INTERVENÇÃO FONOAUDIOLÓGICA NA DISFAGIA EM UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA – ADULTO 

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7826921


Katiane de Lima Pereira
Orientadora: Christiane Lopes de Albuquerque Meirelles


RESUMO

O fonoaudiólogo é o profissional habilitado para avaliar e reabilitar as alterações no processo de deglutição na Unidades de Terapia Intensiva (UTI), através do conhecimento da anatomia e fisiologia do sistema miofuncional orofacial, podendo realizar avaliações criteriosas e direcionar com propriedade a reabilitação, reduzindo complicações e contribuindo para qualidade de vida. Sendo a disfagia um sintoma frequente nas UTIs, faz-se necessário a divulgação da contribuição fonoaudiológica neste ambiente.

Palavras-chave: Disfagia; Deglutição; UTI e Fonoaudiologia.

ABSTRACT

The speech therapist is the professional qualified to evaluate and rehabilitate the changes in the process of deglutition in the Intensive Care Units (ICU), through the knowledge of the anatomy and physiology of the orofacial myofunctional system, being able to make judicious evaluations and appropriately direct the rehabilitation, reducing complications And contributing to quality of life. Since dysphagia is a frequent symptom in ICUs, it is necessary to disseminate the speech-language pathology contribution in this environment.

Keywords: Diffuse; Swallowing; ICU and Phonoaudiology.

  1. INTRODUÇÃO

As disfagias são alterações  no processo de deglutição, que dificulta ou impossibilita a alimentação por via oral de forma segura e eficiente, podendo ser de origem congênita ou adquirida,  pode ser decorrente de traumatismo de cabeça e pescoço, acidentes vasculares cerebrais, doenças neuromusculares degenerativas, câncer de cabeça e pescoço, demências e encefalopatias. Podendo resultar em desnutrição, desprazer na alimentação e broncoaspiração, consequentes de patologias e seus tratamentos (ANDRADE, 2012). 

O fonoaudiólogo é o profissional que atua junto a equipe multidisciplinar na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), e que desempenha papel específico no gerenciamento das disfagias orofaríngeas (DO), prevenindo pneumonias aspirativas, bem como possibilitando a reintrodução da alimentação por via oral de forma segura. Desta forma, favorecendo a redução de custos hospitalares, promovendo altas mais rápidas, melhorando a qualidade de vida dos pacientes (FURKIM et al., 2015).

Alguns fatores, como a intubação orotraqueal, presença de traqueostomia, períodos prolongados de ventilação mecânica e alterações neurogênicas, estão associados a grande ocorrência de alterações relacionadas à deglutição em  UTI, tornando fundamental o trabalho fonoaudiológico neste ambiente, de forma a minimizar as complicações e agravos à saúde relacionados à desnutrição, desidratação e as pneumonias aspirativas (ALBUQUERQUE, 2014).  

Estudos mostram que é alta a prevalência de DO nas UTIs, observando que mais da metade dos pacientes internados neste ambiente apresentam alterações no processo de deglutição, justificando a necessidade de avaliação e intervenção fonoaudiológica (PADOVANI et al., 2013). 

O presente trabalho pretende divulgar a importância da intervenção fonoaudiológica nas UTIs. Para isso, caracterizamos a disfagia e sua relação com pacientes de UTIs, apresentando os principais riscos  destes pacientes e discutiremos as principais vantagens da atuação fonoaudiológica nesse ambiente.

Foi realizada revisão bibliográfica em artigos e livros. Foram analisados os estudos que envolvessem indivíduos em estado crítico nas UTIs, a atuação fonoaudiológica nas alterações relacionadas à deglutição e as complicações acometidas pelas disfagias.  Os artigos foram pesquisados nos portais Scielo, Google Acadêmico e BIREME. A pesquisa foi realizada a partir dos seguintes descritores: disfagia, Unidade de Terapia Intensiva, fonoaudiologia hospitalar e transtorno o de deglutição. Foram recuperados 49 artigos dos quais foram selecionados 22 mediante os critérios de: disfagia, deglutição, transtornos da deglutição, UTI e fonoaudiologia.

  1. DEGLUTIÇÃO 

A deglutição é processo sinérgico resultante da ação de estruturas osteomioarticulares que ocorre de forma sincrônica, harmônica e organizada, que leva o alimento da cavidade oral até o estômago (MARCHESAN, 1999).

2.1 FISIOLOGIA DA DEGLUTIÇÃO 

A deglutição é composta por fases sequenciais e harmônicas que se relacionam e se dividem em: fase oral, faríngea e esofagogástrica (PATATAS, 2011).

