REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202411271404
Cristiane M. C. Alves
Izabel C. R. Moreno
Jânia V. Silva
Joeliton B. Lima
Laísa L. Silva
Rosângela H. Lara
Sandra M. Oliveira
Sirley A. Tristão
Sônia R. R. Moreno
Sueli M. Oliveira
RESUMO: O presente estudo, realizado por este grupo de professores, visa explorar a inclusão da educação especial no âmbito escolar, através de uma pesquisa qualitativa, pontuando a necessidade da formação em Atenção em Educação Especial do professor em sala, visando a evolução e desenvolvimento dos alunos -principalmente os neuro divergentes-. Esta inclusão, vai desde o aprofundamento do estudo do professor até as políticas públicas para implementação da AEE em sala, visando melhoria de desempenho da evolução escolar. A despeito disso, o propósito deste artigo é elucidar o leitor acerca da viabilidade de transfigurar a sala de aula tradicional em um espaço acessível a todos os discentes, sem exceções. Serão abordadas as intersecções entre o direito universal à educação e o direito à alteridade, analisando a linha tênue que os distingue, além de como tal prerrogativa permeia as transformações imprescindíveis na instituição escolar, de modo a configurá-la como um ambiente educacional inclusivo.
Palavras-Chave: Inclusão; Educação Especial; Professor.
INTRODUÇÃO
Sabemos que a educação é um dos direitos assegurados previsto em lei para todos, mas é fato que, na prática, pessoas com neuro divergências no Brasil sofrem com ensino adequado para seu desenvolvimento.
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), por meio de pesquisas estatísticas, consegue traçar o perfil de docentes e sua atuação no ensino brasileiro. Atualmente, o Brasil conta com 2,3 milhões de docentes na educação básica regular. Outras pesquisas apontam um crescimento acentuado, sobretudo nos últimos 10 anos, no número de docentes da Educação Especial na Educação Básica no Brasil, que saltou de 32.772 professores em 1996 para 1.260.049 no ano de 2019. Ou seja, cerca de 50% dos professores no Brasil possuem formação na área de Educação Especial.₈
A educação inclusiva problematiza a artificialidade das identidades normativas e concebe as diferenças como produto da multiplicidade, em vez de interpretá-las apenas como diversidade, como frequentemente se sustenta. Trata-se de uma abordagem educacional que assegura o direito à diferença, em detrimento da diversidade, visto que garantir o direito à diversidade implica na perpetuação do status quo, ou seja, na reafirmação da homogeneidade.
A diferença (vem) do múltiplo e não do diverso. Tal como ocorre na aritmética, o múltiplo é sempre um processo, uma operação, uma ação. A diversidade é estática, é um estado, é estéril. A multiplicidade é ativa, é fluxo, é produtiva. A multiplicidade é uma máquina de produzir diferenças – diferenças que são irredutíveis à identidade. A diversidade limita-se ao existente. A multiplicidade estende e multiplica, prolifera, dissemina. A diversidade é um dado – da natureza ou da cultura. A multiplicidade é um movimento. A diversidade reafirma o idêntico. A multiplicidade estimula a diferença que se recusa a se fundir com o idêntico (SILVA, 2000, p.100-101). ₁₁
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 206, explicita, como um dos princípios para a educação no Brasil, “[…] a gestão democrática do ensino público”. Essa preocupação é reiterada na LDBEN (Lei nº 9394/96), no artigo 3º, ao assinalar que a gestão democrática, além de estar em conformidade com a Lei, deve estar consoante à legislação dos sistemas de ensino, pois como Lei que detalha a educação nacional, acrescenta a característica das variações dos sistemas nas esferas federal, estadual e municipal. Ainda nesse detalhamento, a LDBEN avança, no seu artigo 14, afirmando que:
[…] Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. ³
Gadotti e Romão (1997) manifestam suas posições sobre a construção da democracia na escola e afirmam que esse tipo de gestão constitui um passo relevante no aprendizado da democracia.₇
Os educadores fomentam a democracia no ambiente escolar por meio de sutis aspectos da organização da prática pedagógica. Nesse contexto, exercem um impacto significativo: a maneira como abordam os conteúdos com os estudantes; a forma de propor atividades na sala de aula; a gestão disciplinar; a dinâmica de interação dos alunos nas tarefas acadêmicas; a estruturação da Educação Especial no contraturno; a distribuição do tempo; o modo como planejam junto aos alunos; e a avaliação da execução das atividades de forma colaborativa.
COMO O PROFESSOR PODE AUXILIAR NO DESENVOLVIMENTO DOS NEURO DIVERGENTES?
