GESTAÇÕES NÃO PLANEJADAS E DIFICULDADES NO USO E ACESSO A MÉTODOS CONTRACEPTIVOS: ANÁLISE DE UM SERVIÇO PÚBLICO DE SAÚDE. 

UNPLANNED PREGNANCIES AND DIFFICULTIES IN USING AND ACCESSING CONTRACEPTIVE METHODS: ANALYSIS OF A PUBLIC HEALTH SERVICE.

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10408383


Ingrid Albuquerque Egito1
Letícia Queiroz Limeira2
Lara Marques Galhardo2
Debora Paulo Santos3


RESUMO: A gravidez não planejada configura um sério e prevalente problema de  saúde pública. As dificuldades no uso e acesso aos métodos contraceptivos tem  importância central ao se analisar a gênese das gestações não planejadas. Nesse sentido,  este estudo pretende elencar os obstáculos ao uso e acesso aos métodos contraceptivos  enfrentados pelas gestantes que vivenciaram uma gestação não planejada em um serviço  público de saúde. Foram analisados os prontuários eletrônicos e entrevistadas por meio  de questionário online 178 gestantes, acompanhadas no Ambulatório de Pré-Natal de  Alto Risco de um hospital público do Distrito Federal. 81.5% da amostra relataram ter  vivenciado ao menos uma gestação não planejada. 46.7% delas tinham renda média  mensal de até um salário-mínimo e a 50.6% tinham pelo menos uma fonte de renda na  família. Quanto à paridade, 73.6% experimentaram ao menos duas gestações. As  gestantes que utilizaram camisinha masculina como contraceptivo, que consideraram  não ter recebido informações suficientes sobre os métodos contraceptivos, que não  tinham sido consultadas por um ginecologista antes de engravidar, que não participaram  de atividade de planejamento familiar, que já pensam em prevenir uma próxima  gestação e desejam fazê-lo por meio de laqueadura tubária foram as que apresentaram  maior probabilidade de terem experimentado uma gravidez não planejada; a partir  desses fatores de risco, foi elaborado um Escore de Risco para Gestação Não Planejada  a fim de reconhecer as mulheres vulneráveis ao fenômeno. Em conclusão, observou-se  que a baixa adoção de métodos contraceptivos e sua descontinuidade devido a fatores  dependentes da usuária impactam diretamente na ocorrência de gestações não  planejadas. Assim, reforça-se a necessidade de melhoria das ações de planejamento  familiar com medidas a serem realizadas já no pré-natal, pois esse muitas vezes é o  primeiro contato com o ginecologista da usuária. 

PALAVRAS-CHAVE: Métodos contraceptivos – Gravidez não planejada – Planejamento familiar – Saúde Pública.

ABSTRACT: Unplanned pregnancy is a serious and prevalent public health problem.  Difficulties in the use and access to contraceptive methods are of central importance  analyzing the genesis of unplanned pregnancies. That way, this study intends to list the  obstacles to the use and access to contraceptive methods faced by pregnant women who  experienced an unplanned pregnancy in a public health service. Electronic medical  records were analyzed and 178 pregnant women were interviewed using an online  questionnaire, followed at the High-Risk Pre-Natal Outpatient Clinic of a public  hospital in the Federal District. 81.5% of the sample reported having experienced at  least one unintended pregnancy. 46.7% of them had an average monthly income of up  to one minimum wage and 50.6% had at least one source of income in the family.  Regarding parity, 73.6% had at least two pregnancies. Pregnant women who used  condoms as contraceptive, who felt they had not received sufficient information about  contraceptive methods, who had not been consulted by a gynecologist before becoming  pregnant, who didn’t participate in family planning activities, who are already thinking  about preventing a future pregnancy and wish to do so through surgical sterilization were those most likely to have experienced an unplanned pregnancy. Based on these  risk factors, a Risk Score for Unplanned Pregnancy was created to recognize women  vulnerable to the event. In conclusion, it was observed that the low compliance of  contraceptive methods and their discontinuation due to user-dependent factors directly  impact the occurrence of unplanned pregnancies. Thus, the need to improve family  planning actions is reinforced with measures to be carried out during prenatal care, as  this is often the first contact with the user’s gynecologist. 

