REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7652526
Fernando Pereira da Silva1
Patricia Sousa da Silva2
Paulo Maurício Silva Lopes3
RESUMO
A drenagem superficial de mina a céu aberto é muito importante para a viabilidade do projeto e deve ser pensada desde os primeiros passos do planejamento do empreendimento. O objetivo deste trabalho é demonstrar a importância do sistema de drenagem na geotecnia dos taludes em minas à céu aberto. Para tal, a pesquisa foi desenvolvida em uma das minas de um grande complexo minerador localizado no Norte do Brasil, onde os índices pluviométricos são altos e os taludes das minas são em grande parte friáveis. Estes dois fatores aumentam as criticidade dos diversos problemas relacionados à drenagem que principalmente são causados por atividades operacionais ou a falta de sistemas eficientes de drenagem superficial. Durante o trabalho foi observado uma grande necessidade de disciplinar o fluxo superficial garantindo que não haja acúmulos nas bermas e que a água percorre pequenas distâncias e seja coletada por Sumps no fundo da cava, fora implantado um sistema de tubos removíveis que garante o direcionamento da água e conseguintemente preserva a integridade geotécnica das bermas e faces dos taludes.
Palavras-chave: Drenagem superficial. Disciplina de fluxo. Geotecnia. Estabilidade de talude.
ABSTRACT
The surface drainage of an open pit mine is very important for the viability of the project and must be considered from the first steps of the project’s planning. The objective of this work is to demonstrate the importance of the drainage system in the geotechnics of slopes in open pit mines. To this end, the research was carried out in one of the mines of a large mining complex located in Northern Brazil, where rainfall is high, and the slopes of the mines are largely friable. These two factors increase the criticality of several drainage-related problems that are mainly caused by operational activities or the lack of efficient surface drainage systems. During the work, there was a great need to discipline the surface flow, ensuring that there is no accumulation on the berms and that the water travels small distances and is collected by Sumps at the bottom of the pit, a system of removable tubes was implemented that guarantees the direction of the water and consequently preserves the geotechnical integrity of the berms and slope faces.
Keywords: Surface drainage. Flow discipline. Geotechnics. Slope stability
1. INTRODUÇÃO
A mineração alcançou patamares surpreendentes na vida moderna, e qualquer atividade executada atualmente tem uma certa ligação com atividades ou materiais extraídos por meios da mineração. Deste modo, uma unidade de mineração traz elevada contribuição econômica para a região na qual está inserida. Com uma necessidade cada vez mais crescente por minerais, foram criados processos complexos que envolvem uma gama de profissionais especializados de áreas distintas que subsidiam as atividades de mineração em busca de um controle de processos mais eficaz para as diversas componentes de um complexo minerário (JÚNIOR,1987).
Em grandes empreendimentos minerários a influência das águas é tratada com um certo nível de detalhamento devido suas implicações e impactos econômico e ambientais na atividade. Uma mina a céu aberto recebe tanto influência de águas pluviais quanto de águas subterrâneas, por isso, o correto e eficiente direcionamento desta água pode impactar positivamente em todo o processo de extração mineral e, por outro lado, a ineficiência deste pode causar sérios prejuízos a todo o processo (JÚNIOR, 1987).
A drenagem superficial de mina é uma atividade imprescindível para o bom funcionamento de todo o complexo, a execução e controle das drenagens, contribui no fator de segurança da estabilidade de taludes, limita a erosão do local, carreamento de sedimentos, controla o nível do lençol freático para permitir o avanço de cava, garante o abastecimento das instalações de suporte do complexo minerário, usina e apoios, além do que, garante a não poluição dos recursos hídricos quando se desvia o escoamento\bombeamento para áreas de descontaminação ou sedimentação de finos.
2. OBJETIVO
O objetivo deste trabalho é demonstrar a importância do sistema de drenagem para a infraestrutura e a geotecnia de mina, avaliar maneiras de disciplinar o fluxo de maneira a garantir a estabilidade e a operacionalidade dos taludes.
3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
3.1 Drenagem superficial
O uso da água pela mineração é bastante comum, pois a sua utilização é imprescindível durante o beneficiamento ou no uso das suas instalações de apoio. Seus processos são muito diversificados e podem provocar alterações nos cursos d’água, aquíferos entre outros, em diferentes escalas. Contudo, visando a proteção dos corpos hídricos, o conselho nacional de recursos hídricos aprovou a Resolução Nº 29, de 11 de dezembro de 2002, que em seu art. 2º, relaciona os usos e as interferências nos recursos hídricos pela mineração, sujeitos à outorga ANA (2006).
