INCIDÊNCIA DE TRANSTORNO DE ANSIEDADE GENERALIZADA EM ACADÊMICOS DE MEDICINA: UMA REVISÃO DE LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10528494


Kamilla Fonseca da Silva1
Ulisses Rezende Brandão2
Juliana Lilis da Silva2
Natália de Fátima Gonçalves Amâncio2


RESUMO

Introdução: A graduação em medicina, com suas exigências e competências, contribui para a alta incidência de transtornos psiquiátricos. A etiologia do Transtorno de Ansiedade Generalizada é multifatorial, envolvendo fatores estressores psicossociais e genéticos. A população acadêmica nesse campo é suscetível a sintomas de depressão e ansiedade, impactando no desempenho acadêmico e na prática médica. Objetivo: Analisar a incidência do Transtorno de Ansiedade Generalizada em acadêmicos de medicina, bem como avaliar os fatores de risco associados e o impacto na saúde e no desempenho acadêmico. Método: Trata-se de uma revisão integrativa da literatura, com uma busca abrangente de artigos nos últimos cinco anos nas bases de dados BVS, Google Scholar, SciELO, PubMed e EbscoHost. A estratégia PICO orientou a definição da questão central: “Qual a incidência de transtorno de ansiedade generalizada em acadêmicos de medicina?”. O processo seguiu critérios de inclusão e exclusão, resultando na análise de 28 artigos. Resultados: A análise dos artigos identificou uma elevada incidência de ansiedade entre acadêmicos de medicina, com uma marcante predominância de sintomas entre estudantes do sexo feminino, do ciclo básico e maiores de 20 anos. O estudo destaca fatores como sobrecarga acadêmica, questões de gênero, uso  indevido de psicoestimulantes e a relação com a síndrome de Burnout. Discussão: Destaca a vulnerabilidade intrínseca desses estudantes a transtornos mentais e como elas repercutem em suas esferas pessoal e profissional. O estudo sublinha a multicausalidade dos sintomas ansiosos, a recorrência de automedicação de psicotrópicos e enfoca a relação entre a prática médica futura e os desafios emocionais durante a graduação. Além disso, apresenta possíveis intervenções não farmacológicas para a melhoria do bem-estar emocional e do desempenho acadêmico. Conclusão: Este estudo ressalta a necessidade urgente de atenção à saúde mental dos acadêmicos de medicina. Os resultados apontam para a complexidade dos fatores contribuintes e a importância de estratégias preventivas não farmacológicas e de promoção da saúde mental dentro das próprias instituições de ensino.

Palavras-chaves: Ansiedade, estudantes de medicina, saúde mental.

ABSTRACT

Introduction: Graduation in medicine, with its requirements and skills, contributes to the high incidence of psychiatric disorders. The etiology of Generalized Anxiety Disorder is multifactorial, involving psychosocial and genetic stressors. The academic population in this field is susceptible to symptoms of depression and anxiety, impacting academic performance and medical practice. Objective: To analyze the incidence of Generalized Anxiety Disorder in medical students, as well as evaluate the associated risk factors and the impact on health and academic performance. Method: This is an integrative literature review, with a comprehensive search for articles in the last five years in the VHL, Google Scholar, SciELO, PubMed and EbscoHost databases. The PICO strategy guided the definition of the central question: “What is the incidence of generalized anxiety disorder in medical students?”. The process followed inclusion and exclusion criteria, resulting in the analysis of 28 articles. Results: The analysis of the articles identified a high incidence of anxiety among medical students, with a marked predominance of symptoms among female students, in the basic cycle and over 20 years of age. The study highlights factors such as academic overload, gender issues, misuse of psychostimulants and the relationship with Burnout syndrome. Discussion: Highlights the intrinsic vulnerability of these students to mental disorders and how they impact their personal and professional spheres. The study highlights the multicausality of anxious symptoms, the recurrence of psychotropic self-medication and focuses on the relationship between future medical practice and emotional challenges during graduation. Furthermore, it presents possible non-pharmacological interventions to improve emotional well-being and academic performance. Conclusion: This study highlights the urgent need for attention to the mental health of medical students. The results point to the complexity of the contributing factors and the importance of non-pharmacological preventive strategies and mental health promotion within educational institutions themselves.

