INTERFERÊNCIAS DA PANDEMIA DE COVID-19 NO DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DA TUBERCULOSE EM PACIENTES DE UTI

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8267496


Cristiane Ferreira Pires1
Ana Paula Vasconcelos Carneiro2
Carlos José Matos Franco3
Daniele da Silva Oliveira Lima4 
Deisy Rejane Barbosa Bezerra5
Edilma Casimiro Gomes Serafim6
Evania Maria Alves Mota Felix7
Gardenia Monteiro Farias8 
Ivonete Alves da Silva9
Karene Ferreira Cavalcante10 
Leidiana Braga Rodrigues11 
Xênia Maria Fideles Leite de Oliveira12 
Raquel Carvalho dos Santos13


Resumo

A pandemia de COVID-19 desencadeou uma crise global de saúde que teve efeitos profundos em todas as áreas de atendimento médico. Neste cenário, doenças crônicas e infecciosas, como a tuberculose, não foram isentas dos impactos adversos desta pandemia devastadora. Na verdade, os desafios pré-existentes associados ao controle e gestão da tuberculose foram agravados de maneira preocupante, especialmente nos contextos das Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) (Organização Mundial da Saúde, 2020).
Este estudo mergulha profundamente nas complexidades que surgiram no epicentro dessa interseção catastrófica de duas doenças devastadoras. Nosso objetivo é lançar uma luz intensiva sobre os múltiplos desafios que têm obstaculizado o diagnóstico efetivo e o tratamento da tuberculose em pacientes de UTI durante a pandemia de COVID-19. Esse foco é crucial, pois estes pacientes já estão entre os mais vulneráveis, com o potencial de deterioração rápida e severa se o diagnóstico ou o tratamento for inadequado (Hogan et al., 2020).

Palavras-chave: COVID-19; Tuberculose; Diagnóstico; Tratamento; Unidade de Terapia Intensiva; Coinfecção; Pandemia; Desafios de saúde; Crise global.

Abstract 

The COVID-19 pandemic has unleashed a global health crisis with profound effects across all areas of medical care. In this scenario, chronic and infectious diseases such as tuberculosis have not been exempt from the adverse impacts of this devastating pandemic. Indeed, the preexisting challenges associated with the control and management of tuberculosis have been worryingly exacerbated, especially within the contexts of Intensive Care Units (ICUs) (World Health Organization, 2020).
This study delves deeply into the complexities that have arisen at the catastrophic intersection of these two devastating diseases. Our aim is to shed intensive light on the multiple challenges that have been hindering the effective diagnosis and treatment of tuberculosis in ICU patients amid the COVID-19 pandemic. This focus is critical as these patients are already among the most vulnerable, with the potential for rapid and severe deterioration if the diagnosis or treatment is inadequate (Hogan et al., 2020).

Keywords: COVID-19; Tuberculosis; Diagnosis; Treatment; Intensive Care Unit; Coinfection; Pandemic; Health Challenges; Global Crisis.

Introdução

Desde o surgimento do vírus SARS-CoV-2 e o início subsequente da pandemia de COVID-19, os sistemas de saúde ao redor do mundo foram submetidos a uma pressão incrível e sem precedentes. Esse evento catastrófico global redefiniu completamente o panorama de saúde pública e forçou os sistemas de saúde a se adaptarem a circunstâncias novas e extremamente desafiadoras (Kandel et al., 2020).

Enquanto lutamos contra essa nova ameaça, não podemos esquecer as doenças existentes que continuam a afetar a população global. Em particular, doenças crônicas e infecciosas, como a tuberculose, persistem como um sério desafio para a saúde pública. Essas doenças, muitas vezes negligenciadas na onda de atenção voltada para a COVID-19, continuam a infectar e matar um número significativo de indivíduos todos os dias (Organização Mundial da Saúde, 2020).

A tuberculose, uma das principais doenças infecciosas mortais do mundo, é uma dessas doenças cujo controle tornou-se particularmente difícil neste cenário de pandemia. O diagnóstico e o tratamento da tuberculose foram seriamente comprometidos, especialmente em ambientes críticos, como as Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), onde os recursos são frequentemente limitados e os pacientes são extremamente vulneráveis (Gupta et al., 2020).

Este estudo se propõe a aprofundar o entendimento sobre os efeitos catastróficos dessa sobreposição entre COVID-19 e tuberculose. Nosso objetivo é analisar detalhadamente como a pandemia de COVID-19 influenciou o diagnóstico e o tratamento da tuberculose em pacientes de UTI, um ambiente já desafiador mesmo sem a adição do fardo da COVID-19 (Liam et al., 2020).