Os professores AEE podem facilmente identificar sinais ou a presença de Autismo e TDAH, e ainda podendo auxiliar, em casos onde não há o diagnóstico pelo médico psiquiatra/psicólogo, orientando o responsável a encaminhar aos profissionais habilitados para iniciar o tratamento/diagnóstico.
Neurodivergentes são indivíduos cujo funcionamento neurológico ou desenvolvimento cognitivo se desvia do que é considerado típico ou padrão. Isso pode se manifestar em condições como Transtorno do Espectro Autista (TEA), dislexia e Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH). ₄
O TDAH é um transtorno de desenvolvimento prevalente caracterizado por níveis inadequados de atenção, hiperatividade e impulsividade e frequentemente há comorbidades com outros transtornos psiquiátricos. De acordo com a Academia Americana de Pediatria, há diferentes áreas da vida da criança que podem ser comprometidas em decorrência do TDAH, como o relacionamento interpessoal e o bem-estar, levantando a necessidade de tratamentos eficazes. ₁₂
Hoje entende-se que o Transtorno do Espectro Autista, faz parte de uma das características em um espectro com causas biológicas e congênitas. O autismo é um distúrbio do neurodesenvolvimento caracterizado por uma tríade de sintomas: déficits persistentes na comunicação social e interação social, e padrões restritos e repetitivos de comportamentos, interesses ou atividades, sendo o autismo considerado como uma entidade clínica. ¹
O TEA é um transtorno caracterizado por prejuízos do desenvolvimento como na interação social, comunicação e repertório de interesses. Dessa forma, os indivíduos que apresentam TEA demonstram déficits no domínio de cognição e linguagem, porém apresentam boa habilidade em relação a memória, principalmente voltada para a lembrança de detalhes. Em contrapartida, a mesma pode estar alterada se o indivíduo também apresentar comprometimento intelectual devido má organização das informações como consequência da falha de raciocínio e compreensão. ₅
Segundo uma pesquisa realizada pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) em março de 2023, a incidência global do autismo ocorre em cerca de uma a cada 160 crianças. ₆
No Brasil, embora não haja dados específicos do autismo, estima-se que a condição afete aproximadamente 1% da população mundial. Com relação ao TDAH, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que a condição afete entre 5% e 7% das crianças, em idade escolar, em todo o mundo. ₁₀
Com o propósito de oferecer suporte às redes públicas de ensino na organização e oferta desse atendimento especializado, além de contribuir para o fortalecimento do processo de inclusão educacional nas turmas regulares, o Ministério da Educação instituiu o Programa de Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais, por meio da Portaria nº 13, de 24 de abril de 2007. ₉
As Salas de Recursos Multifuncionais constituem ambientes situados nas instituições de ensino básico, destinados à realização do Atendimento Educacional Especializado. Esses espaços são meticulosamente equipados com mobiliário apropriado, materiais didáticos e pedagógicos, recursos de acessibilidade e equipamentos específicos, com a finalidade de atender aos alunos pertencentes ao público-alvo da educação especial, em turno oposto à escolarização regular.
Este programa visa suprir as demandas das escolas públicas que matriculam alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento ou superdotação/altas habilidades, disponibilizando as Salas de Recursos Multifuncionais nos tipos I e II. Para a efetivação desse processo, é imperativo que os gestores municipais, estaduais ou do Distrito Federal assegurem a alocação de professores capacitados para o Atendimento Educacional Especializado, além de garantir a infraestrutura necessária para a implantação desses espaços.
As Salas de Recursos Multifuncionais Tipo I são constituídas de microcomputadores, monitores, fones de ouvido e microfones, scanner, impressora laser, teclado e colméia, mouse e acionador de pressão, laptop, materiais e jogos pedagógicos acessíveis, software para comunicação alternativa, lupas manuais e lupa eletrônica, plano inclinado, mesas, cadeiras, armário, quadro melamínico. Já As Salas de Recursos Multifuncionais Tipo II são constituídas dos recursos da sala Tipo I, acrescidos de outros recursos específicos para o atendimento de alunos com cegueira, tais como impressora Braille, máquina de datilografia Braille, reglete de mesa, punção, soroban, guia de assinatura, globo terrestre acessível, kit de desenho geométrico acessível, calculadora sonora, software para produção de desenhos gráficos e táteis.
Segundo a Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA), cerca de 3% a 5% das crianças do mundo possuem o transtorno, sendo que 70% delas apresentam outra comorbidade (doença associada), como ansiedade e depressão. ²
Sendo assim, é primordial a especialização do professor em Atenção em Educação Especial, afim de acompanhar esses alunos com precisão, de forma eficaz e contínua. Pois cada aluno necessita de um acompanhamento e plano pedagógico diferente. Desta forma, o professor é o responsável por alfabetizar e ensinar, de forma que o aluno absorva e mais se adapte ao ensino.
