REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202411132115
Alaine Pinto da Silva Rodrigues; Antônia Daybi Guimarães Bizerra; Iranildo Batista de Souza Silveira; Matheus Marinho Rodrigues Guajajara; Aracy Dias da Silva; Pedro Henrique Rodrigues Alencar
RESUMO
INTRODUÇÃO: A tuberculose (TB) é uma enfermidade infecciosa transmitida pelo Mycobacterium tuberculosis, que se dissemina pelas vias aéreas quando indivíduos infectados tossirem, espirrarem ou falarem, liberando aerossóis contendo bacilos ativos. OBJETIVO: Analisar a incidência e características clínico-epidemiológicas da tuberculose em Imperatriz – Ma, entre os de 2019 a 2023. MATERIAIS E MÉTODOS: Estudo epidemiológico descritivo, de abordagem quantitativa, realizado a partir das notificações compulsórias de casos novos da doença disponíveis via DATASUS. Foram calculados os coeficientes de incidência a cada ano da doença. As variáveis epidemiológicas foram tratadas por meio da estatística descritiva. RESULTADOS: No período sob investigação foram notificados 447 casos novos de tuberculose distribuídos na cidade de Imperatriz. A taxa de detecção de novos casos, foi maior no ano de 2022 e menor em 2021. Quanto às características epidemiológicas, a maioria dos casos era do sexo masculino, raça/cor parda, forma clínica pulmonar, primeira cultura de escarro positiva, coinfecção TB/HIV negativo, TDO não realizado, não tabagista, não etilista e com evolução à cura. Ademais, destacou-se a faixa etária de 20 a 29 anos, 5º a 8º série incompleta do EF e baciloscopia 6º mês não realizada. CONSIDERAÇÕES FINAIS: É essencial investir em estratégias que ampliem o acesso e a adesão ao tratamento, promovam uma abordagem mais humanizada no acompanhamento dos pacientes, e que desenvolvam ações intersetoriais para enfrentar as barreiras socioeconômicas e educacionais.
Palavras-chave: Tuberculose. Vigilância em Saúde Pública. Epidemiologia.
ABSTRACT
INTRODUCTION: Tuberculosis (TB) is an infectious disease transmitted by Mycobacterium tuberculosis, which spreads through the airways when infected individuals cough, sneeze or speak, releasing aerosols containing active bacilli. OBJECTIVE: To analyze the incidence and clinical-epidemiological characteristics of tuberculosis in Imperatriz – Ma, between 2019 and 2023. MATERIALS AND METHODS: Descriptive epidemiological study, with a quantitative approach, carried out from compulsory notifications of new cases of the disease available via DATASUS. The incidence coefficients were calculated for each year of the disease. The epidemiological variables were treated using descriptive statistics. RESULTS: During the period under investigation, 447 new cases of tuberculosis were reported in the city of Imperatriz. The detection rate of new cases was higher in 2022 and lower in 2021. Regarding the epidemiological characteristics, most cases were male, brown race/color, pulmonary clinical form, first positive sputum culture, negative TB/HIV coinfection, DOT not performed, non-smoker, non-alcoholic and with evolution to cure. In addition, the age group of 20 to 29 years, incomplete 5th to 8th grade of PE and 6th month bacilloscopy not performed stood out. FINAL CONSIDERATIONS: It is essential to invest in strategies that expand access and adherence to treatment, promote a more humanized approach in patient monitoring, and develop intersectoral actions to address socioeconomic and educational barriers.
Keywords: Tuberculosis. Public Health Surveillance. Epidemiology.
1. INTRODUÇÃO
A tuberculose (TB) é uma enfermidade infecciosa transmitida pelo Mycobacterium tuberculosis, que se dissemina pelas vias aéreas quando indivíduos infectados tossirem, espirrarem ou falarem, liberando aerossóis contendo bacilos ativos. Além dos fatores biológicos, a ocorrência da TB está correlacionada com condições socioeconômicas desfavoráveis, como pobreza, desnutrição e moradias precárias, bem como com a presença de outras doenças, como diabetes e infecção por vírus da imunodeficiência humana (HIV) (Pessoa; Gomez, 2022; Tavares et al., 2020; Oliveira et al., 2018).
Nos últimos anos, significativos progressos foram alcançados na abordagem da TB, incluindo avanços no tratamento, desenvolvimento de novas técnicas de diagnóstico e a mobilização de organizações internacionais. Apesar dessas conquistas, a TB continua a ser um dos principais desafios de saúde pública em muitos países em desenvolvimento, representando uma questão que ainda está longe de ser superada. A luta contra a TB tornou-se ainda mais complexa com a chegada do HIV a partir da década de 1980, resultando em um aumento na mortalidade associada à doença, revertendo a tendência de declínio observada anteriormente (Pessoa; Gomez, 2022; BRASIL, 2018).
A TB permanece como uma significativa questão de saúde pública global. Em 2019, estima-se que aproximadamente dez milhões de pessoas tenham contraído TB em todo o mundo, resultando em 1,2 milhão de óbitos atribuídos à doença. Em relação aos resultados do tratamento, em 2018, a taxa de sucesso terapêutico foi de 85% entre os casos de tuberculose recém-diagnosticados (World Health Organization, 2020; Brasil, 2021).
No contexto brasileiro, o país continua a figurar entre os 30 países com alta carga de tuberculose (TB) e coinfecção TB-HIV, sendo designado como uma prioridade para o controle da doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Em 2020, o Brasil reportou 66.819 novos casos de TB, com uma taxa de incidência de 31,6 casos por 100 mil habitantes. No ano anterior, em 2019, foram registrados aproximadamente 4,5 mil óbitos relacionados à TB, com uma taxa de mortalidade de 2,2 óbitos por 100 mil habitantes (Brasil, 2021; World Health Organization, 2020).