Metodologia

Para realizar uma investigação abrangente e meticulosa sobre o impacto da pandemia de COVID-19 no diagnóstico e tratamento da tuberculose em pacientes de UTI, adotamos uma metodologia rigorosa e baseada em evidências. Realizamos uma revisão sistemática da literatura, uma abordagem de pesquisa que nos permitiu identificar, avaliar e sintetizar todas as pesquisas relevantes disponíveis sobre o tema (Page et al., 2021).

Para esta revisão, utilizamos três bases de dados de pesquisa científica respeitadas e internacionalmente reconhecidas: PubMed, ScienceDirect e Scopus. Estas bases de dados foram escolhidas por sua abrangência e pelo alto padrão de qualidade dos estudos que indexam. Além disso, eles oferecem uma variedade de disciplinas que atravessam várias disciplinas, permitindo uma visão mais abrangente do tema em estudo (Bramer et al., 2018).

O período de tempo escolhido para a seleção dos estudos foi de janeiro de 2010 a setembro de 2021. Esta ampla janela temporal permitiu-nos explorar uma década de pesquisas, proporcionando uma visão valiosa da evolução das práticas de diagnóstico e tratamento da tuberculose, bem como do impacto sem precedentes da pandemia de COVID-19 nessas práticas. A escolha de incluir estudos tanto em inglês quanto em português também permitiu uma revisão mais inclusiva e abrangente da literatura disponível (Higgins et al., 2019).

Nossa pesquisa se concentrou especificamente no diagnóstico e tratamento da tuberculose em pacientes de UTI no contexto da pandemia de COVID-19. Ao fazer isso, esperamos contribuir para o corpo de conhecimento existente sobre este importante tópico e, finalmente, informar práticas clínicas melhores e mais eficazes.

Revisão de Literatura

A revisão sistemática da literatura revelou uma complexa interação entre a COVID-19 e a tuberculose, particularmente no ambiente desafiador das Unidades de Terapia Intensiva (UTIs). Essa interação é complexa e apresenta uma série de obstáculos significativos que complicam o diagnóstico, o tratamento e o controle dessas duas doenças devastadoras (Motta et al., 2020).

Um obstáculo crítico identificado na literatura é a semelhança dos sintomas clínicos entre COVID-19 e tuberculose. Ambas as doenças apresentam um quadro clínico que pode incluir febre, tosse, falta de ar e fadiga (Lewinsohn et al., 2020). Isso torna extremamente difícil distinguir entre essas duas doenças apenas com base nos sintomas do paciente. Como resultado, pode ocorrer um diagnóstico errado ou atrasado, o que pode ter graves implicações para o paciente e para o controle da doença na população em geral (Lewinsohn et al., 2020).

Outro desafio destacado pela literatura é a alocação de recursos durante a pandemia de COVID-19. A urgência da situação levou à alocação em massa de recursos humanos, financeiros e materiais para combater a COVID-19 (Tadolini et al., 2020). Enquanto isso, doenças crônicas como a tuberculose, que requerem uma abordagem sistemática e de longo prazo, podem ter sido negligenciadas. A diminuição do foco na tuberculose pode resultar em um aumento nas taxas de incidência e mortalidade desta doença, apagando o progresso alcançado nas últimas décadas (Tadolini et al., 2020).

Esses desafios são ainda mais agudos em ambientes de UTI, onde os pacientes são geralmente mais vulneráveis e os recursos são extremamente limitados (Bhatraju et al., 2020). Em tal ambiente, a capacidade de realizar testes de diagnóstico e implementar intervenções terapêuticas adequadas é ainda mais crucial. Entretanto, a sobrecarga de pacientes de COVID-19 pode resultar em atrasos e comprometimento do cuidado de pacientes com tuberculose (Bhatraju et al., 2020).

Discussão

A análise aprofundada dos resultados da nossa revisão sistemática revela que a pandemia de COVID-19 não apenas apresentou desafios novos e sem precedentes, mas também exacerbou os obstáculos já existentes no diagnóstico e tratamento da tuberculose em ambientes de UTI.

Identificar e diagnosticar corretamente a tuberculose em pacientes de UTI já era uma tarefa complexa antes do advento da COVID-19, dada a semelhança dos sintomas clínicos com outras doenças respiratórias e o estado frequentemente comprometido dos pacientes. No entanto, a sobreposição dos sintomas clínicos de COVID-19 e tuberculose adicionou um nível adicional de complexidade, aumentando a possibilidade de diagnósticos errados ou atrasados e, consequentemente, de tratamentos inadequados (Lewinsohn et al., 2020).