Keywords: Anxiety, medical students, mental health.

1 INTRODUÇÃO

Os transtornos mentais têm sido objeto de debates significativos desde a Grécia Antiga até os tempos contemporâneos. Primordialmente, “doença mental” era encarada como um mal ao qual todo homem estaria sujeito a enfrentar, sendo caracterizada por uma perda de razão ou um adoecimento físico, interpretada como um castigo divino. Hipócrates, frequentemente considerado o patrono da medicina ocidental, introduziu uma nova perspectiva sobre o sofrimento psíquico, desvinculando-o de explicações sobrenaturais e propondo que fosse compreendido como um desequilíbrio corporal, baseado em sua teoria dos humores no século IV a.C. (FERREIRA et al., 2023).

Na sociedade atual, o adoecimento mental tem, para além das bases neurobiológicas, sido associado ao ritmo de vida acelerado, a qual as pessoas, majoritariamente, encontram-se mergulhadas numa exigência social de produtividade, que desencadeia, principalmente, sintomas característicos de ansiedade (DIAS et al., 2021). A palavra “ansiedade” encontra suas raízes no latim, “anxietas”, e traz o significado de “aflição, angústia e perturbação causada pela incerteza”. Entretanto, quando essa emoção transcende os limites do efêmero e se torna um padrão comportamental, adquire natureza patológica, apresentando sintomas intensificados e desproporcionais ao estímulo desencadeante (SILVA et al., 2021).

É notório que a graduação de medicina engloba uma jornada de grandes exigências e competências necessárias que se estendem ao longo dos períodos. Dessa forma, faz-se necessário absorver uma ampla gama de conhecimentos em um tempo relativamente curto, abrangendo não apenas respectivo aos entendimentos médicos, mas também habilidades essenciais para interações interpessoais. Por esses e outros precedentes, a incidência de transtornos psiquiátricos no decorrer da formação acadêmica na área da medicina revela-se notavelmente alta (CARRIJO et al., 2020).

Sabe-se que a etiologia do Transtorno de Ansiedade Generalizada é multifatorial, consistindo em fatores de risco estressores psicossociais, como também fatores genéticos (MOTA; MAGALHÃES 2020). Desse modo, além dos supracitados, podem ser destacados outros fatores predisponentes para sintomas de ansiedade em acadêmicos de medicina, tais como: restrições financeiras, escassez de tempo para o lazer ou atividades não relacionadas à medicina, sobrecarga de informações e competição por alto desempenho, além do confronto com questões de ligadas à morte e ao sofrimento (OTTERO et al, 2022).

Com efeito, acadêmicos de medicina formam uma população que está suscetível ao desenvolvimento de sintomas de depressão e ansiedade, que podem impactar no desempenho acadêmico, na saúde física e ocasionar a redução da empatia e ética (MACHADO et al, 2019). Ademais, nota-se uma reciprocidade negativa entre assertividade e nível de ansiedade, a qual interfere no comportamento assertivo, uma habilidade médica crucial, acarretando prejuízos ao desenvolvimento do conhecimento profissional e à aprendizagem da prática médica (BARBOSA et al, 2020).

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, o Brasil possui taxas de Transtorno de Ansiedade Generalizada exibindo prevalência de 9,3%. Contudo, entre os estudantes do curso de medicina as taxas são substancialmente superiores, com cerca de 30,6% para ansiedade e 49,9% para estresse. Tais dados justificam a necessidade premente deste estudo e reforçam a importância de direcionar uma atenção ampliada a esse grupo (MOURA et al, 2023). Diante do exposto, o objetivo do presente artigo reside em examinar a incidência do Transtorno de Ansiedade Generalizada em acadêmicos de medicina, bem como avaliar os fatores de risco associados e o impacto na saúde e no desempenho acadêmico do estudante.