Segundo o Boletim Epidemiológico de Tuberculose de 2021, o Brasil registrou um total de 66.819 casos novos de TB com incidência de 31,6 por 100 mil habitantes. Outrossim, registrou 4.532 óbitos por TB com coeficiente de mortalidade de 2,2 por 100 mil habitantes. Dentre as regiões, o Nordeste é a terceira mais incidente (30,1 casos por 100 mil hab.) e a segunda em mortalidade (2,4 por 100 mil hab.) (Brasil, 2021).
O Maranhão, em 2020, registrou 1.955 casos novos de TB apresentando incidência de 27,5/100 mil hab. e coeficiente de mortalidade de 2,4/100 mil hab. (Brasil, 2021). Estudo ecológico mostrou que o Maranhão, entre 2009 e 2018, apresentou 20.192 notificações de casos novos de pacientes tuberculosos, onde a maioria era do sexo masculino, raça/cor parda, de 20 a 39 anos, ensino fundamental incompleto, forma clínica pulmonar e com situação de encerramento para cura (Passarinho Neto et al., 2020).
Localmente, em Imperatriz, entre 2010 e 2019, foram notificados 800 casos de tuberculose, dos quais 68 casos (8,5%) foram identificados como coinfectados com HIV, com base nos resultados positivos para sorologia anti-HIV (Santos et al., 2023). Ademais, com relação a coinfecção TB/HIV, 62 (91%) foram geocodificados, a distribuição espacial dos casos demonstrou heterogeneidade, com taxas de prevalência variando entre 0,00 e 7,00 casos por 100 habitantes, sendo as maiores taxas observadas na região leste dos setores censitários urbanos. O uso do estimador de Kernel revelou a presença de áreas quentes, com uma maior densidade de casos por quilômetro quadrado, especialmente em setores censitários urbanos caracterizados por intensas desigualdades socioespaciais (Santos et al., 2023).
Entender os indicadores epidemiológicos da tuberculose é crucial para o planejamento eficaz de ações destinadas ao controle da doença em diferentes níveis. Isso não apenas possibilita a identificação de necessidades e desafios no manejo da tuberculose, mas também auxilia na compreensão das situações que exigem atenção especial. Esse conhecimento é especialmente relevante diante contexto de enfrentamento da pandemia de COVID-19, que exacerbou os desafios epidemiológicos relacionados à tuberculose tanto no Brasil quanto globalmente (Brasil, 2021).
Durante a pandemia, observaram-se mudanças significativas nos indicadores epidemiológicos e operacionais relacionados à tuberculose. Entre elas, destaca-se a redução no número total de notificações de casos de TB em todos os níveis de atenção, com uma queda mais acentuada na atenção terciária. Além disso, houve uma diminuição no consumo de cartuchos da rede de testes rápidos moleculares para tuberculose, em comparação com o ano de 2019. Essas alterações indicam possíveis impactos da pandemia na detecção e no diagnóstico da tuberculose, destacando a necessidade de medidas específicas para mitigar seus efeitos sobre o controle da doença (Brasil, 2021).
A enfermagem tem um papel fundamental no combate à tuberculose (TB), desde a prevenção e diagnóstico até o tratamento e acompanhamento dos pacientes. A relevância deste estudo para a enfermagem reside em sua capacidade de suprir lacunas de conhecimento e fortalecer a atuação profissional no combate à tuberculose em Imperatriz.
Nesse sentido, o objetivo deste estudo é analisar a incidência e características clínico-epidemiológicas da tuberculose em Imperatriz – Ma, entre os de 2019 a 2023.
2. REFERÊNCIAL TEÓRICO
2.1 Histórico e Epidemiologia da Tuberculose
A tuberculose (TB) é uma doença infecciosa de notificação compulsória que representa um grave problema de saúde pública mundial, sendo responsável por elevadas taxas de morbimortalidade. O agente etiológico, o Mycobacterium tuberculosis, é transmitido principalmente pela via respiratória, através de gotículas eliminadas por pessoas infectadas. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é um dos 30 países que concentram 90% dos casos de tuberculose no mundo, com desafios significativos na prevenção, diagnóstico e tratamento (World Health Organization, 2020). Em 2020, a incidência mundial de TB foi estimada em 10 milhões de novos casos, dos quais o Brasil contribuiu com aproximadamente 96.000 casos notificados (Brasil, 2021).
Além da elevada incidência, a TB apresenta uma distribuição desigual entre diferentes regiões, refletindo disparidades socioeconômicas e fatores de vulnerabilidade. Estudos indicam que as regiões Norte e Nordeste do Brasil apresentam as maiores taxas de incidência, influenciadas por fatores como pobreza, desnutrição e acesso limitado aos serviços de saúde (Pessoa e Gomez, 2022). Tais condições contribuem para a manutenção de cadeias de transmissão e dificultam o alcance das metas globais para o controle da doença (Brasil, 2021).
A coinfecção com o vírus da imunodeficiência humana (HIV) representa um desafio adicional, pois o sistema imunológico comprometido aumenta a probabilidade de desenvolvimento ativo da TB em indivíduos infectados (Martins et al., 2019). O Brasil implementa estratégias integradas de controle da coinfecção TB-HIV, enfatizando o diagnóstico precoce e o tratamento simultâneo para ambas as condições, a fim de reduzir a mortalidade associada (Santos et al., 2021).