2.1.1 FASE ORAL 

Que podendo ser subdividida em estágios: 

A) Antecipatória : fase que antecede a chegada do alimento à boca. Quando são feitas as primeiras modulações cerebrais que preparam o corpo para receber o alimento. Envolve características como cheiro, textura, cor. 
B) Captação: é a forma como o alimento é captado do utensílio.Depende de boa movimentação labial e vedamento. 
C) Qualificação: caracteriza-se pela percepção de inúmeras características, como volume, consistência, densidade e grau de umidificação do bolo alimentar.
D) Preparo: momento de aceitação do alimento na boca partindo de respostas, olfativas, gustativas, tátil, térmica e salivação. Assim o alimento é reconhecido pela boca e inicia-se o processo de mastigação do alimento, triturando-o junto a uma ação coordenada da musculatura da face, língua e mandíbula, transformando-o em um bolo de textura homogênea em condições adequadas para ser deglutido.
E) Organização : O alimento será posicionado sobre a língua, organizando-se para ejeção. 
F) Ejeção: propulsão do bolo alimentar posteriormente em movimentos ondulatórios. A partir do contato com os pilares anteriores e rebaixamento do palato mole, é gerado estímulo que dispara o reflexo para fase faríngea (YAMADA et al., 2004).

2.1.2 FASE FARÍNGEA:

Na fase faríngea, ocorre o trânsito do bolo alimentar para o esôfago, envolvendo complexa sequência. Ocorre a elevação e a posição do palato mole, promovendo a separação da naso e orofaringe, evitando regurgitação nasal de alimentos. Em sequência ocorre contração da musculatura faríngea em sentido crânio-caudal, associada à apnéia preventiva, fazendo uma pausa respiratória. Associados aos eventos faríngeos ocorrem os mecanismos de proteção de vias aéreas, que excluem a via aérea da via digestiva e impedem a entrada de alimento na via aérea inferior. Ocorre, elevação e anteriorização do complexo hiolaríngeo, adução glótica e aproximação de pregas vestibulares seguidos da abertura da transição faringoesofágica iniciando a fase esofagogástrica (MARCHESAN, 1999).

2.1.3 FASE ESOFAGOGÁSTRICA:

Através de movimentos involuntários, o bolo é transportado por contração e ação da gravidade, até o esfíncter esofágico inferior pelas ondas peristálticas. Chegando ao estômago em um espaço de trânsito entre 8 e 20s (JOTZ; DORNELES, 2009).

  1. UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA -UTI

Em 1950, em função de uma epidemia de poliomielite, onde os pacientes acometidos pela doença necessitam de suporte ventilatório mecânico e cuidados intensivos, surgiram os primeiros conceitos de uma unidade de terapia intensiva (UTI). Atualmente o objetivo permanece, com a intenção de manter uma estrutura adequada provendo assistência necessária para o paciente em estado grave e que precisa de cuidados intensivos da equipe de saúde. Podendo ser especializadas ou gerais. (MAZZA, 2015).         

A UTI é composta por uma vasta gama de equipamentos tecnológicos avançados capazes de monitorar e auxiliar na manutenção dos sinais vitais dos pacientes. deve possuir equipamentos e instrumentos de acordo com a complexidade do serviço e necessários ao atendimento de sua demanda, geralmente cada leito contém monitores cardíacos, cama elétrica projetada, oximetria de pulso e rede de gases. É comum a utilização dos principais equipamentos: termômetro, oxímetro de pulso, eletrocardiográfico, monitor de pressão arterial, máscara e cateter de oxigênio, cateter central, tubo orotraqueal, ventilador mecânico (MARTINS, 2005), Conforme figura 1:

Figura 1. Unidade de Terapia Intensiva.

Fonte: Campo Grande News,2016

A rotina em geral preconiza visitas multidisciplinares, através de “rounds “ clínicos de forma que os pacientes sejam avaliados e os casos discutidos entre a equipe, favorecendo o prognóstico, diminuindo complicações, estabelecendo diferenciação de tipos de conduta, em conjunto (BOLERA, 2003).

  1. A UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA E OS IMPACTOS SOBRE A DEGLUTIÇÃO 

Nas UTIs de modo geral os pacientes encontram-se debilitados, clinicamente instáveis, aumentado o risco para desenvolverem alterações durante o processo de deglutição. Essas condições podem impactar na segurança da deglutição , causando a entrada de alimento no trânsito aéreo, o que poderá resultar em, aspirações, aumento do risco de pneumonia aspirativa devido às dificuldades do funcionamento dos mecanismos de defesa destes pacientes (FURKIM et al., 2015).

