REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7606058
Adson Antônio Ferreira Costa¹
Jádila Alves Costa²
Carolyne Amélia Assis Ávila³
RESUMO
A indústria da construção civil é uma grande contribuinte para o desenvolvimento socioeconômico do Brasil. Destaca-se, entre os processos construtivos mais utilizados, as de estruturas de concreto armado. Consequentemente, o cimento, principal constituinte da mistura do concreto, refere-se a um dos materiais mais utilizados no país e no mundo. Contudo, trata-se de um material ativo e pulverulento que ao ser misturado com a água reage quimicamente, podendo assim causar impactos na saúde dos trabalhadores que manuseiam este material. Visando a disseminação de medidas protetivas e preventivas aos trabalhadores da construção civil em relação ao uso do cimento, o presente artigo tem como objetivo identificar os riscos e as doenças inerentes aos trabalhadores ao elaborar o cimento de maneira inadequada. Para isso, realizou-se uma pesquisa bibliográfica. Conforme os resultados apresentados, baseando-se nas normas de segurança do trabalho, destaca-se a importância da utilização de medidas preventivas e protetivas, a fim de evitar estes impactos na saúde do trabalhador.
Palavras-chave: Construção civil, Cimento, Riscos ambientais, Segurança do trabalho.
ABSTRACT
The construction industry is a major contributor to Brazil’s socio-economic development. Among the most used construction processes, reinforced concrete structures stand out. Consequently, cement, the main component of the concrete mix, is one of the most used materials in the country and in the world. However, it is an active and powdery material that, when mixed with water, chemically reacts, thus being able to impact the health of workers who handle this material. Aiming at the dissemination of protective and preventive measures to civil construction workers in relation to the use of cement, this article aims to identify the risks and diseases inherent to workers when working with cement improperly. For this, a bibliographical research was carried out. According to the results presented, based on work safety standards, the importance of using preventive and protective measures is highlighted, in order to avoid these impacts on the worker’s health.
Keywords: Civil construction, Cement, Environmental risks, Occupational safety.
1. INTRODUÇÃO
A indústria da construção civil é uma das grandes contribuintes do desenvolvimento socioeconômico no Brasil, gerando empregos, renda, viabilizando moradias e infraestrutura (MAZUR, 2015). Responsável pelas mais diversas construções, sejam elas edificações, pontes, túneis, barragens, rodovias, etc., a construção civil utiliza-se de diferentes materiais, mão de obra, técnicas construtivas e tecnologia para execução das obras.
Neste sentido, destaca-se o uso de estruturas de concreto armado, sendo o processo construtivo mais difundido no país. Estima-se que, o cimento, constituinte principal do concreto, é o produto mais consumido no mundo após a água (MEHTA; MONTEIRO, 1994). Referindo-se a um material ativo, o cimento resulta em reações químicas nas misturas quando em contato com a água, podendo causar acidentes de trabalho e problemas de saúde aos trabalhadores. Diante disso, é necessária a disseminação do conhecimento e dos cuidados necessários para a utilização e manuseio deste material.
Com o objetivo de antecipar, reconhecer, avaliar e controlar os possíveis e iminentes riscos existentes dentro de uma construção, aplica-se o regramento e as ordens necessárias para que seja evitado ao máximo ou diminuído os possíveis danos acarretados aos trabalhadores, adotando-se a segurança do trabalho (NETO WALDHELM, 2019). Dentre as medidas de segurança, destaca-se a importância da prevenção e do uso correto e consciente dos equipamentos de proteção, a fim de proporcionar uma melhor qualidade de vida ao trabalhador.
Neste sentido, este estudo objetivou identificar os riscos que os trabalhadores da construção civil estão sujeitos quanto ao uso do cimento. Visa ainda, entender as atividades que envolvam seu uso, identificar as doenças provocadas ao se manusear o mesmo e assim, propor medidas preventivas e protetivas na busca da mitigação ou eliminação dos riscos de acidentes ou doenças ao trabalhador.
Nesta perspectiva, a escolha deste tema se justifica em virtude da falta de atenção em relação ao uso do cimento na obra, a não utilização dos equipamentos de proteção necessários, bem como o não cumprimento das técnicas que visam reduzir os riscos inerentes à atividade.
2. METODOLOGIA
De acordo com a metodologia utilizada na pesquisa, a mesma se classifica como qualitativa, de natureza descritiva. Para Gil (2022) a pesquisa descritiva busca discorrer sobre as características do objeto de estudo e estabelecer relações entre as variáveis estudadas sem manipulá-las.
A pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como fonte direta de dados e o pesquisador como instrumento fundamental. Tem como preocupação o estudo e a análise do mundo empírico em seu ambiente natural. De natureza descritiva, a palavra escrita ocupa lugar de destaque nessa abordagem, desempenhando um papel fundamental tanto no processo de obtenção dos dados quanto na disseminação dos resultados (GODOY, 1995).
Para se atingir os objetivos propostos no estudo, realizou-se uma pesquisa bibliográfica, onde foram consultados diversos acervos digitais para elaboração do referencial teórico, visando uma melhor compreensão da temática. Posteriormente, foi realizado um levantamento dos riscos ambientais aos quais os trabalhadores da indústria da construção civil estariam expostos e proposto medidas de proteção e prevenção.
3. REFERENCIAL TEÓRICO
3.1 O CIMENTO PORTLAND E SUA IMPORTÂNCIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL
O cimento Portland é o principal material de construção usado como aglomerante ou ligante. Consiste em uma das principais mercadorias mundiais, servindo até mesmo como indicador econômico (FERREIRA, 2010). Totalmente versátil em obras civis, o cimento pode ser empregado tanto em peças de mobiliário urbano como em grandes barragens, estradas, edificações, pontes, tubos de concreto e telhados (RODRIGUES, 2012).
Produzido a partir de mistura, calcinação e moagem de materiais calcários e argilosos em certas proporções, é um material pulverulento e ativo. Constituído de silicatos e aluminatos de cálcio, ao serem misturados com a água, hidratam-se e produzem o endurecimento da massa, podendo oferecer elevada resistência mecânica (NEVILLE, 2015; PETRUCCI, 1987).
Para a produção de cimento podem ser utilizados minerais de origem natural, e também produtos industriais, mas para qualquer que seja o material utilizado ele deve obedecer a condição de conter os quatro componentes essenciais para sua produção, que são: cal, sílica, alumínio e ferro (SANTOS, 2021). Posteriormente a obtenção do clínquer, que consiste no processo de calcinação do calcário e argila, tem-se a adição da gipsita na produção do cimento, cuja função básica é controlar o tempo de pega, isto é, a perda da plasticidade da pasta de cimento (SENFF; FOLGUERAS; HOTZA, 2005).
Quando o cimento é misturado com a água inicia-se uma série de reações químicas, denominada hidratação do cimento, que tem como característica a liberação de calor, que pode ser muito ou pouco a depender dos constituintes da mistura (SENFF; FOLGUERAS; HOTZA, 2005).
Neste contexto, observa-se que existem riscos inerentes ao manuseio do cimento, os quais serão abordados neste estudo mais adiante.
3.2 ACIDENTES DO TRABALHO
Ao longo da história humana, muitas mortes, doenças e mutilações de trabalhadores tiveram como causa direta ou indireta seu ambiente de trabalho. Desde as épocas mais remotas, as atividades laborais apresentam riscos em potencial, frequentemente concretizados em lesões que afetam a integridade física e a saúde do trabalhador (MELO JÚNIOR; RODRIGUES, 2005).
Segundo Bergamini (1997), a melhoria da segurança, saúde e meio ambiente de trabalho, além de aumentar a produtividade, diminui o custo do produto final, pois diminui as interrupções no processo, absenteísmo e acidentes e/ou doenças ocupacionais.
Neste contexto, coloca-se em pauta a ocorrência dos acidentes do trabalho, definido como: aquele que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, a perda ou redução da capacidade para o trabalho, permanente ou temporária” (BRASIL, 1991).
Segundo Brasil (2016) e Ferreira e Peixoto (2012), pode-se dizer que os acidentes de trabalho se dividem basicamente em 3 grupos: Acidente típico, Acidente de trajeto e Doenças ocupacionais, apresentados de forma sucinta no Quadro 1.
Quadro 1 – Descrição dos acidentes de trabalho.
Acidente | Descrição |
Típico | É aquele que ocorre no local e durante o trabalho, sendo um acontecimento repentino, violento e eventual, provocando no trabalhador uma incapacidade para a prestação de serviço. |
Trajeto | É o acidente sofrido pelo trabalhador no percurso da residência para o local de trabalho ou vice-versa, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do trabalhador, em horários e trajetos compatíveis. Deixa de caracterizar-se como “acidente de trajeto” quando o mesmo, por interesse próprio, tenha interrompido ou alterado o percurso normal. |
Doenças ocupacionais | São doenças decorrentes do trabalho e podem ser classificadas em “doenças profissionais” e “doenças do trabalho”. |
Fonte: Elaborado pelos autores, baseado em Brasil, 2016; Ferreira; Peixoto, 2012.