Outro aspecto crítico no controle da tuberculose é a adesão ao tratamento. A terapia é longa e exige uso contínuo de medicamentos por pelo menos seis meses, o que pode levar ao abandono por parte dos pacientes. O abandono do tratamento aumenta o risco de resistência medicamentosa, tornando a doença mais difícil de tratar e exigindo medicamentos de segunda linha, que são mais caros e causam mais efeitos colaterais (Nonato et al., 2022). Em Pernambuco, por exemplo, a taxa de abandono do tratamento foi uma das mais elevadas do país entre 2018 e 2022 (Rodrigues et al., 2023).
As políticas públicas de saúde, como o Plano Nacional pelo Fim da Tuberculose, focam na detecção precoce, no fortalecimento da atenção primária e na garantia de tratamento completo para os casos diagnosticados. A implementação de estratégias de vigilância epidemiológica também tem sido importante para mapear e atuar sobre áreas endêmicas (Brasil, 2018). No entanto, a sobrecarga do sistema de saúde e a necessidade de maior integração entre os serviços representam barreiras para a efetiva execução das políticas estabelecidas (Temoteo et al., 2019).
A prevenção da tuberculose também envolve o uso de vacinas. A vacina BCG, utilizada principalmente para proteger crianças contra formas graves da doença, tem seu papel limitado na prevenção de infecções pulmonares em adultos. Pesquisas sobre novas vacinas e tratamentos mais eficazes estão em andamento, buscando alternativas que possam contribuir para a eliminação da TB enquanto problema de saúde pública (Campos, 2006).
Por fim, a superação dos desafios impostos pela tuberculose requer não apenas esforços do setor de saúde, mas também melhorias nas condições sociais e econômicas que favorecem a propagação da doença. A integração de ações intersetoriais, como o combate à pobreza e a promoção de condições adequadas de moradia e alimentação, são medidas essenciais para reduzir a incidência da TB e alcançar as metas estabelecidas pela OMS para 2035 (World Health Organization, 2020).
2.2 Tuberculose no Brasil e no Maranhão
No Brasil, as regiões Norte e Nordeste apresentam as maiores taxas de incidência de tuberculose, especialmente em áreas com elevado nível de vulnerabilidade social e dificuldades no acesso aos serviços de saúde. A concentração da doença nessas regiões reflete desigualdades socioeconômicas e estruturais que impactam negativamente as condições de vida e saúde da população. Fatores como pobreza, desnutrição, e precariedade nas condições de moradia estão fortemente associados à maior transmissão da doença (UFRJ, 2020). Além disso, o acesso limitado a serviços de saúde adequados contribui para o diagnóstico tardio e, consequentemente, para a disseminação do Mycobacterium tuberculosis.
O estado do Maranhão apresenta desafios específicos no combate à tuberculose, sendo um dos estados com maiores taxas de incidência e mortalidade relacionadas à doença. A dificuldade no acesso a serviços de saúde de qualidade e a carência de programas de controle eficazes em algumas áreas rurais e periféricas são fatores que agravam a situação epidemiológica. Dados indicam que a maioria dos casos ocorre em áreas urbanas, mas a falta de infraestrutura e de cobertura da atenção básica em áreas rurais dificulta a detecção e o tratamento precoce, contribuindo para a propagação da tuberculose (Brasil, 2021).
No município de Imperatriz, localizado na região sul do Maranhão, a tuberculose constitui um problema de saúde pública importante. A cidade, caracterizada por uma alta densidade populacional e intensos fluxos migratórios, possui condições que favorecem a disseminação da doença, especialmente em bairros mais populosos e com maior precariedade habitacional. O crescimento urbano desordenado e a migração interna aumentam a concentração de indivíduos em ambientes com pouca ventilação e aglomeração, o que facilita a transmissão do agente infeccioso (Temoteo et al., 2019).
Esforços têm sido realizados para combater a tuberculose no Maranhão, com a implementação de estratégias de controle, como o diagnóstico precoce e o tratamento diretamente supervisionado (TDO). No entanto, a falta de recursos materiais e humanos nos serviços de saúde pública dificulta a realização das ações de forma efetiva, levando a altas taxas de abandono do tratamento, o que favorece o surgimento de formas resistentes da doença. O fortalecimento da atenção primária e a capacitação dos profissionais de saúde são fundamentais para melhorar os índices de cura e reduzir a transmissão (Pessoa e Gomez, 2022).
Outro aspecto importante no controle da tuberculose em Imperatriz e em outras regiões do Maranhão é a coinfecção com o HIV, que aumenta a complexidade dos casos e demanda uma abordagem integrada para o diagnóstico e tratamento. O manejo clínico de pacientes coinfectados requer articulação entre os serviços de saúde e a garantia de acesso contínuo a medicamentos antirretrovirais e à terapia antituberculosa (Martins et al., 2019). Essas medidas visam reduzir a mortalidade associada e melhorar a qualidade de vida dos pacientes.
As políticas públicas, como o Plano Nacional pelo Fim da Tuberculose, têm sido implementadas com o objetivo de eliminar a tuberculose como problema de saúde pública até 2035. Entretanto, os desafios logísticos e a falta de integração entre os níveis de atenção à saúde dificultam a implementação de estratégias mais eficazes em estados como o Maranhão, onde as desigualdades regionais persistem. A ampliação da cobertura vacinal com a vacina BCG e a intensificação das ações de vigilância epidemiológica são passos necessários para o controle da doença (Brasil, 2018).
