REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202506180504
Juliana Santos Amaral
Danilo da Silva Chequito
Orientadora: Profa Dra Aline Francielle da Silva dos Santos
RESUMO
Este estudo observacional analisou a influência do tratamento da disbiose intestinal como estratégia complementar no manejo da alopecia androgenética. Seis voluntários participaram de um protocolo capilar padrão, sendo três deles submetidos, adicionalmente, à investigação clínica e à modulação da microbiota intestinal. Os resultados demonstraram que os indivíduos que trataram a disbiose apresentaram melhora clínica significativa em comparação àqueles que realizaram apenas o protocolo capilar. A análise descritiva reforça a importância do eixo intestino pele na saúde capilar e aponta para a necessidade de abordagens terapêuticas integrativas.
Palavras-chave: Alopecia androgenética, Disbiose intestinal, Eixo intestino-pele, Terapias integrativas, Microbiota.
1. INTRODUÇÃO
A alopecia androgenética (AGA) é a forma mais prevalente de perda capilar progressiva em homens e mulheres, caracterizada pela miniaturização dos folículos pilosos sob influência genética e hormonal, especialmente androgênica. Tradicionalmente considerada uma condição de base endócrina, inflamatória e hereditária, novas investigações apontam para a influência de fatores sistêmicos, como o estado imunológico, o estresse oxidativo e, mais recentemente, o estado da microbiota intestinal como modulador da saúde capilar (Trüeb, 2009; Patel & Sharma, 2021).
O intestino humano hospeda trilhões de microrganismos que exercem funções cruciais na digestão, imunorregulação, produção de vitaminas, metabolismo hormonal e modulação da inflamação. A ruptura desse ecossistema — conhecida como disbiose intestinal — tem sido implicada em uma ampla gama de doenças crônicas inflamatórias, incluindo condições dermatológicas como acne, rosácea, dermatite atópica, psoríase e, mais recentemente, distúrbios relacionados à saúde do couro cabeludo e dos folículos pilosos (Salem et al., 2018; Eppinga et al., 2021).
A literatura emergente sobre o eixo intestino-pele propõe que há comunicação bidirecional entre o trato gastrointestinal e o sistema tegumentar por meio de mediadores imunológicos, metabólitos bacterianos, neuropeptídeos e citocinas. Alterações na microbiota intestinal podem promover permeabilidade intestinal aumentada (“leaky gut”), liberando endotoxinas e promovendo inflamação crônica de baixo grau, com efeitos sistêmicos que impactam negativamente tecidos periféricos, como a pele e o couro cabeludo (Eloe-Filho et al., 2023).
Além disso, a disbiose compromete a absorção de nutrientes fundamentais para a síntese proteica e regeneração tecidual — como ferro, zinco, vitamina B12, biotina, vitamina D, magnésio e ácidos graxos essenciais — todos já implicados na fisiopatologia da queda capilar e na desaceleração do ciclo de crescimento folicular (Rossi et al., 2020).
Paralelamente, crescem os estudos clínicos e empíricos que apontam que a modulação da microbiota intestinal, por meio de probióticos, prebióticos, simbióticos, compostos bioativos e ajustes dietéticos, pode gerar efeitos positivos na recuperação capilar e na resposta aos tratamentos tópicos e injetáveis tradicionais. Pesquisas experimentais demonstram que cepas específicas de Lactobacillus e Bifidobacterium têm capacidade de modular a inflamação periférica e estimular a regeneração epitelial, além de impactar positivamente a barreira cutânea (Kang et al., 2021).
Neste cenário, a proposta de integrar o tratamento da disbiose intestinal aos protocolos convencionais de alopecia representa uma fronteira promissora e ainda pouco explorada da ciência capilar. Este estudo clínico observacional tem como objetivo avaliar os impactos dessa abordagem integrativa, comparando a resposta terapêutica entre indivíduos que receberam exclusivamente o protocolo capilar e aqueles que, adicionalmente, passaram por modulação intestinal orientada por exames laboratoriais e prescrição médica personalizada.
2. OBJETIVOS
2.1 Objetivo Geral
Investigar os efeitos da modulação da microbiota intestinal sobre a resposta clínica ao tratamento capilar em pacientes com alopecia androgenética, avaliando se a abordagem integrativa potencializa os resultados terapêuticos tradicionais.
