REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202412051545
Gabrielly Menusi1
RESUMO
Introdução: A endometriose é uma doença ginecológica crônica e progressiva que afeta a fertilidade feminina, especialmente em mulheres em idade reprodutiva. Com uma prevalência de aproximadamente 10%, a condição é caracterizada pelo desenvolvimento anômalo de tecido endometrial fora do útero, afetando principalmente a pelve feminina. Além de causar dor, a doença está associada a complicações reprodutivas, como infertilidade, devido a aderências, lesões nos órgãos pélvicos e desequilíbrios hormonais. Objetivo: Analisar o impacto da endometriose na fertilidade feminina, revisar as opções terapêuticas existentes e destacar a necessidade de tratamentos que preservem a fertilidade das pacientes. Metodologia: Trata-se de uma revisão narrativa da literatura, conduzida por meio da estratégia PICO. A busca foi realizada em bases científicas como PubMed, LILACS e SciELO, selecionando artigos originais, estudos de coorte, ensaios clínicos randomizados e relatos de casos, publicados entre 2014 e 2024, que abordassem a relação entre endometriose e fertilidade. Resultados e Discussão: A endometriose compromete a fertilidade feminina ao causar alterações anatômicas e funcionais, como lesões, aderências, e inflamação crônica, que afetam a ovulação, o transporte dos óvulos e a implantação embrionária. Cirurgias repetidas, embora necessárias em casos avançados, podem diminuir a reserva ovariana, aumentando o risco de falência ovariana precoce. Além disso, intervenções como a criopreservação de óvulos e fertilização in vitro são alternativas importantes, mas com limitações. Conclusão: O desenvolvimento de novas terapias e abordagens, como a preservação de fertilidade, é fundamental para melhorar as perspectivas de gravidez para mulheres afetadas pela condição.
Palavras-chave: Endometriose; Fertilidade; Infertilidade Feminina.
ABSTRACT
Introduction: Endometriosis is a chronic and progressive gynecological condition that affects female fertility, especially in women of reproductive age. With a prevalence of approximately 10%, the condition is characterized by the abnormal development of endometrial tissue outside the uterus, primarily affecting the female pelvis. In addition to causing pain, the disease is associated with reproductive complications, such as infertility, due to adhesions, lesions on the pelvic organs, and hormonal imbalances. Objective: To analyze the impact of endometriosis on female fertility, review existing therapeutic options, and highlight the need for treatments that preserve patients’ fertility. Methodology: This is a narrative literature review, conducted through the PICO strategy. The search was carried out in scientific databases such as PubMed, LILACS, and SciELO, selecting original articles, cohort studies, randomized clinical trials, and case reports published between 2014 and 2024 that addressed the relationship between endometriosis and fertility. Results and Discussion: Endometriosis compromises female fertility by causing anatomical and functional changes, such as lesions, adhesions, and chronic inflammation, which affect ovulation, egg transport, and embryo implantation. Repeated surgeries, although necessary in advanced cases, can reduce ovarian reserve, increasing the risk of premature ovarian failure. Furthermore, interventions such as egg cryopreservation and in vitro fertilization are important alternatives but have limitations. Conclusion: The development of new therapies and approaches, such as fertility preservation, is essential to improve pregnancy prospects for women affected by the condition.
Keywords: Endometriosis; Fertility; Female Infertility.
INTRODUÇÃO
A endometriose é uma doença ginecológica crônica, não cancerosa e de caráter progressivo, que afeta milhares de mulheres no Brasil e em diversos países, especialmente aquelas em idade reprodutiva. A condição ocorre devido ao desenvolvimento anormal de glândulas e estroma, conhecidos como tecido endometrial, em regiões fora do útero e áreas próximas. Seus efeitos manifestam-se principalmente na pelve feminina (Cirino et al., 2023).
A endometriose atinge aproximadamente 10% das mulheres em idade reprodutiva e até metade das que apresentam dor pélvica crônica e infertilidade, podendo comprometer tanto a reserva de óvulos quanto a capacidade de conceber no futuro. A infertilidade associada à doença é explicada por diversos fatores, como aderências nos órgãos pélvicos, bloqueios nas trompas de Falópio, alterações hormonais, disfunção dos óvulos, modificações no endométrio e processos inflamatórios que dificultam a interação entre espermatozoide e óvulo. Além disso, há uma piora na qualidade dos embriões, uma menor taxa de implantação e redução da reserva ovariana (Carneiro et al., 2021).
