INTERCURRENCIES IN THE AESTHETIC USE OF FACIAL BOTULINUM TOXIN
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202410311712
Tiago dos Santos¹;
Lilian de Abreu Ferreira².
RESUMO
A toxina botulínica, o agente causal do botulismo, é o produto da fermentação da bactéria Clostridium Botulinum. As toxinas existem em 8 tipos, embora no Brasil apenas o tipo A possua aprovação da ANVISA para fins cosméticos e terapêuticos. Devido a sua versatilidade e mecanismo de ação específico, tornou-se uma ótima opção tanto no uso terapêutico quanto no uso cosmético em todo mundo, tendo em vista o grande potencial em relação à sua técnica minimamente invasiva. As injeções de toxina botulínica tratam de problemas estéticos induzidos ou agravados pela contração muscular, controlando a neurotransmissão local. No entanto, atribui-se alguns riscos e possíveis complicações decorrentes de seu uso. O presente estudo realizado na forma de revisão narrativa teve como objetivo descrever as possíveis complicações advindas do uso terapêutico e cosmético da toxina para rejuvenescimento facial. Para tanto, foram selecionados estudos publicados nos últimos 10 anos, recuperados a partir das bases do Google Acadêmico e CAPES que abordavam a temática. Além das complicações no local da injeção, como eritema, edema, dor, ptose da pálpebra ou sobrancelha e equimose, há um grupo de efeitos adversos estéticos e funcionais associados a diferentes respostas musculares à toxina botulínica ou à sua migração. Essas complicações ocorrem com menos frequência do que as reações associadas à injeção, porém seus riscos e consequências são potencialmente maiores. Não há relatos de complicações graves ou fatais decorrentes do uso cosmético da toxina botulínica. As complicações dependem da técnica utilizada, por isso é importante ter conhecimento e treinamento adequado sobre a técnica de aplicação.
Palavras chave: Complicações, neurotoxina, efeitos adversos.
ABSTRACT
Botulinum toxin, the causal agent of botulism, is the fermentation product of the bacteria Clostridium Botulinum. Toxins exist in 8 types, although in Brazil, only type A has ANVISA approval for cosmetic and therapeutic purposes. Due to its versatility and specific mechanism of action, it has become a great option for both therapeutic and cosmetic use worldwide, given the great potential in relation to its minimally invasive technique. Botulinum toxin injections treat aesthetic problems induced or aggravated by muscle contraction, controlling local neurotransmission. However, there are some risks and possible complications arising from its use. The present study, carried out in the form of a narrative review, aimed to describe the possible complications arising from the therapeutic and cosmetic use of the toxin for facial rejuvenation. To this end, studies published in the last 10 years were selected, retrieved from the Google Scholar and CAPES databases that addressed the topic. In addition to complications at the injection site, such as erythema, edema, pain, ptosis of the eyelid or eyebrow and ecchymosis, there is a group of aesthetic and functional adverse effects associated with different muscular responses to botulinum toxin or its migration. These complications occur less frequently than injection-associated reactions, but their risks and consequences are potentially greater. There are no reports of serious or fatal complications resulting from the cosmetic use of botulinum toxin. Complications depend on the technique used, so it is important to have adequate knowledge and training on the application technique.
Keywords: Complications, neurotoxin, adverse effects.
1 INTRODUÇÃO
O poeta e médico alemão Justinus Kerner (1786-1862) foi o primeiro a estudar os efeitos da toxina botulínica durante as Guerras Napoleônicas, após constatar que houve um aumento de mortes por intoxicação alimentar em pessoas que comeram salsichas. A pobreza causada por essas guerras culminou em um declínio da higiene e de acesso aos alimentos, aumentando os casos de intoxicação alimentar, o que corroborou para a investigação de Kerner, levando a descrever os sinais e sintomas clinicos de uma doença que hoje a medicina denomina de botulismo (Whitcup, 2021).