2 METODOLOGIA

O presente estudo consiste de uma revisão exploratória integrativa de literatura. A revisão integrativa foi realizada em seis etapas: 1) identificação do tema e seleção da questão norteadora da pesquisa; 2) estabelecimento de critérios para inclusão e exclusão de estudos e busca na literatura; 3) definição das informações a serem extraídas dos estudos selecionados; 4) categorização dos estudos; 5) avaliação dos estudos incluídos na revisão integrativa e interpretação e 6) apresentação da revisão.

Na etapa inicial, para definição da questão de pesquisa utilizou-se da estratégia PICO (Acrômio para Patient, Intervention, Comparation e Outcome). Assim, definiu-se a seguinte questão central que orientou o estudo: “Qual a incidência de transtorno de ansiedade generalizada em acadêmicos de medicina?” Nela, observa-se o P: Acadêmicos de Medicina; I: Transtorno de ansiedade generalizada; C: Não apresenta; O: Incidência.

 Para responder a esta pergunta, foi realizada a busca de artigos envolvendo o desfecho pretendido utilizando as terminologias cadastradas nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCs) criados pela Biblioteca Virtual em Saúde desenvolvido a partir do Medical Subject Headings da U.S. National Library of Medcine, que permite o uso da terminologia comum em português e inglês. Os descritores utilizados foram: generalized anxiety disorder, medical students, anxiety, common mental disorders, anxiety symptoms, mental health, anxiety risk factors. Para o cruzamento das palavras chaves utilizou-se o operador booleano “and”.

Realizou-se um levantamento bibliográfico por meio de buscas eletrônicas nas seguintes bases de dados: Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), Google Scholar, Scientif Eletronic Library Online (SciELO), National Library of Medicine (PubMed), EbscoHost.

A busca foi realizada no mês de setembro de 2023. Como critérios de inclusão, limitou-se a artigos escritos em português, inglês e espanhol, publicados nos últimos 5 anos (2019 a 2023), que abordassem o tema pesquisado e que estivem disponíveis eletronicamente em seu formato integral, foram excluídos os artigos em que o título e resumo não estivessem relacionados ao tema de pesquisa e pesquisas que não tiverem metodologia bem clara.

Após a etapa de levantamento das publicações, encontrou 76 artigos, dos quais foram realizados a leitura do título e resumo das publicações considerando o critério de inclusão e exclusão definidos. Em seguida, realizou a leitura na íntegra das publicações, atentando-se novamente aos critérios de inclusão e exclusão, sendo que 48 artigos não foram utilizados devido aos critérios de exclusão. Foram selecionados 28 artigos para análise final e construção da revisão.

Posteriormente a seleção dos artigos, realizou um fichamento das obras selecionadas afim de selecionar a coleta e análise dos dados. Os dados coletados foram disponibilizados em um quadro, possibilitando ao leitor a avaliação da aplicabilidade da revisão integrativa elaborada, de forma a atingir o objetivo desse método.

A Figura 1 demonstra o processo de seleção dos artigos por meio das palavras-chaves de busca e da aplicação dos critérios de inclusão e exclusão citados na metodologia. O fluxograma leva em consideração os critérios elencados pela estratégia PRISMA (PAGE et al., 2021).

Figura 1 – Fluxograma da busca e inclusão de artigos

Fonte: Adaptado do Preferred Reporting Items for Systematic review and Meta-Analyses (PRISMA). PAGE et al., (2021).

3 RESULTADOS

A tabela 1 sintetiza os principais artigos que foram utilizados na presente revisão de literatura, contendo informações relevantes sobre os mesmos, como os autores do estudo, o ano de publicação, o título e os achados relevantes.

Tabela 1- Aspectos relacionados ao transtorno de ansiedade generalizada em acadêmicos de medicina no período de 2019 a 2023.