O diagnóstico da endometriose frequentemente sofre atrasos, pois seus sintomas, como dor pélvica e/ou infertilidade, também são comuns a outras doenças. Embora técnicas de imagem possam acelerar a identificação de alguns tipos da condição, o desenvolvimento de um exame de sangue não invasivo e confiável ainda avança lentamente. Os tratamentos atuais envolvem a remoção cirúrgica das lesões e o uso de medicamentos que bloqueiam a produção de hormônios ovarianos. Contudo, mais da metade das mulheres submetidas à cirurgia precisa de um novo procedimento em até cinco anos, e muitos tratamentos medicamentosos apresentam efeitos colaterais indesejados. Pacientes ressaltam consistentemente a necessidade de terapias que aliviem os sintomas e preservem a fertilidade como uma prioridade nas pesquisas (Saunders; Horne, 2021).
Sendo assim, o estudo sobre o impacto da endometriose na fertilidade feminina é relevante devido à alta prevalência da doença entre mulheres em idade reprodutiva, muitas das quais enfrentam dificuldades para conceber. Com isso, o estudo tem por objetivo analisar como a condição afeta a capacidade reprodutiva, revisar as opções terapêuticas atuais e ressaltar a necessidade de tratamentos que preservem a fertilidade.
METODOLOGIA
O presente estudo consiste em uma revisão narrativa da literatura sobre o impacto da endometriose na fertilidade feminina. Para a formulação da questão central, foi aplicada a estratégia PICO. A pergunta principal do estudo foi: “Qual é a relação entre a endometriose e a fertilidade feminina?”
A utilização da estratégia PICO foi a seguinte:
- P (População/Problema): Mulheres em idade reprodutiva diagnosticadas com endometriose;
- I (Intervenção): Presença de endometriose;
- C (Comparação): Mulheres sem endometriose;
- O (Desfecho): Impacto na fertilidade feminina.
Para a coleta de dados, foi realizada uma busca bibliográfica em bases de dados científicas, incluindo PubMed, Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Scientific Electronic Library Online (SciELO). Foram utilizados Descritores em Ciências da Saúde/Medical Subject Headings (DeCS/MeSH), como “Endometriose”, “Fertilidade”, “Infertilidade Feminina”, intercalados pelo operador booleano “AND”.
Os critérios de inclusão foram estabelecidos como: artigos originais, estudos de coorte e transversais, ensaios clínicos randomizados e relatos de casos, publicados entre 2014 e 2024, nos idiomas português, espanhol ou inglês.
Foram excluídos artigos incompletos, publicações que não abordavam diretamente o objetivo do estudo, pesquisas fora do período determinado e aqueles com amostras que envolviam mulheres com outras comorbidades que poderiam interferir na análise dos resultados, como doenças autoimunes graves.
A revisão narrativa realizada não requer submissão ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), uma vez que este tipo de estudo não envolve a coleta de dados primários ou a realização de experimentos com seres humanos, mas sim a análise e síntese de informações previamente publicadas na literatura científica. Por tratar-se de uma pesquisa baseada em fontes secundárias publicamente acessíveis, não há riscos éticos diretos aos participantes, isentando, assim, a necessidade de aprovação ética formal pelo CEP.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A endometriose compromete a fertilidade feminina devido a alterações tanto anatômicas quanto funcionais que dificultam a concepção. As lesões fora do local habitual, as aderências e os cistos ovarianos podem prejudicar a captura e o transporte dos óvulos, além de interferir na implantação do embrião. A inflamação crônica causada pela doença também afeta a função ovariana e o ambiente uterino. Os desequilíbrios hormonais e imunológicos associados à endometriose prejudicam a ovulação e o desenvolvimento folicular. Além disso, intervenções cirúrgicas frequentes podem reduzir a reserva ovariana e aumentar o risco de infertilidade (Saunders; Horne, 2021).
Somado a isso, a condição pode comprometer a fertilidade feminina ao reduzir a reserva ovariana, afetando indicadores como o hormônio antimulleriano (AMH). A presença de endometriomas nos ovários prejudica a vascularização e, frequentemente, exige intervenções cirúrgicas, que podem remover tecido saudável e diminuir a quantidade de oócitos disponíveis. Cirurgias repetidas elevam o risco de falência ovariana precoce. Técnicas como a criopreservação de oócitos e de tecido ovariano são estratégias importantes para preservar a fertilidade, especialmente antes de procedimentos cirúrgicos. Dessa forma, é fundamental orientar as pacientes sobre os riscos, alternativas terapêuticas e suas perspectivas reprodutivas futuras (Carneiro et al., 2021).
