REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7337754
Larissa Pereira Tomás Arcanjo¹
Blenda Lanessa Marques Coelho¹
Lízia Maria Andrade Melo de Aguiar¹
Lucas Pinheiro de Menezes Barreto¹
Lucas Felipe de Oliveira¹
Maria Rilda Loiola de Vasconcelos¹
Natália Fontenelel Rocha¹
Yanka Linhares Prado Carneiro¹
Luana Dàvila Rodrigues Carneiro²
Bruna Linhares Prado3
RESUMO
Objetivo: Relatar um raro caso clínico de paciente portadora de hipertireoidismo que evoluiu com hepatite aguda tóxica após uso de metimazol.
Métodos: As informações foram obtidas por meio de revisão de prontuário, entrevista com a paciente e revisão da literatura.
Discussão: Considerações finais: o caso relatado descreve o raro acontecimento de uma hepatite tóxica pelo uso de metimazol, ao mesmo tempo que levanta a discussão sobre qual o mecanismo que levou a ocorrência da situação e mostra o sucesso do tratamento com a retirada do medicamento.
DESCRITORES: hepatite, tóxica, metimazol, hipertireoidismo, tratamento
INTRODUÇÃO
O hipertireoidismo é uma condição clínica resultante da produção excessiva dos hormônios tireoidianos, que pode levar a sérias complicações para o organismo. A forma mais comum de tratamento é o uso de fármacos antitireoidianos, como propiltiuracil (PTU) e metimazol. Tais fármacos inibem a síntese de tiroxina (T4) e tri-iodotironina (T3) dentro das células foliculares.
O metimazol consiste em um fármaco que apresenta meia-vida e duração longas, o que permite que seja utilizado em dose única diária, facilitando a adesão do paciente ao tratamento. Além disso, tal fármaco apresenta maior perfil de segurança, visto que possui menor toxicidade. Dentre os efeitos adversos mais comuns, podem surgir exantema, prurido, artralgias, parestesias, cefaléia e náuseas. Reações adversas mais graves são raras e incluem agranulocitose, anemia aplásica, vasculites, nefrites e hepatotoxicidade, sendo esta última mais frequente mediante uso de elevadas doses de PTU, o qual pode causar necrose hepática fulminante, potencialmente fatal.
Dessa forma, a hepatite causada pelo uso de metimazol é bastante rara, sendo mais comum e grave aquela decorrente da administração de PTU, o qual apresenta maior efeito hepatotóxico. Segundo a análise do banco de dados do Sistema de Relatórios de Eventos Adversos dos EUA, foram identificados 34 casos de lesões hepáticas graves ou fatais induzidas por PTU, superando em aproximadamente sete vezes aquelas resultantes do uso de metimazol.
A hepatotoxicidade causada por fármacos pode ser de dois tipos: dose dependente ou idiossincrática. Nesta última, determinantes do indivíduo, como predisposição genética, parecem ser fundamentais para a lesão hepática. Além disso, um de seus mecanismos, a idiossincrasia metabólica, pressupõe que fármacos seguros em doses convencionais possam gerar lesão hepática em raras pessoas que apresentam suscetibilidade decorrente de alterações genéticas ou adquiridas.
Apresentamos o caso clínico de uma paciente com hipertireoidismo que desenvolveu quadro de hepatite aguda tóxica decorrente do uso de metimazol. A relação causal entre o metimazol e a hepatite foi estabelecida no decorrer da evolução clínica da paciente, a partir da análise de seu quadro clínico e dos resultados dos exames complementares realizados.
OBJETIVO
Relatar um raro caso clínico de paciente portadora de hipertireoidismo que evoluiu com hepatite aguda tóxica após uso de metimazol durante dois anos, mostrando sua melhora clínica com a suspensão do medicamento.
MÉTODO
As informações foram obtidas por meio da realização de anamnese, exame físico, exames complementares, revisão do prontuário e revisão literária. É válido lembrar que para a reunião dos dados pessoais, a paciente assinou um termo de consentimento, a partir do qual autorizou o compartilhamento das informações sobre seu caso clínico. Em tal documento, está esplanada a concessão voluntária, o padrão sigiloso de sua identidade e a disposição à paciente do relato de caso quando finalizado.
RELATO DO CASO
Anamnese
Paciente E.S.L, 31 anos, sexo feminino, casada, natural de Sobral, admitida na emergência dia 06/02/2017, relata que há 15 dias iniciou um quadro de dor em hipocôndrio direito, de intensidade moderada, sem irradiações e fator de melhora ou piora., associada a icterícia, acolia fecal, colúria e plenitude gástrica. Nega fatores desencadeantes. Refere piora da dor há 04 dias. Portadora de hipertireoidismo, e em uso de metimazol há 2 anos. Sedentária, nega tabagismo e etilismo. Nega outras comorbidades.
Exame Físico
Ao exame físico: apresenta-se em BEG, orientada no tempo e no espaço, eutrófica, hidratada, afebril, acianótica, ictérica 3+/4+, sem edema. Sinais Vitais: PA de 130/90 mmHg, FC de 88bpm, FR de 18irpm. Aparelho Cardiovascular: ritmo cardíaco regular, em dois tempos, bulhas normofonéticas e sem sopro. Aparelho respiratório: MVU, sem ruídos adventícios. Aparelho digestivo: abdome plano e simétrico, flácido, ruídos hidroaéreos presentes, sem visceromegalias e sinais de irritação peritoneal. Referiu dor à palpação profunda em hipocôndrio direito.