O fortalecimento das medidas de prevenção e controle da tuberculose no Maranhão requer uma abordagem intersetorial que considere as determinantes sociais da saúde. Ações que busquem reduzir a pobreza, melhorar as condições de habitação e garantir o acesso à educação e aos serviços básicos são fundamentais para quebrar o ciclo de transmissão da doença. Dessa forma, será possível alcançar um controle mais eficaz da tuberculose, melhorando a qualidade de vida das populações afetadas e reduzindo a carga da doença no estado (Rodrigues et al., 2023).
2.3 Características Clínico-Epidemiológicas da Tuberculose
As características clínico-epidemiológicas da tuberculose mostram uma elevada prevalência entre grupos populacionais em situação de vulnerabilidade, como pessoas em situação de rua, presidiários e indivíduos com comorbidades como HIV/AIDS, diabetes mellitus e alcoolismo. Esses grupos apresentam maior risco de infecção e progressão da doença devido a fatores como desnutrição, condições precárias de moradia e acesso limitado a serviços de saúde. A forma pulmonar da tuberculose é a mais comum e a principal responsável pela transmissão, ocorrendo por meio de gotículas respiratórias expelidas durante a tosse, espirro ou fala (BRASIL, 2019).
Os principais sintomas da tuberculose pulmonar incluem tosse crônica (por mais de três semanas), febre vespertina, sudorese noturna e perda de peso inexplicada. Em estágios avançados, o paciente pode apresentar hemoptise, que é a expectoração de sangue, e sinais de insuficiência respiratória. Essas manifestações clínicas são mais severas em indivíduos imunossuprimidos, como aqueles com coinfecção TB-HIV, nos quais a doença pode evoluir rapidamente para formas mais graves e disseminadas, dificultando o diagnóstico precoce e o tratamento (MARTINS et al., 2019).
No contexto do Maranhão, a coinfecção TB-HIV representa um grande desafio para os sistemas de saúde, exigindo uma abordagem integrada para o diagnóstico e o tratamento simultâneo dessas condições. A presença do HIV aumenta em até 20 vezes a probabilidade de um indivíduo com infecção latente pelo Mycobacterium tuberculosis desenvolver a forma ativa da doença. Além disso, o manejo clínico da coinfecção requer a administração concomitante de medicamentos antituberculose e antirretrovirais, o que pode aumentar os efeitos adversos e as interações medicamentosas, dificultando a adesão ao tratamento (Temoteo et al., 2019).
A detecção e o tratamento da tuberculose extrapulmonar também constituem um desafio, especialmente em pacientes com HIV/AIDS, em que a doença pode se manifestar em locais como pleura, linfonodos, ossos e meninges. Essas formas extrapulmonares são menos contagiosas, porém mais difíceis de diagnosticar e tratar, requerendo métodos laboratoriais específicos e acesso a exames de imagem. No Maranhão, a baixa disponibilidade de tecnologias de diagnóstico avançado e a carência de laboratórios com capacidade para realizar cultura de micobactérias limitam a capacidade de confirmação diagnóstica em casos suspeitos (Pessoa e Gomez, 2022).
Outro grupo de risco importante são os portadores de diabetes mellitus, nos quais a tuberculose apresenta uma progressão mais rápida e uma resposta mais lenta ao tratamento. A hiperglicemia crônica associada ao diabetes altera o sistema imunológico e favorece a replicação do Mycobacterium tuberculosis, o que resulta em uma maior gravidade das manifestações clínicas. Dados sugerem que o controle glicêmico rigoroso é essencial para reduzir o risco de complicações e melhorar os desfechos terapêuticos nesses pacientes (Rodrigues et al., 2023).
A situação prisional no Maranhão, onde a superlotação e as condições insalubres são comuns, contribui significativamente para a disseminação da tuberculose. A alta densidade populacional em espaços confinados favorece a transmissão do bacilo entre os detentos, resultando em taxas de incidência significativamente superiores às observadas na população em geral. A dificuldade em garantir o seguimento adequado do tratamento e a alta rotatividade da população carcerária aumentam as chances de desenvolvimento de tuberculose resistente a múltiplas drogas, um grave problema de saúde pública (Brasil, 2021).
No cenário da saúde pública maranhense, destaca-se a importância da busca ativa de casos em grupos vulneráveis como uma estratégia essencial para reduzir a transmissão e melhorar os índices de cura. A realização de campanhas de sensibilização e o fortalecimento da atenção primária são medidas fundamentais para garantir o diagnóstico precoce e a adesão ao tratamento, especialmente em comunidades com maior risco epidemiológico (UFRJ, 2020). Essas ações são complementadas pela ampliação do acesso a exames diagnósticos e pelo fornecimento de tratamento supervisionado para garantir que os pacientes completem o regime terapêutico recomendado.
2.4 Importância do Diagnóstico e Tratamento
O diagnóstico precoce e o tratamento adequado da tuberculose são medidas essenciais para reduzir a transmissão e prevenir complicações graves. A detecção oportuna dos casos permite a instituição imediata do tratamento, interrompendo a cadeia de transmissão e diminuindo o risco de disseminação na comunidade. No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece o tratamento gratuitamente, composto por uma combinação de antibióticos administrados durante seis meses, que inclui rifampicina, isoniazida, pirazinamida e etambutol nos primeiros dois meses, seguidos por rifampicina e isoniazida nos quatro meses subsequentes (BRASIL, 2021).
