HOSPITALIZAÇÕES POR TIREOTOXICOSE NO NORDESTE NA ÚLTIMA DÉCADA: UMA ANÁLISE EPIDEMIOLÓGICA DE 2013 A 2022

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10075369


James Guerra de Oliveira Neto1
Mateus Franco Veloso1
André Gonçalves da Silva2


RESUMO

A tireotoxicose é caracterizada por níveis elevados de hormônios tireoidianos circulantes, podendo levar o paciente à necessidade de cuidados hospitalares. Desse modo, objetivou-se construir uma pesquisa ecológica em bases de dados pública acerca de sua morbimortalidade no Nordeste do Brasil entre 2013 e 2022. Houve 1.020 internações, com 19 óbitos (1,86%). No sexo masculino houve 220 internações e 5 óbitos (2,27%); no sexo feminino 800 pacientes foram hospitalizadas, ocorrerendo 14 óbitos (1,75%). Quanto à cor/raça, a amarela apresentou a maior taxa de mortalidade (5,26%). Por outro lado, a cor/raça parda, que teve o maior número de internações (558), apresentou a menor taxa de mortalidade, 0,72%. A faixa etária de 30 a 39 anos teve o maior número de internações, 238 no total, porém uma mortalidade relativamente baixa (0,84%); nos anos seguinte, houve redução da mortalidade chegando a 0,0% entre 60 a 79 anos. As faixas etárias mais jovens, de menos de 1 ano até 19 anos, também não registraram nenhum óbito, apesar das internações. A maioria das internações ocorreu em urgência e a taxa de mortalidade foi maior nesses casos. Isso sugere a necessidade de intervenções preventivas e diagnósticos precoces para evitar complicações graves. Ao longo dos anos, houve algumas flutuações na taxa de mortalidade, no entanto, o ano de 2020, no qual ocorreu a pandemia de Covid-19, se destacou pelo menor número de internações em todo o período, sendo seguido por aumento nos anos finais.

ABSTRACT

Thyrotoxicosis is characterized by elevated levels of circulating thyroid hormones, which can lead to the patient’s need for hospital care. Thus, the aim was to construct an ecological research on public databases about its morbidity and mortality in Northeast Brazil between 2013 and 2022. There were 1,020 hospitalizations, with 19 deaths (1.86%). In males, there were 220 hospitalizations and 5 deaths (2.27%); in females, 800 patients were hospitalized, with 14 deaths occurring (1.75%). As for color/race, yellow had the highest mortality rate (5.26%). On the other hand, the brown color/race, which had the highest number of hospitalizations (558), had the lowest mortality rate, 0.72%. The age group of 30 to 39 years had the highest number of hospitalizations, 238 in total, but a relatively low mortality (0.84%); in the following years, there was a reduction in mortality reaching 0.0% between 60 to 79 years. The youngest age groups, from less than 1 year to 19 years, also did not register any deaths, despite hospitalizations. Most hospitalizations occurred in emergency and the mortality rate was higher in these cases. This suggests the need for preventive interventions and early diagnoses to avoid serious complications. Over the years, there have been some fluctuations in the mortality rate, however, the year 2020, in which the Covid-19 pandemic occurred, stood out for the lowest number of hospitalizations in the entire period, followed by an increase in the final years.

INTRODUÇÃO

A tireotoxicose é uma condição médica caracterizada por níveis elevados de hormônios tireoidianos circulantes, podendo levar o paciente à necessidade de cuidados hospitalares.

Essa condição pode ser causada por uma variedade de fatores, incluindo Doença de Graves, uma doença autoimune que ocorre quando o sistema imunológico do corpo ataca a tireoide, Bócio multinodular tóxico: uma condição em que a tireoide aumenta de tamanho e produz níveis excessivos de hormônios tireoidianos, Adenomas tireoidianos: tumores benignos da tireoide que podem produzir níveis excessivos de hormônios tireoidianos, Exposição à radiação: a exposição a radiação pode danificar a tireoide e causar tireotoxicose (Guyton; Hall, 2011).

Os sintomas da tireotoxicose podem incluir aumento da frequência cardíaca, perda de peso, ansiedade, tremores, suor excessivo, insônia, dificuldade de concentração, palpitações, fraqueza muscular, diarreia, menstruação irregular, queda de cabelo, infertilidade. O seu diagnóstico é feito com base nos sintomas do paciente e em exames laboratoriais. Os exames laboratoriais que podem ser usados incluem dosagem sérica de T3 livre, T4 livre e TSH. O tratamento da tireotoxicose geralmente envolve o uso de medicamentos antitireoidianos. Esses medicamentos reduzem a produção de hormônios tireoidianos. Em alguns casos, pode ser necessário o tratamento cirúrgico para ressecção parcial ou total da glândula (Tortora; Grabowski, 2002).