CONCLUSÃO
O processo de inclusão educacional enfrenta múltiplos obstáculos, pois, embora seja um direito formalmente reconhecido pela legislação, é evidente a dificuldade de reconhecer o aluno em suas especificidades.
Diante disso, o docente deve superar tais desafios para assegurar a concretização desse direito. A garantia do acesso, da participação e da aprendizagem de todos os alunos nas instituições de ensino contribui para a construção de uma nova cultura de valorização das diferenças.
O presente texto enfatiza a necessidade de reestruturar tanto a organização pedagógica quanto a administrativa das escolas, a fim de transformá-las em ambientes verdadeiramente inclusivos. Compreendemos que a diversidade transcende um mero agrupamento de diferenças, sendo, na realidade, o reconhecimento do outro com suas singularidades e com o devido respeito.
Esta reflexão convoca a participação ativa de toda a sociedade na efetivação da verdadeira educação inclusiva, que exige um trabalho pedagógico coletivo, abrangente e sensível às diferenças.
Para tanto, é imprescindível garantir intervenções contínuas de formação para todos os membros da comunidade escolar, com a inclusão dos gestores, docentes de classes regulares e de educação especial, funcionários técnico-administrativos, estagiários e auxiliares de vida escolar (AVEs), pois todos devem compreender seu papel diante dos estudantes.
Além disso, é fundamental aprimorar os mecanismos de monitoramento das políticas educacionais, a fim de identificar distorções e necessidades de aprimoramento, promovendo intervenções mais direcionadas sempre que houver deslocamentos nas atribuições. As ações para a consolidação do Atendimento Educacional Especializado (AEE) demandam firmeza e o engajamento de todos os envolvidos no processo, a fim de que as escolas se tornem espaços plenamente inclusivos. Nesse contexto, a educação especial no Brasil tem adotado medidas ousadas e coerentes, alinhadas com os preceitos da Constituição de 1988, que estabelece a educação como um direito fundamental.
REFERÊNCIAS
1. ARAÚJO CA. Autismo: uma ‘epidemia’ da contemporaneidade. O Jornal de psicologia analític. ,2022;67,1: 5-20.
2. ABDA. Associação Brasileira de Déficit de Atenção. Disponível em: https://tdah.org.br/
3. BRASIL. LEI Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm#:~:text=L9394&text=Estabelece%20as%20diretrizes%20e%20bases%20da%20educa%C3%A7%C3%A3o%20nacional.&text=Art.%201%C2%BA%20A%20educa%C3%A7%C3%A3o%20abrange,civil%20e%20nas%20manifesta%C3%A7%C3%B5es%20culturais.
4. CONSELHO FEDERAL DE ADMINISTRAÇÃO. Quantidade de neurodivergentes levantam necessidade de debate sobre o assunto. 2024. Disponível em: https://cfa.org.br/numero-de-neurodivergentes-levantam-a-necessidade-de-debate-sobre-o-assunto/
5. CRAIG F, et al. Uma revisão dos déficits de funções executivas no transtorno do espectro do autismo e no transtorno de déficit de atenção/hiperatividade. Neuropsiquiatra Dis Treat,2016.
6. CDC: Centers for Disease Control and Prevention. Autism Spectrum Disorder (ASD). 2023. Disponível em: https://www.cdc.gov/autism/about/index.html
7. GADOTTI, M. Uma escola, muitas culturas. In: GADOTTI, M.; ROMÃO, J. E. (Org.) Autonomia da escola: princípios e propostas. São Paulo: Cortez, 1997.
8. INEP. Dia do professor. 2023. Disponível em: https://www.gov.br/inep/pt-br/assuntos/noticias/institucional/dia-do-professor-pesquisas-do-inep-tracam-perfil-de-docentes#:~:text=O%20Instituto%20Nacional%20de%20Estudos,e%20316.792%20na%20educa%C3%A7%C3%A3o%20superior.
9. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Portaria normativa nº- 13, de 24 de abril de 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/multifuncional.pdf
10. SECRETARIA DO ESTADO DE SÁUDE. Autismo afeta cerca de 1% da população. 2015. Disponível em: https://www.saude.mg.gov.br/ajuda/story/6884-autismo-afeta-cerca-de-1-da-populacao#:~:text=A%20Organiza%C3%A7%C3%A3o%20Mundial%20de%20Sa%C3%BAde,possuam%20algum%20grau%20do%20transtorno.
11. SILVA, T. T. da. (Org.). Identidade e Diferenças. A perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes, 2000.12.
12. POSNER J, et al. Desordem do Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) . Lancet,2020;395(10222):450-462.