A doença profissional é definida como aquela produzida ou estimulada pelo exercício do trabalho, onde há exposição dos trabalhadores a agentes físicos, químicos e biológicos. Podem servir como exemplos dessas doenças: as lesões por esforços repetitivos (inflamações em músculos, tendões e nervos, provocadas por atividades de trabalho que exigem movimentos manuais repetitivos durante longo tempo); perda auditiva induzida pelo ruído (provocada, na maioria das vezes, pela exposição a altos níveis de ruído durante período prolongado); dentre outras (BRASIL, 2016; FERREIRA; PEIXOTO, 2012).
Já a doença do trabalho, ainda de acordo com os autores Brasil (2016) e Ferreira e Peixoto (2012) é aquela adquirida ou desencadeada em função de condições inadequadas de trabalho, onde se torna necessária a comprovação de que foram adquiridas em decorrência do trabalho. Cita-se como exemplos: alergias respiratórias adquiridas em ambientes condicionados; estresse; fadiga; dores de coluna; e intoxicações profissionais agudas.
Contudo, observa-se que, mais do que cumprir com a legislação existente, é um dever das empresas proporcionar um ambiente de trabalho seguro e saudável aos seus colaboradores (ALEVATO, 1999).
3.3 SEGURANÇA DO TRABALHO E NORMAS
A segurança do trabalho pode ser entendida como um conjunto de medidas a serem adotadas visando minimizar os acidentes de trabalho, as doenças ocupacionais, bem como proteger a integridade e a capacidade de trabalho do colaborador (SANTOS; VASCONCELOS, 2019). Através da Portaria 3.214/78 foi aprovado no Brasil as Normas Regulamentadoras (NR), Normas Regulamentadoras Rurais (NRR), outras leis complementares, portarias, decretos, e as convenções da Organização Internacional do Trabalho, relativas à Segurança e Medicina do Trabalho (PINTO, 1997).
Com foco na área da construção civil, cita-se as NR-1 (Disposições Gerais); NR-5 (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA); NR-6 (Equipamento de Proteção Individual – EPI); NR-9 (Avaliação e controle das exposições ocupacionais a agentes físicos, químicos e biológicos); NR-17 (Ergonomia); e NR-18 (Condições e Meio Ambiente de Trabalho na indústria da Construção), as quais são de grande relevância para este estudo.
Discorrendo brevemente sobre estas NR, a NR-1: 2020 tem como objetivo estabelecer as disposições gerais, o campo de aplicação, os termos e as definições comuns às NR relativas à segurança e saúde no trabalho, bem como as diretrizes e os requisitos para o gerenciamento de riscos ocupacionais e as medidas de prevenção em Segurança e Saúde no Trabalho – SST.
Ainda, estabelece as diretrizes para implementação do Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) (BRASIL, 2020).
Já a NR-9:2021 tem por objetivo estabelecer os requisitos para avaliação das exposições ocupacionais a agentes físicos, químicos e biológicos quando identificados no PGR, auxiliando nas medidas de prevenção para os riscos ocupacionais. Além disso, a NR-9 apresenta exigências que devem ser atendidas no PGR visando à preservação da saúde e da integridade dos trabalhadores, como o controle de ocorrências de riscos ambientais existentes ou que venham a existir no ambiente de trabalho (ANDRADE, 2014; BRASIL, 2021b).
Quanto a NR-17:2022, a mesma dispõe sobre a avaliação ergonômica das situações de trabalho que demandam adaptação às características psicofisiológicas dos trabalhadores, a fim de implementar medidas de prevenção e adequações necessárias (BRASIL, 2022). Por sua vez, a NR-5:2021 tem por objetivo a prevenção de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho, de modo a tornar compatível permanentemente o trabalho com a preservação da vida e a promoção da saúde do trabalhador (BRASIL, 2021a).
Por fim, tem-se uma das principais normas de segurança do trabalho que regulamentam as atividades da construção civil, a NR-18:2020. Dentre seus principais objetivos, cita-se: garantir plenamente a saúde e a integridade física dos trabalhadores da construção; definir quais são as atribuições e as responsabilidades dos administradores de obras; criar e operar mecanismos para prever riscos que derivam do processo de execução de obras em canteiros; determinar medidas de proteção e prevenção que sejam capazes de evitar ações e situações de risco; e ainda, aplicar as técnicas de execução pertinentes a cada atividade que reduzam riscos de doenças e acidentes. (BARSANO, 2015; BRASIL, 2020b; COELHO; GHISI, 2016; FIESP, 2003).