O sistema de drenagem superficial é uma das atividades que demanda um planejamento estratégico bastante robusto e alinhado com outras áreas da mineração, como por exemplo a geologia e geotecnia de curto e longo prazo, que influenciam diretamente no modelo da cava final, em conjunto com a topografia JÚNIOR (1987).
A confecção de um Sistema de Drenagem Superficial deve levar em consideração as seguintes premissas:
I. Elevação da segurança geotécnica das estruturas;
II. Aumento da viabilidade econômica;
III. O dimensionamento de todas as estruturas de drenagem deve contemplar o início das operações de mina até a sua de descomissionamento. Isso é justificado devido às interferências causadas pela atividade minerária nos recursos hídricos, que são iniciadas com supressão vegetal e posterior decapeamento.
De acordo com as especificidades geomorfológicas e topográficas do local onde será instalada a mina, bem como o tipo de minério a ser extraído, após os procedimentos primários de supressão e decapeamento, é iniciada construção do sistema de drenagem de isolamento, com a confecção de valetas e valas de drenagem para evitar o carreamento desse material para o interior da mina, esse sistema inicial é muito barato por estar baseado na descarga gravitacional. Posteriormente, os primeiros taludes e bermas a serem confeccionados podem e devem ter sua inclinação da berma direcionada para fora da mina por gravidade.
O prosseguimento das operações deve estar em consonância com as outras áreas estratégicas, já mencionadas, pois os taludes serão confeccionados de acordo com os parâmetros estabelecidos por elas. E com eles a necessidade crescente de escoamento das águas superficiais por meio da introdução do sistema de escoamento e acumulação.
Os critérios para a implantação eficaz deste sistema seria uma avaliação integrada a geologia, geotecnia, hidrogeologia, topografia e planejamento da mina. A geologia é importante para definir a composição dos materiais que envolvem os taludes que ficarão expostos, a geotecnia define o ângulo de inclinação destes taludes com base em seu fator de segurança, adquirido através de parâmetros como resistência, grau de intemperismo, grau de faturamento, descontinuidades e as características destas descontinuidades.
Silva et al (2019), utiliza o método de análise computacional D-Infinity na preparação para o plano de período chuvoso em minas a céu aberto, foi comprovado que a utilização deste método auxilia na identificação das áreas para execução de ações preventivas e corretivas, visando impactar de forma direta na minimização dos riscos e antecipação de problemas relacionados a drenagem operacional.
3.2 Tipos de sistemas de drenagem
Todos os sistemas de escoamento possuem a função de impedir que a água não interfira nos trabalhos de exploração e garanta a segurança necessária para a continuação da atividade. Eles são construídos para conduzir a água para locais adequados, impedindo o acúmulo em locais inapropriados (BASTOS, 2010). Esse tipo de medida também possui suas vantagens nos aspectos ambientais, pois evitam erosão dos taludes naturais e de escavação, além de assoreamentos.
Os sistemas de drenagem de águas superficiais são ou podem ser divididos em três tipos principais: isolamento da exploração, sistemas de escoamento e acumulação, além de sistema de remoção. Basicamente, todos têm o intuito de impedir a entrada de água, minimizar seus efeitos (após sua entrada) ou retirá-la, respectivamente.
3.2.1 Sistema de isolamento
É um sistema de drenagem preventivo, cujo objetivo é impedir que a água chegue ao interior da cavidade da mina. Para isso constroem-se valas, drenos ou tubulações para evitar o escoamento da água (Figura 1) (BASTOS, 2010). Esses elementos fazem com que a água escoe fora da área de exploração, normalmente bem próxima, e seja descarregada em uma superfície com cota mais baixa (depressão).
Figura 1. Esquema do sistema de isolamento exterior em perfil
Fonte: BASTOS, 2010.
Definem-se, então, valas no pé do talude, limitadas internamente por diques e soleiras na crista da berma, feita de material impermeável ou o próprio rejeito, impedindo o galgamento da água quando situações anômalas (figura 2) (BASTOS, 2010).
Figura 2. Esquema do sistema de isolamento exterior em planta.
Fonte: BASTOS, 2010.