A adesão ao tratamento, no entanto, constitui um dos principais desafios no controle da doença, especialmente em populações vulneráveis, como pessoas em situação de rua e usuários de drogas. O abandono terapêutico, caracterizado pela interrupção do uso dos medicamentos antes da conclusão do regime recomendado, pode resultar em resistência medicamentosa. Essa resistência, particularmente à rifampicina e à isoniazida, complica o manejo da tuberculose, pois requer o uso de esquemas terapêuticos alternativos, mais prolongados e com maior potencial de efeitos adversos (SANTOS et al., 2020).
Para melhorar a adesão ao tratamento, a estratégia de Tratamento Diretamente Observado (TDO) é recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e adotada pelo Ministério da Saúde do Brasil. No TDO, um profissional de saúde supervisiona a ingestão dos medicamentos pelo paciente, garantindo que as doses sejam administradas corretamente e reduzindo as taxas de abandono. Essa prática tem se mostrado eficaz na melhoria das taxas de cura e na diminuição da incidência de tuberculose resistente a múltiplas drogas, especialmente em regiões com altos índices de abandono (WHO, 2020).
A importância do diagnóstico também se reflete no uso de técnicas laboratoriais avançadas para a identificação do Mycobacterium tuberculosis e para a detecção de resistência medicamentosa. Testes moleculares rápidos, como o GeneXpert, permitem a confirmação diagnóstica em poucas horas e identificam a resistência à rifampicina, auxiliando na definição do esquema terapêutico mais adequado. Contudo, o acesso a esses testes ainda é limitado em algumas regiões do Brasil, especialmente em áreas rurais e nas periferias das grandes cidades, o que dificulta o diagnóstico precoce (MARTINS et al., 2019).
A continuidade do tratamento é particularmente crítica em casos de tuberculose multirresistente, onde a taxa de cura é consideravelmente menor e o regime terapêutico pode se estender por até dois anos. Nesse contexto, o uso de medicamentos de segunda linha, como levofloxacina e amicacina, é necessário, e os efeitos adversos frequentes podem comprometer ainda mais a adesão dos pacientes ao tratamento. Programas de apoio social, que incluem fornecimento de alimentação e incentivos financeiros para pacientes em tratamento, têm sido implementados em algumas localidades com o objetivo de melhorar a adesão e os desfechos clínicos (Rodrigues et al., 2023).
Além do tratamento, a profilaxia pós-exposição é uma estratégia importante para prevenir a progressão da infecção latente para a forma ativa da doença, especialmente em contatos próximos de casos confirmados. A isoniazida, administrada por um período de seis a nove meses, é amplamente utilizada na profilaxia de indivíduos com maior risco de desenvolver a doença, como crianças menores de cinco anos e pessoas vivendo com HIV (Brasil, 2019). A ampliação do acesso a essa medida preventiva é um componente fundamental na estratégia de eliminação da tuberculose em longo prazo.
No Maranhão, os desafios para a implementação efetiva dessas estratégias são agravados por questões estruturais, como a escassez de profissionais de saúde treinados e a falta de laboratórios equipados para a realização de testes moleculares. Programas de capacitação para profissionais de saúde e investimentos em infraestrutura laboratorial são essenciais para fortalecer a resposta ao controle da tuberculose no estado (UFRJ, 2020). Além disso, campanhas educativas para a população são importantes para aumentar a conscientização sobre os sintomas da doença e a importância de completar o tratamento.
Em conclusão, o diagnóstico precoce e o tratamento adequado, aliados a estratégias de adesão ao tratamento e profilaxia, são fundamentais para o controle da tuberculose. Superar os desafios existentes requer esforços coordenados dos sistemas de saúde e da sociedade, visando à redução das taxas de morbidade e mortalidade associadas à doença.
2.5 Tuberculose em Imperatriz
Em Imperatriz, o cenário da tuberculose reflete a complexidade enfrentada em regiões com alta carga da doença. A cidade, com grande densidade populacional e significativa migração interna, apresenta desafios específicos para o controle da tuberculose, como o acesso desigual aos serviços de saúde e as condições de vida precárias de parte da população. Tais fatores contribuem para a maior vulnerabilidade à infecção e para a manutenção das altas taxas de incidência. A análise das características sociodemográficas dos pacientes é essencial para entender os fatores de risco associados e para direcionar melhor as políticas de saúde (BRASIL, 2019).
A coinfecção por HIV é um dos aspectos mais preocupantes na epidemiologia da tuberculose em Imperatriz. O HIV compromete o sistema imunológico, aumentando a susceptibilidade ao Mycobacterium tuberculosis e a progressão para a forma ativa da doença. Estudos indicam que pessoas vivendo com HIV têm um risco significativamente maior de desenvolver tuberculose, o que exige uma abordagem integrada dos serviços de saúde para o manejo dessas condições. Em Imperatriz, as taxas de coinfecção apresentam variações conforme os bairros, evidenciando a necessidade de estratégias diferenciadas para populações específicas (MARTINS et al., 2019).
A resistência a medicamentos antituberculose é outro desafio importante na região. Casos de tuberculose resistente e multirresistente dificultam o tratamento e aumentam os custos para o sistema de saúde. Em Imperatriz, a detecção de resistência à rifampicina, por meio de testes rápidos como o GeneXpert, é crucial para iniciar o tratamento adequado e evitar a disseminação de cepas resistentes. No entanto, o acesso a esses testes ainda é limitado em áreas mais afastadas da zona urbana, o que compromete o diagnóstico precoce e o início oportuno do tratamento (UFRJ, 2020).