Tendo em vista as sérias complicações que podem ocorrer em qualquer parte do trato digestivo, as alterações que ocorrem nas fases oral e faríngea são as que mais necessitam da presença do fonoaudiólogo. Assumindo assim uma grande responsabilidade, considerando o grande número de aspirações silentes, ou seja, microaspirações pulmonares sem sinais aparentes de disfagia durante a alimentação, desta forma o fonoaudiólogo permite a prevenção e redução, diminuindo os índice dessas complicações (MORAES, 2006).  

Os sinais e sintomas da disfagia são variados e podem se apresentar de diversas formas,  como por exemplo: 

Desorganização e diminuição no controle e movimentos da língua, desordem da mastigação, aumentando seu tempo e a alimentação com diminuição do apetite, dificuldade de iniciar a deglutição, dificuldade para determinadas consistências, regurgitação nasal, presença de resíduo de alimento na boca, controle de saliva diminuído, presença de tosses e engasgo durante as refeições, sensação de alimentos parados na faringe, podendo também apresentar desidratação, perda de peso, pneumonia aspirativa, ausência de elevação faringea e presença de alterações vocais, como voz molhada rouca e soporosa (ANDRADE, 2012).

4.1 FATORES DE RISCO PARA OCORRÊNCIA DE DISFAGIA NA UTI E SEUS IMPACTOS.  

Pacientes internados em UTI apresentam risco elevado em desenvolver disfagia, podendo variar de acordo com a doença de base, tempo de permanência de intubação orotraqueal e a população em questão.  Considerando a idade, doenças pulmonares, doenças neurológicas, câncer de cabeça e pescoço e ventilação artificial prolongada como os principais fatores de risco para a ocorrência de disfagia neste ambiente. Dentre esses, incluem o rebaixamento do nível de consciência, a posição corporal, a presença de traqueostomia, sondas nasogástricas e/ ou tubo endotraqueal. (PADOVANI et al., 2013). 

Um dos recursos fundamentais utilizados na UTI é a ventilação artificial para manutenção e restabelecimento da mecânica respiratória adequada, que consiste em método de suporte ventilatório empregado em casos em que o indivíduo não seja capaz de manter níveis adequados de oxigênio e gás carbônico sanguíneo. É indicada em descontrole da dinâmica respiratória na qual ocorra a necessidade de dispositivo externo para manter a troca gasosa, podendo ser empregada por intubação orotraqueal ou por traqueostomia (CARVALHO; TOUFEN; FRANÇA, 2007).

Todavia, a ventilação mecânica prolongada pode resultar em incoordenação entre deglutição e respiração, além de alterações morfofuncionais como: diminuição da elevação laríngea, redução da sensibilidade faríngea e laríngea, além de diminuição da pressão aérea subglótica podendo comprometer significativamente a deglutição (RODRIGUES, 2015).

Estudos têm demonstrado que indivíduos submetidos à ventilação mecânica via intubação translaríngea e/ou traqueostomia apresentam com frequência alteração na deglutição e broncoaspiração (SIMÃO, 2009).

A presença do tubo orotraqueal por tempo superior a 48 horas pode alterar mecanoreceptores e quimiorreceptores da mucosa faríngea e laríngea, causando alteração no reflexo de deglutição  e transtornos à função laríngea, alterando a competência glótica ,  comprometendo os mecanismos protetores  , aumentando o risco de invasão de alimentos e saliva nas vias aéreas (ALBUQUERQUE; DAVID, 2015).

A traqueostomia (Fig. 2) pode impor limitações morfofuncionais ao processo de deglutição devido à obstrução esofageana, redução da pressão aérea subglótica e redução da elevação e anteriorização da laringe. É considerada fator de alto risco para broncoaspiração , que geralmente é silente, ou seja, sem sinais clínicos, principalmente se associada ao uso de cuff  (SIMÃO, 2009). 

Figura 2. Traqueostomia


C:\Users\Patrick-\Downloads\traqueostomia.jpg

Fonte: ABC MED,2016

Dentre os altos índices de acometimento da  disfagia estão os  pacientes idosos. As mudanças estruturais, funcionais e neurais decorrentes do processo de  envelhecimento, que acabam comprometendo os órgãos e funcionamento necessários para os padrões adequados de deglutição, assim ocasionando alterações, também denominadas como presbifagia. A hipotonia muscular da boca e da faringe, perda dos referenciais orais, redução do tônus muscular e incoordenação, são aspectos observados na população idosa própria de envelhecimento, sendo significativos para ocorrência de disfagia. O aumento desta prevalência está associado tanto em função da idade, quanto à ocorrência de comorbidades relacionadas ao avanço da idade e seus tratamentos ( MITRE, 2003).