Resumidamente este circuito consiste em captar a água nas valas de drenagem existentes em volta do perímetro da exploração, por onde são conduzidas por gravidade para uma depressão de modo a serem coletadas (Figura 3) (LNEG, 1999).
Figura 3. Sistema de drenagem por valas de drenagem na zona envolvente da área de exploração.
Fonte: LNEG, 1999
Considerando os métodos de drenagem, este não pode ser descartado devido ao seu baixo custo de implantação (BASTOS, 2010). Sua eficiência aumenta (e isso ocorre com todos os métodos) quando são associados para realizar o desaguamento da água.
3.2.2 Sistema de escoamento e acumulação
Apesar do bom desempenho dos sistemas de isolamento, sempre há a entrada de água na cava, seja por precipitação ou fluxo subterrâneo devido a freática dos taludes. (Figura 4).
Figura 4. Fluxo de água para o corte.
Fonte: BASTOS, 2010.
3.2.3 Sistema de Remoção
Para os sistemas de remoção, existem duas alternativas: bombeamento ou descarga gravítica. Para implantação de ambos é preciso considerar fatores como configuração da cava, profundidade, topografia etc. (BASTOS, 2010). Em termos de custos o sistema de descarga gravítica é o mais econômico, pois não se usa qualquer tipo de energia para realizar o trabalho, contudo esse sistema só pode ser implantado nos estágios iniciais da mina onde a topografia permite que a água coletada por canaletas, seja direcionada para fora da mina. Quando a mina vai se aprofundando e existem cortes nos taludes, há a necessidade de um método de remoção que consiste na coleta da água nas cotas mais baixas, geralmente no fundo da cava onde bombas são colocadas em sumps (Figura 5). Na zona A ocorre a drenagem por gravidade, ao passo que na zona B é preciso o sistema de bombeamento; caso esse segundo método não seja colocado, a descarga passará a ser gravítica quando a zona B for inundada (BASTOS, 2010).
Figura 5. Esquema do escoamento de água num corte.
Fonte: BASTOS, 2010.
3.3 Elementos constituintes do sistema de drenagem
Segundo Silveira (2014), os principais elementos constituintes do processo de drenagem são:
• Canaletas: canais que podem ser retangulares, triangulares ou trapezoidais que têm como objetivo interceptar as águas que escorrem pelo terreno natural a montante, impedindo-as de atingir o talude de corte. As valetas podem incorporar pequenas barragens de desaceleração que favorecem a infiltração e protegem contra erosão.
• Canais: são valetas de grande profundidade, são caracteristicamente obras de grande largura e baixa declividade no sentido longitudinal.
• Corta rios: canais de derivação executados para desviar pequenos cursos d’água. Têm a finalidade de retificar, ampliar, aprofundar ou desviar córregos e arroios, quando necessários para uma melhor solução técnica da rodovia.
• Rápidos (descida d’água): são canais ou tubos fechados construídos nos taludes de corte ou aterro, geralmente em degraus. Sua finalidade é captar toda água das sarjetas e afastá-las do corpo da estrada.
• Bacia de Amortecimento (Sump): pequeno reservatório que armazena o excesso de vazão pluvial, dimensionado para a área contribuinte de um lote, destinado a amortecer o aumento de vazão.
• Diques de Amortecimento: são pequenas barragens executadas nas valetas, com a finalidade de diminuir a velocidade da água, quando o terreno for muito inclinado.
• Bueiros: são elementos de drenagem superficial construídos transversalmente sob o leito das estradas, destinados a conduzir as águas provenientes de riachos, córregos, açudes ou bacias por elas cortados.
• Reservatório de detenção e retenção: são dispositivos utilizados para armazenar águas pluviais por um período de tempo, reduzindo os problemas de enchentes durante as chuvas. O principal problema dos reservatórios de detenção é a manutenção após os eventos de chuva, no qual o escoamento superficial transporta todos os tipos de resíduos sólidos e sedimentos presentes na bacia.
• Trincheiras de infiltração: são estruturas lineares de grande comprimento. A geometria depende da infiltrabilidade do solo e da área disponível para que se proceda à infiltração. A função principal da trincheira de infiltração é a redução do escoamento, promover a recarga de aquíferos e promover o tratamento da água pelos meios de infiltração no solo.
