OCCUPATIONAL THERAPY INTERVENTIONS FOR ADULTS WITH AUTISM SPECTRUM DISORDER.
INTERVENCIONES DE TERAPIA OCUPACIONAL PARA ADULTOS CON TRASTORNO DEL ESPECTRO AUTISTA.
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/dt10202506052255
Autor1: Bianca de Oliveira Lima
Autor2: Leilaine Saburi Cintas Ruiz – Orientadora
Autor3: Rodrigo de Sousa Marques – Coorientador
RESUMO
Este artigo apresenta uma revisão sistemática da literatura sobre intervenções de Terapia Ocupacional (TO) voltadas para adultos com Transtorno do Espectro Autista (TEA), com ênfase em estratégias como vídeo modelagem, treino de habilidades sociais, integração sensorial e treinamento vocacional. Foram analisadas publicações entre 2015 e 2025, nas bases de dados PubMed, Scopus e SciELO. Os resultados indicam que a TO desempenha papel significativo na promoção da autonomia, inclusão social e funcionalidade desses indivíduos. No entanto, persistem desafios relacionados à generalização das habilidades adquiridas para ambientes naturais, à sustentabilidade dos ganhos terapêuticos a longo prazo e à adaptação cultural das intervenções. Conclui-se que, embora promissoras, as práticas terapêuticas necessitam de personalização, suporte contínuo e maior produção de evidências por meio de estudos longitudinais e culturalmente contextualizados.
Palavras-chave: Terapia ocupacional; transtorno do espectro autista; adultos; intervenções terapêuticas; inclusão social.
ABSTRACT
This article presents a systematic review of the literature on Occupational Therapy (OT) interventions aimed at adults with Autism Spectrum Disorder (ASD), with an emphasis on strategies such as video modeling, social skills training, sensory integration, and vocational training. Publications published between 2015 and 2025 in the PubMed, Scopus, and SciELO databases were analyzed. The results indicate that OT plays a significant role in promoting autonomy, social inclusion, and functionality in these individuals. However, challenges remain related to the generalization of acquired skills to natural environments, the sustainability of long-term therapeutic gains, and the cultural adaptation of interventions. It is concluded that, although promising, therapeutic practices require personalization, ongoing support, and greater production of evidence through longitudinal and culturally contextualized studies.
Keywords: Occupational therapy; autism spectrum disorder; adults; therapeutic interventions; social inclusion.
RESUMEN
Este artículo presenta una revisión sistemática de la literatura sobre intervenciones de Terapia Ocupacional (TO) dirigidas a adultos con Trastorno del Espectro Autista (TEA), con énfasis en estrategias como el modelado de video, el entrenamiento en habilidades sociales, la integración sensorial y la formación vocacional. Se analizaron las publicaciones entre 2015 y 2025 en las bases de datos PubMed, Scopus y SciELO. Los resultados indican que la TO juega un papel importante en la promoción de la autonomía, la inclusión social y la funcionalidad de estos individuos. Sin embargo, siguen existiendo desafíos relacionados con la generalización de las habilidades adquiridas a los entornos naturales, la sostenibilidad de los resultados terapéuticos a largo plazo y la adaptación cultural de las intervenciones. Se concluye que, si bien prometedoras, las prácticas terapéuticas requieren personalización, apoyo continuo y mayor producción de evidencia mediante estudios longitudinales y contextualizados culturalmente.
Palabras clave: terapia ocupacional; trastorno del espectro autista; adultos; intervenciones terapéuticas; inclusión social.
1. INTRODUÇÃO
Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5-TR; American Psychiatric Association, 2014), o Transtorno do Espectro Autista (TEA), anteriormente classificado como Transtorno Invasivo do Desenvolvimento (TID), foi reconfigurado para englobar uma gama mais ampla de condições do neurodesenvolvimento. Embora frequentemente diagnosticado na infância, observa-se um número crescente de diagnósticos na fase adulta (Montalvão Morais et al., 2022; Alves, 2024). Isso demonstra que o TEA afeta indivíduos em todas as faixas etárias, contrariando a concepção de que se trata de uma condição exclusivamente infantil.