KEYWORDS: Contraceptive methods – Unplanned pregnancy – Family planning – Public Health.

1. INTRODUÇÃO 

A gravidez indesejada configura um sério e prevalente problema de saúde  pública. Apesar de atividades preventivas e educativas para os diversos segmentos da  população serem previstas em nossa legislação, mais de 55% das brasileiras que tiveram  filhos não haviam planejado a gestação, de acordo com pesquisa da Escola Nacional de  Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz realizada entre 2011 e 2012. Essa taxa é  superior à média mundial de 48% de gestações não planejadas entre 2015 e 2019, como  detalhado em um artigo de 2020 na Lancet Global Health. Sabe-se que as dificuldades  no uso e acesso aos métodos contraceptivos são determinantes para esse cenário em  particular na rede pública de saúde (VIEIRA, 2016; PASSARINO e FRANCO, 2018). 

O acesso à informação e aos métodos contraceptivos deve ser garantido pelo  Estado e pelo sistema de saúde para promover o exercício responsável e igualitário dos  direitos sexuais e reprodutivos pelas mulheres. Essa concepção foi estabelecida  internacionalmente pelo Plano de Ação da Conferência Internacional sobre População e  Desenvolvimento em 1994 e nacionalmente pelo Programa de Assistência Integral à  Saúde da Mulher (PAISM) em 1983. Apesar desses esforços, a implementação integral  desses direitos encontra inúmeros obstáculos e persistem desigualdades sociais no  acesso e uso de contraceptivos modernos, permanecendo o Sistema Único de Saúde na  contramão da tendência global de diminuição de necessidades insatisfeitas de  planejamento familiar (GONÇALVES, et al, 2019).  

Entres as barreiras enfrentadas na rede pública, pode-se destacar a oferta restrita  e irregularidade na provisão de métodos contraceptivos reversíveis, baixa oferta de  métodos contraceptivos de longa duração, burocratização no acesso a exames e  consultas de acompanhamento, dificuldades de organização de referências efetivas para  esterilização cirúrgica voluntária, falta de realização de atividades educativas  específicas para planejamento reprodutivo, pouca articulação da assistência ao  planejamento reprodutivo com outras ações e programas de saúde e necessidade de  capacitação de profissionais. Somados a isso, há fatores relativos ao uso pela usuária:  uso inconsistente com redução de eficácia do método, falta de motivação para uso,  efeitos adversos às vezes inerentes ao método, questões religiosas, desinformação/mitos  sobre a eficácia e funcionamento do método além da influência/dependência do parceiro  para utilização (BONAN, et al, 2010).

Tal situação repercute negativamente nos indicadores de saúde e  socioeconômicos e está associada ao aumento das taxas de aborto ilegal: mais de 500  mil abortos clandestinos são realizados todos os anos no Brasil, como resultado de  gestações indesejadas, conforme a Pesquisa Nacional do Aborto, dos professores  Débora Diniz (Universidade de Brasília), Marcelo Medeiros (UnB) e Alberto Madeiro  (Universidade Estadual do Piauí). Em adição, eleva o risco de morbimortalidade  materna, neonatal e infantil e impacta negativamente nos cuidados de pré-natal e no  aleitamento materno. Também reduz as oportunidades educacionais e de carreira para as  mães e pode contribuir para a privação socioeconômica e aumentar as disparidades de  renda (PASSARINO e FRANCO, 2018; PRIETSCH, et al, 2011).  

O custo total atribuído à gravidez não planejada no Brasil é estimado em R$ 4,1  bilhões (aproximadamente US$ 1,85 bilhão) anualmente. Estima-se que, a cada ano, 6  milhões de gestações não planejadas, 2,1 milhões de partos não planejados, 3,2 milhões  de abortos e 5.600 mortes maternas seriam evitados se a população feminina  inadequadamente assistida em relação ao planejamento reprodutivo tivesse acesso a  métodos contraceptivos eficazes (VIEIRA, 2016; BONATTI, et al, 2018).  