As disfagias também podem ser decorrentes de Acidente Vascular Encefálico (AVE), que se trata de uma doença circulatória nas artérias cerebrais, causadora de deficiência motora adquirida e é responsável por 80% das incapacidades, bem como outras alterações como na fala e deglutição (JACQUES, 2011). 

Estudo observou que pacientes que sofreram AVE, apresentaram os seguintes sintomas: predomínio de atraso do reflexo de deglutição em (76%), resíduo em recesso faríngeo (60%), dificuldade de propulsão do bolo alimentar (56%), presença de tosse antes, durante ou após a deglutição (52%), presença de aspiração antes, durante ou pós a deglutição (48%) e ausência do reflexo de deglutição (12%) (BASSI et al., 2004).

Sendo assim, é fundamental conhecer os principais fatores de risco para ocorrência de disfagia na UTI, considerando inclusive a associação entre esses fatores, que é uma realidade e torna ainda mais complexo o gerenciamento da deglutição nesses pacientes.

  1. INTERVENÇÃO FONOAUDIOLÓGICA 

O fonoaudiólogo é o profissional indicado para identificar os fatores de risco para disfagia na UTI, sendo essencial aos pacientes submetidos à ventilação mecânica e insere-se entre os requisitos mínimos para o funcionamento das UTIs, conforme o Conselho Federal de Fonoaudiologia (BRASIL, 2016) Resolução CFFa nº 492, de 07 de abril de 2016, que dispõe sobre a regulamentação da atuação do fonoaudiólogo em disfagias e dá outras providencias.

Atuando junto à equipe de forma multi e interdisciplinar de forma específica, com avaliação de forma criteriosa e cautelosa, podendo assim observar sinais discretos ou até mesmo diagnosticar pacientes que já apresentam comprometimentos na deglutição. (MORAES et al., 2006)

Tendo como objetivo dentro de uma UTI, identificar precocemente fatores de riscos durante o processo de deglutição, prevenindo complicações, de maneira segura e eficaz, possibilitando o retorno da ingestão por via oral, reduzindo as indicações de alimentação por vias alternativas, diminuindo os riscos de pneumonias aspirativas. Promovendo qualidade de vida para os pacientes. (PADOVANI, 2007).

5.1 RASTREIO DA DISFAGIA E RISCO DE BRONCOASPIRAÇÃO.

As necessidades de avaliação fonoaudiológica podem ser analisadas por meio da utilização protocolo como checklist quanto ao risco para ocorrência da disfagia e broncoaspiração, considerando os seguintes critérios como fatores de risco: IOT superior há 48 horas, traqueostomia com cuff insuflado por tempo prolongado, história prévia de disfagia e de broncoaspiração, senilidade, doenças neurológicas e câncer de cabeça e pescoço, como principais critérios para análise de risco das disfagias nas UTIs. Ao identificar o risco, propõe-se a avaliação especializada com fonoaudiólogo para caracterização da biomecânica da deglutição e comportamentos de risco, auxiliando na definição de uma melhor conduta de reabilitação. (ALBUQUERQUE, 2014). 

5.2  AVALIAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA 

A avaliação fonoaudiológica, visa estabelecer o máximo possível de informações que caracterizem a deglutição para direcionar o condicionamento da conduta terapêutica. 

É realizado inicialmente a avaliação clínica, compondo anamnese e avaliações dos reflexos orais e avaliação vocal. Seguido da avaliação funcional, na qual o paciente será observado durante a refeição para acompanhamento de no mínimo 15 minutos, avaliando a presença de sinais clínicos de aspiração, controle do bolo, mobilidade da laringe durante a deglutição e a qualidade da voz após este processo observando sinais que  podem estar ligados à disfagia, o funcionamento oral, faríngeo e laríngeo, como postura, tônus, movimentos involuntários respiratórios como tosse crônica, respiração encurtada, possibilidade e qualidade de fonação, pois uma voz molhada pode indicar presença de saliva ou secreção na região laríngea, bem como a ausência ou diminuição do reflexo pode indicar disfunção do nervo craniano e de proteção de via aérea (RODRIGUES; GONÇALVES, 2015).

5.2.1. CRITÉRIOS DE ENQUADRAMENTO 

O paciente necessita apresentar condições clínicas adequadas para iniciar a intervenção fonoaudiológica, apresentando estabilidade dos sinais vitais, bem como os aspectos cognitivos e nível de consciência. No entanto, são avaliados a história da disfunção da deglutição, o estado clínico e os órgãos fonoarticulatórios, por meio da avaliação clínica da deglutição e sua relação com a respiração e fonação na avaliação biodinâmica da deglutição (PADOVANI, 2013).