EstudoTítuloAchados Principais
1. ABDIVALIEVNA; QIZI, 2023Psychological characteristics of anxiety in medical students  O alto nível de ansiedade pode impactar negativamente os processos mentais, como a memória e a atenção.  
2. MOURA et al, 2023A prevalência de sintomas de ansiedade em acadêmicos de medicina  ↑ prevalência de ansiedade entre academicos do sexo feminino.  
3. LOFFREDO; MARTINS, 2023Ansiedade e aproveitamento acadêmico de estudantes de medicina: revisão sistemáticaO sucesso acadêmico será alcançado quando superadas as barreiras de saúde mental, devendo ser criadas estratégias para o processo de aprendizagem, com acompanhamento especializado.  
4. SILVA, J. et al, 2023Mental health and psychodrugs use among medical students  ↑ uso de psicotrópicos entre estudantes do 3º e 4º ano do curso.
5. SILVA, N. et al, 2023Uso de psicofármacos por estudantes de medicina e engenharias  Uso indevido de psicoestimulantes por acadêmicos de medicina.
6. AMARAL et al, 2022Precisamos falar sobre uso de Metilfenidato por estudantes de medicina – revisão da literatura  ↑ taxas de uso do Metilfenidato por estudantes de medicina.  
7. CARVALHO et al, 2022A prevalência do adoecimento psicológico e psiquiátrico estudantes de medicina: uma revisão integrativa  O estigma associado aos transtornos mentais levam a uma ↓ procura por ajuda e  por tratamento adequado.  
8. MAGALHÃES; MAIA, 2022Sintomas depressivos e ansiosos em estudantes de medicina e seus fatores associadosA ansiedade pode acarretar no descuido pessoal, automedicação e predisposição para outras patologias.  
9. OTTERO et al., 2022A saúde mental dos estudantes de medicina: uma revisão de literaturaAspectos associados à ansiedade: privação do sono e presença de relacionamento não satisfatório com familiares, colegas de sala e professores.
 10. PIFFER et al., 2022  Prevalência de sintomas de ansiedade e depressão em estudantes de medicinaAcadêmicos que saem do núcleo familiar possuem maior susceptibilidade para desenvolver transtornos psicológicos.  
 11. SILVA; ROMARCO, 2021  Análise dos níveis de ansiedade, estresse e depressão em universitários da Universidade Federal de Viçosa (UFV).  Aborda estratégias não farmacológicas de combate à ansiedade, estresse e depressão, incluindo a psicoterapia, atividades físicas e atividades recreativas  
 12. SOUZA; COELHO, 2021Prevalência dos sintomas de ansiedade e depressão nos estudantes de Medicina da UNIFAGOC  Prevalência  de 29,4% de sintomas de ansiedade entre acadêmicos de medicina, sendo a maioria do sexo feminino e em maior percentual, alunos do Ciclo Básico.  
 13. MENDES; DIAS, 2021Sintomas de depressão, ansiedade, estresse e fatores associados em estudantes de medicina brasileiros: revisão integrativaFatores que influenciam a qualidade de vida: ↓ frequência de atividades de lazer, dificuldade financeira, ↓ horas de sono e uso de drogas ilícitas e psicoativas.  
 14. PICTON, 2021Work-life balance in medical students: selfcare in a culture of self-sacrificeNecessidade do autocuidado e do equilíbrio entre a vida pessoal e profissional para obter um melhor aprendizado e um cuidado médico eficaz.  
 15. CARRIJO et al, 2020Sintomas do transtorno de ansiedade e prática de atividade física nos estudantes de medicina  ↑ prática de atividade física pode ↓ sintomas de ansiedade.
 16. COSTA et al., 2020Sintomas de Depressão, Ansiedade e Estresse em Estudantes de Medicina e Estratégias Institucionais de Enfrentamento.Presença de estresse em 66,3% dos acadêmicos, sintomas ansiosos em 33,6% e sintomas depressivos em 28%.  
17. FONTANA et al, 2020Síndrome de burnout, atividades extracurriculares e apoio social entre estudantes de medicina brasileiros: uma análise transversal. ↑ taxas de Síndrome de Burnout.
18. MOTA; MAGALHÃES, 2020A incidência do transtorno de ansiedade generalizada em acadêmicos de medicina  ↑ risco de desenvolver depressão e transtorno do pânico.  
19. SHAO et al, 2020Prevalence of depression and anxiety and correlations between depression, anxiety, family functioning, social support and coping styles among Chinese medical students  Acadêmicos com ≥20 anos apresentaram níveis mais elevados de depressão e ansiedade.  
20. CASTALDELLI-MAIA et al, 2019Stressors, psychological distress and mental health problems among Brazilian medical students. A prevalência de problemas com álcool chega a 32,9%.
21. MACHADO et al, 2019Ansiedade e depressão em estudantes de medicinaImpactos: ↓ desempenho acadêmico, ↓ rigor físico, ↓ empatia e ↑ ocorrência de erros.  
22. QUEK et al, 2019The Global Prevalence of Anxiety Among Medical Students: A Meta-AnalysisImpactos: ↑taxa de evasão, ↓ desempenho acadêmico e ↓desenvolvimento profissional.
Fonte: autoria própria, 2023.

