricas em carboidratos até duas horas antes da cirurgia. As práticas recomendadas demonstram impacto positivo no metabolismo, na segurança e no conforto do paciente, promovendo uma recuperação perioperatória mais eficaz e segura.

Palavras-chave: Jejum pré-operatório. Protocolo ACERTO. Anestesia. Complicações perioperatórias. Jejum abreviado.

ABSTRACT

Preoperative fasting is a traditional practice aimed at preventing complications such as pulmonary aspiration during anesthesia. However, recent scientific evidence questions the benefits of prolonged fasting, highlighting potential harms such as dehydration, hypoglycemia, and increased patient discomfort. This article reviews current preoperative fasting practices based on international guidelines and the ACERTO Protocol, which advocates for shortened fasting strategies, including the intake of clear liquids and carbohydrate-enriched solutions up to two hours before surgery. Recommended practices demonstrate positive impacts on metabolism, safety, and patient comfort, promoting a more effective and safer perioperative recovery.

Keywords: Preoperative fasting. ACERTO Protocol. Anesthesia. Perioperative complications. Shortened fasting.

1  INTRODUÇÃO

Ainda existem muitas divergências entre as recomendações pré-operatórias e a prática hospitalar, especialmente no que diz respeito à redução do tempo de jejum. Isso se deve à resistência de diversos profissionais em adotar novas abordagens, preferindo manter a recomendação tradicional de um jejum mínimo de 8 horas antes da cirurgia, tanto para alimentos sólidos quanto líquidos, o que pode ser prolongado em razão de atrasos na programação das cirurgias. (ARAUJO, et al. 2023).

O jejum pré-operatório tem sido amplamente adotado como prática padrão desde a década de 1940, com o objetivo de reduzir o risco de aspiração pulmonar durante a anestesia geral. Entretanto, a abordagem tradicional de jejum prolongado tem sido questionada devido aos seus efeitos adversos sobre o metabolismo, conforto do paciente e recuperação pós-operatória. Nos últimos anos, protocolos como o ACERTO (Aceleração da Recuperação Total Pós-Operatória) e diretrizes de sociedades internacionais, como a American Society of Anesthesiologists (ASA), têm revisado essas práticas, sugerindo estratégias de jejum abreviado que promovem benefícios metabólicos e perioperatórios sem comprometer a segurança anestésica. Este artigo explora os benefícios e malefícios do jejum pré-operatório, analisando evidências científicas recentes e diretrizes internacionais, com foco no Protocolo ACERTO. (SANTOS, et al. 2020)

2  METODOLOGIA

Este estudo segue a abordagem da revisão integrativa, um método que possibilita uma análise ampla e estruturada dos dados sobre temas de interesse do pesquisador. Essa metodologia não apenas contribui para a discussão de métodos e resultados de pesquisa, mas também estimula reflexões acerca de futuras investigações. A revisão foi conduzida em seis etapas:

1.     Definição do tema e formulação da pergunta norteadora da pesquisa;

2.     Estabelecimento dos critérios de inclusão e exclusão;

3.     Identificação e seleção dos estudos relevantes;

4.     Categorização dos estudos selecionados;

5.     Análise e interpretação dos resultados;

6. Apresentação da revisão do conhecimento.

A estratégia PICo, onde: P é a População/Participante/Fenômeno; I- Intervenção/Interesse e Contexto/Característica, foi utilizada para caracterização desse estudo visando o auxílio na construção da pesquisa e na busca científica, com a finalidade de localizar de forma rápida e acurada as informações mais relevantes sobre o assunto estudado. Sendo, a população: paciente no pré-operatório de cirurgia; Interesse: conhecer os benefícios e malefícios do jejum pré-operatório e o Co: submetido a anestesia. Assim, buscou-se responder à questão de pesquisa: “Benefícios e malefícios do jejum pré-operatório durante a anestesia, baseados no protocolo ACERTO?”.                   