Diante disso, este estudo se propõe a elencar as dificuldades no uso e/ou acesso  aos métodos contraceptivos pelas gestantes que vivenciaram uma gestação não  planejada e que são usuárias de um Hospital Público do Distrito Federal.  Secundariamente, busca-se traçar o perfil socioeconômico e a paridade das participantes  e verificar se elas receberam educação em contracepção e planejamento familiar. A  partir daí, esperamos ser possível sugerir estratégias de promoção de informação sobre a  temática e elaborar medidas que facilitem o acesso aos métodos contraceptivos em um  serviço público de saúde.

2. OBJETIVOS 

2.1 Objetivo Geral  

– Analisar as dificuldades no uso e acesso aos métodos contraceptivos de gestantes que  vivenciaram uma gestação não planejada e que são usuárias do Sistema Único de Saúde. 

2.2 Objetivos Específicos 

– Identificar o perfil socioeconômico das gestantes que vivenciaram uma gestação não  planejada e que são usuárias do Sistema Único de Saúde. 

– Identificar a paridade das gestantes que vivenciaram uma gestação não planejada e que  são usuárias do Sistema Único de Saúde. 

– Verificar como e se as gestantes que vivenciaram uma gestação não planejada e que  são usuárias do Sistema Único de Saúde receberam informações sobre contracepção e  planejamento familiar. 

– Propor estratégias de promoção de informação sobre contracepção e planejamento  familiar em um serviço público de saúde. 

– Sugerir estratégias que facilitem o acesso aos métodos contraceptivos em um serviço  público de saúde.

3. METODOLOGIA  

O estudo proposto tem caráter observacional e transversal. Foram consideradas  elegíveis para a pesquisa 200 gestantes atendidas no Ambulatório de Pré-Natal do  Hospital Regional de Taguatinga no período de janeiro de 2023 a julho de 2023. Após  refinamento da amostra conforme critérios de inclusão e exclusão abaixo discriminados,  obteve-se uma amostra final de 145 participantes. 

Na pesquisa, foram incluídas as pacientes que preencheram os seguintes critérios  clínicos/administrativos: gestantes usuárias do serviço de Pré-Natal do Hospital  Regional de Taguatinga. Em seguida, foram excluídas as participantes menores de 18  anos desacompanhadas de responsável legal, as que necessitam de atendimento  imediato devido à urgência médica e as que negaram ter vivenciado alguma gestação não  planejada. Os dados coletados de forma incompleta sejam eles oriundos dos  questionários ou dos prontuários eletrônicos também foram descartados.  

A coleta de dados foi realizada em duas etapas. Em um primeiro momento,  houve a aplicação de um questionário online (Anexo I) às participantes da pesquisa, o qual foi elaborado pelas autoras. Em um segundo momento, a pesquisa se debruçou sobre a revisão retrospectiva dos prontuários eletrônicos das participantes a fim de  identificar comorbidades e verificar registros sobre aconselhamento em planejamento  familiar com o objetivo de elaborar estratégias que facilitem o acesso aos métodos  contraceptivos no serviço público de saúde. 

As informações coletadas foram incluídas em tabelas e/ou gráficos para análise estatística das variáveis envolvidas, permitindo uniformização, racionalização e melhor visualização do fenômeno. Observou-se ainda valores de  tendência central e de variabilidade bem como instrumentos de medidas. O valor de  associação entre as variáveis foi obtido por meio de testes que se fizeram pertinentes. 

Cabe ressaltar que essa pesquisa atende a Resolução 466 de 12/12/2022 e a  coleta de dados só teve início após aprovação pelo CEP sob CAAE nº  64765922.9.0000.5553 com comprovante de envio sob o nº 123738/2022.  

3.1 Benefícios 

Em conformidade com o disposto na Resolução CNS/MS 466/2012 – pesquisa  com seres humanos, os benefícios envolvem a análise de as dificuldades no uso e acesso  aos métodos contraceptivos de gestantes que vivenciaram uma gestação não planejada e que são usuárias do Sistema Único de Saúde e elaboração de estratégias para solucionar  esse problema. A longo prazo, isso impacta na redução das taxas de gestações não  planejadas, abortamentos, melhora nos indicadores de morbimortalidade materna,  neonatal, infantil e na assistência pré-natal, diminuindo os custos e aumentando a  qualidade de atendimento a essas usuárias do SUS. 

