REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7644505
Marciane Pinto Boiba1
Felix dos A Tedesco1
Julia Mendes Santos1
França, Maia Jairo2
RESUMO:
As medidas de distanciamento social implicaram mudanças de comportamentos severas e exigiram adaptações rápidas para os mais diversos setores da sociedade, visibilizando crises de ordem social, sanitárias e econômicas, trazendo sobrecarga e precarização dos vínculos trabalhistas. A desregulamentação dos direitos trabalhistas garantidos pela CLT, a terceirização e as inúmeras manobras de serviços na informalidade, resultam em baixa qualidade de vida, impactando na descaracterização de identidade, baixa autoestima, gerando traumas e interferindo na saúde mental do trabalhador, gerando novas fontes de problemas no processo saúde-doença. A metodologia utilizada será pesquisa científica e bibliográfica com abordagem qualitativa.
Palavras chaves: Trabalho, saúde-doença, pandemia.
Summary:
The social distancing measures implied severe behavioral changes and required quick adaptations for the most diverse sectors of society, making social, health and economic crises visible, bringing overload and precariousness of labor ties. The deregulation of labor rights guaranteed by the CLT, outsourcing and the numerous maneuvers of services in informality, result in low quality of life, impacting on the mischaracterization of identity, low self-esteem, generating trauma and interfering with the mental health of the worker, generating new sources of problems in the health-disease process. The methodology used will be scientific and bibliographic research with a qualitative approach.
Keywords: Work, health-illness, pandemic.
1- INTRODUÇÃO:
Em 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS)3 declarou uma pandemia causada por uma nova cepa do coronavírus, nomeada de SARS-CoV-2, causadora da Covid-19. Em ressonância, no dia 20 de março de 2020, no Brasil, foi expedido o Decreto Legislativo nº 06, assinado pelo Chefe do Governo, Jair Messias Bolsonaro, reconhecendo estado de calamidade pública em decorrência da pandemia do novo Coronavírus.
No Município de Porto Velho, capital de Rondônia, a situação de emergência deu-se através do Decreto nº 16.597, de 18 de março de 20204. As medidas adotadas para contenção da pandemia e redução dos riscos geraram modificações abruptas e profundas no funcionamento de todos os setores da sociedade, implicaram em mudanças de comportamentos severas e exigiram adaptações rápidas para os mais diversos contextos, ao qual, visibilizou crises de ordem social, sanitárias e econômicas, trazendo sobrecarga e precarização dos vínculos trabalhistas.
As Medidas Provisórias (MP) nº 927/20 e 936/20, para enfretamento do Estado de Calamidade Pública, reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6 de 20 de março de 2020, ampliou ainda mais a deslegitimação dos direitos trabalhistas, com a flexibilização de acordos entre patrão e empregado, ao qual, ficaram dispensados de comunicar as mudanças dos regimes de contratos de trabalho ao órgão do Ministério da Economia e os Sindicatos.
Com a defasagem à garantia dos direitos, instabilidade e incerteza no cenário atual, os trabalhadores portuvelhenses engendraram-se em múltiplas formas de sustento à suas famílias, como: trabalho remoto, tele trabalho, uberização, motoboy/entregador, plataformas digitais, algumas delas de forma precária, encarando jornadas duplas, é, até tripa de trabalhos, exposição a um conjunto de medidas limitantes e incomuns, de forma conjunta as demandas e adversidades comuns à vida diária a fim de garantir equidade e qualidade de vida ao combate e prolongamento da pandemia causada pelo novo Coronavírus (Covid-19) e suas variantes, que, até o dia 7 de abril de 2022 chegam a um total de mortes no Brasil de 660.973 pessoas, e o número de casos recuperados era de 28.976.397 pessoas5.
2- REFERENCIAL TEORICO:
2.1 Vida em sociedade, relacionamento interpessoal e trabalho
A busca por equilíbrio ocorre em todo campo social e do trabalho num movimento subjetivo da psique, uma mobilização corpo e mente, entendida como ação. As relações sociais acontecem através da comunicação como processo mediador das relações entre indivíduos, que são mutáveis de acordo com cada cultura e realidade social (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2001). As relações interpessoais englobam um conjunto de comportamentos verbais e não verbais para habilidades sociais dentro do seu contexto social, variando entre sexo, classe social, faixa etária, educação, cultura e etc, não existindo um padrão tido como universal. Destaca também, a importância das relações interpessoais em diferentes contextos do cotidiano, para diversificação de repertório, como fator de proteção e ajustamento psicossocial, nos diferentes ambientes da vida pessoal, social e profissional (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2001).