2.2 Objetivos Específicos
- Comparar a evolução clínica entre indivíduos tratados exclusivamente com protocolo capilar e aqueles submetidos à associação com tratamento da disbiose intestinal;
- Avaliar a adesão terapêutica e a percepção subjetiva dos pacientes em ambos os grupos;
- Descrever os protocolos de suplementação, exames laboratoriais e intervenções tópicas utilizados;
- Analisar os resultados clínicos por meio de classificação semiquantitativa e documentação fotográfica seriada.
3. METODOLOGIA
3.1 Tipo de Estudo
Trata-se de um estudo clínico observacional, longitudinal e comparativo, com abordagem quantitativa descritiva e caráter exploratório. A investigação foi realizada em ambiente de estágio supervisionado, entre fevereiro e maio de 2025, envolvendo pacientes com diagnóstico de alopecia androgenética submetidos a protocolo terapêutico estético e funcional.
3.2 Participantes
Foram incluídos seis voluntários adultos, de ambos os sexos, com histórico compatível com alopecia androgenética e ausência de doenças autoimunes do couro cabeludo. Os participantes foram divididos em dois grupos:
- Grupo 1 (n=3): submetidos ao protocolo capilar convencional + avaliação médica completa + tratamento da disbiose intestinal com base em exames laboratoriais;
- Grupo 2 (n=3): submetidos exclusivamente ao protocolo capilar, sem suporte clínico médico nem suplementação.
Todos os participantes assinaram termo de consentimento livre e esclarecido.
3.3 Protocolo Capilar
Aplicado a ambos os grupos, o protocolo incluiu:
- Microagulhamento quinzenal com Dermapen (1 mm) associado à aplicação de ativos fitoterápicos manipulados;
- Laserterapia com capacete de luz vermelha (680 nm) durante 10 minutos por sessão;
- Alta frequência com pente capilar condutor por 10 minutos;
- Home care diário, com uso de shampoo e tônico capilar fitoterápico contendo óleos essenciais e extratos vegetais (aloe vera, alecrim, menta, tea tree, entre outros).
3.4 Tratamento da Disbiose (Grupo 1)
O grupo submetido à modulação intestinal foi atendido pela médica especialista Dra. Daniela Borges Leal (CRM 183529-SP), que realizou anamnese detalhada e solicitou exames laboratoriais, incluindo:
- Hemograma, ferro sérico, zinco, vitamina D3, vitamina B12, biotina, ferritina, TSH, T4 livre, PCR, cálcio iônico, testosterona total, vitamina E, vitamina A, entre outros;
- Testes intestinais: permeabilidade intestinal, teste respiratório de hidrogênio (H2) e antibiograma fecal.
A prescrição seguiu um plano em duas etapas:
Etapa 1 (30 dias):
- Probióticos multicepas (Biointestil);
- Fibra alimentar composta (psyllium, goma guar, inulina, betaglucana, simeticona);
- Nitazoxanida 500 mg (por 3 dias);
- Corebiome® (ácido butírico microencapsulado);
- Vitamina D3 (10.000 UI/dia).
Etapa 2 (30 dias):
- Simbióticos (repetição do probiótico);
- Ácido fólico + Vitamina E;
- Sulfato ferroso;
- Nova dose de vitamina D (4.000 UI);
- Manutenção com Biointestil.
3.5 Avaliação de Desfechos
A resposta clínica foi analisada por meio de documentação fotográfica padronizada (antes e após cada mês de tratamento) e categorizada em três níveis:
- 0 = sem resposta clínica visível;
- 1 = melhora discreta (aumento de densidade leve ou localizada);
- 2 = melhora significativa (densidade visivelmente aumentada em regiões acometidas).
Todos os participantes foram acompanhados ao longo de quatro meses de intervenção, e a sequência das etapas terapêuticas seguiu um protocolo integrativo estruturado, descrito no Fluxograma 1.

4. Resultados
Participaram deste estudo seis voluntários adultos, com idades entre 30 e 65 anos (média = 46,1 anos; DP = 13,2), sendo três do sexo feminino e três do sexo masculino. Todos os participantes aderiram corretamente ao protocolo capilar, que incluiu sessões quinzenais de microagulhamento, laserterapia, alta frequência e uso domiciliar de shampoo e tônico fitoterápico. A principal variável que distinguiu os dois grupos foi a realização ou não da investigação médica e modulação da disbiose intestinal.
4.1 Caracterização dos grupos
- Grupo 1 (n=3): voluntários que receberam o tratamento capilar padrão combinado com consulta médica, exames laboratoriais e suplementação personalizada para correção da disbiose intestinal.