A inflamação crônica associada à endometriose pode comprometer a fertilidade de diferentes maneiras, como o aumento de citocinas no ambiente ovariano, o que prejudica a resposta ovariana. O aumento de IL-6 no fluido peritoneal pode interferir na motilidade dos espermatozoides e causar danos ao seu DNA. Além disso, mediadores inflamatórios afetam as interações entre oócito e espermatozoide, dificultando o desenvolvimento embrionário e a implantação. O estresse oxidativo e as prostaglandinas também contribuem negativamente para esses processos. A alteração no eixo hipotálamo-hipófise-ovariano, com mudanças hormonais, pode impactar a qualidade do oócito e a receptividade do endométrio, embora os achados sobre esse efeito ainda sejam inconclusivos (Tanbo; Fedorcsak, 2017).
A relação entre endometriose e infertilidade feminina apresenta desafios devido à falta de consenso em evidências e diretrizes. O tratamento deve ser personalizado, levando em conta fatores como idade, reserva ovariana e o grau da doença. Em estágios iniciais (I e II), a laparoscopia pode ajudar a aumentar as chances de gestação, mas nos estágios mais avançados (III e IV), os resultados cirúrgicos são mais difíceis de prever. A fertilização in vitro (FIV) é uma alternativa frequentemente usada, embora sua eficácia possa ser limitada pela diminuição da reserva ovariana e alterações na receptividade endometrial. O uso de medicamentos, como os agonistas de GnRH, continua sendo um tópico de debate. Estudos sobre novos biomarcadores e tratamentos estão em andamento, visando aprimorar o diagnóstico e as opções terapêuticas (Bonavina; Taylor, 2022).
Portanto, a endometriose pode afetar a fertilidade de várias formas, como pela inflamação crônica no ambiente peritoneal, que resulta em aderências e danos ao transporte de gametas, além de prejudicar a implantação de embriões. A endometriose peritoneal pode criar um ambiente hostil devido à presença de fatores pró-inflamatórios no fluido peritoneal, impactando a função das trompas de Falópio. Já os endometriomas ovarianos causam danos diretos aos ovários por estresse oxidativo, prejudicando a qualidade dos óvulos e a função ovariana. Além disso, o desequilíbrio hormonal e alterações na receptividade endometrial também dificultam a implantação do embrião. A endometriose profunda está associada a dor intensa, que pode reduzir a frequência de relações sexuais e contribuir para a infertilidade (Coccia; Nardone; Rizzello, 2022).
CONCLUSÃO
A endometriose é uma doença que afeta a fertilidade feminina ao causar alterações tanto estruturais quanto funcionais no sistema reprodutor. As lesões endometriais e as aderências geradas por essa condição podem interferir diretamente no processo de ovulação, transporte dos óvulos e implantação do embrião.
Diante dessa complexidade, o manejo da infertilidade relacionada à endometriose exige uma abordagem personalizada que considere o grau da doença, a idade da paciente e suas condições reprodutivas. Embora as intervenções cirúrgicas possam ser necessárias em estágios mais avançados, elas podem diminuir a reserva ovariana, o que aumenta o risco de falência ovariana. Estratégias como a preservação de óvulos ou tecido ovariano e o uso de técnicas de fertilização assistida são alternativas importantes para garantir as chances de gravidez. Além disso, são necessários novos tratamentos e pesquisas para aprimorar as opções terapêuticas para mulheres afetadas por essa condição.
REFERÊNCIAS
BONAVINA, Giulia; TAYLOR, Hugh S. Endometriosis-associated infertility: From pathophysiology to tailored treatment. Frontiers in endocrinology, v. 13, p. 1020827, 2022.
CARNEIRO, Márcia Mendonça et al. Preservação de fertilidade em mulheres com endometriose. Femina, p. 615-621, 2021.
CIRINO, Geovana Aparecida dos Reis et al. endometriose e saúde sexual feminina–Desafios, tratamento, perfil epidemiológico e impactos biopsicossociais: Uma revisão integrativa. Revista Ciência Plural, v. 9, n. 3, p. 1-19, 2023.
COCCIA, Maria Elisabetta; NARDONE, Luca; RIZZELLO, Francesca. Endometriosis and infertility: a long-life approach to preserve reproductive integrity. International journal of environmental research and public health, v. 19, n. 10, p. 6162, 2022.
SAUNDERS, Philippa TK; HORNE, Andrew W. Endometriosis: Etiology, pathobiology, and therapeutic prospects. Cell, v. 184, n. 11, p. 2807-2824, 2021.
TANBO, Tom; FEDORCSAK, Peter. Endometriosis‐associated infertility: aspects of pathophysiological mechanisms and treatment options. Acta obstetricia et gynecologica Scandinavica, v. 96, n. 6, p. 659-667, 2017.
1Graduada em Medicina pela Universidade de Cuiabá – UNIC, Cuiabá, Mato Grosso. E-mail: gabriellymenusi@gmail.com