IDENTIFICAÇÃO DE AUTORIA DE CRIME POR MEIO DE CONFRONTO COM IMPRESSÃO PALMAR TRANSFERIDA EM SANGUE SOBRE UMA PAREDE: RELATO DE CASO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10067694


Régis De Moraes Félix
Daniel Veríssimo Teles De Faria²
Flávia Teixeira Vieira Artur³
João Victor Silva Nogueira³
Ludmilla Carolina Pereira³


1. INTRODUÇÃO

De acordo com o princípio da transferência de Locard, todo contato deixa uma marca1. Esse princípio, básico da Criminalística, é a essência da análise de locais de crime pelos Peritos Criminais, sendo aplicável a todo vestígio, inclusive o de natureza papiloscópica.

A presença de sangue, ou outro contaminante, sobre as cristas dérmicas facilita a verificação de impressões papilares transferidas para a superfície periciada. Além disso, esse tipo de impressão provê uma importante e indissociável ligação entre o criminoso e o local onde o crime ocorreu2.

Nesse sentido, os fragmentos de impressões papilares produzidos em substância hematoide têm alto valor probante, podendo ser levantados por meio de registros fotográficos e confrontados com os padrões do suspeito, a fim de inseri-lo na cena do crime3.

Palavras-chave: Perícia Criminal; Papiloscopia Forense; Fragmento Palmar em Sangue; Parede; Confronto Positivo.

2. OBJETIVOS

Verificar a viabilidade técnica de fragmentos de impressão papilar transferidos em sangue para a realização de Exame de Perícia Criminal de Confronto de Impressões Papilares.

3. ESTUDO DE CASO

Durante Perícia em um apartamento, local de crime contra a vida, o Perito Criminal de Local D.V.T.F., coautor do presente artigo, notou a existência de fragmentos de impressão papilar transferidos em substância hematoide sobre a superfície de uma parede e da estrutura metálica inferior de uma janela, próximo ao local de repouso do cadáver (Figura 1).

No local, fora feita, previamente, a vistoria dos acessos tanto ao condomínio em que se situava o apartamento supracitado quanto do próprio apartamento. Não havia sinais de arrombamento e, conforme informações coletadas com a equipe de segurança, nenhuma movimentação estranha fora notada.

Sendo assim, três hipóteses iniciais foram aventadas, quais sejam: I) O autor seria conhecido da vítima e adentrara por determinação dela própria; II) O autor seria alguém com acesso ao condomínio e que, fortuitamente, encontrara a porta do apartamento aberta ou, pelo menos, destrancada; III) O autor seria o companheiro da vítima – mas ele mesmo teria contatado a polícia no momento em que voltara de uma viagem, alegando tê-la encontrado morta e não ter tocado qualquer superfície ensanguentada.

Nesse sentido, fez-se necessário, inicialmente, realizar os Exames de Perícia Criminal de Análise de Impressões Papilares e de Confronto entre tais fragmentos e os padrões papiloscópicos acessíveis do companheiro da vítima.

Figura 1. Fragmentos de impressão papilar transferidos em substância hematoide sobre a superfície de uma parede e da estrutura metálica inferior de uma janela. Fonte: os autores.

4. DISCUSSÃO

Por meio de Requisição de Perícia, foram encaminhadas, pelo referido Perito Criminal de Local, ao Laboratório de Papiloscopia Forense (LAPAP), do Instituto de Criminalística Leonardo Rodrigues (ICLR), da Superintendência de Polícia Técnico-Científica de Goiás, fotografias digitais dos fragmentos de impressão papilar verificados no local de crime contra a vida, ocorrido no município de Goiânia-GO, figurando como vítima S.S.R., para a realização de Exame de Perícia Criminal de Pesquisa de Impressões Papilares.

Foi igualmente solicitada, pela Delegacia Estadual de Investigações de Homicídios de Goiás, a realização de Exame de Perícia Criminal de Confronto de Exclusão entre tais fragmentos de impressão papilar (material questionado) e os padrões papiloscópicos do suspeito P.F.A.S. (material padrão), coletados no LAPAP.