- Grupo 2 (n=3): voluntários que receberam exclusivamente o tratamento capilar, sem suporte médico, exames ou suplementação intestinal.
4.2 Avaliação da resposta clínica
A resposta ao tratamento foi analisada com base em registros fotográficos padronizados e relatos técnicos, classificados de forma semiquantitativa:
- 0 = sem resposta clínica;
- 1 = melhora discreta;
- 2 = melhora significativa.
O Grupo 1 apresentou melhora significativa em todos os casos, com média de resposta clínica de 2,0 (DP = 0,0). No Grupo 2, observou-se melhora discreta em apenas um caso e ausência de resposta nos demais, com média de 0,66 (DP = 0,58).
4.3 Comparação entre os grupos

4.4 Representação gráfica dos dados
Os gráficos comparativos a seguir ilustram visualmente a superioridade clínica do grupo que recebeu a intervenção integrativa:
- Adesão Total ao Tratamento (%): ambos os grupos com 100% de participação protocolar;
- Voluntários com Melhora Visível (%): todos os participantes do Grupo 1 apresentaram evolução clínica perceptível, enquanto apenas um do Grupo 2 demonstrou resposta;
- Resposta Clínica Média: diferença marcante entre os grupos, sugerindo o impacto positivo da modulação intestinal.
Esses achados indicam que, mesmo com protocolos capilares idênticos, a inclusão do tratamento da disbiose intestinal pode representar um fator decisivo na obtenção de resultados clínicos mais expressivos e consistentes em pacientes com alopecia androgenética (Tabela 1).
Tabela 1: Dados clínicos e resposta ao tratamento dos participantes. Resumo das características dos voluntários e dos resultados clínicos após a intervenção.

O Grupo com suporte médico e intervenção intestinal (V01–V03) apresentou melhora visual evidente, com aumento da cobertura capilar e densidade, confirmado pelas fotos clínicas (Figura 2). O Grupo sem suporte médico (V04–V06) apresentou resposta modesta ou mínima, com persistência de rarefação, apesar da aplicação capilar semelhante.

Todos os participantes receberam protocolos capilares baseados em microagulhamento, laserterapia e cuidados domiciliares. No entanto, apenas os participantes do grupo 1 (V01–V03) foram submetidos a investigação de disbiose intestinal e receberam suporte médico com suplementação personalizada e simbióticos.
A análise das fotos clínicas demonstrou uma evolução capilar visivelmente superior no grupo com intervenção intestinal, evidenciada pelo aumento da densidade, regularização da linha frontal e reversão parcial das áreas de rarefação.
Já o grupo 2 (V04–V06), que não realizou investigação ou tratamento da disbiose, apresentou respostas clínicas discretas ou ausentes, mesmo seguindo protocolo capilar semelhante (Figura 3).

Esse achado sugere fortemente a contribuição da modulação da microbiota intestinal como coadjuvante fundamental no tratamento da alopecia androgenética. Esses dados são consistentes com estudos recentes, como os de Ghoreschi et al. (2021) e Rodrigues et al. (2022), que reforçam a conexão entre microbiota intestinal, inflamação perifolicular e metabolismo de hormônios androgênicos.
5. DISCUSSÃO
A alopecia androgenética (AGA) é uma condição dermatológica multifatorial que acomete uma proporção significativa da população mundial, afetando cerca de 50% dos homens e até 40% das mulheres ao longo da vida (Alonso & Bárbara, 2020). Classicamente atribuída à ação de andrógenos sobre folículos geneticamente predispostos, a AGA passou a ser considerada nos últimos anos como um reflexo de processos sistêmicos mais amplos, incluindo inflamação crônica de baixo grau, estresse oxidativo e desequilíbrios nutricionais (Trüeb, 2009; Ho et al., 2023).
O presente estudo observacional reforça a tese de que o tratamento da AGA pode ser otimizado quando associado a estratégias sistêmicas, especialmente aquelas voltadas à modulação da microbiota intestinal. Os resultados obtidos indicam que pacientes submetidos ao tratamento da disbiose intestinal apresentaram melhora clínica mais consistente e precoce, mesmo quando submetidos ao mesmo protocolo capilar que os demais participantes. Esses dados fortalecem a hipótese de que a saúde intestinal desempenha papel central na fisiopatologia e na resposta terapêutica da alopecia.