5.2.2. AVALIAÇÃO EM PACIENTES PÓS INTUBAÇÃO OROTRAQUEAL

A avaliação em pacientes pós IOT, deve ser iniciada 24 horas após a extubação em pacientes em pacientes abaixo de 60 anos de idade, acima desta faixa etária a avaliação  deverá ser realizada 48 horas após o procedimento. Este intervalo será essencial para para eliminação da sedação e retorno da sensibilidade laríngea, garantindo a estabilidade e segurança do paciente (RODRIGUES, 2012). 

5.3.3. AVALIAÇÃO EM TRAQUEOSTOMIZADOS

A avaliação em pacientes traqueostomizados, envolve critérios minuciosos, como: a  observação da função dos órgãos fonoarticulatórios; presença e quantidade de secreções orotraqueais. Considerando a presença de reflexos patológicos e ausência de reflexos fisiológicos (BARROS, 2009). 

O uso do corante azul é um método  entre os demais procedimentos de avaliação, auxiliando nas investigações, sendo o corante azul muito utilizado, por ser considerado vantajoso, podendo ser realizado à beira do leito, além de ser rápido e de baixo custo, sem exposições radiológicas, embora indicado apenas para pacientes traqueostomizados.

Descrito como “Teste de corante azul em traqueostomizados”  o Blue Dye Test (Fig. 3), é bastante utilizado na análise da deglutição de saliva ou de alimentos corados com azul em pacientes traqueostomizados seguida de aspiração com cateter quando necessário, classificação brasileira de procedimentos em fonoaudiologia, pelo conselho federal de fonoaudiologia, seu uso é considerado uma ferramenta de grande importância na investigação de pacientes com risco de disfagia, considerado de fácil execução, consiste na aplicação de 4 gotas de 1% da solução de corante alimentício azul no dorso da língua do paciente, seguido de aspirações endotraqueais, em intervalos de 4 horas, monitorado  48h, para registro de possíveis aspirações de saliva. Considerando o resultado positivo para aspiração salivar a ocorrência de secreção corada saindo pela traqueostomia (SUGENO; PIRES, 2015).

Figura 3. Teste do corante azul em traqueostomizados

C:\Users\Patrick-\Downloads\image.png

O teste de análise da deglutição de saliva deve considerar as peculiaridades de cada caso, considerando a biomecânica da deglutição e a capacidade de proteção das vias aéreas, de modo que os resultados irão condicionar a conduta de realimentação e troca ou desmame da traqueostomia. (ALBUQUERQUE, 2014).

O teste modificado inclui a possibilidade de corar alimentos e líquidos durante a avaliação da deglutição, tornando mais fácil identificar a aspiração de alimentos em pacientes traqueostomizados. 

A avaliação funcional da deglutição, por meio da ausculta cervical, é uma avaliação subjetiva que avalia os ruídos da deglutição, que completa a avaliação clínica e pode auxiliar o monitoramento da deglutição durante a terapia. Com auxílio de recurso instrumental, como microfones, acelerômetro, sendo o mais comumente utilizado nas avaliações por fonoaudiólogo, os estetoscópios, com objetivo de avaliar a integridade dos mecanismos da deglutição e mecanismo de proteção das vias aéreas , estabelecendo uma relação entre o tempo dos sons associados a deglutição. O estetoscópio é posicionado, lateralmente, à cartilagem tireóide, auscultando-se a passagem do ar na respiração e depois os ruídos referente a deglutição, analisando o transporte do bolo alimentar, a coordenação entre deglutição e respiração. É um recurso útil em pacientes pós extubação, mas pouco efetiva em pacientes traqueostomizados , considerando a baixa acurácia (CARDOSO et al., 2009).

Incluindo os exames objetivos complementares, de videoendoscopia da  deglutição (VED), muito utilizado por ser bem tolerado pelo paciente, podendo ser realizado à beira do leito, assim evitando que o paciente seja removido de dentro da UTI. 

Figura 4. Videofluoroscopia da deglutição

C:\Users\Patrick-\Downloads\d8d3aaefd9cbf3249277ba28da298104.jpg

Fonte: http://www.langmorefees.com

Também a videofluoroscopia (VFC), considerados padrão-ouro na avaliação da deglutição e diagnóstico de disfagia.  Possibilitando criar um perfil funcional da deglutição, averiguando o método mais adequado de alimentação por via oral, assim como a seleção da consistência da dieta, podendo especificar os riscos durante a alimentação para que possam ser tomadas devidas providências de precauções para cada caso, atribuindo técnicas manobras de terapêuticas e junto à equipe discutir e orientar os cuidadores (RODRIGUES, 2012).