Além do benefício social, há a contribuição científica desta pesquisa já que ele  serviu como base para a publicação desse artigo científico. 

3.2 Riscos 

Os riscos incluem a possibilidade de quebra de sigilo e confidencialidade dos  dados, e foram minimizados por meio do uso de computador pessoal, acesso através de  senha pessoal, acesso aos prontuários apenas pela equipe de pesquisa, não  armazenamento dos dados em nuvem e descarte das informações após a finalização de  pesquisa, não identificação das participantes por número de prontuário ou iniciais de  nome e sim por uma codificação adequada. Além disso, há o risco relacionado ao  constrangimento ao responder o questionário e possibilidade de sofrimento por reviver  questões relacionadas a aborto, às influências familiares e etc. Essas situações serão  manejadas com a aplicação de questionário online disponível em qualquer horário e  local com garantia de privacidade, tempo máximo de mandado de aplicação do  questionário de cinco minutos, podendo ser interrompido e retomado a qualquer  momento e oferta de escuta ativa e humanizada assim como acolhimento psicológico  caso a paciente deseje. 

4. RESULTADOS 

Os resultados foram tabulados em três partes. Na primeira parte, caracterizou-se  a amostra conforme as seguintes variáveis: idade, escolaridade, paridade, média da  renda mensal familiar, quantidade de pessoas com fonte de renda no domicílio da  participante, vivência ou não de alguma gestação não planejada e comorbidades que  justificaram o acompanhamento da gestação atual em serviço especializado. Na segunda  parte, identificou-se o perfil de escolha das participantes em relação aos métodos  contraceptivos. Na terceira parte, houve a comparação entre as participantes que já  vivenciaram gestação não planejada e as que nunca vivenciaram, a fim de traçar  possíveis fatores de risco estatisticamente significativos para o evento. 

4.1 Perfil das participantes 

4.1.1 Faixa etária materna 

A idade materna no momento de preenchimento do questionário variou de 16  anos a 45 anos, com média 31.9 (±6.2 anos), mediana de 32.0 anos (1º Quartil =28 anos  e 3º Quartil = 36 anos). A faixa etária mais frequente foi de 30 a 39 anos (59.6%).  

Tabela 1: Idade materna no momento de preenchimento do questionário.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*teste de Qui-quadrado de independência. 

4.1.2 Escolaridade materna 

Quanto à escolaridade, observou-se que 76.4% das participantes possuíam  escolaridade igual ou superior a ensino médio completo.

Tabela 2: Escolaridade das participantes.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*teste de Qui-quadrado de independência. 

4.1.3 Paridade das participantes 

Quanto à paridade, a maioria das gestantes experimentaram ao menos duas  gestações (73.6%). 

Tabela 3: Paridade das participantes.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*teste de Qui-quadrado de independência.

4.1.4 Perfil econômico 

Em termos econômicos, 46.7% das gestantes tinham renda média mensal de até um  salário-mínimo e a maioria tinha pelo menos uma fonte de renda na família (50.6%).

Tabela 4: Perfil socioeconômico das participantes.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*teste de Qui-quadrado de independência. 

4.1.5 Vivência de gestação não planejada 

De uma amostra n=178, 145 participantes, representando 81.5% do total,  relataram ter vivenciado ao menos uma gestação não planejada. 

Tabela 5: Vivência ou não de uma gestação não planejada.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*teste de Qui-quadrado de independência.

4.1.6 Comorbidades que justificaram o acompanhamento da gestação atual em Serviço  de Pré-Natal de Alto Risco 

A partir da revisão de prontuário, pôde-se conhecer as principais indicações de  acompanhamento dessas gestantes no Ambulatório de Pré-Natal de Alto Risco. Desse  modo, as participantes foram estratificadas em grupos de acordo com a principal  condição motivadora de seguimento ambulatorial especializado: doença obstétrica na  gestação atual, história obstétrica anterior e intercorrências clínicas. 