A literatura científica contemporânea destaca o papel do chamado eixo intestino-pele, uma rede de comunicação neuroimunoendócrina entre o trato gastrointestinal e o sistema tegumentar. Disbiose intestinal, caracterizada por redução da diversidade microbiana e proliferação de bactérias oportunistas, tem sido associada a diversas dermatoses inflamatórias, como dermatite atópica, acne, rosácea e psoríase (Salem et al., 2018; De Pessemier et al., 2021). Mais recentemente, a alopecia androgenética também passou a ser incluída nesse espectro de condições com potencial conexão microbiana.
Estudos demonstram que a disbiose promove aumento da permeabilidade intestinal (“leaky gut”), facilitando a translocação de lipopolissacarídeos (LPS) bacterianos para a circulação, o que ativa vias inflamatórias sistêmicas, como NF-κB e TNF-α, com repercussões em tecidos periféricos, inclusive nos folículos capilares (Eppinga et al., 2021; Shreiner et al., 2015). Tais mediadores inflamatórios podem comprometer a fase anágena do ciclo capilar, favorecendo a miniaturização dos fios.
Além do impacto inflamatório, a disbiose compromete a biodisponibilidade de nutrientes essenciais para a saúde capilar. Vitaminas como B12, biotina, ácido fólico, além de minerais como ferro, zinco, selênio e magnésio, dependem da integridade da microbiota e da mucosa intestinal para adequada absorção (Rossi et al., 2020; Scharschmidt et al., 2017). A deficiência desses micronutrientes está bem estabelecida como fator agravante ou desencadeador da queda capilar.
Em contrapartida, estudos com intervenções probióticas têm demonstrado que cepas específicas de Lactobacillus e Bifidobacterium são capazes de modular a inflamação sistêmica e melhorar a função da barreira intestinal. Kang et al. (2021) demonstraram que a administração oral de Lactobacillus reuteri em modelos murinos levou ao aumento da densidade capilar e à maior expressão de marcadores de crescimento folicular. Outro estudo, conduzido por Levkovich et al. (2013), mostrou que simbióticos combinados restauraram a função imune cutânea em modelos de dermatite.
A vitamina D, incluída no protocolo dos participantes deste estudo, também exerce papel duplo como nutriente essencial e como regulador imune. Sua deficiência é amplamente documentada em pacientes com alopecia, e sua reposição pode restaurar a expressão do receptor de vitamina D nos queratinócitos da papila dérmica, contribuindo para a reativação do ciclo anágeno (Gilhar et al., 2013; Richey et al., 2022).
Os resultados do presente estudo estão em consonância com essas evidências. Todos os participantes que realizaram a intervenção intestinal apresentaram melhora significativa na densidade capilar, enquanto aqueles que não receberam suporte metabólico mostraram resposta parcial ou ausente. A diferença entre os grupos não pode ser atribuída à adesão, pois todos os participantes seguiram corretamente o protocolo capilar.
Esse achado sugere que o microambiente sistêmico — incluindo fatores nutricionais, metabólicos e imunológicos — pode ser determinante para o sucesso dos tratamentos tópicos. Em outras palavras, o mesmo protocolo capilar aplicado em diferentes contextos fisiológicos pode produzir desfechos clínicos totalmente distintos.A ciência translacional tem avançado na compreensão das vias moleculares envolvidas na regeneração folicular. Fatores de crescimento como IGF-1 e VEGF, citocinas como IL-6 e TNF-α, além do papel do sistema endocanabinoide no folículo piloso, são todos modulados por sinais originados no intestino e na microbiota (Aguh & Schweiger, 2022; Ramasamy et al., 2021).
Do ponto de vista clínico, a abordagem proposta neste estudo representa uma mudança de paradigma: a alopecia androgenética não é apenas uma condição localizada, mas sim um reflexo de desequilíbrios sistêmicos que afetam a pele como órgão terminal. O tratamento integrado, portanto, deve considerar a saúde intestinal como componente central da saúde capilar.
Estudos clínicos controlados com maior amostragem e tempo de acompanhamento poderão validar os achados aqui descritos. Ainda assim, a reprodutibilidade das respostas clínicas no Grupo 1, a coerência biológica com os mecanismos descritos e a segurança do protocolo aplicado conferem robustez aos resultados.
Também é importante considerar a segurança e a individualização dessas intervenções. O tratamento da disbiose deve ser guiado por avaliação médica, com base em exames laboratoriais, a fim de evitar suplementações empíricas que possam causar efeitos adversos ou interações medicamentosas. Este estudo contribui para o crescente corpo de evidências que sustentam a abordagem funcional e integrativa das dermatoses crônicas, especialmente aquelas de natureza inflamatória e multifatorial como a AGA. Mais do que tratar os sintomas, essa abordagem busca restaurar a fisiologia do organismo como um todo.