As pessoas com TEA compartilham características como dificuldades persistentes na comunicação social e a presença de comportamentos repetitivos e interesses restritos. No entanto, a especificidade individual e a ausência de marcadores biológicos objetivos dificultam o diagnóstico precoce e preciso (Reis et al., 2019; Nalin et al., 2022). Apesar dos avanços na compreensão do TEA, os fatores etiológicos permanecem inconclusivos, com hipóteses multifatoriais que, embora promissoras, ainda carecem de comprovação definitiva (Graf et al., 2017). Além disso, a escassez de profissionais qualificados para o atendimento dessa população e a heterogeneidade clínica apresentada por cada indivíduo (Harris, 2016), muitas vezes associada a comorbidades, impõem desafios adicionais aos sistemas de saúde, educação e assistência social.
Esses serviços precisam oferecer suporte contínuo aos adultos com TEA, que, mesmo com suas limitações, demandam oportunidades de viver com autonomia, qualidade de vida e inclusão social. Nesse contexto, a Terapia Ocupacional (TO) tem se destacado como uma área estratégica, atuando de forma interdisciplinar para promover a funcionalidade, a participação social e a independência desses indivíduos.
A TO se concentra no ensino de habilidades funcionais, sociais, educacionais e vocacionais, capacitando os adultos com TEA a participarem de atividades cotidianas com maior independência e autossuficiência. Suas abordagens buscam responder não apenas às demandas motoras ou cognitivas, mas também às necessidades sociais, essenciais para a integração no mercado de trabalho, no convívio familiar e na comunidade (Pereira et al., 2020).
Nos últimos dez anos, diversos estudos investigaram o papel da TO no apoio a adultos com TEA, com ênfase na aprendizagem de habilidades que favoreçam sua funcionalidade diária (Souza & Martins, 2021). Entretanto, os desafios persistem, principalmente no que se refere à generalização e à manutenção das habilidades aprendidas em contextos naturais. A eficácia das intervenções depende de fatores como a personalização dos atendimentos, o trabalho colaborativo entre profissionais e a adaptação cultural das práticas terapêuticas (Almeida et al., 2022).
Diante desse cenário, o presente estudo tem como objetivo analisar os avanços mais recentes nas intervenções de Terapia Ocupacional para adultos com TEA, destacando os métodos mais eficazes para o ensino de habilidades e apontando as lacunas que ainda permanecem. A pesquisa concentra-se nas publicações da última década, buscando identificar práticas promissoras e áreas que demandam aprofundamento para garantir a inclusão social e profissional de adultos no espectro autista.
2. DESENVOLVIMENTO
A Terapia Ocupacional (TO) tem se consolidado como uma abordagem imprescindível para a promoção da autonomia em indivíduos com Transtorno do Espectro Autista (TEA), particularmente na fase adulta (American Psychiatric Association, 2014). Apesar das limitações inerentes a essa população, a necessidade de desenvolver competências que possibilitem maior independência em atividades cotidianas — tais como higiene pessoal, alimentação, mobilidade, bem como habilidades laborais e sociais — é premente (Alves, 2024; Nalin, Matos, Vieira, & Orsolin, 2022). Dentre as práticas terapêuticas utilizadas, destacam-se a vídeo modelagem, o treinamento de habilidades sociais, a intervenção sensorial e o treinamento vocacional, cada qual com características, desafios e resultados específicos (Pereira, Gomes, & Oliveira, 2020; Rodrigues, Fernandes, & Souza, 2020).
A vídeo modelagem consiste em uma técnica que utiliza registros audiovisuais para demonstrar comportamentos alvo, que são posteriormente reproduzidos pelos indivíduos, facilitando a aprendizagem de novas habilidades. Esta abordagem tem se revelado particularmente eficaz no ensino de habilidades sociais e comportamentais em adultos com TEA, promovendo a compreensão de ações esperadas, sobretudo em contextos nos quais a comunicação verbal é um obstáculo (Carmo, Nogueira, & Andrade, 2024). Pesquisas recentes evidenciam que a vídeo modelagem não só contribui para o desenvolvimento social, mas também favorece a inclusão no mercado de trabalho, auxiliando em situações como entrevistas e interações sociais complexas (Mapurunga, Santos, & Oliveira, 2021).