Após uma série de experimentos com animais e autoexperiências, Kerner levantou a hipótese de que a toxina era produzida em condições anaeróbicas, atuava sobre o sistema nervoso autônomo e motor, era potente e foi letal em pequenas doses – cerca de 1 nanograma por kg de peso corporal. Foi ele que também deduziu que a toxina era capaz de impedir a transmissão do sinal nervoso periférico e autônomo, reduzindo ou bloqueando as altas taxas de atividade e excitabilidade desse sinal, sem alterar a transmissão do sinal sensorial (Morgado, 2017).
No início do século 20, o microrganismo responsável pela toxina da paralisia foi identificado como uma bactéria, a Clostridium botulinum. Na década de 1960, Scott, um médico oftalmologista e pesquisador, investigou o uso terapêutico da toxina em macacos, e mais tarde em seres humanos com estrabismo e blefaroespasmo. Posteriormente a Allergan, uma empresa farmacêutica, comprou os direitos do produto, mudando seu nome para Botox, recebendo aprovação do FDA para uso cosmético, em 2002. Desde então, a injeção de toxina botulínica, que foi originalmente usada para fins médicos, tornou-se um dos procedimentos mais populares e mais realizados (Souza-Dias, 2022).
Existem oito neurotoxinas botulínicas sorologicamente distintas, A, B, C1, C2, D, E, F, G, produzidas a partir de diferentes cepas da bactéria Clostridium botulinum. O sistema nervoso humano é suscetível apenas aos tipos A, B, E, F e G, não sendo afetado pelos tipos C e D. Somente os tipos A e B são utilizados para fins terapêuticos. Esses dois tipos agem da mesma forma, paralisando os músculos, no entanto, a principal diferença é a potência de sua atuação. O tipo B possui ação rápida de curta duração e, devido ao seu pH baixo, possui maior limitação na área cosmética, enquanto que o tipo A, mais estudado e utilizado, possui ação mais potente, de duração maior. No Brasil, apenas o tipo A possui aprovação da ANVISA para fins cosméticos e terapêuticos (Sethi et al., 2020; Silva, 2024).
A estética é um campo em constante avanço, principalmente na área voltada para o rejuvenescimento facial. A toxina botulínica é uma neuromodulador injetável criado a partir de neurotoxinas produzidas pela bactéria Clostridium botulinum, causadora do botulismo. Ela é comumente utilizada na prática estética para atenuação de rugas e flacidez e, quando usada corretamente, é um método extremamente seguro e eficaz para melhorar a aparência da pele em decorrência do processo de envelhecimento, além de suavizar marcas ou linhas de expressão ocasionadas ou exacerbadas pela contração muscular, como por exemplo, as rugas glabelares – marcas verticais e paralelas que surgem com a contração excessiva da região entre as sobrancelhas e acima do nariz (Caprielova et al., 2022).
O mecanismo de ação da toxina botulínica consiste no bloqueio da liberação de acetilcolina no local da placa motora, causando paralisia seletiva muscular, ou seja, enfraquece ou paralisa o músculo esquelético ao inibir a neurotransmissão entre os terminais nervosos periféricos e as fibras musculares. Esse efeito se inicia a partir do terceiro dia após a aplicação intramuscular e a partir do 14º dia se estabiliza. A função muscular é recuperada, voltando a normalizar-se entre 3 a 4 meses (Morgado, 2017; Caprielova et al., 2022).
Em sua molécula ativa, que possui um peso molecular de 150 kDa, existem duas cadeias interligadas, uma mais leve, de 50 kDa, capaz de catalisar a inibição da acetilcolina – neurotransmissor de contração muscular, e outra mais pesada, com 100 kDa, capaz de conduzir a toxina para o local de ação desejado, facilitando a entrada nas células, logo, quanto maior a quantidade de cadeia leve, maior será o halo de ação e maior será o resultado (Silva, 2024).
Atualmente, a marcas de toxina comercializadas e aprovadas pela ANVISA, são Botox®, Botulim®, Dysport®, Prosigne®, Xeomin®, Botulift® e Nabota® (Silva, 2024). Embora as injeções de toxina botulínica sejam geralmente bem toleradas, podem ocorrer baixa satisfação do paciente e complicações com seu uso. Assim, diante do exposto, o objetivo do presente estudo foi revisar a literatura científica, explorando as complicações causadas pelo uso da toxina botulínica tipo A advindas de sua utilização para rejuvenescimento facial.