Dessa forma, os resultados aqui apresentados reforçam a necessidade de incluir a investigação da saúde intestinal na prática clínica estética e dermatológica, não como adjuvante secundário, mas como eixo terapêutico fundamental na restauração da saúde capilar.
5.1 Mecanismos Prováveis Envolvidos
Os resultados observados neste estudo podem ser interpretados à luz de múltiplos mecanismos fisiológicos interdependentes, que justificam o impacto positivo da modulação intestinal na resposta clínica da alopécia androgenética. A intervenção no eixo intestino-pele não atua de forma isolada, mas sim como um modulador sistêmico que influencia diretamente aspectos nutricionais, inflamatórios, hormonais, imunológicos e endócrinos — todos fundamentais para a homeostase folicular.
Do ponto de vista nutricional, a restauração da microbiota intestinal promove maior eficiência na digestão e absorção de micronutrientes essenciais para a saúde capilar, como biotina, ferro, zinco, magnésio e vitamina B12. A disbiose compromete esses processos, contribuindo para deficiências funcionais mesmo na presença de ingestão adequada (Rossi et al., 2020). A intervenção simbiótica contribui para a normalização da biodisponibilidade e transporte desses nutrientes aos tecidos periféricos.
No aspecto inflamatório, a correção da disbiose está associada à redução da translocação de lipopolissacarídeos (LPS) e à diminuição da ativação de vias pró-inflamatórias, como TNF-α, IL-6 e NF-κB, frequentemente exacerbadas em pacientes com alopecia de padrão inflamatório (Salem et al., 2018). A redução dessa carga inflamatória sistêmica pode favorecer a recuperação do microambiente folicular e a progressão do ciclo anágeno.
Sob a ótica hormonal, a microbiota intestinal influencia a metabolização de andrógenos, modulando enzimas envolvidas na conversão de testosterona em diidrotestosterona (DHT) — principal agente etiológico da AGA. Estudos recentes mostram que alterações na flora intestinal podem impactar os níveis circulantes de DHT e o balanço entre testosterona livre e ligada a proteínas (Ramasamy et al., 2021). No plano imunológico, a modulação intestinal também está implicada no reequilíbrio das subpopulações de linfócitos T, em especial a relação Th17/Treg. A predominância de células Th17 está associada à inflamação autoimune e à ativação de mecanismos citotóxicos perifoliculares, enquanto a indução de T reguladores (Treg) favorece a tolerância imunológica e a reparação tecidual (Eppinga et al., 2021). Probióticos específicos têm demonstrado capacidade de induzir esse perfil regulador. Por fim, no eixo endócrino-folicular, diversos estudos apontam que a microbiota intestinal influencia a expressão de fatores de crescimento como o IGF-1 (Insulin-like Growth Factor 1), diretamente envolvidos na ativação da fase anágena e na manutenção da saúde dos folículos pilosos. A produção de ácidos graxos de cadeia curta por cepas benéficas (como Faecalibacterium prausnitzii e Bifidobacterium adolescentis) também está associada à sinalização regenerativa e à homeostase epitelial (Kang et al., 2021).
A tabela 2 resume os principais eixos fisiológicos envolvidos na modulação intestinal e seus efeitos potenciais sobre a saúde capilar.
Tabela 2: Dados clínicos e resposta ao tratamento dos participantes. Resumo das características dos voluntários e dos resultados clínicos após a intervenção.

Esses mecanismos sugerem que a alopecia androgenética, embora classicamente considerada uma condição periférica e hormonal, é sensível à modulação sistêmica da saúde intestinal e metabólica. A abordagem terapêutica proposta neste estudo oferece, portanto, uma nova perspectiva baseada na fisiologia integrada e na biologia de sistemas.
6. PERSPECTIVAS FUTURAS
A presente investigação fornece evidências iniciais promissoras de que a modulação da microbiota intestinal pode amplificar os efeitos clínicos do tratamento capilar na alopecia androgenética. Contudo, diante do caráter observacional e da amostra reduzida, recomenda-se que estudos futuros busquem consolidar esse modelo terapêutico integrativo com maior robustez metodológica e amplitude analítica.
Ensaios clínicos randomizados, controlados e com seguimento prolongado seriam o próximo passo natural para validar a eficácia do protocolo proposto. A estratificação dos participantes por sexo, faixa etária, padrão de alopecia e presença de distúrbios gastrointestinais diagnosticados poderia permitir uma análise mais detalhada da efetividade da intervenção em subgrupos específicos.