A vacina BCG (Bacillus Calmette-Guérin), aplicada em recém-nascidos, constitui uma das principais medidas de prevenção contra formas graves de tuberculose, como a meningite tuberculosa e a tuberculose miliar. Em Imperatriz, a cobertura vacinal tem se mantido próxima dos padrões nacionais, porém, variações na cobertura entre diferentes bairros podem indicar desigualdade no acesso aos serviços de vacinação. A análise da cobertura vacinal é importante para identificar áreas que necessitam de esforços adicionais para garantir que a vacina seja acessível a toda a população (BRASIL, 2019).
Além disso, os determinantes sociais da saúde, como pobreza, educação limitada e condições de moradia inadequadas, são fatores que influenciam a propagação da tuberculose em Imperatriz. A concentração de casos em áreas com alta densidade populacional e infraestrutura deficiente sugere a necessidade de intervenções que vão além do tratamento médico. Programas de melhoria das condições de vida e iniciativas para aumentar a conscientização da população sobre a doença são fundamentais para um controle efetivo (WHO, 2020).
Outro aspecto relevante é a detecção dos casos de tuberculose latente, que se trata de indivíduos infectados pelo Mycobacterium tuberculosis, mas que não apresentam sintomas. Identificar e tratar essas pessoas pode prevenir a progressão para a forma ativa da doença, contribuindo para a redução da transmissão. Em Imperatriz, a implementação de estratégias de rastreamento para populações de risco, como contatos próximos de casos confirmados, pode ser um passo importante para a eliminação da tuberculose (Rodrigues et al., 2023).
Por fim, a participação comunitária no controle da tuberculose é crucial. O envolvimento da população em ações de saúde, como campanhas educativas e programas de apoio ao tratamento, fortalece a rede de cuidados e promove uma maior adesão ao tratamento. Em Imperatriz, a colaboração entre os serviços de saúde e a comunidade pode facilitar a identificação precoce de casos e reduzir o estigma associado à doença, melhorando os indicadores de saúde relacionados à tuberculose (BRASIL, 2019).
Portanto, o enfrentamento da tuberculose em Imperatriz demanda uma abordagem multifacetada, que considere as especificidades locais e integre ações de diagnóstico, tratamento, prevenção e melhoria das condições de vida. Somente com uma estratégia abrangente será possível reduzir significativamente o impacto da tuberculose na cidade e alcançar as metas de controle propostas pelos programas de saúde pública.
3 MATERIAIS E MÉTODOS
Trata-se de um estudo epidemiológico descritivo, com abordagem quantitativa, utilizando dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), disponível no Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). O estudo abrangeu casos novos de tuberculose notificados na cidade de Imperatriz – Ma durante o período de janeiro de 2019 a dezembro de 2023.
O município possui uma população estimada de 259.980 habitantes e abrange uma área territorial de 1.369,039 km². De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, conta com 102 estabelecimentos de saúde cadastrados no Sistema Único de Saúde (SUS). Localizado a 626 km da capital São Luís, o município destaca-se como polo universitário e comercial da região Tocantina, sendo o segundo maior centro populacional, econômico, universitário, político, de serviços de saúde e cultural do estado do Maranhão. Além disso, apresenta 48,3% de esgotamento sanitário adequado e uma taxa de 86% de abastecimento de água potável. Quanto à educação, a taxa de analfabetismo é de 9,7% (IBGE, 2021; Santos et al., 2023).
As variáveis epidemiológicas sob investigação compreenderam sexo, raça/cor, faixa etária, escolaridade, forma clínica da doença, primeira cultura de escarro, coinfecção TB/HIV, Tratamento diretamente observado (TDO) realizado, baciloscopia 6º mês, tabagismo, alcoolismo, situação de encerramento do caso. A coleta de dados ocorreu em junho de 2024.
A taxa de incidência de TB foi calculada considerando o número total de registros de TB confirmada, de acordo com o ano, dividido pela estimativa populacional da cidade para o respectivo ano, multiplicado por 100 mil habitantes (Passarinho Neto et al., 2020), conforme apresentado abaixo.
As estimativas populacionais foram obtidas por meio da estimativa de população do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), acessadas através do Sistema IBGE de Recuperação Automática – SIDRA (IBGE, 2011).
Entretanto, como o site só disponibiliza de estimativas até o ano de 2021, para os anos de 2022 e 2023, utilizou-se o método de crescimento exponencial, que considera a variação proporcional ao tamanho da população. A fórmula utilizada foi P(t)=P0 x (1+ r)t onde P0 é a população em 2019, r é a taxa de crescimento anual, e t o número de anos desde o ano base. A taxa r foi calculada com base na variação entre 2019 e 2021, por meio da fórmula r = (P2021/P2019)1/2 – 1, permitindo assim projetar a população dos anos subsequentes.
Os dados passaram por análise descritiva da distribuição de frequência das características sociodemográficas e clínicas dos casos novos confirmados, através do cálculo dos valores absolutos e relativos (Tavares et al., 2020).
Como o estudo foi conduzido utilizando dados de domínio público, não foi necessária a apreciação pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), conforme estabelecido pelas diretrizes brasileiras em vigor.
4 RESULTADOS
No período sob investigação foram notificados 447 casos novos de tuberculose distribuídos na cidade de Imperatriz. A taxa de detecção de novos casos, foi maior no ano de 2022, com 40,20 casos/100.000 hab., e menor em 2021, com 25,90 casos/100.000 mil hab.
Figura 1 – Incidência da Tuberculose em Imperatriz – MA entre os anos de 2019 e 2023. Imperatriz, Maranhão, Brasil, 2023.