Adicionalmente, o treinamento de habilidades sociais visa aprimorar a capacidade do indivíduo de interagir adequadamente em diferentes contextos, promovendo a compreensão das normas sociais e o comportamento apropriado. Indivíduos com diagnóstico tardio frequentemente apresentam dificuldades no reconhecimento de sinais sociais, como expressões faciais e linguagem corporal, as quais podem ser mitigadas por programas estruturados que empregam estratégias como jogos de papéis, ensino de empatia e grupos de interação social (Barros, 2023, 2024). Tais intervenções demonstram eficácia na melhoria das relações interpessoais e no fortalecimento da autoconfiança em situações cotidianas.
No que tange à intervenção sensorial, está objetiva otimizar a resposta do indivíduo aos estímulos sensoriais, tendo em vista que muitos adultos com TEA apresentam hipersensibilidade ou hipossensibilidade que impacta negativamente a realização de atividades diárias e a interação com o ambiente (Souza & Silva, 2022). Por meio de estratégias de integração sensorial, os terapeutas ocupacionais promovem o processamento eficiente desses estímulos, proporcionando maior conforto e autonomia. Essas intervenções são comumente aplicadas em atividades relacionadas à alimentação, vestuário e organização do espaço domiciliar, demonstrando potencial para reduzir comportamentos desafiadores, adaptando o ambiente às necessidades sensoriais específicas (Figueira & Almeida, 2021).
O treinamento vocacional e a promoção da inclusão no mercado de trabalho constituem outra vertente relevante das intervenções de TO. Estudos indicam que a TO contribui para o desenvolvimento de habilidades práticas e sociais necessárias ao desempenho profissional, por meio de adaptações ambientais e treinamentos específicos (Souza & Martins, 2021; Lima & Silva, 2023). Embora tais estratégias tenham evidenciado melhora na empregabilidade e produtividade, persistem desafios relativos à compreensão e apoio por parte dos empregadores, bem como à necessidade de ações que favoreçam a aceitação e a integração desses indivíduos no ambiente laboral (Mapurunga, Santos, & Oliveira, 2021).
Entretanto, as intervenções de TO enfrentam desafios consideráveis. Destaca-se a dificuldade na generalização das habilidades adquiridas em contextos terapêuticos para ambientes cotidianos, uma vez que a transferência dessas competências depende do envolvimento do círculo social do indivíduo e da adequação das intervenções a diferentes contextos (Figueira & Almeida, 2021; Pereira, Gomes, & Oliveira, 2020). A manutenção dos ganhos a longo prazo constitui outro desafio, uma vez que os efeitos terapêuticos tendem a se reduzir na ausência de acompanhamento contínuo (Harris, 2016). Assim, o suporte prolongado — incluindo terapia, suporte social e profissional — revela-se fundamental para garantir a funcionalidade e autonomia ao longo da vida adulta (Figueira & Almeida, 2021).
Ademais, a adaptação cultural das intervenções é um aspecto crucial. As práticas de TO devem ser sensíveis às diferenças culturais, sociais e econômicas dos indivíduos, especialmente no contexto brasileiro, onde fatores como acesso aos serviços de saúde, o papel da família e normas culturais influenciam significativamente a eficácia das intervenções (Almeida, Santos, & Lima, 2022; Reis, Tomaz, & Franco, 2019). Estratégias bem-sucedidas em determinados contextos podem não apresentar o mesmo efeito em outros, o que ressalta a necessidade de personalização das técnicas (Almeida, Santos, & Lima, 2022).
Para mitigar tais limitações, recomenda-se que futuras pesquisas direcionem-se para a realização de estudos longitudinais que avaliem os impactos das intervenções ao longo do tempo, além de investigarem formas de promover a generalização e a transferência das habilidades para o cotidiano (Figueira & Almeida, 2021). A integração multidisciplinar, envolvendo terapeutas ocupacionais, psicólogos, assistentes sociais, educadores e familiares, é igualmente imprescindível para a constituição de um suporte abrangente, maximizando os resultados terapêuticos (Lima & Silva, 2023). Por fim, a personalização das intervenções, respeitando as particularidades individuais e contextuais, deve ser prioridade para a ampliação da eficácia das abordagens (Barros, 2024; Montalvão Morais, Furini Lazaretti, Sayuri Nakamura de Vasconcelos, & Pujals, 2022).