Dentre as medidas de proteção e prevenção de riscos, destaca-se o Mapa de riscos. Segundo Hall et al. (2000), o mesmo consiste em um conjunto de registros gráficos que buscam representar os riscos existentes nos diversos ambientes, ou postos de trabalho. Seu objetivo é reunir as informações necessárias para estabelecer o diagnóstico da situação de segurança e saúde no ambiente e, também, informar e conscientizar as pessoas que praticam alguma atividade naquele local dos riscos ali existentes, através de representações de fácil visualização.
A identificação das situações e locais potencialmente perigosos é feita a partir de uma planta baixa de cada área ou seção, onde são levantados todos os tipos de riscos, classificando-os conforme o grau de perigo em pequeno, médio ou grande. Estes riscos estão agrupados em cinco grupos, os quais são classificados pelas cores vermelho, verde, marrom, amarelo e azul, conforme pode ser observado no Quadro 2. Cada grupo corresponde a um tipo de agente: químico, físico, biológico, ergonômico e acidental, os quais são brevemente definidos no Quadro 3 (SCHWAB; STEFANO, 2008).
Quadro 2 – Riscos ambientais
Grupo | Riscos | Cor de Identificação | Exemplos |
1 | Físicos | Verde | Ruído, calor, frio, pressão, umidade, radiações ionizantes e não ionizantes, vibração, etc. |
2 | Químicos | Vermelho | Poeiras, fumos, gases, vapores, névoas, neblinas, etc. |
3 | Biológicos | Marrom | Fungos, vírus, parasitas, bactérias, protozoários, insetos, etc. |
4 | Ergonômicos | Amarela | Levantamento e transporte manual de peso, monotonia, repetitividade, responsabilidade, ritmo excessivo, posturas inadequadas de trabalho, trabalho em turnos, etc. |
5 | Acidentais | Azul | Arranjo físico inadequado, iluminação inadequada, incêndio e explosão, eletricidade, máquinas e equipamentos sem proteção, quedas e animais peçonhentos. |
Fonte: HOKEBERG et al., 2006
Quadro 3 – Definição dos riscos ambientais
Riscos | Descrição | Autores |
Físico | Consideram-se agentes de risco físico as diversas situações a que possam estar expostos os trabalhadores, tais como: ruído, temperaturas extremas, pressões anormais, umidade, etc. | BARSANO, 2015; BRASIL, 1978; BRASIL, 2007; MOTERLE, 2014. |
Químico | São representados pelas substâncias químicas que se encontram nas formas líquida, sólida e gasosa. Quando os agentes são absorvidos pelo organismo podem produzir reações tóxicas e causar danos à saúde do trabalhador, tais como: poeiras, gases, névoas, etc. | VECCHIONE, 2010 |
Biológico | Os agentes classificados nesta categoria são os vírus, bactérias, fungos, bacilos, parasitas, protozoários, entre outros, que podem penetrar no corpo humano pelas vias cutânea, digestiva e respiratória, podendo causar infecções diversas. Esses microrganismos, em sua maioria, são invisíveis a olho nu e são capazes de produzir doenças, deterioração de alimentos, mau cheiro, uma vez que apresentam muita facilidade de reprodução. | BARSANO, 2015; BRASIL, 1978; BRASIL, 2007; MOTERLE, 2014 |
Ergonômico | Referem-se à adaptação das condições de trabalho, às características psicofisiológicas do trabalhador relacionadas ao ritmo de produção, ao processo de trabalho, às pausas e revezamentos, à jornada diária de trabalho e às instruções operacionais. Dizem respeito ao conforto, à segurança e à eficiência em uma atividade. Os fatores relacionados ao trabalhador envolvem dimensões pessoais, psicossociais e biomecânicas. | FERNANDES, 2006 |
Acidente | São classificados os agentes decorrentes das situações perigosas nos ambientes e nos processos de trabalho que envolvem arranjo físico, uso de máquinas, equipamentos e ferramentas, condições das vias de circulação, organização e higiene dos ambientes, métodos e práticas de trabalho, entre outros. | BRASIL, 2007; MOTERLE, 2014 |
Fonte: Elaborado pelos autores, 2023.
3.4 MEDIDAS PREVENTIVAS E PROTETIVAS
As medidas preventivas e protetivas fazem parte da prática da segurança do trabalho e visam evitar que uma pessoa ou grupo de pessoas se contaminem, adoeçam, sofram acidentes, traumas, etc., em função da sua prática laboral. É necessário estabelecer o método a ser usado para a identificação e avaliação dos fatores de riscos ocupacionais e orientar a prescrição de medidas de controle dos ambientes de trabalho, que assegure a proteção da saúde dos trabalhadores (JUNIOR FRIAS, 1999).
