IMPACTOS DO USO DE MÉTODOS ABORTIVOS NO ÂMBITO DA SAÚDE MATERNO/INFANTIL

IMPACTS OF THE USE OF ABORTION METHODS IN THE SCOPE OF
MATERNAL/INFANT HEALTH: Theoretical analysis with emphasis on the impacts generated on the mother through the use of abortive methods and the relevance of the role of nursing in assisting such events.

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10185020


Gabriela Alves de Freitas Leite1
Vanessa Alexandre Lanciarte2
Maria Vera Rocha Cruz3
Allan Bruno de Souza Marques4


RESUMO:

O aborto provocado inclui-se num eminente percentual na causa de óbito materno e internações. Foi constatado que em relação a assistência ainda há atitudes discriminatórias, preconceituosas e maus tratos por parte da equipe de saúde que realiza o atendimento a essas mulheres. O trabalho trata-se de uma revisão bibliográfica, utilizando para pesquisa e análise as bases de dados: Medline, Scientific Eletronic Library Online (Scielo), Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e Google Acadêmico incluindo sites organizacionais como o Ministério da Saúde, Organização Mundial da Saúde (OMS) e sua Constituição e Código Penal Brasileiro. O objetivo do estudo foi evidenciar os principais métodos abortivos utilizados indiscriminadamente para prática do aborto ilegal e o impacto causado na saúde da mulher, formas de obtenção clandestina a medicamentos abortivos e a forma que a enfermagem atua em relação a essas mulheres juntamente com a importância da conscientização da população no intuito de prevenir novos episódios. Conclui-se que o estudo evidencia a necessidade de mudanças tanto nas atitudes dos profissionais visando a necessidade da humanização, prevenção, conscientização e informações necessárias para redução da prática do ato, devido indicar problema de saúde pública em virtude de seu percentual elevado de morbimortalidade e complicações.

Palavras-chave: Aborto induzido, Aborto provocado, Complicações, Mortalidade materna, Enfermagem.

ABSTRACT:

Induced abortion accounts for an eminent percentage of maternal deaths and hospitalizations. It was found that in relation to care there are still discriminatory, prejudiced attitudes and mistreatment on the part of the health team that provides care to these women. The study is a literature review, using the following databases for research and analysis: Medline, Scientific Electronic Library Online (Scielo), Virtual Health Library (BVS) and Google Scholar, including organizational sites such as the Ministry of Health, World Health Organization (WHO) and its Constitution and Brazilian Penal Code. The aim of the study was to highlight the main abortion methods used indiscriminately to perform illegal abortions and the impact this has on women’s health, the ways in which abortifacient drugs are obtained clandestinely and the way in which nursing acts in relation to these women, together with the importance of raising public awareness in order to prevent further episodes. In conclusion, the study highlights the need for changes both in the attitudes of professionals and in the need for humanization, prevention, awareness and the information needed to reduce the practice of abortion, as it is a public health problem due to its high percentage of morbidity, mortality and complications.

Key words: Induced abortion, induced abortion, complications, maternal mortality, Nursing.

1.     INTRODUÇÃO

No Brasil, conforme o Decreto de Lei 2848 de 1940, Código Penal, em seu Art. 124, considera aborto provocado como crime, dispositivo legal o qual constata que “Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lhe provoque” salvo quando não há outro meio de salvar a vida da gestante ou em caso de estupro. (BRASIL, 1940)

Além dos casos de gravidez resultante de estupro e ameaça a vida da gestante, o aborto também é assentido em caso de indícios de anencefalia fetal e por intervenção das investigações de Barros e Albuquerque foi demonstrado que também é permitido quando há probabilidade fundamentada, atestado por dois outros médicos, do feto indiciar anomalias físicas ou mentais irreversíveis. (AQUINO et al., 2020)

De acordo com o Ministério da Saúde (2005), o abortamento é a interrupção da gravidez até a 20ª a 22ª semana e com o produto da concepção pesando menos que 500g, sendo o aborto considerado o produto da concepção eliminado no abortamento. Segundo a Organização Mundial da Saúde (1946), saúde além de seu conceito representar ausência de enfermidade, consiste também em uma condição de bem estar físico, mental e social em sua totalidade, portanto, serviços inclusivos de cuidados em relação ao aborto induzido contribuem para veracidade de tal conceito,

seja no quesito de informação, conscientização, prevenção ou cuidados pós-aborto.