Nesse contexto, surge a dúvida de como tem sido o comportamento epidemiológico da Tireotoxicose, direcionada à região Nordeste do Brasil, a fim de compreender quais fatores de risco influciam no aumento das internações e no incremento do risco de morbidade dos pacientes hospitalizados devido à crise tireotóxica, na busca por gerar observações que melhor direcionem condutas e o planejamento de saúde pública na região.

METODOLOGIA

A configuração metodológica desta pesquisa adere ao modelo de estudo ecológico, com enfoque transversal e documental. As informações foram obtidas através da plataforma DATASUS, que disponibiliza dados epidemiológicos sobre pacientes hospitalizados e falecimentos em várias regiões do Brasil no item de Sistema de informações Hospitalares.

A amostragem consistiu em pacientes internados devido à tireotoxicose atendidos em instituições de saúde públicas e privadas do estado do Nordeste entre janeiro de 2013 e dezembro de 2022. As autorizações para internação hospitalar foram categorizadas por local de internação. As variáveis empregadas foram idade, gênero e etnia. Para a coleta dos dados, as variáveis mencionadas foram correlacionadas com as seguintes: internações, mortes, taxa percentual de mortalidade por internação, duração média da estadia hospitalar, macrorregião de saúde e natureza do atendimento.

Foi utilizada estatística descritiva simples para analisar os dados, por meio da descrição de frequências em números absolutos e relativos, permitindo a visualização de tendências e padrões no comportamento do número de internações e mortes de acordo com as variáveis. Os dados foram organizados e apresentados em gráficos para facilitar a sua interpretação.

Do ponto de vista ético, a execução deste estudo seguiu a resolução nº 510, de 7 de abril de 2016, do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que determina que pesquisas que utilizem informações de domínio público não precisam ser registradas nem avaliadas pelo sistema de Comitê de Ética em Pesquisa (CEP)/Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), conforme a Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011 (Brasil, 2016).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com base nos dados fornecidos, as hospitalizações devido à tireotoxicose no Nordeste tiveram um registro total de 1.020 internações, com uma média de permanência de 9 dias. Infelizmente, houve 19 óbitos, resultando em uma taxa de mortalidade de 1,86%. Ao analisar os dados por sexo, observamos que o número de internações para o sexo masculino foi de 220, com uma média de permanência de 8,9 dias e 5 óbitos, resultando em uma taxa de mortalidade de 2,27%. Por outro lado, o número de internações para o sexo feminino foi significativamente maior, com 800. A média de permanência foi similar à dos homens, com 9 dias. No entanto, ocorreram 14 óbitos entre as mulheres, resultando em uma taxa de mortalidade um pouco menor, de 1,75%.

Quanto à cor/raça, a amarela, apesar de ter um número relativamente baixo de internações (38), apresentou a maior taxa de mortalidade entre as categorias, com 5,26%. Por outro lado, a cor/raça parda, que teve o maior número de internações (558), apresentou a menor taxa de mortalidade, 0,72%, o que é um dado positivo. A cor/raça indígena teve apenas uma internação registrada, com uma permanência de 13 dias, a mais longa entre as categorias, e não houve óbitos. Por fim, os casos sem informação de cor/raça tiveram uma média de permanência um pouco maior (10,1 dias) e uma taxa de mortalidade preocupante de 3,54%.

A faixa etária de 30 a 39 anos teve o maior número de internações, 238 no total, mas curiosamente, teve uma taxa de mortalidade relativamente baixa de 0,84%. Por outro lado, a faixa etária de 40 a 49 anos teve quase o mesmo número de internações que a faixa etária de 30 a 39 anos, mas com uma taxa de mortalidade mais alta (2,55%). Isso pode sugerir um aumento na gravidade da tireotoxicose com a idade, porém nos anos seguintes houve redução da mortalidade chegando a 0,0% entre 60 a 79 anos. As faixas etárias mais jovens, de menos de 1 ano até 19 anos, também não registraram nenhum óbito, apesar das internações.

Quadro 1 – Distribuição total de número de internações, média de permanência, óbitos e taxa de mortalidade por internação devido a tireotoxicose por sexo, cor/raça e faixa etária. Nordeste, 2013 a 2022.

SexoInternaçõesMédia permanênciaÓbitosTaxa mortalidade %
Total1.0209191,86
Masculino2208,952,27
Feminino8009141,75
Cor/raçaInternaçõesMédia permanênciaÓbitosTaxa mortalidade %
Branca635,911,59
Preta496,612,04
Parda558940,72
Amarela388,925,26
Indígena113
Sem informação31110,1113,54
Faixa EtáriaInternaçõesMédia permanênciaÓbitosTaxa mortalidade %
Menor 1 ano410
1 a 4 anos43,3
5 a 9 anos76,6
10 a 14 anos2011,4
15 a 19 anos448,8
20 a 29 anos1648,874,27
30 a 39 anos2389,920,84
40 a 49 anos2358,562,55
50 a 59 anos1749,421,15
60 a 69 anos817,6
70 a 79 anos398,9
80 anos e mais109,2220

Fonte: TabNet Win32 3.0: Morbidade Hospitalar do SUS – por local de internação – Nordeste (datasus.gov.br).