Notou-se que as três principais condições de acompanhamento foram diabetes,  síndromes hipertensivas e transtornos hematológicos que responderam por 22.4%,  12.9% e 14% dos casos, respectivamente. 

Tabela 6: Principal motivo de acompanhamento no Serviço de Pré-Natal de Alto Risco.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*teste de Qui-quadrado de independência. 

4.2 Influência do perfil do uso dos métodos contraceptivos nas gestações não planejadas 

As participantes foram questionadas sobre o motivo ao qual atribuíam a gestação  não planejada. Parcela importante (46.6%) indicaram que não estavam usando qualquer  método contraceptivo. Dentro do grupo que responderam o campo “Outros”, destaca-se  que 6 relataram ter contraindicação ao uso de métodos contraceptivos, 6 apontaram a  troca de pílulas anticoncepcionais e 2 indicaram que não foram bem orientadas no  serviço público sobre os métodos naturais para prevenção de gravidez. 

Quanto ao perfil de uso de métodos contraceptivos, 35.4% apontaram a pílula  anticoncepcional e apenas 17.8% reportaram uso de métodos de longa duração. Outro  aspecto importante foi o fato de o serviço público de saúde ter sido o responsável pela  indicação em 31.5% dos casos, enquanto 68.5% informaram que sua obtenção tenha  sido na “farmácia”. As principais dificuldades quanto ao uso dos MAC foram efeitos  colaterais e esquecimento, que representaram 41.6% e 19.1%. Essas últimas proporções  podem ser ainda maiores já que 22 participantes que assinaram a opção “Outros”  informaram descontinuidade de medicação devido ganho de peso, sangramento irregular  e esquecimento frequente. 

Tabela 7: Fatores relacionados ao uso de métodos contraceptivos que podem interferir em gestações não  planejadas.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*teste de Qui-quadrado de independência. 

O conhecimento, a percepção e a participação em atividades de planejamento  familiar também foram investigados nas perguntas de 12 a 20, sendo possível notar que  a maioria considera que tem informação suficiente sobre contracepção, já participou de  algum programa de planejamento familiar e já havia se consultado com ginecologista.  Ainda assim, 59% concordam que expandir o conhecimento a respeito das opções de  métodos contraceptivos poderia evitar uma gravidez não planejada. 

Evidenciou-se que 91% não desejam uma futura gestação nos próximos dois  anos e que 80.3% já pensam em como preveni-la. 50.6% desejam contracepção  definitiva, fenômeno corroborado pelas sugestões expressivas numericamente de  diminuição de burocracia para laqueadura e realização do procedimento ou da inserção  do DIU no momento do parto ou após o puerpério. 

Tabela 8: Conhecimento e percepção das participantes a respeito do planejamento reprodutivo.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*teste de Qui-quadrado de independência.

Tabela 9: Sugestões das participantes.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*teste de Qui-quadrado de independência. 

4.3 Fatores de risco para gestações não planejadas 

A amostra n=178 participantes foi dividida em dois grupos: GP (Gestação  Planejada) com n=33 e GNP (Gestação Não Planejada) com n=145. Analisados os  dados, obteve-se discrepância entre os grupos nas respostas das perguntas 7, 12, 14, 15,  19 e 20 do questionário. Seguem abaixo os resultados obtidos. 

Comparando os grupos, a resposta “Camisinha masculina (preservativo)” da  pergunta 7 resultou em p-valor = 0.0478* (estatisticamente significantes), portanto,  houve real diferença na resposta entre GP (8.2%) e grupo GNP (91.8%). 

Tabela 10: características de n=178 pacientes analisados e classificados nos grupos GP (Gravidez  Planejada) e GNP (Gravidez Não Planejada) de acordo com as variáveis do Hospital Regional de  Taguatinga, Brasília, Brasil, 18 de novembro de 2023. 

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*teste de Qui-Quadrado de Aderência.  