2 METODOLOGIA
O presente estudo caracteriza-se como uma revisão narrativa da literatura realizada através de busca nas bases de dados SciELO, Google Acadêmico e site de periódicos da CAPES. Foram utilizados os termos “toxina botulínica”; “complicações”; “efeitos adversos”; “estética facial” e seus correspondentes em inglês, com delimitação de publicações dos últimos 10 anos, nas línguas portuguesa e inglesa. Foram selecionados estudos que abordavam as complicações advindas do uso da toxina botulínica em procedimentos para rejuvenescimento facial. As listas de referências dos artigos selecionados também foram consultadas para inclusão de artigos não recuperados na busca online.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os músculos da expressão facial estão diretamente próximos à superfície da pele, de modo que a contração repetitiva faz com que se formem rugas perpendicularmente à direção da contração. A Figura 1 mostra os vetores de força dos músculos faciais. No rejuvenecimento facial, a toxina botulínica é usada para tratar uma variedade de indicações, como linhas de expressão glabelares, correção do canto bucal (sorriso triste), linhas frontais horizontais, rugas ao redor dos lábios, rugas de marionete, bandas platismais do pescoço (Sethi et al., 2020).
Apesar da utilização da toxina botulínica na estética facial ser considerada um procedimento relativamente simples e seguro, sua aplicação exige cuidados adequados para evitar intercorrências negativas que a ela podem estar associadas. Os efeitos adversos e complicações ocorrem em cerca de 17,74% dos indivíduos e podem estar associados ao procedimento ou a própria toxina. A maioria deles se caracterizam como temporários e leves; todavia, ocasionam desconforto e preocupação ao paciente (Kós et al., 2023; Martino, 2022; Santos; Mattos; Fulco, 2017; Oliveira, 2019; Seith et al., 2020).
Figura 1 – Vetores de força muscular dos músculos faciais.
Não há relatos de complicações graves ou fatais decorrentes do uso cosmético da toxina botulínica. As complicações dependem da técnica utilizada, por isso é importante ter conhecimento e treinamento adequado sobre a técnica de aplicação (Faria; Suguihara; Muknicka, 2023). Quando as zonas de segurança são respeitadas, a chance de ocorrer alguma dessas complicações é praticamente nula. Porém, esses efeitos também podem ocorrer por difusão da toxina para músculos adjacentes, o que pode alterar o efeito clínico e aumentar as chances de efeitos adversos. Alguns fatores que podem impactar no perfil de migração da toxinas botulínica são a área de aplicação, o volume de diluição, características específicas do produto utilizado, doses e técnica de aplicação (Borba; Matayoshi; Rodrigues, 2022).
Existem duas classes de eventos adversos, os transitórios e benignos e os eventos potencialmente graves. Os eventos transitórios e benignos são geralmente complicações bem localizadas, reversíveis e autolimitadas que se desenvolvem alguns dias após a injeção e geralmente desaparecem sem qualquer tratamento. Em sua maioria são efeitos adversos no local da injeção (Witmanowski; Błochowiak, 2020). O quadro 1 lista as principais complicações relacionadas à aplicação facial da toxina botulínica.
Quadro 1 – Complicações relacionadas à toxina botulínica
Além das complicações no local da injeção, há um grupo de efeitos adversos estéticos e funcionais associados a diferentes respostas musculares à toxina botulínica ou à migração da toxina botulínica. Essas complicações ocorrem com menos frequência do que as reações associadas à injeção, são causadas principalmente pela desnervação temporária dos músculos adjacentes, fora da área de tratamento pretendida e dependem da técnica. Quando os músculos adjacentes são paralisados inadvertidamente, podem surgir problemas estéticos e funcionais
3.1 Hematomas e equimoses
As equimoses ou hematomas resultam da lesão de um vaso sanguíneo no local da injeção e são mais propensas quando a aplicação da toxina ocorre ao redor da área ocular e perioral. A equimoses leves, que atingem somente os vasos superficiais, afetam entre 11% a 25% dos pacientes, já o hematoma atinge vasos sanguíneos mais profundos, causando inchaço e dor, além de sua duração ser por um período mais longo. O hematoma geralmente requer prevenção contra a formação de abscessos com antibióticos. Uma simples medida, como aplicação de bolsas de pressão e gelo no local da injeção aplicadas imediatamente no momento do sangramento causa efeitos vasoconstritores, que podem diminuir o tamanho do hematoma formado ou até mesmo impedir que ele apareça ( Wertheimer; Nunes, 2021).