É indispensável, para a realização do exame de confronto papiloscópico, haver qualidade técnica do material questionado e do padrão, pois o resultado está fundamentado na configuração do desenho (formato e direção das linhas), na legibilidade, na nitidez e na quantidade de minúcias das impressões papilares analisadas3.

Respeitados esses critérios e adotado o método ACE-V (Analysis, Comparison, Evaluation and Verification)4 é possível obter informações suficientes que permitam a individualização (confronto positivo) de fragmentos de impressões papilares questionados.

Com base no método mencionado, os Peritos Criminais do LAPAP realizaram a análise do material questionado, constatando 01 (um) fragmento de impressão palmar que apresentava condições técnicas para a utilização em exame comparativo.

Após confrontá-lo com o material padrão, fora verificado um número superior a 12 (doze) pontos papilares característicos coincidentes quanto à forma, localização, direção e sentido, quando comparado à impressão palmar direita do companheiro da vítima; número este suficiente para se determinar confronto positivo, ilustrado por meio do assinalamento de 14 (quatorze) pontos papilares característicos coincidentes (Figura 2).

Figura 2. Confronto positivo entre o fragmento de impressão palmar transferido em sangue encontrado no local e a palmar direita do companheiro da vítima. Fonte: os autores.

5. CONCLUSÕES

O confronto positivo entre o fragmento de impressão palmar transferido em sangue encontrado no local e a palmar direita do companheiro da vítima subsidiou informações importantes ao caso, confirmando a hipótese III aventada, desmantelando a tentativa de forjamento de um álibi pelo autor, levando-o à confissão e fechando, com êxito, o caso.

A verificação de fragmentos de impressão papilar de um indivíduo, frequentador contumaz de determinado local, não possui relevância para relacioná-lo ao fato criminoso. No entanto, se estes fragmentos forem produzidos em sangue, há fortes indícios da presença desta pessoa no momento da realização do crime ou imediatamente após, direcionando as investigações criminais à identificação de autoria e contribuindo decisivamente com a persecução penal.

No mais, o resultado alcançado permitiu comprovar a viabilidade técnica de impressões papilares transferidas em sangue em locais de crime, permitindo a realização de exames comparativos e a determinação de confronto positivo, podendo igualmente, em outras circunstâncias contribuir decisivamente com a persecução penal.

AGRADECIMENTOS

Os autores do presente relato gostariam de homenagear e agradecer as Peritas Criminais Andréa Brandão Martins França Montanini e Nilza Lylian Belo Castilho que abrilhantaram o LAPAP/ICLR, dedicando as suas carreiras à disseminação e ao aprimoramento de técnicas de revelação de impressões papilares em superfícies relacionadas a locais de crime, provando que a Papiloscopia Forense e a Perícia Oficial de Natureza Criminal são indissociáveis.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. J.A., VELHO; K.A., COSTA; C.T.M. DAMASCENO. Locais de Crime. Campinas: Millennium Editora, 2013.

2. W.J., BODZIAK, W. J. Footwear impression evidence.detection, recovery, and examination. 2. ed. [S.l.]: CRC Press, 2000.

3. A.R.L., FIGINI et al. A identificação humana através das impressões digitais e o confronto papiloscópico. In: TOCCHETTO, Domingos (org.). Datiloscopia e revelação de impressões digitais. Campinas: Millennium Editora, 2012. cap. 5. p. 67-97.

4. A.R.L., FIGINI; J.R., LEITÃO E SILVA; A.K., SOARES. Exames Periciais de Revelação de Impressões Papilares. Recomendações técnicas para a padronização de procedimentos e metodologias. In ESPINDULA, Alberi; TOCCHETTO, Domingos (Coord.) Criminalística: procedimentos e metodologias. 2 ed. Porto Alegre: [s.n.], 2009.


¹ Instituto de Criminalística – GECRIM, Superintendência da Polícia Técnico Científica, Goiânia (GO), Brasil
*Apresentador (regismf@policiacientifica.go.gov.br)

² Instituto de Criminalística – HOMICÍDIOS, Superintendência da Polícia Técnico Científica, Goiânia (GO), Brasil

³ Instituto de Criminalística – LAPAP, Superintendência da Polícia Técnico Científica, Goiânia (GO), Brasil