No Caderno nº 4, Série Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos do Ministério da Saúde (2005) informa que há um percentual considerável de mortes maternas e internações hospitalares devido complicações mediante a prática de abortos inseguros que acontecem mundialmente afetando principalmente pessoas em vulnerabilidade, seja social ou econômica, ou seja, o tópico de atuação da Enfermagem perante tais situações é de suma importância pois como mencionado por Madeiro e Rufino (2017) mediante direito das mulheres, serviços de saúde acessíveis, adequados e profissionais qualificados são necessários.

Nota-se que o uso de métodos abortivos por mulheres que tenham engravidado de forma indesejada ainda é prevalente, gerando impacto nos indicadores de morbimortalidade materna e infantil, e neste contexto, precisa-se de atenção com foco na conscientização da população em relação a prevenção desta prática. Portanto, a referida pesquisa tem como objetivo principal revelar os principais métodos abortivos usados indiscriminadamente e o impacto na saúde da mulher, no desenvolvimento

fetal e durante o desenvolvimento da criança, bem como descrever as formas de acesso clandestino aos métodos abortivos por mulheres gestantes e mostrar a atuação da Enfermagem no processo de conscientização da população na prevenção da prática de aborto ilegal.

2.     MATERIAS E MÉTODOS

O presente estudo trata-se de uma revisão bibliográfica acerca do conhecimento científico produzido sobre os impactos do uso de métodos abortivos no âmbito da saúde materno/infantil. Essa revisão fundamenta-se em uma análise aprofundada da literatura possibilitando discussões acerca do determinado tema assim como reflexões para base de futuros estudos.

Para realização da pesquisa foram utilizadas bases de dados MedLine, Scientific Eletronic Library Online (SciELO), Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e Google Acadêmico, incluindo sites organizacionais como o Ministério da Saúde, Organização Mundial da Saúde (OMS) e sua Constituição e Código Penal Brasileiro. Foram utilizados os seguintes descritores da saúde (DECS): Aborto induzido, aborto induzido e complicações, aborto induzido e métodos abortivos, aborto induzido e assistência de enfermagem, mortalidade materna.

De acordo com os critérios de inclusão, foram selecionados: artigos eletrônicos disponíveis nas bases de dados supracitadas, que versam como os impactos do uso de métodos abortivos no âmbito da saúde materno/infantil, a mortalidade materna, vulnerabilidade social e econômica, despesas na saúde pública devido internações hospitalares, os desafios das mulheres que praticaram o ato de abortamento frente ao atendimento de uma porcentagem dos profissionais de saúde; que dispunham de texto completo com data de publicação prioritariamente entre 2006 a 2023 e disponíveis na línguas: portuguesa e inglesa. Na pesquisa inicial foram encontrados 34 artigos, destes, 16 foram selecionados juntamente a 2 sites organizacionais e 2 documentos sendo 1 Constitucional e 1 Ministerial totalizando 20 referências pois continham os conteúdos de interesse dessa pesquisa.

Foram descartados artigos que não fossem ao encontro da temática proposta, que não contivessem conteúdos relevantes para os objetivos propostos, que não estivessem completos eletronicamente e artigos que não cumpriam o requisito de serem publicados nos últimos 17 anos.

3.RESULTADOS E DISCUSSÕES

Após análise em base de dados utilizando os descritores desta pesquisa e leitura reflexiva para desfecho do estudo e alcance dos objetivos propostos, o presente estudo foi organizado em 3 pilares do saber que se descrevem a seguir:

3.1     Principais métodos abortivos usados indiscriminadamente e o impacto na saúde da mulher.

Dados escassos influenciam relativamente no âmbito da Saúde Pública devido abortos provocados serem uma grande causa de mortalidade materna e emergência nos pronto-socorros se estabelecendo na posição de 5ª causa de internação pelo Sistema Único de Saúde (SUS). (BARROS; ALBUQUERQUE, 2012)

Evidencia-se que a problemática gerada devido as complicações pós aborto engloba vários pontos como a saúde da mulher, a possibilidade de atendimento nos Serviços de Saúde, sobrecarga hospitalar e custos de internações. (FUSCO; ANDREONI; SILVA, 2008)

Segundo Menezes et al. (2020), a criminalização reforça as desigualdades sociais se tornando mais suscetíveis complicações e mortes maternas, exponencialmente mulheres negras, jovens, com baixa escolaridade e sem companheiro.