A prevenção dos acidentes deve ser realizada através de medidas gerais de comportamento, eliminação de condições inseguras e treinamento dos empregados, devendo o uso dos Equipamentos de Proteção Individuais (EPI) ser obrigatório, havendo fiscalização em todas as atividades, sendo os empregados treinados quanto ao seu uso correto (PENA; SCORTEGAGNA; UHDE, 2015). Conforme Saliba (2021), na etapa da implementação das medidas de controle dos riscos são determinados os métodos para a prevenção, eliminação ou minimização dos riscos ocupacionais, podendo ser dividida em três grupos: medidas de proteção coletiva, administrativas e individuais.
As medidas de proteção coletiva, de acordo com Rodrigues (2016) são aquelas usadas para proteger grupos de trabalhadores durante suas atividades laborais e tem a função de garantir a saúde e a integridade física no local e proximidades. Sugere-se para a proteção coletiva o uso de Equipamentos de Proteção Coletiva (EPC), que são importantes como medidas de controle perante a ação de agentes potencialmente insalubres (BARSANO, 2015; THOMÉ, 2016).
Define-se EPC como toda medida ou dispositivo utilizado ou projetado para a proteção de uma ou mais pessoas ao mesmo tempo, a fim de realizar uma determinada tarefa ou qualquer atividade. São exemplos de EPC: sistemas de exaustão, sistema de enclausuramento, comando bimanual, cabo de segurança, entre outros (BARSANO, 2015; BOZZA, 2010).
As medidas de caráter administrativo normalmente possuem um custo inferior às medidas de proteção coletiva. De maneira geral são mudanças no processo produtivo e necessitam do apoio da gestão da empresa para serem implementadas. Dentre essas medidas, destaca-se a limitação do tempo de exposição do trabalhador ao agente perigoso, por meio de rodízio de funcionários ou pausas entre as atividades. Além disso, são consideradas estratégias eficientes, executar as tarefas de forma correta, adotando posturas adequadas e manuseando corretamente os equipamentos (SALIBA, 2021).
Já as medidas de proteção individual atuam especificamente em cada trabalhador, e para isso, indica-se a utilização dos Equipamentos de Proteção Individual (EPI). De acordo com a NR-6:2022, considera-se EPI, todo dispositivo ou produto de uso individual utilizado pelo trabalhador, destinado à proteção de riscos suscetíveis de ameaça à segurança e à saúde no trabalho. São exemplos: capacete, capuz, óculos, protetor facial, protetor auditivo, respirador purificador de ar, luvas, calçados, etc.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
O cimento por ser um pó fino, abrasivo, alcalino e higroscópico sua ação sobre a pele pode provocar dermatites, queimaduras e conjuntivite, além de infecções secundárias fúngicas ou bacterianas (BARBOSA, 2005). Na construção civil, os trabalhadores ficam em contato com o cimento por longos períodos, expostos aos riscos de contaminação, em alguns casos ainda, provocam danos aos sistemas cardiovascular, respiratório, endócrino, gastrointestinal, renal, reprodutor, imunológico e neurológico dos seres humanos (SANTI; SEVÁ, 2004).
As rotas de exposição ao cimento incluem a via dérmica, cuja a mesma é responsável pelo desenvolvimento de dermatites alérgicas, que são a maior causa de afastamento do trabalho dos operários da construção civil (SANTI; SEVÁ, 2004). Ali (2001) ainda complementa que o cimento e os produtos compostos por ele (argamassa e concreto), quando em contato frequente com a pele pode ressecar, irritar, ou ferir as mãos, os pés, ou qualquer local da pele em contato por determinado tempo, ou ainda, produzir reações alérgicas, dependendo do contato do cimento com essas partes do corpo.
Segundo Cunha (2009) o contato do cimento com as unhas torna-as mais secas e quebradiças e também pode provocar manifestações de sensibilidade na conjuntiva ocular e, pequenas manifestações na mucosa nasal e oral, por ser um material pulverulento, pode propiciar o desenvolvimento de câncer de estômago e da via respiratória (SANTI; SEVÁ, 2004).