Outra medida preventiva é garantir que o paciente não esteja tomando nenhum medicamento anticoagulante, como a varfarina, vitamina E, aspirina ou antiinflamatórios não esteróides (AINEs), por um período de 10 a 14 dias antes do tratamento, e não tenha nenhum problema de coagulação subjacente. Além disso, fitoterápicos, como ginseng, ginkgo e altas doses de cápsulas de alho, podem estar associados à altas taxas de hematomas (Witmanowski; Błochowiak, 2020; Martino, 2022).
3.2 Reações alérgicas
Essas reações vão desde a edema e eritema limitados ao local da injeção, passando por eritema difuso e urticária generalizada ou até choque anafilático. O eritema (vermelhidão) e o edema (acúmulo de líquido no tecido) costumam regredir espontaneamente em 24 horas; caso ultrapasse essa duração, a utilização de um medicamento anti-histamínico será necesessária (Witmanowski; Błochowiak, 2020).
A disseminação sistêmica da toxina conduz a características semelhantes às do botulismo ou a reações anafiláticas sistêmicas. O uso cosmético da toxina botulínica raramente causa efeitos colaterais graves. A frequência de efeitos colaterais graves é 33 vezes maior nos casos terapêuticos do que nos cosméticos. No caso de uma reação anafilática, se trata de uma emergência médica e, para prevenir essas circunstâncias, deve-se obter um histórico médico completo para descartar reações alérgicas anteriores, principalemnte a diferentes marcas de toxina botulínica, além de cautela extra ao lidar com pacientes com histórico de alergias múltiplas, pois o risco é maior (Rodrigues; Martins; Alcântara, 2022).
3.3 Dor localizada
A dor localizada está associada à perfuração da pele pela agulha. A experiência de dor maior que o comum costuma estar associada ao uso do tamanho incorreto da agulha. Nessas situações, o uso de anestésicos tópicos pode minimizar a dor, assim como técnicas de introdução correta da agulha – bisel voltado para cima, formando um ângulo a depender da região aplicada ou perpendicular à pele – e injetar a toxina lentamente, além de agulhas trifacetadas e o uso de vibradores e/ou vibração manual. A dor também pode ser minimizada utilizando solução salina (0,9%) com conservante (alcool benzílico) para diluir a toxina botulínica. A redução da dor da injeção pode ser o resultado do pH mais elevado da solução salina enriquecida com conservante (Roy; Sadick, 2018; Wertheimer; Nunes, 2021).
3.4 Ressecamento da pele e descamação
O ressecamento localizado da pele pode ser devido à diminuição da atividade das glândulas sudoríparas. Em raras ocasiões, pode manifestar-se como um trauma de injeção (Wertheimer; Nunes, 2021). Sensação de boca seca e leve mal-estar semelhante ao da gripe também podem ocorrer após injeções de toxina botulínica (Kroumpouzos et al., 2021).
3.5 Dores de cabeça/Cefaleia
A dor de cabeça é um efeito colateral comum de curto prazo (24h a 48h após o tratamento), pois a toxina inicialmente causa espasmo muscular e depois paralisia completa. Outra explicação para dores de cabeça leves é a agulha atingir o periósteo ou provocar hematomas musculares profundos. Além disso, o estresse e ansiedade causados pelas injeções podem ser fatores importantes em pacientes que apresentam dores de cabeça transitórias. Há também relatos de dores de cabeça graves idiossincráticas com duração de duas a quatro semanas. Para controlar as dores, antiinflamatórios não esteróides ou opioides podem ser usados de acordo com o grau da dor de cabeça (Kroumpouzos et al., 2021).