A ilegalidade não impossibilita a prática, a restrição aumenta a ocorrência da ação pois anualmente no cenário mundial ocorrem cerca de milhões de abortos inseguros, em seu maior percentual em países de baixa ou média renda resultando no aumento de complicações. (AQUINO et al., 2020)

Conforme Barros e Albuquerque (2012), mediante metodologia transversal e observacional, foi aplicado um questionário a 40 adolescentes na faixa etária de 13 a 21 anos num Núcleo de Atenção Médica Integrada (NAMI) em Fortaleza e foi constatado que métodos abortivos mais utilizados foram substâncias como: chás medicinais abortivos, reguladores de ciclo menstrual disponíveis em farmácias e o misoprostol que segundo estudo de Machado e Taquette (2022) demonstram que mesmo com acesso restringido desde 1998, ainda é comercializado em sua ilegalidade.

Apesar de confirmações de alta taxa de aborto incompleto e indícios de efeitos tóxicos mediante o uso do misoprostol, ainda assim, o medicamento permanece sendo utilizado pela população. (BARROS; ALBUQUEQUE, 2012)

Aproximadamente 22 tipos de medicamentos foram encontrados no estudo de Barros e Albuquerque (2012), em sua maioria são ervas mas também encontram-se água inglesa, regulador menstrual, “coquetel”, o que presume-se ser uma associação de doses elevadas de hormônios sexuais sintéticos, e o mais utilizado misoprostol, porém, dentre todas plantas medicinais citadas, o maior uso entre as mulheres que realizaram o procedimento estão a quina verdadeira, hortelã e romã portanto consideram assim a ineficácia dos demais chás.

Substâncias presentes nos diversos métodos abortivos citados podem intoxicar o organismo podendo trazer dores gástricas ou abdominais, diarreias, vômitos, distúrbios urinários, circulatórios e/ou respiratórios em casos mais graves podendo levar a morte ou ocasionar hemorragias, em outros casos, quando sem sucesso, a tentativa pode ocasionar anormalidades congênitas no feto, baixo peso no nascimento ou parto prematuro. (BARROS; ALBUQUERQUE, 2012)

Por intermédio da análise de Fusco, Andreoni e Silva (2008), foi constatado que o uso do Misoprostol foi utilizado na maioria dos abortos induzidos, seja por via oral, intravaginal ou até mesmo pelas duas vias, também entra em aplicabilidade o uso de chás de plantas medicinais, sondas ou espancamento e/ou agressões físicas. Em seu maior percentual de complicações houve hemorragia seguida de infecção ou abortamento incompleto.

Machado e Taquette (2022)referiram mediante seus estudos que há uma lacuna entre as informações sobre o uso do misoprostol em relação a dose, vias de administração, contra indicações, cuidados necessários, causando procura para atendimento hospitalar para confirmar se o aborto foi concluído ou tratamento das complicações após o sangramento decorrente do uso do medicamento, cólicas uterinas intensas ou infecções que são confirmadas também no estudo de Madeiro e Rufino (2017), mediante estudo dos mesmos, essas complicações submeteram-nas a necessidade de curetagem como forma de esvaziando uterino, transfusão sanguínea ou até mesmo histerectomia.

Diante de pesquisa realizada por Silva et al. (2010) em duas maternidades que atendem a clientela do Sistema Único de Saúde (SUS) da cidade de Campinas, observou-se que gestantes que fizeram o uso do misoprostol relataram complicações

menos graves do que aquelas que utilizaram métodos invasivos para interromper a gestação, como chá de arruda, chá de buxinha, chá de folha de laranja, chá de pimenta-do-reino, chá de maconha, chá de boldo, chá de arruda e canela, inalação com buxinha, ergotrato, anticoncepcional de emergência.