4 DISCUSSÃO

A incidência crescente de sintomas de ansiedade é uma realidade preocupante, especialmente entre acadêmicos de medicina, um grupo que apresenta taxas elevadas de transtornos psíquicos. Ao analisar criticamente esses padrões, identificou-se uma notável prevalênciade ansiedade, atingindo 29,4% dos acadêmicos,, com uma marcante predominância de sintomas entre estudantes do sexo feminino, do Ciclo Básico e acima de 20 anos (SOUZA, COELHO; 2021; SHAO et al, 2020). Adicionalmente, identificou-se a presença de outras perturbações psíquicas, com 66,3% dos acadêmicos apresentando estresse e 28% manifestando sintomas depressivos (COSTA et al, 2020). Tais dados suscitam sérias preocupações sobre o potencial impacto desses transtornos na saúde mental dos acadêmicos de medicina, afetando aspectos que vão além do seu bem-estar pessoal.

Dessa forma, a vulnerabilidade intrínseca dos acadêmicos de medicina a transtornos mentais, associada à baixa adesão a tratamentos medicamentosos e à pouca busca por ajuda profissional, muitas vezes devido ao estigma associado, impacta negativamente na esfera pessoal e profissional desses estudantes (CARVALHO et al, 2022). A qualidade do desempenho acadêmico, afetada pelos sintomas da ansiedade, influencia diretamente na futura prestação de serviços médicos, destacando a interconexão entre a saúde mental do médico e a qualidade do atendimento à população. Sendo assim, a preservação da saúde mental dos acadêmicos vai além de uma questão individual, trata-se de uma salvaguarda essencial para o bem-estar coletivo. Desse modo, é imperativo promover o autocuidado e o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional para otimizar o aprendizado e proporcionar um cuidado médico eficaz (MACHADO et al, 2019; PICTON, 2021).

Outro aspecto relevante abordado refere-se a multicausalidade acerca do desenvolvimento de sintomas ansiosos, ou seja, a evolução desse transtorno psiquico não apresenta uma causa específica ou única. Assim, dentre os fatores desencadeantes mais recorrentes encontrados no presente estudo, destaca-se a excessiva cobrança desde a graduação até a prática médica, a extensa carga horária que compromete as atividades de lazer, a dificuldade financeira e a insuficiência de horas de sono. Desse modo, uma ampla gama de aspectos influenciam diretamente a qualidade de vida e a saúde mental dos estudantes, repercutindo em diversos aspectos de suas vidas (MENDES; DIAS, 2021). Adicionalmente, é cabível salientar que acadêmicos que saem do núcleo familiar apresentam maior susceptibilidade para desenvolver transtornos psicológicos (PIFFER et al., 2022).