Hipótese Diagnóstica
Diante do quadro apresentado, foi pensado com principal hipótese diagnóstica: Hepatite aguda tóxica pelo uso de metimazol.
Conduta
Foi indicado como plano terapêutico a interrupção do uso do metimazol para observação de uma possível melhora posteriormente, já que causas virais e autoimunes tinham sido descartadas através dos exames complementares. Como houve a melhora esperada, a paciente deveria utilizar outro plano terapêutico para o tratamento do hipertireoidismo, sendo planejado o método de radioiodo.
Exames Complementares
Foi solicitado um USG abdominal, que mostrou hepatomegalia, leve edema periportal e espessamento parietal difuso vesicular, ajudando na elucidação do diagnóstico de hepatite. Além disso, foram solicitados: hemograma completo, fosfatase alcalina, TGO, TGP, GGT, sumário de urina, TAP, potássio sérico, sódio sérico, bilirrubina total e frações, albumina sérica, creatinina, uréia, ceruloplasmina, FAN, anti-músculo liso e anti-mitocôndrias.
Figura 1
DISCUSSÃO
Devido à raridade dos casos de hepatotoxicidade decorrente do uso de metimazol, este caso clínico mostrou-se importante. O metimazol, assim como as demais drogas antitireoidianas, apresenta metabolismo essencialmente hepático, sendo 80% excretado pelos rins. Dessa forma, tal fármaco pode causar, embora menos frequentemente, lesões hepáticas mediante aumento do estresse oxidativo e consequente dano ao hepatócito.
É importante salientar que o próprio hipertireoidismo pode alterar provas de função hepática com elevação moderada das transaminases, da fosfatase alcalina e da bilirrubina, que tendem a normalizar após o início do tratamento. Tais alterações, se forem leves, não contraindicam o uso de antitireoidianos. Nos casos em que pacientes com níveis de transaminases duas a três vezes acima do limite superior da normalidade, a medicação deverá ser interrompida.
De acordo com o quadro clínico e o resultado dos exames complementares, o diagnóstico de hepatite medicamentosa só foi possível ser realizado após exclusão das principais causas de hepatite, que são: virais, autoimunes e metabólicas.
As hepatites virais foram excluídas a partir dos seguintes resultados sorológicos obtidos durante a internação hospitalar: Anti-HBS, HBSAg, Anti – HBC Total, Anti – HCV negativos, HAV IgM não reagente, HAV IgG reagente, demonstrando que a paciente é imune à hepatite A. As hepatites autoimunes foram descartadas após a negativação dos testes: Anti- Músculo Liso, M2 – anticorpos, FAN, e apresentando ceruloplasmina com valor dentro da normalidade.
Dessa forma, o diagnóstico de hepatite medicamentosa foi realizado com base na exclusão das hipóteses acima investigadas, na qual foi observada uma melhora significativa no quadro após a suspensão do metimazol por dois meses. Os novos exames solicitados obtiveram como resultado a tabela abaixo:
Tabela 1
Hemoglobina | 12,6 |
Leucócitos | 5790 |
Plaquetas | 316 mil |
TGO | 46,4 |
TGP | 27,7 |
Fosfatase Alcalina | 173,7 |
Gama GT | 85,1 |
Bilirrubina Total | 0,97 |
Bilirrubina Direta | 0,31 |
Bilirrubina Indireta | 0,66 |
Anti – HBs | Reagente |
HBsAg | Não reagente |
Anti – HCV | Não reagente |
T3 total | 4,24 |
T4 livre | 4,43 |
TSH | 0,01 |
FAN | Não reagente |
Anti – Músculo Liso | Não reagente |
Anti – Mitocôndrias | Não reagente |
Ceruloplasmina | 34 NL |
CONCLUSÃO
Diante do que foi pautado em todo os tópicos anteriores, fica enfatizado a importância do relato de caso caracterizado por hepatite tóxica por metimazol, visto ser uma comorbidade pouco documentada. Dessa forma, fica recomendado uma atenção maior a estudos e trabalhos futuros que a incluam, para que possa ser reconhecida antecipadamente e entendida por uma gama superior de profissionais.
Ademais, torna-se pertinente o registro dos casos de hepatotoxicidade por metimazol com o intuito de torná-la uma hipótese diagnóstica a ser considerada diante de situacões envolvendo hepatite aguda em portadores de Doenca de Graves, contribuindo, dessa forma, para reducão de sub diagnósticos, apesar da conhecida seguranca e eficácia do medicamento exposto durante esse estudo. E, para que também ocorra uma noção da verdadeira incidência.
REFERÊNCIAS
BLANCO, S. C.; VALERO, M.A.; SÁNCHEZ, F.M. et al. Hepatitis aguda tóxica por metimazol y propiltiouracilo. Gastroenterol Hepatol. 2007;30(5):268-70.
BRUNTON, L. L. et al. Manual de farmacologia e terapêutica de Goodman & Gilman. 2 ed. Porto Alegre: AMGH, 2015.
FELDMAN, M; FRIEDMAN, L. S.; BRANDT, L. J. Sleisenger & Fordtran. Tratado Gastrointestinal e Doenças do Fígado. 2v. 9 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.
M-T. Wang et al. Antithyroid drug-related hepatotoxicity in hyperthyroidism patients: a population-based cohort study. Br J Clin Pharmacol, 78:3, 619–629.
VILAR, L. Endocrinologia Clínica. 5 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.
¹Discente do Curso de Medicina UNINTA
²Discente do Curso de Medicina UNIFOR
³Docente do Curso de Farmácia UNINTA