O Sistema de Internação Hospitalar (SIH) evidenciou uma média de 200 mil internações por ano por procedimentos com relação ao aborto, incluindo serviços profissionais e hospitalares, apresentando um custo um desembolso de 40 milhões por ano. O principal procedimento realizado é a curetagem pós abortamento em maior percentual dos casos, procedimento o qual segundo Gesteira, Diniz e Oliveira (2008) relatam ser o segundo procedimento obstétrico mais realizado na unidade de internação dos serviços de saúde pública. (CARDOSO; VIEIRA; SARACENI, 2020)

Considerando pesquisas de Cardoso, Vieira e Saraceni (2020), onde utilizaram como metodologia dados públicos dos sistemas de informação em saúde do Brasil: SIM (Sistema de Informações sobre mortalidade), SINASC (Sistema de Informações de Nascidos Vivos) e DATASUS (Departamento de Informática do SUS), foi constatado que a maior proporção de risco de óbito por aborto é entre negras e indígenas, mulheres com baixa escolaridade, sem companheiro, com menos de 14 anos e mais de 40 anos pertencendo aos Estados Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Os percentuais mais altos de prevalência mediante ato de aborto induzido foram em relação a baixa escolaridade, baixa renda, solteiras, negras, na faixa dos 20 a 24 anos, falta do apoio do parceiro. (MADEIRO; RUFINO, 2017)

3.2   Formas de acesso clandestino aos métodos abortivos por mulheres gestantes.

O uso do misoprostol é restrito a hospitais desde 1998 resultando na comercialização ilegal onde impacta na procedência duvidosa em relação a doses e efeitos adversos. Foi constatado que a maioria das mulheres utilizaram isoladamente, outras o usaram concomitantemente com chás para indução do aborto induzido ou associando-o ao uso de sonda uterina e mesmo com o uso solitário de chás/ervas como uma mistura de ervas denominada “garrafada” até chá de boldo, canela e buchinha o uso do misoprostol foi necessário para interromper a gravidez. (MADEIRO; RUFINO, 2017)

A forma de acesso ao misoprostol foi predominante mediante farmácia de bairro onde viviam, procurados pela própria mulher, dirigindo-se sozinhas ao adquirir, em outros casos o companheiro adquiriu e as informações fornecidas sobre o uso do mesmo foi por intermédio de amigas, irmãs ou outras mulheres. Já no caso dos chás foram adquiridos em residências de especialistas em ervas, mercados ou feiras. (MADEIRO; RUFINO, 2017)

Por intervenção da análise de Nunes, Madeiro e Diniz (2013), o misoprostol foi utilizado isoladamente no maior percentual das vezes e pouco combinado aos chás, no que difere do estudo de Madeiro e Rufino que houve maior porcentagem. Maior percentual do uso do misoprostol foi por via oral e vaginal concomitantemente, o número de comprimidos utilizados foram de 3 a 6 comprimidos a depender da forma de administração, em embalagens sem identificação de procedência.

A internet também é considerada um meio de aquisição e negociação do medicamento abortivo misoprostol, além de ser recorrido para troca de experiências e informações. Os contatos são desempenhados via internet ou telefone mediante indicações de pessoas próximas ou até farmacêuticos. A entrega pode ser exercida via correio ou encontro em local assentido pelas partes. (DUARTE; MORAES; ANDRADE, 2018)

De acordo com um estudo realizado com 39 prostitutas de três cidades do Brasil com experiência anterior de aborto induzido o principal método para realizar o aborto era o uso intravaginal e oral do misoprostol, adquirido em farmácias ou no mercado negro, seguido pelas ervas tradicionais e clínicas clandestinas. No mesmo estudo verificou-se que houve um aumento no uso de preservativos entre as profissionais do sexo, mas que ainda assim não são suficientes para evitar uma gravidez não planejada. (MADEIRO; DINIZ, 2015)

3.3     A atuação da Enfermagem no processo de conscientização da população na prevenção da prática de aborto ilegal.

A ilegalidade influencia nas pesquisas, foi evidenciado que o número exato de mulheres que realizaram o aborto induzido não são precisos devido em sua pluralidade serem executados em estabelecimentos clandestinos ou sob o uso do misoprostol juntamente com as informações alcançadas imprecisamente em

entrevistas diretas com as mulheres devido o receio em expor a realização do ato frente a ilegalidade e dissentimento social. (PAES et al., 2021)

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), restringir o acesso ao aborto não reduz o número de abortos mas como visto no estudo de Fusco, Andreoni e Silva (2008), ainda assim, há preconceito e discriminação no atendimento dos profissionais da saúde, além de, no Brasil haver limitados estudos sobre o aborto induzido clandestinamente, descuido esse levando em consideração a necessidade do planejamento familiar preventivo como preza a Saúde Reprodutiva visto que o aborto inseguro é um problema de Saúde Pública.