No âmbito dos transtornos mentais, a preocupação com o uso de substâncias, especialmente o álcool, surge como uma questão significativa, afetando 32,9% dos estudantes (CASTADELLI-MAIA et al., 2019). O consumo excessivo de álcool, além dos prejuízos pessoais, impacta negativamente no desenvolvimento de habilidades cognitivo-comportamentais e emocionais. O abuso de álcool e tabaco, práticas que tendem a persistir na profissão médica, torna-se ainda mais alarmante quando até 12% dos casos evoluem para a dependência (ARDISSON et al, 2021). Destaca-se ainda a recorrência da automedicação com drogas psicoativas, incluindo antidepressivos e psicoestimulantes, intrinsecamente ligadas às características do curso, estigma associado à saúde mental e facilidade de acesso aos psicofármacos (SILVA, J. et al, 2023).

Nesse contexto, o uso de psicoestimulantes, especialmente o Metilfenidato (MPH), entre acedêmicos de medicina é uma prática comum em busca de aprimoramento cognitivo, apesar dos riscos e efeitos adversos associados a esse fármaco, como o aumento da irritabilidade, hiperatividade, taquicardia e o agravamento da ansiedade. É crucial ressaltar que, para indivíduos saudáveis sem prescrição para esses medicamentos, não há confirmação de benefícios cognitivos, apenas prolongamento do tempo de vigília. Diante desse cenário, torna-se imperativa a implementação de ações nas faculdades de medicina, fornecendo informações sobre os riscos do uso inadequado desses psicoativos. Ademais, programas educativos devem ser desenvolvidos para apoiar a rotina universitária, com estratégias comportamentais focadas no aprimoramento cognitivo e na promoção da qualidade de vida, incluindo atividades físicas, hábitos alimentares equilibrados e sono adequado. Essas iniciativas não apenas reforçam a autoconfiança nas habilidades naturais dos estudantes, mas também contribuem para a preservação da saúde física e mental (AMARAL et al, 2022; SILVA, N. et al, 2023).

Além disso, é crucial ressaltar a intrínseca conexão entre os aspectos psíquicos dos acadêmicos de medicina e a maior predisposição ao desenvolvimento da Síndrome de Burnout e despersonalização. Nesse contexto, merece destaque o expressivo contingente de estudantes que evidenciam, de forma conjunta, níveis moderados e/ou elevados de exaustão emocional e despersonalização. A despersonalização, caracterizada pelo distanciamento emocional do indivíduo em relação a colegas e pacientes, revela-se associada à síndrome de Burnout, apresentando uma prevalência de 57,5% no grupo estudado. Tal perspectiva apresentada, por sua vez, pode acarretar na redução da empatia médica e agravar a saúde mental desses acadêmicos (FONTANA et al, 2020).

Adicionalmente, ao analisar a relação entre a prática regular de atividade física e a presença de sintomas de ansiedade, destaca-se que a maioria dos participantes classificados como não ansiosos também foi categorizada como muito ativa. Esse achado sugere que a incorporação consistente de atividade física desempenha um papel crucial na mitigação dos sintomas de ansiedade entre os acadêmicos de medicina. Tal constatação reforça a importância de considerar a promoção de um estilo de vida ativo como uma estratégia potencialmente eficaz na gestão da saúde mental durante a trajetória acadêmica. Outro ponto relevante que emerge deste estudo é a associação identificada entre a maior taxa de incidência de ansiedade e sedentarismo entre estudantes do sexo feminino, indicando que a complexa relação entre atividade física e saúde mental pode variar entre os gêneros (CARRIJO et al, 2020).