No âmbito do trabalho, como também nas organizações, para qualquer atuação profissional evocamos habilidades das mais diversificadas possíveis, a fim de envolver os indivíduos e seus repertórios sociais no manejo por competências para o processo produtivo das organizações e trabalhos, nesse sentido:
Os novos paradigmas organizacionais e do trabalho, que orientam a reestruturação produtiva têm priorizado processos de trabalho que remetem diretamente à natureza e qualidade das relações interpessoais. Entre tais aspectos, pode-se citar a ênfase na multiespecialização associada à valorização do trabalho em equipe, intuição, criatividade e autonomia na tomada de decisões, ao estabelecimento de canais não formais de comunicação como complemento aos formais, ao reconhecimento da importância da qualidade de vida e a preocupação com a autoestima e com o ambiente e cultura organizacional (Del Prette; Del Prette 2001, p.57).
Porém, na contramão desse paradigma, o período pandêmico vem imparcial na desproteção social das relações de trabalho, não só pelas Medidas Provisórias (MP) nº 927/20 e 936/20, para enfretamento do Estado de Calamidade Pública, reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6 de 20 de março de 2020, como também o país passou por alterações no sistema de regulação social do trabalho e de sua proteção no ano de 2017, alterando mais de 100 pontos consolidados das Leis Trabalhistas, flexibilizando formas de contratos entre empregador e empregado, algumas delas: contrato de trabalho intermitente, contratação parcial ou temporário, subcontratação (terceirização), etc., um retrocesso aos direitos, alargando ainda mais a situações de desemprego (CLT, 2022).
2.2 Instabilidade financeira e adoecimento psíquico
Nessa inter-relação, pessoa-ambiente, trabalho e trabalhador, por novos meios de subsídios, trabalhadores da capital de Porto Velho/RO, passam por verdadeiras metamorfoses, polivalência, pautados em atividades multifuncionais, trabalho remoto, tele trabalho, uberização, motoboy/entregador, plataformas digitais, algumas delas de forma precária, encarando jornadas duplas, é, até tripa de trabalhos, exposição a um conjunto de medidas limitantes e incomuns, submetidos a mecanismos de adoecimento e pressão psicológica pela troca capital-trabalho, manifestando novos processos de adoecimento da saúde mental, de forma conjunta as demandas e adversidades comuns à vida diária a fim de garantir equidade e qualidade de vida nesse processo de início de pós pandemia, que, ainda não está completamente definido entre os governantes.
Para tanto, chega a ser um desafio complexo definir a saúde mental que dificilmente poderia ocorrer sem o surgimento de numerosas críticas e apontamentos das mais variadas perspectivas, entretanto, a Organização Mundial da Saúde apresentou o conceito como “[…] um estado de bem-estar no qual o indivíduo perceba as suas próprias capacidades, possa lidar com as tensões normais da vida, possa trabalhar de forma produtiva e frutífera e possa contribuir para a sua comunidade” (OMS, 2001).
Ainda de acordo com a OMS (2019) os fatores que podem afetar a saúde mental de um indivíduo extrapolam as questões genéticas, de gerenciamento das emoções e de comportamento, estendendo-se também aos fatores sociais, econômicos, condições de trabalho, estresse e exposição a riscos ambientais.
Estamos longe do conceito de qualidade de vida nesse momento, definido pela (OMS), pois, de acordo com levantamento realizado pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) Brasil, em parceria com a Offer Wise Pesquisas, 51% dos brasileiros acreditam que as condições da economia em 2021 pioraram em relação a 2020. A pesquisa aponta ainda que quatro em cada dez brasileiros avaliam que a própria condição financeira piorou em 2021 (43%), enquanto 31% acreditam que não melhorou nem piorou, e para 23% houve melhora (CNDL, 2022).
Com relação aos meios de sustento atuais, 34% exercem trabalho autônomo, 22% trabalham com carteira assinada e 22% fazem trabalhos temporários ou “bicos”. Para manter ou aumentar seu padrão de vida, 40% precisaram realizar trabalhos extras; 29% utilizaram o cartão de crédito; e para 17%, mais pessoas da família tiveram que trabalhar (CNDL; SPC 2022).
Entre aqueles que afirmaram ter sido necessário realizar “bicos” para manter ou aumentar o padrão de vida, 19% afirmam estar trabalhando como diarista ou lavando roupa, 19% realizando serviços gerais de manutenção e 17% revendendo produtos, entre outros (CNDL, 2022).
Nove em cada dez brasileiros possuem algum temor quanto a sua vida financeira em 2022 (90%), sendo os principais: não conseguir pagar suas contas (52%, em relação à 2019 era 39%), não ser possível guardar dinheiro (39%), ter que desistir de consumir coisas que gosta (24%) e não conseguir um emprego (24%) (CNDL, 2022).