Independente das crenças e valores morais de cada um dos indivíduos da equipe multiprofissional, Fusco, Andreoni e Silva (2008) salientam a necessidade de haver acolhimento, suporte emocional, orientação e informação na assistência ao aborto.

Apesar da existência de política pública voltada a esse eixo, torna-se violado mediante situações de violência institucional que se caracteriza como 7 pontos: ausência de confidencialidade, cuidado clínico não consentido, violência física, negligencia, detenção na instituição, cuidado não digno e discriminação, fatos designados em 2010 pela Agência para Desenvolvimento Internacional dos Estados Unidos (USAID). (FUSCO; ANDREONI; SILVA, 2008)

O julgamento moral, adiamento da curetagem, baixo controle da dor no cotidiano da assistência e ameaças com probabilidade de denúncia à polícia também são situações rotineiras, atos que opõem-se a vários códigos deontológicos na área da saúde devido o sigilo ser um pilar entre o profissional e o paciente evitando omissão de circunstâncias relevantes para a resolução do problema de enfermidade. (FUSCO;ANDREONI; SILVA, 2008)

As dificuldades de acesso a uma vaga hospitalar e situações de discriminação durante as internações hospitalares são recorrentes, afirma-se em estudo de Aquino, et al. (2020), ou seja, há problemas enfrentados frente aos serviços de saúde.

Em concordância a observação de Cardoso, Vieira e Saraceni (2020) evidencia- se a necessidade do acesso e competência de ações focadas no planejamento reprodutivo e atenção pré-natal com interesse na redução do risco de ocorrência do aborto, seja ele espontâneo ou provocado.

As condições de risco devem ser reduzidas por meio da ampliação e melhoria dos serviços de planejamento familiar, aconselhamento pós aborto, educação para evitar a ocorrência novamente, evitando repetidos abortos devido os ocorridos se

darem ao fato desinformação, falta de orientação sexual e o não uso regular de método contraceptivo. (BARROS E ALBUQUERQUE, 2012)

Através de investigação de Nunes, Madeiro e Diniz (2013), as mulheres que omitiram ou negaram o aborto justificaram-se pelo receio de sofrer discriminação, ameaça de denúncia ou exposição perante outras pessoas pois evidencia a precariedade do acolhimento ofertado a elas nesses serviços, assim como em outros estudos, devido relatos de maus tratos, atitudes preconceituosas e denúncia pelos profissionais.

Alguns exemplos situados foram diagnóstico de perfuração uterina e infecção, casos de viagem de mais de 1000km em busca de assistência sendo necessário transfusão sanguínea por choque hipovolêmico e necessidade de internação de 5 dias e também retorno com quadro de aborto infectado grave, dados exemplos de 3 situações de mulheres diferentes ocorridos, complicações que pressupõe a má prática de assistência em saúde fornecida. (NUNES; MADEIRO; DINIZ, 2013)

O risco elevado de morte foi relacionado com o maior tempo de espera no hospital para obtenção do tratamento para complicações do aborto provocado, o medo do julgamento faz com que as mulheres demorem para a procura do hospital por conta dos vestígios da medicação que influenciam nas complicações, aponta a necessidade de capacitação e sensibilização dos profissionais de saúde frente ao atendimento as mulheres em processo de abortamento. (NUNES; MADEIRO; DINIZ, 2013)

Em derivação dos estudos de Gesteira, Barbosa e Endo (2006), após o aborto induzido, a mulher que procura os serviços de saúde com sequelas do ato, além dos procedimentos técnicos também necessitam de uma assistência em decorrência da perda e luto, assistência a qual se faz necessária vir principalmente da sensibilização de enfermeiros(as) que visem abranger essa porção da sociedade feminina e suas adversidades.

Há o componente psicológico do estigma ao aborto, em que as reações negativas identificadas, percebidas ou até presumidas a respeito do julgamento dos outros podem influenciar as decisões quanto a revelar ou ocultar a prática do aborto e até atrasar ou evitar cuidados de saúde (DUARTE, MORAES e ANDRADE, 2018)

Araújo et al. (2018) apresentou por meio de análises realizadas sobre o acesso ao atendimento às complicações relacionadas ao aborto feito com mulheres no Nordeste do Brasil, algumas relataram terem enfrentado dificuldades na obtenção de

cuidados pós-aborto, e o tempo necessário para terem um atendimento adequado teve consequências e complicações mais graves.