5.3 FONOTERAPIA: TRATAMENTO 

A terapia fonoaudiológica  em pacientes disfágicos na UTI visa estabelecer o retorno da alimentação por via oral de forma eficiente e segura e proteção das vias aéreas. Visto que estes pacientes apresentam risco para aspiração, desnutrição e desidratação, tornando de grande importância a intervenção fonoaudiológica. Dispõe  de técnicas de tratamento direto e indireto da deglutição, na qual a terapia direta introduz o alimento por via oral e reforço dos comportamentos apropriados durante a deglutição através de técnicas para treino com saliva e alimentos de diversas consistências, Incluindo posturas compensatórias quando necessário (SILVA, 2007). 

A Terapia indireta conta com exercícios para melhorar as condições de força, mobilidade e sensibilidade geral do paciente, porém não existe oferta de alimento ao paciente. Esta técnica é muito usada em pacientes com rebaixamento cognitivo ou quando não há colaboração, estimulando os reflexos de proteção e deglutição, evitando aspiração saliva e preparando para retornar à alimentação por via oral (ROCHA, 1998).

Para o tratamento das disfagias é importante considerar a eficácia e eficiência da conduta adotada, logo que o retorno alimentação por via oral com valor nutricional e com segurança na deglutição está diretamente ligada à eficácia do tratamento. Desta forma o impacto positivo na musculatura e dinâmica resultante dos exercícios, mesmo que o paciente não volte a se alimentar por via oral (FURKIM, 2008b).

São utilizados frequentemente manobras de reabilitação, através de movimentos compensatórios, com o objetivo de facilitar ao paciente a alimentação de maneira adequada, de forma a ser retirada gradativamente as manobras tentando produzir uma deglutição normal, bem como as manobras  de limpeza das vias aéreas, compensações posturais e modificação de textura, podendo ser utilizado o uso do espessante, de forma a adequar a consistência do alimento de acordo com a dificuldade do paciente considerando sua condição crítica, principalmente nas UTIs, que no entanto, muitas vezes é necessário a modulação das estratégias. De forma que sejam adotadas conduta adequada e indicação correta para a eficiência da terapia (MORAES; MEDEIROS, 2012).

O tratamento das disfagias nas UTIs dispõe de recursos adicionais, com a finalidade de auxílio nas funções respiratórias e proteção das vias aéreas. Dentre estes, os incentivadores e exercitadores respiratórios como : o Respiron, shaker  e os Thresholds, por exemplo, entretanto apesar de clinicamente utilizados ainda carecem de comprovação científica . 

A válvula de fala é um dos maiores e melhores recursos para tratamento da disfagia em pacientes traqueostomizados. Consistem numa válvula unidirecional na qual o ar é inspirado via traqueostomia mas direcionado na expiração para a via aérea superior , após fechamento do diafragma da membrana que a compõe . Apesar do nome tratar da fala, atualmente considera-se como válvula de fala e deglutição, principalmente a válvula de fala cujo sistema de funcionamento é conhecido como sistema fechado (MANGILLI; ANDRADE; LIMONGI, 2012). 

Restabelece a pressão aérea subglótica e direciona o fluxo aéreo para a via aérea superior, restabelecendo inclusive a sensibilidade faringolaríngea, otimizando os mecanismos de proteção das vias aéreas, com impacto significativo na biomecânica da deglutição com redução da broncoaspiração principalmente de líquidos, sendo contra-indicada nos casos de obstrução alta, impossibilidade de desinsuflar o cuff, Pacientes laringectomizados total, com paralisia bilateral  de pregas vocais e estenose laríngeas, excesso de secreção (RODRIGUES; GHION; GONÇALVES, 2012).   

A reintrodução  da alimentação por via oral parcial ou plena com segurança  com valor nutricional adequado, é a principal meta da intervenção fonoaudiológica e determina a  eficácia da terapia fonoaudiológica. 

CONCLUSÃO

A realização deste trabalho mostrou que embora recente a atuação do fonoaudiólogo no ambiente de unidade intensiva, possui um valor significativo sobre as necessidades encontradas neste ambiente e devemos divulgar as evidências do papel fundamental do fonoaudiólogo junto a equipe multidisciplinar.

Diante da imensa necessidade da alimentação na vida dos seres humanos, tanto quanto aos aspectos de nutrição e hidratação, quanto a capacidade de obter esses valores de forma natural e segura, sendo a ingestão de forma natural, com integridade das estruturas envolvidas neste processo, fundamental para uma vida saudável.