Na presente pesquisa, o levantamento bibliográfico foi determinado com o uso dos descritores “Jejum pré-operatório”; “Protocolo ACERTO”; “Anestesia”; “Complicações perioperatórias”; “Jejum abreviado”, os quais foram aplicados na Biblioteca Virtual de Saúde (BVS-Brasil), sendo possível acessar um conjunto de bases de dados relevantes para os estudos no campo da saúde, como: Literatura LatinoAmericana e do Caribe (LILACS), Scientific Electronic Library Online (SciELO), MEDLINE e PUBMED, e implementação de operadores booleanos. A consulta na BVS ocorreu no mês de março de 2025 com a formulação das seguintes estratégias de busca: ANDOR.                    

Para a seleção dos artigos, foram estabelecidos os seguintes critérios de inclusão: artigos completos, com recorte temporal de 2015 a 2025 e estudos nos idiomas português, inglês e espanhol. Como critério de exclusão: artigos que não respondessem à pergunta estabelecida, teses, dissertações, editoriais e artigos duplicados.

A busca resultou em 21 artigos, os quais foram realizados a leitura dos títulos e resumos dos artigos com a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão. Ao final da leitura, permaneceram 12 artigos para análise completa e leitura analítica, os quais foram feitas a leitura e análise na íntegra dos seus conteúdos.

3  DISCUSSÃO

O jejum pré-operatório é uma prática tradicionalmente adotada para reduzir o risco de aspiração pulmonar durante a anestesia. No entanto, evidências recentes sugerem que o jejum prolongado pode trazer mais malefícios do que benefícios, motivando a adoção de protocolos como o ACERTO (Aceleração da Recuperação Total Pós-Operatória), que preconiza a abreviação do jejum e a administração de soluções ricas em carboidratos antes da cirurgia (Lima et al., 2022).

A prática de jejum prolongado pode resultar em uma série de efeitos negativos, incluindo desidratação, resistência insulínica, maior catabolismo muscular e aumento da resposta inflamatória ao estresse cirúrgico (Almeida et al., 2021). Além disso, pacientes submetidos a períodos prolongados sem ingestão de líquidos e alimentos frequentemente relatam sintomas desconfortáveis, como sede, fome, tontura, irritabilidade e ansiedade, prejudicando sua experiência no pré-operatório (Santos et al., 2020).

Do ponto de vista metabólico, o jejum prolongado favorece a mobilização de reservas energéticas por meio da gliconeogênese, aumentando a degradação proteica e levando à perda de massa muscular. Isso impacta negativamente a recuperação pós-operatória, prolongando o tempo de internação e elevando o risco de complicações, como infecções e atraso na cicatrização (Oliveira et al., 2022).

Com base em evidências científicas, o protocolo ACERTO recomenda a redução do tempo de jejum pré-operatório para 6 horas para alimentos sólidos leves e 2 horas para líquidos claros, incluindo soluções ricas em carboidratos (Carvalho et al., 2021). 

Essa abordagem visa otimizar o estado metabólico do paciente, reduzindo a resistência insulínica e promovendo uma recuperação mais rápida. A administração de soluções de carboidratos no período pré-operatório demonstrou benefícios significativos, como a melhora do conforto do paciente, menor liberação de hormônios do estresse, manutenção da glicemia e melhor preservação da função muscular (Silva et al., 2022). 

Além disso, a abreviação do jejum tem sido associada a menor incidência de náuseas e vômitos pós-operatórios, melhor controle da glicemia intraoperatória e menor necessidade de fluidoterapia intravenosa agressiva (Ferreira et al., 2021).

Apesar dos benefícios, a adoção da abreviação do jejum ainda enfrenta resistência em muitos centros cirúrgicos, em parte devido ao receio de aumento do risco de aspiração pulmonar. No entanto, estudos demonstram que a ingestão de líquidos claros até duas horas antes da anestesia não aumenta a incidência de complicações respiratórias (Carvalho et al., 2021).

Um artifício que tem ajudado bastante na avaliação pré-operatória é a ultrassonografia à beira do leito (Point-of-Care Ultrasound, POCUS). Por exemplo, o uso da ultrassonografia gástrica permite avaliar o conteúdo estomacal, auxiliando na identificação do risco de aspiração durante a indução anestésica (Ramsingh, et al., 2020).