Observou-se, portanto, que dentre os riscos ambientais que causam acidentes e doenças de trabalho, o uso do cimento apresenta aos trabalhadores os riscos químicos, ergonômicos e de acidente. Neste sentido, conforme instruções da NR-6:2022, é imprescindível que o mesmo faça uso de EPI adequados, dos quais lista-se para atividades com o material cimento: luvas e botas de borracha (impermeáveis); máscaras; óculos de proteção; além de capacete e vestimentas adequadas resistentes à atividade.
Quanto aos EPC, lista-se de isolamento e sinalização das áreas de riscos, ventilação exaustora local, medidas de higiene pessoal e coletiva (lavatórios, chuveiros, vestiários e sanitários), enclausuramento total ou parcial do processo de produção.
Destaca-se, ainda, a higiene do trabalho através de banhos obrigatórios após o trabalho e a troca diária de roupa (limpa) por conta da empresa. É aconselhável o uso de creme hidratante para a pele. As medidas de higiene e segurança listadas anteriormente devem ser adotadas e praticadas no ambiente de trabalho com o propósito de melhorar a qualidade e integridade dos operários
Além dos cuidados com segurança e higiene, deve se preocupar com o manuseio e transporte do cimento. Atualmente o cimento é comercializado em sacos de 50 kg, o qual o trabalhador necessita transportá-lo muita das vezes manualmente, sujeito aos riscos ergonômicos, não havendo preparo e instrução correta pode acarretar em problemas de coluna, além de lesões em tendões, músculos e articulações.
Uma forma de evitar algumas lesões é sempre carregar e descarregar os sacos de cimento flexionando as pernas e mantendo a coluna reta. Quanto mais próximo o material ficar do corpo, melhor. Importante adotar medidas preventivas, dar instruções e fornecer EPI, para uma boa execução de todo trabalho, evitando danos à saúde do trabalhador e garantindo melhor qualidade de vida.
Percebe-se a importância da aplicação de conceitos ergonômicos dentro do setor da construção civil, pois são atividades árduas e de intenso esforço físico, aliadas a riscos químicos e de acidentes que contribuem para o adoecimento do funcionário.
Apesar da evolução tecnológica ter trazido consigo equipamentos e dispositivos mecânicos para auxiliar o trabalho, a atividade de carregamento manual de sacos de cimento depende do esforço físico do trabalhador, estando suscetíveis a lesões na musculatura e nas articulações, bem como propensos a acidentes e doenças ocupacionais, afastando-os do seu ambiente de trabalho.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Durante a pesquisa, evidenciou-se uma escassez de estudos que relacionasse os riscos quanto ao uso do cimento ao trabalhador. Assim, o trabalho proporciona um olhar mais crítico sobre essa questão, oferecendo embasamento para pesquisas futuras.
A construção civil apresenta um elevado índice de acidentes de trabalho, mesmo com todas as normas regulamentadoras e leis existentes, no entanto, é necessária uma atenção maior das empresas, quanto a oferta e garantia de um ambiente de trabalho mais seguro.
O estudo buscou contribuir na identificação dos impactos causados na saúde do trabalhador com a utilização do cimento na construção civil, verificando quais riscos os mesmos estão sujeitos, quais doenças serão acometidas e sugerindo-se medidas protetivas e preventivas. Por fim, com o intuito de compreender melhor sobre o assunto, sugere-se novos estudos relacionados ao cimento, sua produção, formas de elaborar e cuidados.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALI, S. A. Dermatoses Ocupacionais. FUNDACENTRO. São Paulo, 2001.
ALEVATO, H. M. R. Trabalho e Neurose: enfrentando a tortura de um ambiente em crise. Rio de Janeiro: Quartet, 1999.
ANDRADE, R. C. (2014). As vantagens da segurança do trabalho na indústria da construção civil. Fonte: Repositório Institucional UniCEUB: Disponível em: http://repositorio.uniceub.br/bitstream/235/6393/1/21307481.pdf. Acesso em 05 de set. 2022.
BARBOSA, L. R. Proposta de Promoção da Saúde da Pele Para Trabalhadores da Indústria de Cimento. 2005. Dissertação de Mestrado – Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2005.
BARSANO, P. R. (2015). Segurança do trabalho para concursos públicos. Fonte: Portal Educacional Unitoledo: Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788502627772/cfi/4!/4/4@0.00:27.5. Acesso em 18 de out. 2022.
BERGAMINI, C. W. Motivação nas organizações. São Paulo: Atlas, 1997. BOZZA, A. F. (2010). Segurança do trabalho na construção civil. Fonte: Repositório Digital Institucional da UFPR: Disponível em: https://acervodigital.ufpr.br/bitstream/handle/1884/34382/BOZZA,%20ANDRE%20FRANCI SCO.pdf?sequence =1&isAllowed=y. Acesso em 12 de Agosto, 2022.