Nas UTIs, a ocorrência de disfagias é de alta prevalência, uma vez que o estado crítico desta população os condicionam ao déficit das funções envolvidas na deglutição, desenvolvendo outras complicações como a diminuição nos mecanismos de defesa, provocando aspirações, problemas pulmonares, má alimentação e até mesmo óbito.

Desta forma a intervenção fonoaudiológica destina-se a evitar complicações, possibilitando melhora no quadro crítico destes pacientes.

Assim, conclui-se que a intervenção fonoaudiológica contribui com eficiência na ampliação da perspectiva do prognóstico dos pacientes nas UTIs, promovendo altas mais rápidas, reduzindo quadros de pneumonias aspirativas, possibilitando a reintrodução alimentar por via oral, melhorando a qualidade de vida destes pacientes. 

REFERÊNCIAS

ALBUQUERQUE, C. Avaliação e intervenção terapêutica fonoaudiológica em disfagia orofaringea na UTI. In: MARCHESAN, I. Q; SILVA, H. J; TOMÉ, M. C. (Orgs.). Tratado de especialidades em Fonoaudiologia. 1. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014. cap. 11.

ALBUQUERQUE, C; DAVID, C. M. Intubação Orotraqueal: Procedimento e Complicações.  In: FURKIM, A. M;  RODRIGUES, K. A. (Orgs.). Disfagia nas Unidades de Terapia Intensiva. 1. ed. São Paulo: Roca, 2015. Cap. 7.

ANDRADE, C. R. F. Prática baseada em evidência na disfagia. In: ANDRADE, C. R. F.;  LIMONGI, S. C. O. (Orgs.). Disfagia: Prática baseada em evidências.  1. ed. São Paulo: Sarvier, 2012. cap. 1.

BARRO, Ana Paula Brandão; PORTAS, Juliana Godoy; QUEIJA, Debora dos santos. Implicações da traqueostomia na comunicação e na deglutição. Rev. Brasileira de cirurgia de cabeça e pescoço. v. 38, n. 3, p. 202-207, Sept. 2009.

BASSI, A. E. R. et al. Associação entre disfagia e o topodiagnóstico da lesão encefálica pós-acidente vascular encefálico. Rev. CEFAC, São Paulo, v. 6, n. 2, 135-142, Jun, 2004. 

BRASIL. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Resolução CFFa nº 492, de 07 de abril de 2016. Dispõe sobre a regulamentação da atuação do profissional fonoaudiólogo em disfagia e dá outras providências. Diário oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 20 de mar. 2010. Disponível em:<http\\www.fonoaudiologia.org.br\legislação>. Acesso em: 15 de Nov. 2016. 

BOLELA, Fabiana; JERICO, Marli de Carvalho. Unidade de terapia Intensiva: considerações da literatura acerca das dificuldades e estratégias para sua humanização. Esc. Anna Nery, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p. 301-309, Aug, 2006. 

CARDOSO, Maria Cristina de Almeida Freitas; FONTOURA, Elisiane Godoy. Valor da Auscuta Cervical em Pacientes Acometidos por Disfagia Neurogênica. Arq. Int. Otorrinolaringologia. São Paulo. v.13, n.4, p. 431-439, Out. 2009. 

CARVALHO, C. R. R.: TOUFEN, C. J.: FRANÇA, S. A. Ventilação mecânica: princípios, análise gráfica e modalidades ventilatórias. J. brasileiro de pneumologia. V. 33, supl. 2, p. 54-70, July 2007.

FREITAS et al. Avaliação videoendoscópica da deglutição na abordagem da disfagia orofaríngea. Rev. Portuguesa de otorrinolaringologia e cirurgia cérvico-facial. v. 50, n. 4, p. 285-289, 2012.

FURKIM, A. M et al. Gerenciamento fonoaudiológico da disfagia no paciente crítico na Unidade de Terapia Intensiva. In. FURKIM, A. M.; RODRIGUES, K. A. (Orgs.). Disfagia nas Unidades de Terapia Intensiva. 1. ed. São Paulo: Roca, 2015. Cap. 10.

FURKIM, A. M; SACCO. A B. F. Eficácia da fonoterapia em disfagia neurogênica usando a escala funcional de ingestão por via oral (FOIS). Ver. CEFAC. V. 10, n. 4, p. 503-512, Dez. 2008.

JACQUES, A; CARDOSO, M. C. A. F. Acidente Vascular Cerebral e sequelas fonoaudiológicas: atuação em área hospitalar. Rev. Neurociência. Porto Alegre. v. 19, n. 2, p. 229-236, 2011.

JOTZ, G. P; DORNELES, S. Fisiologia da deglutição. In: JOTZ G. P; ANGELIS, E.C; BARROS, A. P. B. Tratado da deglutição e disfagia no adulto e criança. 1. ed. Rio de Janeiro: Revinter; 2009. p. 3-5.