Em síntese, a Terapia Ocupacional desempenha papel fundamental na melhoria da funcionalidade, socialização e inserção profissional de adultos com TEA, ainda que desafios como a generalização e a manutenção dos ganhos terapêuticos persistam. O investimento em pesquisas, práticas individualizadas e estratégias integradas é essencial para que as intervenções atinjam seu pleno potencial, promovendo uma vida adulta mais independente e inclusiva para essa população
2.1 Metodologia
Este estudo adotou uma abordagem de revisão sistemática da literatura, com o objetivo de analisar intervenções de Terapia Ocupacional (TO) voltadas a adultos com Transtorno do Espectro Autista (TEA). A busca foi realizada nas bases de dados PubMed, Scopus e SciELO, selecionadas por sua relevância e abrangência em publicações das áreas da saúde, ciências sociais aplicadas e contextos latino-americanos.
Foram incluídos estudos empíricos publicados entre janeiro de 2015 e abril de 2025, que investigassem intervenções de TO para adultos com TEA. Neste primeiro momento foram identificados 48 artigos relacionados. Em seguida foram separados os estudos elegíveis, os quais incluíram observacionais, ensaios clínicos randomizados, estudos de corte e caso-controle, desde que abordassem intervenções voltadas ao ensino de habilidades funcionais, sociais ou vocacionais, nesse filtro restaram 28 artigos. Por fim, foram excluídos artigos que não apresentavam resultados empíricos, bem como aqueles que tratavam exclusivamente de populações pediátricas ou de intervenções não ocupacionais, como farmacológicas ou psicológicas. Estudos que abordavam múltiplos diagnósticos, sem delimitação clara da população adulta com TEA, também foram descartados.
A estratégia de busca utilizou operadores booleanos (AND, OR) com combinações de palavras-chave, tais como:
- “Terapia Ocupacional” AND “Transtorno do Espectro Autista” AND “Adultos”;
- “Habilidades Funcionais” OR “Habilidades Sociais” AND “TEA” AND “Intervenção”;
- “Autismo” AND “Terapia Ocupacional” AND “Inclusão Social” AND “Emprego”.
Restando apenas 28 artigos, a triagem dos estudos ocorreu em duas fases: análise de títulos e resumos, seguida da leitura integral dos textos potencialmente relevantes. Após a triagem, 12 artigos atenderam a todos os critérios de elegibilidade e foram incluídos na análise final. A análise dos dados foi qualitativa, concentrando-se na categorização das intervenções, avaliação dos resultados relatados e identificação das ferramentas e instrumentos utilizados. As intervenções foram classificadas nas seguintes categorias:
- Treinamento de habilidades sociais,
- Vídeo modelagem,
- Integração sensorial,
- Intervenções baseadas em análise do comportamento.
Os resultados foram analisados quanto aos impactos nas habilidades funcionais (como higiene pessoal, alimentação e mobilidade), habilidades sociais, participação em ambientes de trabalho e comunitários, além do grau de autonomia dos participantes. Também foram examinados os métodos de avaliação utilizados, incluindo escalas comportamentais, instrumentos de qualidade de vida e observações diretas. Por fim, foram considerados aspectos como duração e frequência das intervenções, visando explorar possíveis relações entre o tempo de exposição e os resultados alcançados.
2.1.2 Resultados
A análise dos estudos selecionados revelou um conjunto diversificado de intervenções de Terapia Ocupacional (TO) voltadas para adultos com Transtorno do Espectro Autista (TEA), agrupadas nas seguintes categorias principais: (1) treinamento de habilidades sociais, (2) vídeo modelagem, (3) integração sensorial e (4) treinamento vocacional. Cada uma dessas abordagens apresentou contribuições distintas para o desenvolvimento da autonomia, funcionalidade e inclusão social dos participantes.
O treinamento de habilidades sociais foi a intervenção mais recorrente, com destaque para formatos de grupos terapêuticos estruturados e uso de roteiros sociais. Os resultados indicaram melhora significativa na capacidade dos indivíduos em iniciar e manter conversações, reconhecer emoções alheias e gerenciar conflitos interpessoais (Barros, 2023). Em alguns estudos, observou-se também a generalização parcial dessas habilidades para contextos não terapêuticos, como o ambiente de trabalho.