3.6 Parestesia ou disestesia
Complicação rara que pode ser causada por trauma no nervo. A hipoestesia também pode estar relacionada às propriedades antinociceptivas localizadas da toxina botulínica, e seu alcance e gravidade dependem do tipo de ramo nervoso (Kroumpouzos et al., 2021).
3.7 Ptose palpebral ou blefaroptose
A mais temida e menos desejada dentre as complicações e intercorrências é a ptose palpebral superior, também conhecida como blefaroptose, que ocasiona o caimento da pálpebra, após injeções na área do complexo glabelar. Ela é quase sempre unilateral e temporária, caracterizada por um abaixamento de 2 a 3 mm da pálpebra afetada, quando os músculos de sustentação da pálpebra não são fortes o suficiente para sustentá-la. A ptose palpebral representa um risco significativo se as injeções forem aplicadas na parte média entre as sobrancelhas ou sob ela, na região da linha pupilar média. Isso é causado pela difusão da toxina através da fáscia do septo orbital até o músculo levantador da pálpebra superior. No paciente idoso, uma combinação da flacidez e septo orbital atenuado pode facilitar ainda mais a migração da toxina botulínica. O músculo levantador da pálpebra é particularmente suscetível a baixas doses de toxina botulínica, devido ao seu número comparativamente limitado de placas terminais motoras. Injeções nos músculos orbicular do olho, corrugador do supercílio e prócero têm maior probabilidade de produzir ptose palpebral (Rodrigues; Martins; Alcântara, 2022; Aguiar et al., 2023). Essa complicação pode ser tratada por meio de massagens que estimulam a contração muscular, eletroestimulação, aplicação de LED infravermelho ou vermelho, radiofrequência, e uso de colírios agonistas alfa-adrenérgicos (Koka; Patel, 2023).
3.8 Ptose da sobrancelha
A ptose da sobrancelha é uma complicação comum, que surge no tratamento do músculo frontal para tratar linhas horizontais da testa com toxina botulínica. O rebaixamento da sobrancelha pode durar até 6 semanas e gerar complicações à visão do paciente e consequências estéticas. Para prevenir a ocorrência de ptose, sugere-se a realização de anamnese adequada, técnica de injeção segura e avaliação dos fatores de risco do paciente (Chacon, 2023).
3.9 Lagoftalmo
Caracterizado pela incapacidade da pálpebra inferior de se fechar por completo ocasionando má lubrificação do olho, bem como dor e lacrimejamento. Evitar o excesso na dose da toxina e aplicá-la no plano correto evitando as áreas de risco, podem prevenir tal efeito. Nessa situação, é necessário consultar um oftalmologista, para avaliar e indicar o tratamento adequado, que pode incluir fita adesiva ou óculos de câmara de umidade e lubrificação tópica (Yi et al., 2022).
3.10 Ectrópio
O ectrópio caracteriza-se pela presença da esclera e conjuntiva expostas pela inversão da margem palpebral, que pode causar dor, lacrimejamento ou secura. O desenvolvimento de ectrópio pós-injeção requer atenção imediata para prevenir ceratite de exposição e danos à córnea. Gotas lubrificantes tópicas, fita adesiva nas pálpebras e oculos com câmaras de umidade podem ser úteis no período imediato, além de consulta ao oftalmologista (Kroumpouzos et al., 2021).
3.11 Xeroftalmia e estrabismo
A xeroftalmia, também conhecida como secura do olho, pode associar-se a aplicação de TB quando se aplicação profunda na lateral superior periocular, podendo atingir a glândula lacrimal ou ainda migrando dos músculos adjacentes para a glândula, e dessa forma afetando a produção de lágrimas. Essa complicação desaparece espontaneamente, mas durante sua ocorrência sugere-se o uso de colírio para lubrificar os olhos e minimizar a situação de desconforto (Feroze; Kaufman, 2023).