Quanto às características epidemiológicas, a maioria dos casos era do sexo masculino (64,20%), raça/cor parda (64,42%), forma clínica pulmonar (86,35%), primeira cultura de escarro positiva (53,02%), coinfecção TB/HIV negativo (85,45%), TDO não realizado (83,22%), não tabagista (87,48%), não etilista (90,38%) e com evolução à cura (76,51%). Ademais, destacou-se a faixa etária de 20 a 29 anos (22,37%), 5º a 8º série incompleta do EF (13,64%) e baciloscopia 6º mês não realizada (33,78%).
Ressalta-se, que foram ignorados dados nas variáveis raça/cor (1,35%), escolaridade (31,55%), TDO realizado (0,68%), baciloscopia 6º mês (23,26%) e situação de encerramento (8,95%).
Tabela 1 – Características clínico-epidemiológicas do da Tuberculose em Imperatriz – MA entre os anos de 2019 e 2023. Imperatriz, Maranhão, Brasil, 2024.
5 DISCUSSÃO
Segundo os resultados, a maior taxa de incidência foi no ano de 2022 (40,20 casos/100.000 hab.), e a menor em 2021 (25,90 casos/100.000 mil hab.).Um estudo epidemiológico sobre a incidência de tuberculose no Brasil identificou que entre janeiro de 2015 e março de 2020 houve uma tendência de aumento no número de casos de TB (β=0,013; p<0,001). No entanto, houve uma queda abrupta em abril de 2020 (β=-0,781; p<0,001), coincidindo com o início da pandemia de COVID-19, o que pode ser atribuído à interrupção dos serviços de saúde e ao impacto das medidas de isolamento social (Silva; Galvão, 2024).
Nos meses subsequentes, até dezembro de 2022, verificou-se uma nova aceleração dos casos (β=0,025; p<0,001), sugerindo a recuperação parcial dos serviços de diagnóstico e tratamento. De acordo com a modelagem Sarima, se essas tendências forem mantidas, a projeção para a incidência de tuberculose entre 2023 e 2030 indica um crescimento contínuo, alertando para a necessidade de estratégias reforçadas de controle da doença (Silva; Galvão, 2024).
Quanto ao sexo a maioria dos casos era do sexo masculino (64,20%), assim como estudo realizado em Santa Catarina, o qual aponta o que 68,5% dos casos eram do sexo masculino (Pereira et al., 2022). Diversos fatores podem explicar a maior incidência de diagnósticos de tuberculose entre os homens. Aspectos biológicos, socioculturais, comportamentais e ocupacionais desempenham um papel importante nessa diferença. Além disso, fatores de risco, como o tabagismo e o consumo de álcool, que são mais comuns entre os homens, contribuem para a maior vulnerabilidade desse grupo à infecção (Hertz; Schneider, 2019).
Quanto à raça/cor a maioria era parda (64,42%), um estudo que investigou o perfil epidemiológico da TB em Alagoas também apontou a raça/cor parda como mais frequente, com 65,76% dos casos (Santos et al., 2019). Esse achado pode estar relacionado ao número de pessoas pardas presentes no estado, considerando que essa é a raça predominante no Maranhão (IBGE, 2010). É importante destacar que, historicamente, a colonização do território maranhense envolveu diferentes grupos étnicos ao longo do tempo, resultando em uma significativa miscigenação e, consequentemente, no predomínio da cor parda na população (Barros et al., 2023).
Quanto à forma clínica houve predomínio da forma pulmonar (86,35%), assim como estudos epidemiológicos conduzidos em Alagoas e Santa Catarina (Santos et al., 2019; Pereira et al., 2022). O resultado obtido nesta pesquisa era esperado, considerando que o pulmão oferece condições ideais para o crescimento bacteriano, sendo a principal porta de entrada do Mycobacterium tuberculosis. Dessa forma, é provável que a disseminação tenha ocorrido por contiguidade, ou ainda por via linfática ou hematogênica, especialmente em indivíduos com imunossupressão (Campos et al., 2006; Pereira et al., 2022).
Com relação aos dados da primeira cultura de escarro foi positiva em 53,02% dos casos. A cultura é considerada o “padrão ouro” para a detecção do Mycobacterium tuberculosis, pois requer apenas 10 a 100 células bacterianas viáveis para obter um resultado positivo. Apresenta alta especificidade e sensibilidade, dependendo da amostra. Nos casos pulmonares paucibacilares, onde a baciloscopia é negativa, a cultura pode aumentar o diagnóstico bacteriológico em até 30%, sendo o método mais eficaz para detectar tuberculose em pacientes com baixa carga bacilar (Santos et al., 2024).
Os resultados revelaram que quanto à coinfecção TB/HIV a maioria dos casos era negativo (85,45%). Estudo ecológico realizado em Imperatriz-MA entre os anos de 2010 e 2019 apresentou que houve 68 casos da coinfecção (Santos et al., 2023). Em 2018, cerca de 8,6% dos casos de tuberculose (TB) no mundo estavam associados ao HIV, totalizando 862 mil pessoas co-infectadas (OMS, 2019a). Em 2021, essa proporção caiu para aproximadamente 6,7% dos casos de TB, uma redução constante ao longo dos anos (WHO, 2022).
A coinfecção TB/HIV afeta de maneira desproporcional indivíduos em situação de vulnerabilidade social, que frequentemente carecem de recursos adequados para prevenir, diagnosticar, tratar e controlar tanto a TB quanto o HIV/Aids. Esse cenário é particularmente grave em áreas subdesenvolvidas e densamente povoadas, como em partes do continente africano, que concentram mais de 50% dos casos mundialmente registrados (WHO, 2019b; WHO, 2022).