O mesmo ocorreu nas perguntas 12, 14 e 15. Em P12, que investiga se a gestante  acha que recebeu informação suficiente sobre os métodos contraceptivos, a comparação  GP X GNP obteve p-valor = 0.0174* (estatisticamente significante), portanto, houve  real diferença entre os grupos na resposta “Não” no grupo GP com 7.3% e no grupo  GNP 92.7%. Em P14, que averigua se a participante teve consulta prévia com um  ginecologista antes de engravidar, houve p-valor = 0.0076* (estatisticamente  significante), portanto, houve real diferença entre os grupos na resposta “Não” no grupo  GP com 5.7% e no grupo GNP 94.3%. Finalmente em P15, que se indaga se a mulher já  participou de alguma atividade de planejamento familiar, a comparação resultou em p valor = 0.0094* (estatisticamente significante), portanto, houve real diferença entre os  grupos na resposta “Não” no grupo GP com 14.0% e no grupo GNP 86.0%. 

Tabela 11: características de n=178 pacientes analisados e classificados nos grupos GP (Gravidez  Planejada) e GNP (Gravidez Não Planejada) de acordo com as variáveis do Hospital Regional de  Taguatinga, Brasília, Brasil, 18 de novembro de 2023.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*teste de Qui-Quadrado de Aderência. 

Por último, também foi notada divergência nas respostas das perguntas 19 e 20.  Em P19, que buscou identificar a participante que já considera prevenir uma próxima  gestação, a comparação entres os grupos GP e GNP resultou em p-valor = 0.0632*  (estatisticamente significante), portanto, houve real diferença entre os grupos na  resposta “Sim” no grupo GP com (15.4%) e no grupo GNP (84.6%). Em P20, que  investiga qual a preferência da gestante para evitar a próxima gestação, a comparação  resultou em p-valor = 0.0600* (estatisticamente significante), portanto, houve real  diferença entre os grupos na resposta “Laqueadura” no grupo GP com (10.0%) e no  grupo GNP (90.0%). 

Tabela 12: características de n=178 pacientes analisados e classificados nos grupos GP (Gravidez  Planejada) e GNP (Gravidez Não Planejada) de acordo com as variáveis do Hospital Regional de  Taguatinga, Brasília, Brasil, 18 de novembro de 2023. 

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*teste de Qui-Quadrado de Aderência.  

Diante da diferença estatística dos grupos, optou-se por construir uma escala de  risco para gravidez não planejada com base nos valores do Odds Ratio de cada resposta.  Para isso, serão atribuídos pontos aos diferentes níveis de risco associados a cada  pergunta de modo que quanto maior o Odds Ratio, maior o risco de gravidez não  planejada. Por outro lado, quanto menor o Odds Ratio, menor o risco. 

As respostas que representam o menor risco têm esses valores: 

Pergunta 1: Usou outro método contraceptivo, Odds Ratio = 0.30; 

Pergunta 2: Recebeu Informação suficiente, Odds Ratio = 0.25; 

Pergunta 3: Consultou ginecologista, Odds Ratio = 0.19; 

Pergunta 4: Realizou planejamento, Odds Ratio = 0.32. 

As respostas que representam o maior risco têm esses valores: 

Pergunta 1: Usou camisinha masculina, Odds Ratio = 3.26; 

Pergunta 2: Informação insuficiente, Odds Ratio = 3.93; 

Pergunta 3: Não consultou ginecologista, Odds Ratio = 5.26; 

Pergunta 4: Não realizou planejamento, Odds Ratio = 03.07. 

Cada paciente recebeu um Escore de Risco para Gravidez Não Planejada, o qual  é formado pela soma do Odds Ratio das quatro perguntas. O Escore varia de 0.87  (menor risco) até 15.52 (mais alto risco). O ponto de corte é 3.810, ou seja, é o valor  intermediário da escala. 

Tabela 13: Medida de risco dos critérios estatisticamente significantes para gravidez não planejada.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*teste de Odds Ratio. 

Gráfico 1: Medida de risco dos critérios estatisticamente significantes para gravidez não planejada.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 

Tabela 14: Grupos GP e GNP conforme o escore de risco para gravidez não planejada.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 
*p-valor<0.0001*, Teste U de Mann-Whitney. 