Para o atendimento eletivo, houve 347 internações com uma média de permanência de 6,8 dias e nenhum óbito registrado. Por outro lado, para o atendimento de urgência, houve um número significativamente maior de internações, 673 no total, com uma média de permanência maior de 10,2 dias. Infelizmente, ocorreram 19 óbitos nesse grupo, resultando em uma taxa de mortalidade de 2,82%. A proporção entre atendimentos de urgência em relação aos eletivos foi de 1,94:1.

Gráfico 1 – Distribuição em pizza das internações por tireotoxicose conforme caráter de atendimento. Nordeste, 2013 a 2022.

Fonte: TabNet Win32 3.0: Morbidade Hospitalar do SUS – por local de internação – Nordeste (datasus.gov.br).

Em relação ao anos de atendimento, em 2018, apesar de uma média de permanência hospitalar semelhante à do ano anterior, a taxa de mortalidade foi a mais alta entre os anos analisados, com 2,8%. Em 2020, apesar de uma diminuição no número de internações e uma média de permanência menor, a taxa de mortalidade foi mais alta, com 2,67%, porém houve somente dois óbitos, e foi o ano com a menor quantidade de internações em todo o período. Em 2021, houve um aumento no número de internações, mas curiosamente, a taxa de mortalidade foi a menor entre os anos analisados, com apenas 0,91%. Por fim, em 2022, o número de internações aumentou novamente, para 122, com uma média de permanência ligeiramente maior (8,9 dias), ocorreram 1 óbito a mais, aumentando a taxa de mortalidade para 1,64%.

Gráfico 2 – Distribuição em linha das internações por tireotoxicose aos longo dos anos de atendimento. Nordeste, 2013 a 2022.

Fonte: TabNet Win32 3.0: Morbidade Hospitalar do SUS – por local de internação – Nordeste (datasus.gov.br).

Gráfico 3 – Distribuição em colunas da taxa de mortalidade por tireotoxicose aos longo dos anos de atendimento. Nordeste, 2013 a 2022.

Fonte: TabNet Win32 3.0: Morbidade Hospitalar do SUS – por local de internação – Nordeste (datasus.gov.br).

CONCLUSÃO

Com base nos dados analisados, é possível concluir que a tireotoxicose é uma condição que requer atenção no Nordeste, dada a quantidade significativa de internações e a taxa de mortalidade observada. A condição afeta mais as mulheres do que os homens, embora a taxa de mortalidade seja ligeiramente maior nos homens.

Quando analisamos os dados por cor/raça, é notável que a taxa de mortalidade é maior na cor/raça amarela, apesar do baixo número de internações. Por outro lado, a cor/raça parda, que teve o maior número de internações, porém apresentou a menor taxa de mortalidade.

A tireotoxicose leva a internaçoes com o avanço da idade, principalmente em adultos jovens, a partir dos 20 anos, com pico na trigésima e quarta década de vida, embora ocorra uma redução da mortalidade e internações a partir da sexta década. As faixas etárias mais jovens não registraram nenhum óbito, apesar terem apresentado internações.

Quanto ao caráter do atendimento, é preocupante que a maioria das internações ocorra em situações de urgência e que a taxa de mortalidade seja maior nesses casos, chegando a uma proporção de 1,92:1 em relação aos eletivos quanto a hospitalizações. Isso sugere a necessidade de intervenções preventivas e diagnósticos precoces para evitar complicações graves.

Por fim, ao longo dos anos, observamos algumas flutuações na taxa de mortalidade. Embora tenha havido anos com taxas de mortalidade mais altas, o ano de 2020, no qual ocorreu a pandemia de Covid-19, se destacou pelo menor número de internações em todo o período, sendo seguido por aumento nos anos finais.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Banco de dados do Sistema Único de Saúde – DATASUS. Ministério da Saúde. Disponível em:<http://www.datasus.gov.br>. Acesso em: 25 de set, 2023.

BRASIL; MINISTÉRIO DA SAÚDE; CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE. Resolução nº 510, de 7 de abril de 2016. Diário Oficial da União, n. 98, p. 44-46, 2016.

GUYTON, Arthur C; HALL, John E. Guyton e Hall: Tratado De Fisiologia Médica. 11a ed. Rio de Janeiro: Elsevier Brasil, 2011.

TORTORA, Gerald J.; GRABOWSKI, Sandra Reynolds. Princípios de Anatomia e Fisiologia. 9ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002.


1. Graduandos de Medicina do Centro Universitário UNINOVAFAPI, Teresina-PI;

2. Médico Endocrinologista pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP); Docente do Curso de Gradução em Medicina pelo Centro Universitário UNINOVAFAPI, Teresina-PI;