• Poço de infiltração: são dispositivos pontuais de profundidade considerável, que permitem a infiltração do escoamento superficial para dentro do solo. Pode ser estruturado por um preenchimento com brita (meio poroso).
• Deflúvio (ou escoamento) superficial: é a parcela do total precipitado que escoa sobre a superfície do terreno, já descontadas as perdas iniciais por infiltração, retenção vegetal e evaporação.
• Talvegue: é a linha sinuosa que se desenvolve no fundo dos vales, por onde correm as águas e que divide os planos de duas encostas.
• Sump: Estrutura similar a caixa coletora com função de dissipar energia da água e/ou reter materiais oriundos da drenagem superficial e possibilitar o direcionamento ordenado.
3.4 Estabilidade de taludes em mina a céu aberto
Em minas a céu aberto a estabilidade dos taludes a serem desenvolvidos estão intimamente ligados a fatores como geologia, geotecnia, inclinação, drenagem superficial, água subterrânea, entre outros. Esta água subterrânea é efeito dos processos de infiltração na própria mina ou através de ligações com o lençol freático do local, que criam pressões neutras entre os poros promovendo o aumento da instabilidade do talude. Gerenciar este fluxo subterrâneo é uma atividade complexa que requer modelamento matemáticos do fluxo, entre outros, e o ato de entender um pouco como esse comportamento pode trazer muitos benefícios para a mina, De lá Cruz (2014).
O conceito de rebaixamento do lençol freático foi desenvolvido com a implementação de técnicas utilizadas para a irrigação e abastecimento hídrico, de acordo com Hall (2003), o “rebaixamento do lençol freático” envolve a remoção de uma quantidade de água da massa rochosa ou perfil de solo, de tal forma que os níveis de água sejam rebaixados para garantir segurança e economia à mina.
Na prática ocorre a instalação de um poço, em uma determinada área, que pode ser no fundo da cava. Este poço que atravessa o perfil de solo e pode ou não chegar ao maciço rochoso, tem diâmetro e bombeamento controlado de acordo com estudo hidrológico e hidráulicos previamente efetuados. Quando em atividade, é criado um efeito “cone” depressivo no lençol freático.
Contudo, segundo Rowe & Beale (2007) quando aplicados na mineração os ganhos na atividade vão além da estabilidade dos taludes principalmente por reduzirem os custos de transporte, o minério seco requer menos emulsão explosiva, reduz os custos de transporte (combustível), desgaste da máquina, condições das estradas e carrega mais material em função do peso.
Segundo De la Cruz (2014) quando um talude é despressurizado ao máximo possível, a inclinação deste pode suportar um acréscimo de 10° a mais do que um talude em condições saturadas, e isto é possível de ser aplicado de maneira vantajosa quando se trabalha com projetos de mineração, devido a que este reduz consideravelmente os volumes de corte.
3.5 Dimensionamento da drenagem de mina
O dimensionamento da drenagem de uma mina não é o objetivo deste trabalho, no entanto, vale ressaltar a importância dos estudos hidrológicos e hidráulicos que tem como objetivo levantar dados que venham a subsidiar o entendimento da bacia hidrográfica e o dimensionamento dos dispositivos de drenagem superficial e estruturas de contenção de sedimentos.
Alguns dados importantes que devem ser considerados para estes estudos são: Área de influência da bacia; Determinação do regime de chuvas da região; O coeficiente de escoamento superficial ou coeficiente run-off, ou coeficiente de deflúvio é definido como a razão entre o volume de água escoado superficialmente e o volume de água precipitado; O modelo hidrológico que, segundo Brewer (2005), pode ser definido como a representação matemática do fluxo de água sobre alguma parte da superfície, como por exemplo, a descrição da distribuição espacial do ciclo hidrológico em uma bacia hidrográfica; Condições pluviométricas, remetem ao dados de intensidade das chuvas no local do empreendimento, que por meio de equações é possível se chegar a precipitação máxima para um determinado período de tempo (Tr). Segundo Pinheiro (2011), às bacias de decantação nos sistemas de drenagem devem ser projetadas para eventos de chuva com períodos de retorno de 10 a 50 anos.
4. METODOLOGIA
O trabalho foi iniciado com pesquisa bibliográfica, a respeito da drenagem superficial em minas a céu aberto, com foco em minas onde as rochas encaixantes são de baixa competência ou friáveis, além da pesquisa sobre tipos de drenagem e os elementos que a constituem.