A avaliação do Escore de Gravidez não Planejada foi estatisticamente  significante (p-valor <0.0001*, Teste U de Mann-Whitney), sendo GP (média =  3.91±2.93) e GNP (7.24±3.61). O Escore apresentou Sensibilidade = 0.727 (72,7%),  Especificidade =0.710 (71,0%) e Acurácia = 0.713 (71,3%). O ponto de corte é 3.810,  ou seja, quando o escore ultrapassar 3.81 é indicativo que aumenta significativamente o  risco de gestação não planejada. 

Gráfico 2: Curva ROC do Escore de Risco para Gravidez não Planejada.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF.

Gráfico 3: Média e desvio padrão do Escore de risco para gravidez não planejada, nos Grupos GP e GNP.

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF. 

Gráfico 4: Resultado da medida de risco dos critérios estatisticamente significativos para gravidez não  planejada. 

Fonte: Dados da pesquisa Gestações não planejadas e dificuldades no uso e acesso a métodos  contraceptivos: análise de um serviço público de saúde Brasília – DF.

5. DISCUSSÃO 

Entende-se por gravidez não planejada toda gestação que não foi programada  pelo casal ou, pelo menos, pela mulher. O fenômeno atinge mais de 55% dos  nascimentos no Brasil conforme pesquisa da Escola Nacional de Saúde Pública da  Fundação Oswaldo Cruz realizada entre 2011 e 2012. Além da elevada prevalência, é  responsável por uma série de agravos ligados à saúde reprodutiva materna e perinatal,  sendo considerada um problema de saúde pública. Dessa forma, a análise dos resultados  desse estudo e a comparação com estudos abrangentes e de relevância nacional e  internacional torna-se importante e contribui para elaboração de ações de saúde pública  adequadas voltadas para a temática (BONATTI, et al., 2018). 

Ressalta-se, ainda, que para que essas medidas sejam desenvolvidas de forma  eficaz é necessário conhecer as características das mulheres afetadas por tal situação.  Nessa pesquisa, observou-se que 81.5% das participantes relataram ter vivenciado ao  menos uma gestação não planejada. A ocorrência foi elevada em relação a outros  estudos desenvolvidos no subúrbio de Salvador-BA, que encontrou prevalência de  gravidez não planejada de 66,5% e outros realizados em na zona urbana do município  de Montes Claros-MG e na região Sul do Brasil, com 58% e 65% de prevalência,  respectivamente. Prevalência semelhante foi encontrada apenas em outro estudo  transversal na zona norte de São Paulo (81,2%) (BONATTI, et al., 2018). 

Sabe-se que a baixa utilização de métodos contraceptivos continua sendo um  importante causa de gestações não intencionais tanto que, ao serem questionadas sobre  o motivo de terem engravidado sem planejamento, 49.6% relataram que não estavam  usando nenhum método. Segundo uma pesquisa realizada em oito países da América  Latina, as mulheres brasileiras apresentam um tempo “sexualmente ativo” protegido por  anticoncepção de apenas 50%. Essa situação se correlaciona diretamente ao nível  socioeconômico da população, por isso é mais evidente em países subdesenvolvidos  onde há dificuldades de acesso aos serviços de saúde, bem como falta de organização  destes, o que ainda pode ser agravado pala associação com outros fenômenos sociais, como abuso sexual e coerção (PRIETSCH, et al, 2011). 

Por conseguinte, é impossível limitar a análise desse problema de saúde pública  apenas ao não uso de métodos contraceptivos. Trata-se de uma questão relacionada ao  direito fundamental da mulher sobre a sua fertilidade e o exercício dessa prerrogativa, e não depende exclusivamente do acesso às informações ou aos métodos anticoncepcionais. Ele perpassa pela autonomia feminina ao decidir sobre sua  sexualidade como parte de sua liberdade individual, impactada diretamente por aspectos  socioeconômicos e culturais e, especialmente, pela posição da mulher na sociedade  (PRIETSCH, et al, 2011). 