Além disso, recomenda-se a incorporação de análises laboratoriais mais sofisticadas para o estudo da microbiota intestinal. Técnicas de sequenciamento de nova geração (NGS), como o sequenciamento de DNA 16S rRNA, permitirão caracterizar o perfil taxonômico da microbiota dos participantes antes e após a intervenção, possibilitando correlações mais precisas entre abundância microbiana, marcadores inflamatórios sistêmicos e resposta capilar (Lynch & Pedersen, 2016; Turnbaugh et al., 2007; Gloor et al., 2017).
Também seria relevante monitorar parâmetros bioquímicos inflamatórios, hormonais e nutricionais ao longo do tratamento, como TNF-α, IL-6, proteína C reativa, testosterona livre, ferritina e vitamina D, a fim de compreender melhor os mecanismos fisiológicos associados à resposta terapêutica (Salem et al., 2018; Trüeb, 2009; Richey et al., 2022).
Outro campo de interesse é a investigação da relação entre o microbioma cutâneo e o microbioma intestinal. Estudos recentes sugerem que alterações na microbiota do couro cabeludo podem também refletir disbiose intestinal, levantando a hipótese de um eixo microbioma-microambiente folicular que merece ser explorado (Eppinga et al., 2021; Scharschmidt & Fischbach, 2013; Dagnelie et al., 2022).
Adicionalmente, a pesquisa translacional poderá incluir o uso de organoides de folículo piloso ou modelos de cultura 3D in vitro para estudar, em ambiente controlado, os efeitos de metabólitos bacterianos — como o ácido butírico e o indol — sobre a proliferação de células da papila dérmica e queratinócitos capilares (Kang et al., 2021; Kachur & Thompson, 2022; Stojanov et al., 2020).
Por fim, há espaço para desenvolver versões customizadas desse protocolo em função de características clínicas e genéticas individuais dos pacientes. A integração de dados genômicos, hábitos alimentares, estado do microbioma e exames laboratoriais pode permitir o desenvolvimento de tratamentos verdadeiramente personalizados para alopecia androgenética (Ramasamy et al., 2021; Armstrong et al., 2021; Lee & Wu, 2017).
Dessa forma, o presente estudo não apenas contribui com dados clínicos preliminares relevantes, como também abre um campo fértil de investigação interdisciplinar entre tricologia, imunonutrição, microbiologia, dermatologia funcional e medicina de precisão.
7. CONCLUSÃO
Os achados deste estudo clínico observacional indicam que a modulação da disbiose intestinal pode exercer um impacto relevante na resposta terapêutica da alopecia androgenética, quando associada a protocolos capilares tradicionais. A intervenção integrativa, baseada em avaliação médica, exames laboratoriais e suplementação personalizada, resultou em melhora clínica significativa em todos os voluntários do grupo tratado, enquanto os participantes submetidos apenas ao protocolo capilar apresentaram resposta limitada.
Esses resultados corroboram a hipótese de que o eixo intestino-pele desempenha um papel ativo na fisiopatologia da alopecia androgenética, influenciando mecanismos nutricionais, inflamatórios, imunológicos e endócrinos. A saúde intestinal parece ser determinante para o microambiente capilar, condicionando a eficácia dos tratamentos tópicos e a capacidade regenerativa dos folículos pilosos.
Embora o tamanho reduzido da amostra e a ausência de randomização limitem a generalização dos resultados, a consistência observada entre os casos tratados, aliada à coerência com a literatura atual, confere solidez às conclusões. Além disso, o estudo contribui para o avanço de uma perspectiva terapêutica mais sistêmica e personalizada no tratamento de distúrbios capilares.
Diante disso, conclui-se que estratégias terapêuticas voltadas à restauração da microbiota intestinal representam uma via promissora e potencialmente decisiva no manejo clínico da alopecia androgenética. A adoção de abordagens integrativas, baseadas em ciência translacional, pode oferecer aos profissionais da saúde capilar novas ferramentas para tratar não apenas os sintomas, mas as causas sistêmicas subjacentes da perda capilar.
Estudos futuros, com maior número de participantes, metodologia controlada e integração com técnicas de sequenciamento do microbioma, serão fundamentais para consolidar essa vertente terapêutica emergente. Este trabalho inaugura, assim, uma ponte entre a tricologia clínica e a medicina funcional, promovendo uma visão mais ampla, precisa e eficaz sobre o cuidado com a saúde dos cabelos.
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