A vídeo modelagem foi descrita como uma estratégia eficaz para o ensino de habilidades específicas, como o uso de transporte público, realização de tarefas domésticas e comportamentos apropriados em ambientes sociais (Carmo et al., 2024). Essa abordagem demonstrou eficácia especialmente em adultos com maior nível de suporte necessário, permitindo a repetição de modelos comportamentais e favorecendo a aprendizagem visual. A maioria dos estudos que utilizaram vídeo modelagem relatou ganhos imediatos nas habilidades-alvo, embora poucos tenham avaliado a manutenção desses ganhos ao longo do tempo.
As intervenções de integração sensorial destacaram-se por seu impacto na autorregulação emocional e na redução de comportamentos disruptivos, especialmente em adultos com sensibilidade sensorial elevada (Souza & Silva, 2022; Barros, 2024). As atividades incluíram uso de salas sensoriais, exercícios proprioceptivos e estratégias de autorregulação incorporadas à rotina diária. Os resultados sugerem que a estabilização do processamento sensorial pode melhorar o engajamento em atividades funcionais e sociais.
O treinamento vocacional abordou desde oficinas preparatórias até a inserção supervisionada no mercado de trabalho (Mapurunga et al., 2021; Souza & Martins, 2021). A Terapia Ocupacional teve papel central na adaptação das tarefas laborais às capacidades individuais, no treino de comportamentos esperados em ambientes profissionais e no suporte aos empregadores. Os estudos relataram avanços na manutenção dos empregos e aumento da autoestima dos participantes, embora ressaltem a necessidade de suporte contínuo e articulação com políticas públicas de inclusão.
Apesar dos resultados promissores, a maioria dos estudos analisados apresentou limitações metodológicas, como amostras reduzidas, ausência de grupos controle, curto período de acompanhamento e heterogeneidade dos instrumentos de avaliação (Rodrigues et al., 2020; Figueira & Almeida, 2021). Além disso, poucos estudos consideraram aspectos culturais na adaptação das intervenções (Lima & Silva, 2023), e apenas dois realizaram acompanhamento longitudinal superior a seis meses.
2.1.3 Discussão
As intervenções de Terapia Ocupacional (TO) têm demonstrado impacto positivo na promoção da autonomia, inclusão social e qualidade de vida de adultos com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Estratégias como vídeo modelagem, treinamento de habilidades sociais e intervenção sensorial se destacam como abordagens promissoras, contribuindo significativamente para o desenvolvimento de competências funcionais e sociais.
A vídeo modelagem tem se mostrado particularmente eficaz devido ao seu caráter visual, estruturado e repetitivo, o que facilita a aquisição de habilidades em indivíduos com dificuldades de comunicação verbal. Além disso, sua aplicação em contextos naturais, como o ambiente de trabalho, contribui para a transferência das habilidades aprendidas (Carmo et al., 2024; Mapurunga et al., 2021). O treinamento de habilidades sociais, com o uso de dramatizações e programas estruturados, tem promovido avanços nas interações interpessoais; no entanto, ainda são limitadas as evidências sobre sua eficácia em contextos espontâneos e imprevisíveis, como interações sociais informais (Barros, 2023). Já as intervenções sensoriais têm mostrado benefícios no manejo comportamental e na realização de atividades cotidianas, mas carecem de avaliações sistemáticas sobre seus efeitos em médio e longo prazo.
Apesar desses avanços, a generalização das habilidades aprendidas para contextos da vida real permanece um dos principais desafios identificados. Grande parte dos estudos concentra-se em ambientes clínicos ou controlados, negligenciando a eficácia das intervenções em situações práticas, como o ambiente laboral, o convívio familiar ou a participação comunitária. A ausência de estratégias específicas para promover essa transferência compromete o alcance dos objetivos terapêuticos.
Outro ponto crítico é a manutenção dos ganhos terapêuticos ao longo do tempo. A literatura indica que, sem suporte contínuo, muitos dos avanços obtidos durante a intervenção tendem a se perder. Essa limitação reforça a necessidade de programas de acompanhamento e suporte prolongado, que envolvam não apenas profissionais da saúde, mas também familiares, educadores e empregadores.
A adaptação cultural das intervenções também surge como uma questão central. Muitas das práticas e protocolos terapêuticos em TO são desenvolvidos em países ocidentais, com realidades socioculturais e econômicas diferentes daquelas observadas no Brasil e em outras regiões da América Latina. Fatores como o papel central da família no cuidado, as desigualdades no acesso aos serviços de saúde e as condições socioeconômicas interferem diretamente na eficácia das intervenções. Estudos conduzidos em contextos latino-americanos (Mapurunga et al., 2021; Barros, 2023) apontam que estratégias que incorporam a cultura local e priorizam ações comunitárias tendem a apresentar maior efetividade. Ainda assim, esses estudos são escassos, evidenciando a necessidade de maior investimento em pesquisas regionalizadas.