Foram realizadas duas visitas de campo nos meses de fevereiro e maio de 2021, em duas minas de grande expressividade do complexo. Foram coletados dados a respeito da geologia e geotecnia dos taludes, foram fotografados pontos estratégicos onde o sistema de drenagem é ineficiente e causa problemas operacionais corriqueiros, mas também foram evidenciados pontos onde a mina incorpora alguns elementos de drenagem mais concretos que agregam operacionalidade e são eficientes.
4.1 Caracterização da área de estudo
A área de estudo está localizada na região Norte do Brasil, na floresta Amazônica, com acesso pela estrada Raimundo Mascarenhas, a pouco mais de 30km da cidade de Parauapebas -PA. Trata de um complexo de minerador com um longo período de exploração inserido no contexto geológico-geotécnico do Cráton Amazônico, na Província Mineral de Carajás, Domínio de Carajás (Santos, 2003), uma região muito diversificada em tipo litológicos e minérios, além da alta complexidade estrutural.
O grupo Grão Pará do supergrupo Itacaiúnas, é formado por sequências vulcânicas sedimentares em diferentes graus metamórficos e deformacionais. Denominados de rocha máfica decompostas e semi decompostas estas rochas possuem resistência branda, menor igual a (R2-) (Figura 6) e intemperismo variando entre completamente e altamente alterada (W5) e (W4) (Tabela 1), sua estratigrafia pode ser consultada em Zucchetti (2007).
Encaixados nestas rochas ocorrem corpos de minério de ferro com alto teor, são rochas com o comportamento de solos pois sua resistência é baixa menor igual a (R1+) e seu intemperismo varia entre (W4 a W5) (VALE, 2018).
Figura 6. Representação da tabela de avaliação de campo para a classificação de resistência, destaque para a classificação das rochas menor igual a R2-. (adaptado da ISRM, 1981 pela BVP Engenharia em 2012 apud Franca et al., 2018).
Tabela 01. Tabela de caracterização do intemperismo. (adaptado da ISRM, 1981, pela Vale, 2012).
5. RESULTADOS
5.1 Influência da drenagem na estabilidade de taludes
Segundo Ventura (2009) os maciços estão sujeitos às tensões naturais, e com a escavação da parte deste material para extração de minério, ocorre descompressão e o alívio, ocasionando um estado de tensões induzidas, a depender de fatores como: dimensões geometria e execução da escavação, podem ocorrer deformações elástica ou plásticas e deslocamentos ocasionando criação de descontinuidades ou abertura das pré-existentes. E os fatores geomecânicos que governam esses mecanismos são: a resistência mecânica dos materiais envolvidos, a anisotropia, o estado de tensão e as características de permeabilidade.
A permeabilidade tem grande relevância pois vai determinar o grau de saturação do talude, principalmente por interferências de águas superficiais, contudo não se pode descartar águas subterrâneas e até mesmo a influência da relação água ar no interstício dos grãos da rocha.
Os taludes saturados e não saturados têm respostas muito diferentes em seus comportamentos de estabilidade, Lambe e Whitman (1979), explicam que à medida que o teor de água do solo aumenta, a água age como lubrificante entre as partículas do solo, diminuindo o atrito entre eles. E Araujo et al (2017), em seu estudo de análise comparativa concluiu que o aumento do grau de saturação do solo em taludes de terra, o que ocorre principalmente em épocas de chuvas, influencia diretamente na estabilidade do talude, ocasionando uma redução do fator de segurança, que pode ser 1.75 vezes menor para taludes saturados Figura 7.
Figura 7 Análise do fator de segurança para taludes saturados e não saturados. ARAUJO et al, 2017.
De acordo com ABGE (1998) os principais mecanismos onde as águas de superfície podem atuar, de forma a desencadear escorregamentos são os seguintes: diminuição da coesão aparente, variação do nível piezométrico em massas homogêneas e elevação da coluna d’água em descontinuidades.
5.2 Problemas gerados pela ausência de drenagem
Como mencionado anteriormente, a drenagem de mina é algo imprescindível na vida do empreendimento e deve ser planejado antecipadamente assim como outros itens, em fases anteriores à implantação. Contudo, este erro pode acontecer, a depender de fatores como: grau de complexidade, nível de maturidade do planejamento, maturidade da equipe envolvida, dificuldades econômicas etc. O sistema de drenagem pode não estar presente, ou pode não ser eficiente a ponto de deixar áreas (descobertas), e assim pequenos problemas vão se acumulando a ponto de gerar desde pequenas trincas e rupturas globais com grandes prejuízos.