BRASIL. (2016). Anuário Estatístico da Previdência Social. Disponível em: http://sa.previdencia.gov.br/site/2018/08/aeps2016.pdf. Acesso em 15 de set. 2022. BRASIL. LEI Nº 8.213, DE 24 DE JULHO DE 1991. Presidência da República-Planalto. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8213cons.html. Acesso em: 25 de jan. 2023.
BRASIL. Ministério do Trabalho. NR-5: Comissão interna de prevenção de acidentes. Rio de Janeiro, 2021a.
BRASIL. Ministério do Trabalho. NR-18: Condições e meio ambiente do trabalho na indústria da Construção. Rio de Janeiro, 2020.
BRASIL. Ministério da Educação. Construção Civil. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf/constciv.pdf. Acesso em: 20 de setembro, 2022.
BRASIL. Ministério do Trabalho. NR-1: Disposições Gerais e Gerenciamento de Riscos Ocupacionais, 2020.
BRASIL. Ministério do Trabalho. NR-6: Equipamento de Proteção Individual – EPI. Rio de Janeiro, 2022b.
BRASIL. Ministério do Trabalho. NR-17: Ergonomia, 2022.
BRASIL. (1978). NR 9 – Programa de prevenção de riscos ambientais. Fonte: Ministério do Trabalho: http://trabalho.gov.br/images/Documentos/SST/NR/NR-09.pdf
BRASIL. Ministério do Trabalho. NR-9: Programa de Prevenção de Riscos Ambientais. Rio de Janeiro, 2021b.
BRASIL. (2007). Segurança e saúde no trabalho. Fonte: Ministério da Educação, coleção cadernos de EJA: http://portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/10_cd_al.pdf
COELHO, D. F., & GHISI, B. M. (2016). Acidente de trabalho na construção civil em Rondônia. Disponível em: https://openaccess.blucher.com.br/article-list/acidente-de trabalhona-construcao-civil-em-rondonia-297/list#articles. Acesso em 9 de nov. 2022.
CUNHA, S. Riscos no Contato com Cimento. Revista Cipa Caderno de Informação de Prevenção de Acidentes, p. 29-44, fev. 2009.
FERNANDES, A. M. Gestão de Saúde, Biosegurança e Nutrição do Trabalhador. Goiânia, 2006.
FERREIRA, G. C. Riscos para a saúde dos trabalhadores em uma usina de concreto na cidade de três lagoas. Cuiabá, 2010. Monografia – Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Segurança do Trabalho da Universidade Federal de Mato Grosso. Cuiabá, 2010.
FERREIRA, L. S.; PEIXOTO, N. H. (2012). Segurança do Trabalho I. Fonte: Rede E-tec Brasil: Disponível em: http://redeetec.mec.gov.br/images/stories/pdf/eixo_amb_saude_seguranca/tec_seguranca/seg_ trabalho/151012_s eg_trab_i.pdf. Acesso em 23 de jan. 2023.
FIESP. (2003). Manual legislação em segurança e medicina do trabalho. Fonte: Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. Disponível em: http://www.fiesp.com.br/indices pesquisas-epublicacoes/manual-legislacao-em-seguranca-e-medicina-do-trabalho/. Acesso em 17 de set. 2022.
GIL, A. C. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. São Paulo: Atlas, 2022.
GODOY, A. S. Introdução à pesquisa qualitativa e suas possibilidades. Revista de administração de empresas, v. 35, p. 57-63, 1995.
HALL, J. et. al. Segurança e Saúde nas Escolas, do Aprendizado à Vivência, uma Questão de Educação. In: Encontro Nacional de Engenharia de Produção, 20, 2000, São Paulo. Anais. São Paulo: ENEGEP, 2000.
HOKERBERG, Y H. M. et al. O processo de construção de mapas de risco em um hospital. Revista Ciência e Saúde Coletiva. Rio de Janeiro. v.11, n. 2, 2006.
JUNIOR FRIAS, C. A. S. A saúde do trabalhador no Maranhäo: uma visäo atual e proposta de atuaçäo. 1999. Tese de Doutorado.
MAZUR, J. Resíduos sólidos da construção civil e a logística reversa no canteiro de obras vinculados à saúde e segurança do trabalhador. 2015.
MEHTA, P. K.; MONTEIRO, P. J.M. Concreto: estrutura, propriedades e materiais. Edição 1. São Paulo: Pini, 1994.