A implementação do protocolo ACERTO exige uma mudança na cultura institucional e o treinamento da equipe cirúrgica e anestésica para garantir a adesão às novas diretrizes. A aceitação deste protocolo já é uma realidade em muitos hospitais brasileiros, promovendo benefícios tanto para os pacientes quanto para o sistema de saúde, reduzindo tempo de internação e complicações pós-operatórias (Lima et al., 2022).

Tabela: Ferreira, et al., 2025

É importante ressaltar, portanto, que a abreviação do jejum traz mais conforto ao paciente e com isso gera menos estresse metabólico no pós-cirúrgico, por exemplo, um lactante que necessita passar por um procedimento cirúrgico, e que estava em aleitamento materno a livre demanda, passar por um jejum de 6-8 horas causaria muito mais malefícios pra essa criança e o jejum abreviado com possibilidade de oferta de leite materno 3 horas antes da anestesia, dessa forma trazer uma recuperação superior a este paciente.

4  CONCLUSÃO

O jejum pré-operatório é uma prática essencial para a segurança anestésica, deve ser ajustado conforme evidências científicas atuais. Embora o jejum pré-operatório prolongado, embora tradicionalmente adotado para prevenir a aspiração pulmonar, apresenta diversos malefícios que comprometem o estado metabólico e o bem-estar do paciente. A abreviação do jejum e o uso de soluções de carboidratos, conforme preconizado pelo protocolo ACERTO, tem se mostrado segura e eficaz na otimização da recuperação pós-operatória, reduzindo complicações e promovendo melhores desfechos clínicos. A ampla adoção dessa prática deve ser incentivada, com base nas evidências científicas disponíveis e na adaptação da equipe médica às novas diretrizes.

5  REFERENCIAL TEÓRICO

●       Almeida, F. et al. (2021). Protocolo de abreviação do jejum pré-operatório no Hospital Universitário Walter Cantídio. Disponível em: periodicos.ufc.br 

●       Araujo, M. et al. (2023). Abreviação de jejum pré-operatório e uso de suplementação como coadjuvante: Revisão Integrativa. Disponível em:

●       Carvalho, J. et al. (2021). Impactos da abreviação de jejum pré-operatório: uma revisão da literatura. Disponível em: bdta.abcd.usp.br

●       Ferreira, M. et al. (2021). Abreviação de jejum pré-operatório e uso de suplementação como estratégia de recuperação pós-operatória. Disponível em: rsdjournal.org

●       Lima, R. et al. (2022). Malefícios do jejum prolongado no período pré-operatório: Revisão integrativa. Disponível em: rsdjournal.org

●       Oliveira, S. et al. (2022). Jejum pré-operatório no cliente submetido a cirurgia eletiva: revisão integrativa. Disponível em: scielo.pt

●       Santos, P. et al. (2020). Abreviação do jejum pré-operatório no contexto do protocolo ACERTO. Disponível em: rsdjournal.org

●       Silva, D. et al. (2022). Abreviação do jejum pré-operatório e sua influência na recuperação cirúrgica. Disponível em: rsdjournal.org

●       Aguilar-Nascimento, J. et al. (2010). Reducing preoperative fasting time: a trend based on evidence. World Journal of Gastrointestinal Surgery, 2(3), 57-60.

●       Nygren, J., et al. (2020). Guidelines for perioperative care in elective surg ERAS Society recommendations. Clinical Nutrition, 39(2),353-378.

●       Maltby, J. R. (2019). Fasting from midnight: is it still necessary? Best Prar Research Clinical Anaesthesiology, 33(1), 3-12.

●       Smith, 1., et al. (2018). Perioperative fasting in adults and children: guidel from the ESA. European Journal of Anaesthesiology, 35(6), 405-407.

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●       Ramsingh, D., et al (2020). Perioperative Point-of-Care Ultrasound: From Concept to Application. Anesthesiology. 2020 Apr;132(4):908-916. doi: 10.1097/ALN.0000000000003113. PMID:31977521. Disponível em: pubmed.ncbi.nlm.nih.gov


1Acadêmico de Medicina. Centro Universitário Uninorte. Rio Branco, AC, Brasil.
2Docente de Medicina e Médico. Centro Universitário Uninorte. Rio Branco, AC, Brasil.