Em um nível mais superficial, as águas pluviais são um dos piores agentes causadores de problemas nos taludes de material friável. Isso ocorre quando encontram bermas com buracos ou sem porcentagem de caimento suficiente para que possa haver o direcione o fluxo pelo pé do banco no encontro da berma com o talude.
Estas bermas mal drenadas, incorrem em acúmulos de água em forma de poças que são um dos principais agentes de instabilização de taludes. Isso porque parte desta água acumulada pode ser drenada pela crista escorrendo pela face do talude inferior e causando diversas feições indesejadas. A figura 8 exemplifica alguns dos problemas gerados devido à ausência de drenagem, são escorregamentos, erosões, ravinamentos, trincas na berma, rupturas, assoreamento da berma abaixo.
Figura 8. Talude de material friável com bermas intrafegáveis apresentando ravinamentos e erosões causadas pela ausência de drenagem.
A depender do material, suas características geológicas – geotécnicas como: intemperismo resistência, grau de fraturamento e características das descontinuidades; parte desta água acumulada na berma agem como mecanismo de instabilização interna no talude, pois são propícias à infiltração preferencialmente através de descontinuidades.
Na área de estudo foram mapeadas ocorrências de famílias de fraturas e falhas que se interceptam e formam cunhas. Esta situação é agravada pois o material que constitui o preenchimento de algumas destas famílias é caulim, considerado um material mole (Bieniawski,1989), cujo contato com a água favorece a perda de aderência nas paredes da descontinuidade. Todo este conjunto de fatores é propício ao aparecimento de trincas e rupturas superficiais nos taludes.
Atividades operacionais de retaludamento na mina também são muito propícias ao aparecimento de estruturas problemáticas nos taludes, isso porque, antes do início da reconformação dos taludes as equipes operacionais criam dispositivos de saídas de água da berma, popularmente conhecidos como “bigodes” (figura 9).
Trata-se da abertura de um canal na leira de proteção da crista da berma de que deixe passar o excesso de água acumulada na berma, que por sua vez é resultado de uma grande quantidade de rejeito gerado e lançado nas bermas e taludes abaixo, dificultando qualquer sistema de drenagem implantado. A figura 8 abaixo mostra este processo de retaludamento e os efeitos causados pelos dispositivos criados pela equipe de operação.
Figura 9. Interrupção da drenagem devido acúmulo de rejeito nas bermas, e a criação de “Bigodes” na crista da berma.
5.3 Disciplina do fluxo superficial
A importância da geometria em mineração a céu aberto vai desde aspectos econômicos do empreendimento até às geometrias dos componentes formadores da cava: talude, berma, corpo mineralizado, talude global e berma operacional. Todos este parâmetros geométricos interagem visando a estabilidade geotécnica e são necessários para a construção de um plano diretor de drenagem cujo objetivo principal é planejar a drenagem superficial de longo prazo e conferir a segurança hídrica do empreendimento, neste contexto ações são geradas e individualizadas anualmente em um plano preparatório para o período chuvoso. Este documento garante e descreve ações necessárias a serem realizadas antes do período chuvoso, Vale (2021).
O principal desafio destas ações é disciplinar a condução do fluxo superficial para que o talude entre na condição de bem drenado e não acumule água nas bermas. Uma das alternativa usualmente utilizadas é o dimensionamento da cava de modo que, em um sistema de drenagem é considerando uma porcentagem de inclinação na berma, assim, ocorre a disciplina do fluxo para o pé do talude e posteriormente uma inclinação a nível de bancada de modo que a água escorra para uma área de coleta e direcionamento comum a todos os bancos, (figura 10).
Figura 10. Plano de drenagem de mina, visão em planta do sistema de drenagem com direcionamento e inclinação, Vale (2013).
A depender das dimensões da mina, este sistema não se torna eficiente em cavas a céu aberto com taludes de material friável, pois a água percorre grandes distâncias pela berma antes da área de desemboque, o que propicia o aparecimento de pontos de concentração e/ou transbordo.