Além disso, o gerenciamento do tratamento da tuberculose em ambientes de UTI durante a pandemia de COVID-19 tem sido um desafio formidável. Os recursos já estressados das UTIs foram ainda mais esticados pelo fluxo de pacientes com COVID-19, o que pode levar a uma falta de capacidade para gerenciar adequadamente os pacientes com tuberculose (Bhatraju et al., 2020). Além disso, a realocação de recursos de saúde para combater a COVID-19 pode ter impactado negativamente o controle da tuberculose, levando a um possível aumento na incidência e mortalidade desta doença (Tadolini et al., 2020).

A complexa interação entre COVID-19 e tuberculose em pacientes de UTI exige uma abordagem multidisciplinar para garantir um manejo eficaz. Tal abordagem envolveria a coordenação entre clínicos, epidemiologistas, autoridades de saúde pública e decisores políticos para garantir a alocação apropriada de recursos, a implementação de estratégias eficazes de diagnóstico e tratamento e o desenvolvimento de políticas que considerem a interação dessas duas doenças (Schutz et al., 2020).

Essa discussão sublinha a necessidade urgente de pesquisa adicional nesta área, a fim de desenvolver estratégias mais eficazes para o diagnóstico e tratamento da tuberculose em pacientes de UTI no contexto da pandemia de COVID-19.

Conclusão

A coexistência de COVID-19 e tuberculose em pacientes de UTI representa uma emergência de saúde global que se estende muito além de uma simples soma das partes. Trata-se de uma crise de saúde subestimada e multifacetada que demanda atenção imediata e respostas estratégicas (Glaziou, 2020).

Com o desdobramento da pandemia de COVID-19, os desafios inerentes ao diagnóstico e ao tratamento da tuberculose foram amplificados, deixando expostas as fragilidades do nosso sistema de saúde. Como demonstrado nesta revisão, a semelhança dos sintomas clínicos entre as duas doenças, a realocação de recursos de saúde para combater a COVID-19, e o estado de vulnerabilidade dos pacientes de UTI têm sido barreiras consideráveis que afetaram o gerenciamento eficaz da tuberculose (Lewinsohn et al., 2020; Tadolini et al., 2020; Bhatraju et al., 2020).

Nesse sentido, são necessárias abordagens inovadoras e multidisciplinares para melhorar o diagnóstico e o tratamento da tuberculose em meio à pandemia de COVID-19. Isso implica não apenas a necessidade de desenvolver e implementar estratégias eficazes de gerenciamento clínico, mas também a importância do investimento em pesquisa para entender a interação entre COVID-19 e tuberculose. Tal compreensão poderá embasar o desenvolvimento de políticas de saúde pública mais eficientes e equitativas, bem como aprimorar o tratamento individualizado em ambientes de UTI (Schutz et al., 2020).

Além disso, esta crise nos alerta sobre a necessidade de fortalecer os sistemas de saúde de maneira holística, de modo que possam responder efetivamente não apenas a surtos de doenças emergentes como a COVID-19, mas também a doenças persistentes como a tuberculose.

Finalmente, esta situação reitera a importância de adotar uma perspectiva global para enfrentar desafios de saúde que não se limitam a fronteiras nacionais, mas que afetam a humanidade como um todo.

Referências

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GLAZIOU, P. Predicted impact of the COVID-19 pandemic on global tuberculosis deaths in 2020. MedRxiv, 2020.


1. Graduada em Enfermagem Unifametro E-mail: cristianefpfranco@gmail.com
2. Graduada em Enfermagem UNIFOR  E-mail: analiga2014@gmail.com
3. Graduado em Farmácia Universidade Federal do Ceará carlos.franco.jm@gmail.com
4. Graduada em Enfermagem Universidade de Fortaleza E-mail: danieleolima@gmail.com
5 Graduada em Enfermagem Instituição: Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares – EBSERH E-mail: deisyenfermagem1@hotmail.com
6. Enfermeira, Mestre em Saúde Pública Universidade de Fortaleza E-mail: edilmacasimiro@yahoo.com.br
7. Graduada em Enfermagem Universidade Estadual do Ceará E-mail: evaniamafelix@gmail.com
8. Graduada em Farmácia Faculdade de Farmácia, Odontologia e Enfermagem da Universidade Federal do Ceará. E-mail: gardênia.mfarias@gmail.com
9. Graduada em Enfermagem UNIFOR E-mail: bozinekivonete@gmail.com
10. Graduada em Farmácia Universidade de Fortaleza  E-mail: karene0979@gmail.com
11. Graduada em Enfermagem Centro Universitário UniAteneu E-mail: leidianabr07@gmail.com
12. Graduada em Enfermagem Faculdade Santa Maria (FSM) E-mail: xeniamariaita@hotmail.com
13. Enfermeira Mestre em Transplantes de Órgãos Universidade Prof. Edson Antônio Velano (UNIFENAS) E-mail: raquelcarvalhosantos2006@yahoo.com.br15