MARCHESAN, I. Q. Deglutição-normalidade. Furkim AM, Santini CS. Disfagia orofaríngea. São Paulo: Pró-Fono, p. 3-18, 1999.

MARTINS, J. J; NASCIMENTO, E. R. P. A Tecnologia e a Organização do Trabalho da Enfermagem em UTI. Rev. Arquivos Catarinenses de Medicina. Florianópolis, v. 34, n. 4, p. 23-27, Mar. 2005.

MAZZA, B. F. Caracterização e rotina da unidade de terapia intensiva. In: FURKIM, A. M; RODRIGUES, K. A. (Orgs.). Disfagia nas Unidades de Terapia Intensiva. 1. ed. São Paulo: Roca, 2015. Cap. 1 

MANGILLI, L. D.; ANDRADE, C. R. F.; LIMONGI, S. C. O. Válvula de fala em pacientes traqueostomizados: benefícios para a comunicação e deglutição. In: ANDRADE, C. R. F.;  LIMONGI, S. C. O. (Orgs.). Disfagia: Prática baseada em evidências.  1. ed. São Paulo: Sarvier, 2012. cap. 22.

MITRE, W. I. Aspectos Otorrinolaringológicos do idoso. In: SUSUKI. H. S. Conhecimentos essenciais para conhecer os pacientes idoso. São Paulo: Pulso Editorial; p25-32, 2003.

MORAES, A. M. et al. Incidência de disfagia em unidade de terapia intensiva de adultos. Rev CEFAC, v. 8, n. 2, p. 171-7, 2006.

MORAES, D. P.; MEDEIROS; G. C. Programa fonoaudiológico de reabilitação da deglutição em Unidade de Terapia Intensiva. In: ANDRADE, C. R. F.;  LIMONGI, S. C. O. (Orgs.). Disfagia: Prática baseada em evidências.  1. ed. São Paulo: Sarvier, 2012. cap. 10.

PADOVANI, A. R et al. Avaliação clínica da deglutição em unidade de terapia intensiva. Rev. CoDAS, v. 25, n. 1, p. 1-7, 2013

PATATAS, Olívia Helena Gomes et al . Parâmetros de duração dos sinais acústicos da deglutição de indivíduos sem queixas. Rev. soc. bras. Fonoaudiologia.  São Paulo ,  v. 16, n. 3, p. 282-290,  Sept.  2011.

ROCHA, E. M. S. S. Disfagia: Avaliação e Terapia. In: MARCHESA, I. Q. Fundamentos em fonoaudiologia – Aspectos Clínicos da motricidade oral. São Paulo: Guanabara Koogan S. A., 1998.

 RODRIGUES, K. A. et al. Reabilitação da deglutição em pacientes traqueostomizados disfágicos sob ventilação mecânica em unidades de terapia intensiva: estudo de factibilidade. Rev. Brasileira de Terapia Intensiva, v.27, n.1, p. 64-71, Mar. 2015.

RODRIGUES, K. A.; GHION, L. G.; GONÇALVES, M. I. R. Válvula de fala Passy – Muir. In: ANDRADE, C. R. F.;  LIMONGI, S. C. O. (Orgs.). Disfagia: Prática baseada em evidências.  1. ed. São Paulo: Sarvier, 2012. cap. 18.

RODRIGUES, K. A; GONÇALVES, M. I. R. Avaliação fonoaudiológica de pacientes disfágicos internados na Unidade de Terapia Intensiva. In: FURKIM, A. M;  RODRIGUES, K. A. (Orgs.). Disfagia nas Unidades de Terapia Intensiva. 1. ed. São Paulo: Roca, 2015. Cap. 11.

SILVA, R. G. A eficácia da reabilitação em disfagia orofaríngea. Ver. Pró-Fono. São Paulo, v. 19, n. 1, abr. 2007

SIMÃO, M. A. et al. Incidência de aspiração traqueal em pacientes traqueostomizados em uso de ventilação mecânica. Arq. Gastroenterologia, São Paulo, v. 46, n. 4, p.311-314, Dec. 2009. 

SUGENO, L. A.; PIRES, E. Teste do corante azul na avaliação da deglutição. In: FURKIM, A. M;  RODRIGUES, K. A. (Orgs.). Disfagia nas Unidades de Terapia Intensiva. 1. ed. São Paulo: Roca, 2015. Cap. 12.

YAMADA, E. K  et al . A influência das fases oral e faríngea na dinâmica da deglutição. Arq. Gastroenterologia.  São Paulo ,  v. 41, n. 1, p. 18-23,  Mar.  2004 .