O medo do julgamento em relação ao aborto atrasou a procura de cuidados e deu-lhes menos prioridade nas unidades de saúde. As mulheres também enfrentaram dificuldades decorrentes das suas condições de vida menos favoráveis e tiveram necessidades não satisfeitas de cuidados obstétricos de emergência (ARAÚJO et al., 2018).

Ressaltado por Gesteira, Diniz e Oliveira (2008), palavras e atitudes de caráter condenatórias e preconceituosas, descaso e postergação da assistência são observados na prática na atuação dos profissionais de saúde, enfatizando profissionais da enfermagem como principais autores.

Há declarações de profissionais que informam que a prioridade é cedida a amparar e atender parturientes, puérperas e gestantes de alto risco comparado ao atendimento as mulheres que abortaram devido considerarem que o ato contraria os mandamentos religiosos, ou seja, os(as) profissionais pensam e agem de acordo com suas crenças e valores esquecendo que segundo a Constituição Federal, o Estado é configurado como laico. (GESTEIRA; DINIZ; OLIVEIRA, 2008)

O Código de Ética de Enfermagem afirma que as questões filosóficas e religiosas dos profissionais de saúde não devem ser transparecidos na assistência, ou seja, preceitos éticos que regem a profissão são violados portanto são necessárias mudanças de comportamento por parte dos profissionais que atendem a mulher que vivencia o processo do aborto de forma oprimida e temerosa da morte, focando na humanização principalmente nos aspectos relacionais entre profissional e paciente. (GESTEIRA; DINIZ; OLIVEIRA, 2008)

Segundo o estudo de Silva et al. (2015) realizado com 12 profissionais de enfermagem do centro obstétrico de um hospital público da Região Sul do Brasil a atuação da enfermagem se dá através de uma escuta qualificada, respeito a individualidade de cada uma, ajudar e dar assistência a elas nesse momento, oferecer conforto e atender. A escuta é considerada uma forma de acolhimento, que faz parte de um tratamento digno e respeitoso oferecido à mulher.

Portanto, neste momento a escuta qualificada caracteriza-se como um instrumento fundamental do atendimento humanizado. Nesse sentido, aconselha-se a adoção de abordagens comunicativas que respeitem a autonomia das mulheres e seu poder de decisão, procurando estabelecer uma relação de confiança. É

importante que o atendimento humanizado à mulher contemple os princípios fundamentais da bioética: respeito pela pessoa, beneficência, não maleficência e justiça. (SILVA ET AL., 2015)

4.CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da análise realizada, conclui-se que, apesar de não ser legalizado, o aborto continua sendo realizado para interrupção de gestação, ocorrendo na maior parte em mulheres muito jovens, de baixa renda e com baixo nível de escolaridade, em gestações com até 15 semanas, podendo ocorrer também de forma tardia. Um dos métodos mais utilizados é o misoprostol, pois pode ser encontrado com facilidade e tem preço acessivo a todas as classes sociais.

Vale destacar que em torno da metade das mulheres que realizam o aborto, acabam procurando uma unidade de saúde devido a complicações e que muitas tem medo de falar que o aborto foi induzido, por medo de sofrer retaliações, sentimento de culpa.

Foi constatado através deste estudo, que existe a necessidade de implementação de políticas públicas em relação a essas mulheres que optam pelo aborto, é importante que da equipe de saúde realize um atendimento humanizado, acolhedor, orientando-as de forma correta e prestando assistência psicológica, que seja de forma integral, sem maus tratos ou qualquer espécie de discriminação, de forma a evitar novos eventos.

REFERÊNCIAS

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Gabriela Alves de Freitas Leite – Discente da UNILS no curso de Enfermagem1
Vanessa Alexandre Lanciarte – Discente da UNILS no curso de Enfermagem2
Maria Vera Rocha Cruz – Discente da UNILS no curso de Enfermagem3
Allan Bruno de Souza Marques – Professor orientador Allan Bruno de Souza Marques, Enfermeiro4