Uma alternativa para essa necessidade crescente de disciplinar o fluxo superficial é a implementação de sistemas de drenagens, que podem ser permanentes ou temporários. As drenagens permanentes podem ser colocadas em áreas onde a operação de extração não está mais atuante e a cava se encontra próxima ou muito próxima ao pit final. As estruturas seriam compostas por canais, canaletas, sumidouros, descidas de água e Sumps.
Já os dispositivos de drenagem temporária são uma excelente opção para aquelas áreas intermediárias da cava, ou seja, uma área que está entre o topo e fundo da cava. Na área de estudo o sistema implantado utilizou a durabilidade e resistência dos tubos de aço carbono com costura helicoidal, sua acoplagem é feita com braçadeiras o que confere grande versatilidade, (figura 11).
Figura 11. Detalhe do tubo utilizado no direcionamento da drenagem.
O sistema compreende utilizar a declividade da bancada, a cada 200 ou 300 metros são confeccionados poços para o acúmulo de água, a tubulação em forma de “Z” (figura 12), é instalada conectando este poço e descendo pela face do talude e desaguando sendo direcionada na berma inferior, pequenas leiras de amortecimento ou sumps devem ser criados, (figura 13).
Figura 12. Disposição espacial dos tubos e poços de coleta da drenagem com detalhes das setas indicativas de fluxo superficial.
Figura 13. Disciplina do fluxo superficial no setor intermediário da mina, com setas indicativas de fluxo superficial até o Sump.
Alternativas de sistemas de drenagem como a utilização de pré-moldados e descidas d’água com PVC, apresentam problemas principalmente no ato da manutenção pois, entre outros, são mais propícios a sedimentação de material o que gera maior necessidade de manutenção, suas dimensões não estão de acordo com os equipamentos de mina que realizam a manutenção e sua implantação causa deformações na berma, (figura 14).
Figura 14. Problemas gerados na utilização de manilhas e pré-moldados como alternativas de descidas de drenagem.
6. CONCLUSÃO
Os resultados obtidos com este trabalho mostram que o sistema de drenagem é parte importante do planejamento de uma mina, pois pode influenciar ao ponto de inviabilizar o empreendimento.
O sistema de drenagem deve ser dimensionado na fase de planejamento do projeto e sua implantação deve ser iniciada de modo a antecipar as necessidades da mina, pois as águas superficiais têm influência no grau de saturação do talude que por sua vez pode diminuir o seu fator de segurança.
A ausência de um sistema de drenagem ou sua baixa eficiência causam acúmulos de água na berma que podem incorrer em um somatório de problemas como: erosões, ravinamentos, trincas, lixiviação de material.
A infiltração de água acumulada pode se dar através da porosidade e das descontinuidades do talude, causando lubrificação destas paredes e diminuição da resistência do material, culminando em ciclagem de argilas, formação de cunhas, rupturas de face e, em certos casos, rupturas locais.
Devido a questões operacionais o processo de retaludamento é lento e, pode não propiciar um efetivo direcionamento das águas superficiais, o que acabaria por agravar possíveis problemas de drenagem como a abertura dos ravinamento, trincas e erosões existentes. Apesar de ser importante pode agravar, em curto prazo, os problemas de drenagem.
A disciplina do fluxo superficial se mostrou mais eficiente quando direcionado a pequenas distâncias, principalmente em minas a céu aberto cuja resistência do material dos taludes é < R1+.
O sistema de drenagem temporário com tubos de aço carbono se mostrou uma alternativa altamente viável e eficaz pois pode ser instalado ou desinstalado com grande otimização do tempo; constitui uma opção durável, reutilizável e barata se comparado a outras opções.
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ZUCCHETTI, Marcia. Rochas máficas do Grupo Grão Pará e sua relação com a mineralização de ferro dos depósitos N4 e N5, Carajás, PA.- Orientadora Profª. Dra. Lydia Maria Lobato – UFMG, Co-Orientadora Profª. Dra. Zara Gherard Lindenmayer – UNISINOS, Co-Orientador Prof. Dr. Steffen Hagemann – UWA.- Belo Horizonte: UFMG/Instituto de Geociências, 2007.
1Geólogo geotécnico, pós-graduado em geotecnia, fernandosilvageologo@gmail.com
2Geóloga geotécnica, pós-graduada em geotecnia, patricia01.geologa@mail.com
3Geólogo geotécnico, paulomslopes@gmail.com
MSc em Geotecnia – Vale