3.12 Diplopia e estrabismo transitório
A diplopia é a visão dupla, com ocorrência de olhos ressecados em resposta à toxina botulínica na glândula lacrimal. Isso acontece pela difusão da toxina para dentro da órbita, sendo considerado um efeito adverso raro. Os potenciais fatores de risco para diplopia são suscetibilidade inerente, proximidade da ponta da agulha à tróclea do músculo oblíquo superior, penetração profunda da agulha no septo orbital e aumento da difusão do medicamento após injeções repetidas. Ambas as complicações necessitam de consulta com um oftalmologista para estabelecer um diagnóstico preciso e um plano de tratamento temporário do estrabismo. O tapa-olho ou a aplicação do prisma de Fresnel nos óculos pode aliviar a diplopia até a recuperação (Testoni; Lino, 2022; Kroumpouzos et al., 2021; Borba; MatayoshI; Rodrigues, 2022; Aguiar et al., 2023).
O estrabismo transitório é uma intercorrência tardia assim como a diplopia, origina-se do enfraquecimento da musculatura e é considerada reversível. Sua recuperação pode ser realizada por meio de aplicações de ativos que incluem laser vermelho e infravermelho, e dimetilaminoetanol (Yi et al., 2022).
3.13 Assimetria
A assimetria é uma intercorrencia comum que ocorre devido à colocação da injeção ou às variações anatômicas do paciente. Uma complicação comum chamada de sobrancelha “Spock” é caracterizada pela curvatura da cauda da sobrancelha para cima, resultante do desequilíbrio causado pela perda de ação do frontal central e ação sem oposição do frontal lateral que eleva a cauda da sobrancelha. Esta complicação pode ser corrigida pela injeção de alguma toxina extra na área ativa do músculo. Outra forma de assimetria é a assimetria iatrogênica, que surge quando a dose equivalente não é injetada no lado contralateral, difusão inadequada da toxina nas fibras musculares, ou quando algumas fibras do músculo são mais espessas ou mais fortes que o outro lado. Esta forma de assimetria pode ser facilmente controlada pela injeção de algumas unidades adicionais nos músculos afetados (Kroumpouzos et al., 2021).
A assimetria labial é outra complicação do uso cosmético da toxina, entretanto é incomum. Ocorre quando a toxina é injetada abaixo da margem superior do arco zigomático ou muito profundo ao longo das paredes laterais nasais, difundindo-se através os músculos elevadores do lábio superior levando a assimetria do lábio superior e até ptose, com consequente dificuldade na fala e alimentação (Sethi et al., 2020).
3.14 Infecções
A infecção é uma possível complicação rara no local da injeção e pode ocorrer com qualquer procedimento que rompa a barreira da pele, se a assepsia da área não for realizada adequadamente. Para prevenir a infecção, uma técnica asséptica deve ser empregada, além de instruir o paciente a não tocar na área até que ela esteja cicatrizada. A aplicação de maquiagem deve ococrrer somente após 6 horas da aplicação, para permitir o fechamento dos locais abertos pela injeção. Para controlar a infecção, é essencial o uso de antibióticos e a monitorização da área, para garantir que não se forme um abscesso, o que pode resultar em uma cicatriz (Witmanowski; Błochowiak, 2020).
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A utilização da toxina, embora considerada um procedimento minimamente invasivo e seguro, não é isento de complicações, podendo ocasionar intercorrências tanto associadas ao produto em si quanto ao procedimento. Tais intercorrências podem ser evitadas seguindo adequadamente os protocolos, normas, indicações e doses. Além disso, o conhecimento, habilidades e experiência do profissional podem minimizar tais intercorrências. O pleno conhecimento da anatomia dos músculos faciais, das potenciais migrações da toxina, a marcação adequada, as técnicas de injeção e o conhecimento do mecanismo de ação do produto utilizado são as melhores formas de evitar tais problemas.
Como o uso da toxina se torna cada vez mais comum, o número absoluto de diferentes tipos de eventos adversos pode aumentar. Assim, revisões como essa, revisões sistemáticas, relatos de casos, e mais ensaios clínicos, podem contribuir para o conhecimento profundo e atualizado das possíveis e inúmeras complicações, amparando os profissionais da área estética a se tornarem mais seguros.
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¹Graduando em Biomedicina pela Faculdade Patos de Minas (FPM). e-mail: Tyaguinho.34patos@gmail.com
²Mestra em Ciências da Saúde pelo Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais, IPSEMG. Docente do Curso de Biomedicina pela FPM. e-mail: lilian.ferreira@faculdadepatosdeminas.edu.br.