Na maioria dos casos, o TDO não foi realizado (83,22%), esse resultado difere de estudo realizado em Fortaleza, Ceará, onde o mesmo foi realizado em 55,32% dos casos (Sousa et al., 2021). Estudo realizado no estado do Mato Grosso, observou que as altas taxas de abandono do tratamento de TB estão associadas a não realização do TDO (Santos et al., 2021). Ressalta-se, que existem muitos desafios para a implementação dessa estratégia no serviço público, como o deslocamento dos pacientes até o serviço e o desconforto dos mesmos durante a supervisão do tratamento. Dessa forma, cabe aos profissionais de saúde oferecerem um serviço humanizado, pois a implementação do TDO fornece melhores resultados nos indicadores de cura (Santos et al., 2021; Pessoa et al., 2022).
A maioria dos casos tratavam de pessoas não tabagistas (87,48%) e não etilistas (90,38%). Estudo realizado no estado de Pernambuco traz resultados que corroboram com o desta pesquisa (Rodrigues et al., 2023). No entanto, é válido destacar que os tabagistas são mais suscetíveis a contrair a infecção e apresentar quadros mais graves da doença. Além disso, o consumo de bebidas alcoólicas é um dos principais fatores para a descontinuidade do tratamento de TB, pois devido às dificuldades da abstinência o paciente tende a retomar o consumo, dificultando a eliminação da doença e contribuindo para a propagação de bacilos resistentes (Nonato et al., 2022; Sousa et al., 2020).
Os resultados destacam que a maioria dos pacientes evoluíram para cura (76,51%), assim como em estudo realizado no estado de Alagoas (Santos et al., 2019). Entretanto, destaca-se que casos de abandono do tratamento são frequentes no território brasileiro. Esse problema pode ser resultado de falhas na assistência, falta de humanização nos serviços e efeitos adversos do tratamento. O acompanhamento e o fornecimento de informações por parte dos profissionais de saúde são essenciais para promover a adesão, o autocuidado e o sucesso do tratamento e consequentemente a cura (Barboza e Ferrer, 2019; Nonato et al., 2022).
Quanto à faixa etária, houve destaque para a população adulto jovem, de 20 a 29 anos (22,37%), assim como em estudo realizado na região Nordeste do Brasil (Sousa et al., 2020). Ressalta-se, que a tuberculose pode atingir faixas etárias distintas a depender dos fatores socioeconômicos e regionais. Em países desenvolvidos, a população idosa é mais atingida devido a supressão do sistema imunológico, já em países subdesenvolvidos, a população adulto jovem é a mais acometida, uma vez que estão inseridos no mercado de trabalho. Ademais, é a população com maior taxa de abandono do tratamento, devido a incompatibilidade com a carga horária de trabalho (Júnior et al., 2020; Santos et al., 2021).
Quanto à escolaridade, a maior parcela dos pacientes apresentava baixa escolaridade, 5º a 8º série incompleta do ensino fundamental (EF) (13,64%). Esse resultado corrobora com os de um estudo realizado no estado do Paraná, variando apenas o percentual (Nonato et al., 2022). Ressalta-se, que a TB é considerada um agravo social e que pacientes com baixa escolaridade e em situação de pobreza tendem a ter baixo autocuidado e enfrentam mais dificuldades no acesso aos serviços de saúde (Pereira et al., 2022).
Quanto à baciloscopia do 6º mês, a maioria dos casos foi apontado como não realizado (33,78%), o que pode indicar falhas no acompanhamento ou dificuldades logísticas na condução do TDO. Entretanto, vale ressaltar que 32,0% indicaram a baciloscopia negativa, reforçando a importância da adesão às terapias e o monitoramento contínuo dos pacientes. Esse dado indica que, apesar das lacunas no controle, a estratégia de tratamento supervisionado está cumprindo seu papel em reduzir a carga bacilar e promover a cura (Temoteo et al., 2019).
Este estudo epidemiológico apresenta algumas limitações que devem ser consideradas na interpretação dos resultados, uma delas é a presença de dados ignorados em algumas variáveis. A subnotificação de casos de tuberculose também se apresenta como uma limitação, especialmente em períodos de maior sobrecarga dos serviços de saúde, como durante a pandemia de COVID-19. A subnotificação pode levar a uma subestimação da real incidência da doença e dos seus determinantes epidemiológicos, dificultando a identificação precisa do perfil dos pacientes e a implementação de estratégias de controle mais eficazes.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No período sob investigação foram notificados 447 casos novos de tuberculose distribuídos na cidade de Imperatriz. A taxa de detecção de novos casos, foi maior no ano de 2022 e menor em 2021. Quanto às características epidemiológicas, a maioria dos casos era do sexo masculino, raça/cor parda, forma clínica pulmonar, primeira cultura de escarro positiva, coinfecção TB/HIV negativo, TDO não realizado, não tabagista, não etilista e com evolução à cura. Ademais, destacou-se a faixa etária de 20 a 29 anos, 5º a 8º série incompleta do EF e baciloscopia 6º mês não realizada.
Os achados deste estudo revelam que, embora haja avanços significativos no controle da tuberculose, ainda persistem desafios substanciais que precisam ser superados. É essencial investir em estratégias que ampliem o acesso e a adesão ao tratamento, promovam uma abordagem mais humanizada no acompanhamento dos pacientes, e que desenvolvam ações intersetoriais para enfrentar as barreiras socioeconômicas e educacionais. Dessa forma, será possível não apenas melhorar os indicadores de cura, mas também fortalecer a resposta do sistema de saúde no combate à tuberculose, contribuindo para a redução da morbimortalidade associada à doença.
REFERÊNCIAS
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