É imperativo sublinhar os impactos decorrentes do transtorno de ansiedade generalizada em acadêmicos de medicina. Além da redução do desempenho acadêmico, observa-se uma atenuação do rigor físico, maiores taxas de evasão, menor empatia e precarização do desenvolvimento profissional (QUEK et al, 2019). Há também um aumento do risco de desenvolver depressão, transtorno do pânico e, associado à exaustão física e psíquica, maior propensão a patologias em geral (MOTA; MAGALHÃES, 2020; MAGALHÃES; MAIA, 2022). Ademais, o alto nível de ansiedade pode impactar negativamente os processos mentais, como memória e atenção (ABDIVALIEVNA; QIZI, 2023). Portanto, medidas urgentes de intervenção e suporte são necessárias para preservar a saúde mental desses estudantes e garantir uma formação médica mais equilibrada e eficaz.

Dessa forma, diante da alta incidência de sintomas ansiosos entre acadêmicos de medicina, destaca-se a necessidade na implementação de abordagens holísticas que visem promover a saúde mental, o bem-estar emocional e o êxito acadêmico dentro da instituição universitária. Nesse contexto, diversas intervenções não farmacológicas, como atividades físicas e recreativas, surgem como opções viáveis, além da disponibilização de espaços para a socialização, lazer e suporte psicossocial nos campus. Contudo, reconhecendo as demandas intensas da vida acadêmica, é imperativo considerar os desafios quanto à disponibilidade de tempo dos estudantes, adaptando políticas e estratégias de saúde mental para alinhar-se à realidade do grupo, garantindo a eficácia e acessibilidade dos recursos disponíveis (SILVA; ROMARCO, 2021).

5 CONCLUSÃO

O presente estudo buscou analisar a incidência do Transtorno de Ansiedade Generalizada em acadêmicos de medicina, delineando os aspectos desencadeantes e o impacto desse transtorno na saúde e no desempenho acadêmico. Os resultados revelam uma incidência alarmante de transtornos psíquicos nessa população, transcendendo as taxas observadas na população em geral e em outros grupos acadêmicos. É crucial ressaltar que os fatores associados, embora identificados, não devem ser interpretados como causas singulares ou diretas dos sintomas. Pelo contrário, eles compõem um intricado conjunto de influências que interagem de maneira complexa. Nesse contexto, a compreensão aprofundada desses elementos se configura como uma ferramenta valiosa para os serviços de apoio psicológico das instituições acadêmicas.

Entretanto, é essencial reconhecer as limitações inerentes a esta revisão. A análise centrada na incidência do transtorno de ansiedade entre acadêmicos de medicina, embora crucial, não permite conclusões definitivas sobre a evolução desses transtornos psíquicos ao longo do curso de medicina. Torna-se, portanto, imperativo realizar estudos de acompanhamento, essenciais para elucidar a dinâmica e o desenvolvimento dos sintomas ansiosos ao longo dos semestres letivos e e em diferentes perfis de estudantes das universidades brasileiras. Essa abordagem longitudinal contribui para uma compreensão mais abrangente e aprimorada, fornecendo informações valiosas para o desenvolvimento de estratégias de intervenção e suporte contínuo aos acadêmicos de medicina em sua jornada durante a graduação.

Assim, diante da expressiva incidência de Transtorno de Ansiedade Generalizada em estudantes de medicina, a melhoria do desempenho acadêmico torna-se viável ao superar os desafios da saúde mental. A fim de alcançar esse objetivo, é imperativo desenvolver estratégias direcionadas ao processo de aprendizagem, com a implementação de suporte especializado. Dessa forma, a abordagem na educação médica deve ser voltada para compreender e enfrentar essas barreiras, propondo intervenções eficazes. Nesse sentido, é crucial que a instituição ofereça acompanhamento e orientação para os acadêmicos que necessitam de suporte psicológico, desempenhando um papel essencial na gestão desse distúrbio, um passo fundamental em direção ao sucesso acadêmico.

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1Discente do curso de Medicina do Centro Universitário de Patos de Minas -UNIPA
2Docente do Centro Universitário de Patos de Minas -UNIPAM

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