O cenário econômico em 2022 é uma verdadeira incógnita, inflação flutuante, aumento dos gastos públicos e proximidades das eleições no mês de outubro.
3 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Portanto, frente a insegurança social e adoecimento mental, podemos destacar alguns pontos relevantes que se relacionam ao conceito de saúde mental da OMS de acordo com o contexto pós pandêmico, sendo o primeiro ponto, o estado de bem-estar propriamente dito; o segundo, a percepção sobre as próprias capacidades; terceiro, o trato com as tensões diárias, e; quarto, o trabalho e a contribuição social.
Vislumbrando, esses pontos de um modo geral, é suas próprias capacidades, Bandura traz como ferramenta a auto-eficácia percebida e o autoconhecimento. Bandura define a autoeficácia percebida como a crença que o indivíduo possui sobre sua capacidade para realizar tarefas específicas em um determinado momento.
Ainda conforme Albert Bandura, “auto-eficácia percebida não é relativa ao número de habilidades que se tem, mas com o que você julga poder fazer com o que você tem, sob uma variedade de circunstâncias” (BANDURA apud Azzi e Polydoro, 2006, p.15).
Como também, podemos ressaltar a importância do autoconhecimento, pois o indivíduo que é capaz de reconhecer as próprias emoções, gerenciá-las e relacioná-las às emoções dos demais, desenvolve sua inteligência emocional, torna-se capaz de estabelecer metas e fazer vínculos e persistir na busca por elas, manter-se positivo e controlar a ansiedade (GOLEMAN, 2011).
Contudo, o investimento em ações que promovam a melhoria do estado de bem-estar pessoal, o incremento da autoeficácia percebida e do autoconhecimento, o aumento do repertório das habilidades sociais para lidar com as tensões diárias e o aprimoramento das relações interpessoais são ferramentas para melhoria do contexto contemporâneo, e, se mostram extremamente valiosas.
REFERÊNCIAS
AZZI, R. G.; POLYDORO, S. A. J. (org.). Auto-eficácia em diferentes contextos. Campinas, SP: Editora Alínea, 2006.
ASSOCIAÇÃO PSIQUIÁTRICA AMERICANA. (2014). DSM-5- Manual de diagnostico e estatística das perturbações mentais. (5ª ed.). Lisboa: Climepsi Editores.
CHIAVENATO, I. Gestão de Pessoas: O novo papel dos recursos humanos nas organizações. 4. ed. Barueri, SP: Manole, 2014.
CONFERERAÇÃO NACIONAL DE DIRIGENTES LOJISTAS (CDL). Disponível:<Phttps://portovelho.cdls.org.br/sala-de-imprensa/noticias/page/3/>.Acesso em 07 de abr. de 2022.
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA CASA CIVIL. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452compilado.htm. Acesso em 07 de abr. de 2022.
DEL PRETTE, A.; DEL PRETTE Z. A. P. Psicologia das relações interpessoais: Vivências para o trabalho em grupo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.
GOLEMAN, D. Inteligência social: o poder das relações humanas. Rio de Janeiro: Elieser, 2011.
RAZZOUK, D.; GOMES A. de L. M.; CODEIRO, Q. Saúde Mental e Trabalho. São Paulo: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, 2015.
PORTELA, M. C.; REIS, L. G. da C.; LIMA, S. M. L. L. (orgs.). Covid-19: desafios para a organização e repercussões nos sistemas e serviços de saúde ― Rio de Janeiro: Observatório Covid-19 Fiocruz, Editora Fiocruz, 2022. Disponível em < https://portal.fiocruz.br/sites/portal.fiocruz.br/files/documentos_2/portela_mc_rei s_lgc_lima_sml._covid- 19_desafios_para_a_organizacao_e_repercussoes_nos_sistemas_e_servicos_ de_saude._2022.pdf>.Acesso em 07 de abr. de 2022.
WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO) [homepage na internet]. Transtornos mentais. 2019. Disponível em: <https://www.who.int/news- room/fact-sheets/detail/mental-disorders> . Acesso em 08 abr. 2022.
WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). International Classification of Functioning, Disability and Health: ICIDH-2. Geneva: WHO; 2001.
3Breve histórico da pandemia por Coronavírus. Disponível em<https://www.paho.org/pt/covid19/historico-da-pandemia-covid-19>. Acesso em 07 de abr. de 2022
4Disponível em <https://coronavirus.portovelho.ro.gov.br/decretos>. Acesso em 07 de abr. de 2022.
5Disponível em <https://covid.saude.gov.br/>. Acesso em 07 de abr. de 2022.
1Acadêmicos de psicologia, Centro Universitário São Lucas/Afya, 2022.
2Mestre orientador, Centro Universitário São Lucas/Afya, 2022.