MELO JÚNIOR, A. S.; RODRIGUES, C. L. P. O risco de acidente de trabalho na indústria de panificação: o caso das máquinas de cilindro em massa. In: XXV Encontro Nacional de Engenharia de Produção, 2005, Porto Alegre: Anais do XXIX Encontro Nacional de Engenharia de Produção, 2005.
MOTERLE, N. (2014). A importância da segurança do trabalho na construção civil: Um estudo de caso em um canteiro de obra na cidade de pato branco – PR. Fonte: Repositório de Outras Coleções Abertas (ROCA). Disponível em: http://repositorio.roca.utfpr.edu.br/jspui/bitstream/1/5688/1/PB_CEEST_V_2014_27.pdf. Acesso em: 16 de out. 2022.
NEVILLE, A. M. Propriedades do concreto-5ª Edição. Bookman Editora, 2015.
NETO WALDHELM, N. O QUE É SEGURANÇA DO TRABALHO. 2019. Disponível em: https://segurancadotrabalhonwn.com/o-que-e-seguranca-do-trabalho/. Acesso em 08 de nov. 2022.
PENA, F. D. P.; SCORTEGAGNA, P. E.; UHDE, L. T. SEGURANÇA DO TRABALHO EM UMA AÇÃO EXTENSIONISTA NO MUNICÍPIO DE ITABAIANA (PB)–PROJETO RONDON–OPERAÇÃO PORTA DO SOL. Salão do Conhecimento, 2015.
PETRUCCI, E. G. R. Concreto de cimento Portland. 11 edição revisada. Rio de Janeiro: Editora Globo, 1987.
PINTO, A. P. Direito ambiental do trabalho. Revista CEJ. Brasília: Conselho de Justiça Federal/Centro de Estudos Jurídicos, 1997, n.3
RODRIGUES, R. C. Segurança do Trabalho na Construção Civil: estudo de caso sobre EPI’S e EPC’S em um canteiro de obras, em PALMAS, TO. 2016. 90 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Engenharia Civil) – Centro Universitário Luterano de Palmas, Palmas, 2016.
RODRIGUES, S. M. Estudo de um compósito de matriz cerâmica com carga de recicláveis para o uso na construção civi. 2012. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
SALIBA, T. M. Manual prático de higiene ocupacional e PPRA: avaliação e controle dos riscos ambientais. LTr Editora, 2021.
SANTI, A. M. M.; SEVÁ, Oswaldo Filho. Combustíveis e riscos ambientais na fabricação de cimento: casos na Região do Calcário ao Norte de Belo Horizonte e possíveis generalizações. II ENCONTRO NACIONAL DE PÓSGRADUAÇÃO E PESQUISA EM AMBIENTE E SOCIEDADE – ANPPAS. Campinas, 2004.
SANTOS, E.; VASCONCELOS, R. E. Sistema de gestão e controle de normas regulamentadoras que auxilia os profissionais de SESMT: 2019. 101 f. Trabalho de Conclusão de Curso Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas – Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Ponta Grossa, 2019.
SANTOS, W. E. Propriedades mecânicas de concretos produzidos com areia natural e areia artificial com uso de aditivo polifuncional. 2021.
SCHWAB, S.; STEFANO, S.R. Acidentes no trabalho e programas de prevenção nas indústrias de médio e grande porte. Revista Eletrônica Lato Sensu – UNICENTRO. ed. 6 Ano: 2008.
SENFF, L.; FOLGUERAS, M. V.; HOTZA, D. Hidratação do cimento CP V ARI-RS: Influência da água nas reações de hidratação. In: Congresso brasileiro de cerâmica. 2005.
THOMÉ, B. B. (2016). Segurança do trabalho na construção civil: Saiba mais sobre essa área! Fonte: Sienge Platform. Disponível em: https://www.sienge.com.br/blog/seguranca-do trabalho-na-construcaocivil/. Acesso em 10 de nov. 2022.
VECCHIONE, D. A. Avaliação da segurança do trabalho para canteiros de obra: Caso Fiocruz. 96 p. Dissertação (Mestrado), Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2008.
¹ Graduado em Engenharia Civil e Ambiental pela Universidade Vale do Rio Doce (2015). Pós-graduando em Segurança do Trabalho pelo Instituto Federal de Minas Gerais, campus Governador Valadares.
² Pós-graduada em Gestão de Pessoas pela PUC (2022). Pós-graduanda em Segurança do Trabalho pelo Instituto Federal de Minas Gerais, campus Governador Valadares.
³ Pós-graduada em Geotecnia pela Faculdade Verde. Professora no Instituto Federal de Minas Gerais, campus Governador Valadares.