A escassez de estudos longitudinais representa outra lacuna relevante. A maioria das pesquisas analisadas adota delineamentos transversais, limitando-se à avaliação de efeitos imediatos. No entanto, compreender a sustentabilidade dos resultados ao longo do tempo é essencial, especialmente no que se refere à inclusão profissional e à participação social. Estudos de longo prazo permitiriam não apenas verificar a manutenção das habilidades, mas também identificar fatores que influenciam sua continuidade.
Diante desse cenário, é fundamental que futuras intervenções sejam integradas aos contextos naturais de vida dos adultos com TEA, favorecendo a generalização das habilidades e a promoção da autonomia. A personalização das abordagens, com base nas necessidades individuais e no perfil funcional do indivíduo, bem como a adaptação cultural das práticas e a colaboração interdisciplinar, são estratégias que podem potencializar os resultados. A atuação conjunta entre terapeutas ocupacionais, psicólogos, educadores, assistentes sociais e familiares possibilita uma abordagem mais abrangente e centrada na pessoa.
Por fim, o fortalecimento da prática baseada em evidências no campo da Terapia Ocupacional requer a ampliação de pesquisas longitudinais, culturalmente contextualizadas e focadas na eficácia real das intervenções. A produção de evidências robustas é essencial para embasar políticas públicas, orientar práticas profissionais e garantir uma maior inclusão e qualidade de vida para adultos com TEA.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Terapia Ocupacional (TO) desempenha um papel central na promoção da autonomia, funcionalidade e inclusão social de adultos com Transtorno do Espectro Autista (TEA). As intervenções analisadas nesta revisão — como vídeo modelagem, treinamento de habilidades sociais e integração sensorial — demonstram eficácia no desenvolvimento de competências essenciais para a vida cotidiana, contribuindo para a aquisição de habilidades funcionais, sociais e vocacionais. Quando aplicadas de forma adequada, essas estratégias favorecem melhorias significativas na qualidade de vida e na participação ativa dos indivíduos em diversos contextos sociais e profissionais.
No entanto, persistem desafios relevantes que limitam o impacto das intervenções. A generalização das habilidades adquiridas para ambientes naturais, como o local de trabalho e as interações sociais do dia a dia, ainda é incipiente. Para que os ganhos terapêuticos sejam efetivamente transferidos para a vida real, é fundamental que as práticas sejam contextualizadas, envolvendo familiares, colegas de trabalho e membros da comunidade no processo terapêutico. Da mesma forma, a manutenção dos resultados ao longo do tempo exige estratégias de suporte contínuo, aspecto ainda pouco explorado na literatura atual.
A adaptação cultural das intervenções constitui outro ponto crítico. Muitas abordagens terapêuticas são originadas em contextos ocidentais e não consideram adequadamente as especificidades culturais, sociais e econômicas de países como o Brasil. Diante disso, torna-se imprescindível o desenvolvimento de práticas terapêuticas sensíveis às realidades locais, que respeitem a diversidade e promovam maior equidade no acesso e nos resultados das intervenções.
A falta de estudos longitudinais representa uma limitação importante para o avanço da prática baseada em evidências. A predominância de delineamentos transversais impede uma compreensão aprofundada da sustentabilidade dos efeitos terapêuticos ao longo do tempo. Assim, é urgente o investimento em pesquisas longitudinais, multicêntricas e culturalmente contextualizadas, que possam orientar a adaptação e a evolução das estratégias de intervenção.
Em síntese, embora as práticas de Terapia Ocupacional apresentem alto potencial para promover a inclusão, a autonomia e a participação social de adultos com TEA, ainda há um campo amplo a ser desenvolvido. O aprimoramento das intervenções depende da personalização das abordagens, da incorporação de aspectos culturais e do acompanhamento terapêutico contínuo. Somente com esses avanços será possível garantir que indivíduos com TEA tenham acesso a uma vida adulta mais plena, participativa e autônoma na sociedade.
4. REFERÊNCIAS
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