Nesse contexto, observa-se no Brasil uma aparente incongruência entre baixas  taxas de fecundidade, alta prevalência de uso de métodos contraceptivos e elevados  índices de gestações não planejadas. Isso significa que parcela representativa das  mulheres experimentam a chamada “fecundidade discrepante positiva”, ou seja,  vivenciam gravidezes não intencionais provavelmente como repercussão da existência  de demanda não atendida por métodos contraceptivos eficazes. Inúmeros fatores podem  contribuir para esse paradoxo, como a inadequação da oferta de insumos contraceptivos  nos serviços de atenção básica de saúde, principalmente os reversíveis de longa duração  (LARCs) como o dispositivo intrauterino (DIU) e o implante contraceptivo; as  ineficazes ou ausentes ações educativas sobre contracepção; a ausência de fluxos e  protocolos para atender as necessidades contraceptivas de mulheres, homens e casais;  além de outras lacunas na atenção em contracepção no país (MELO, et al, 2022). 

Os resultados do estudo estão de acordo com os aspectos supracitados. Os  principais métodos contraceptivos adotados pelas pacientes que vivenciaram uma  gravidez não intencional foram “camisinha masculina” (31%) e “pílula anticoncepcional”  (30.3%). Esse achado também vai ao encontro da pesquisa do Instituto Brasileiro de  Geografia e Estatística (IBGE) que identificou que 30% das brasileiras preferiram usar a  pílula como anticoncepcional. Em contrapartida, apenas 13.1% mencionaram o uso de  métodos contraceptivos de longa duração embora eles sejam os mais recomendados  pelas recentes políticas públicas de planejamento familiar, já que apresentam alta  eficácia, plena ação independente da paciente e duração prolongada (WENDER, et, al,  2022; FELDMAN, et al, 2021).  

Ainda segundo Wender et al, além do problema do acesso aos métodos  contraceptivos, o uso inconsistente tem importância particular sobre as taxas de falhas  dos diferentes métodos. A baixa adesão em geral relaciona-se ao menor conhecimento  das características do método, podendo associar-se à falta de motivação para o uso, e,  ainda, à insatisfação com o método contraceptivo escolhido. No trabalho, foram  apontadas como dificuldades para contracepção: efeitos adversos (51.7%) e  esquecimento (22%), podendo justificar uma baixa adesão e/ou descontinuidade ao  método escolhido (WENDER, et, al, 2022).

Outro aspecto a ser pontuado é que nossos resultados revelaram que as pacientes  que já experimentaram uma gravidez não intencional tinham maior risco de não ter  recebido informação suficiente sobre os métodos contraceptivos disponíveis. O  aconselhamento e a partilha de informação em contracepção contribuem para a seleção  de um método que corresponde às necessidades e prioridades individuais da mulher, o que melhora a adesão, continuação e satisfação. Um dos desafios do aconselhamento  reprodutivo é fornecer às mulheres as informações de que necessitam para que possam  tomar uma decisão informada no tempo limitado de uma consulta (BITZER, et al,  2012). 

Na Espanha, um estudo transversal (TEAM-06) investigou os motivos pelos  quais as mulheres consultaram profissionais de saúde para obter informações sobre  contraceptivos e porque elas selecionaram um determinado método.  Depois de terem sido informadas sobre contracepção pelos profissionais, as mulheres optaram por métodos alternativos aos orais e injetáveis (incluindo o adesivo  transdérmico e o anel vaginal) mais frequentemente. Isso indicou que oferecer  informações abrangentes pode influenciar as escolhas contraceptivas. Essa tendência de  mudar ou selecionar um método não administrado diariamente após aconselhamento  também foi demonstrada no estudo multicêntrico CHOICE (BITZER, et al, 2012).  

Cabe lembrar que esse processo de educação em saúde, que integra o programa  de planejamento familiar, tem como ponto de partida, no Brasil, as equipes de Saúde da  Família (ESF), Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), Unidades Básicas  de Saúde (UBS) e Unidades Mistas, ou seja, a atenção primária à saúde. Os serviços de  saúde supracitados também são responsáveis por fornecer todos os métodos  anticoncepcionais recomendados pelo Ministério da Saúde a nível primário de atenção e  referenciar para outros níveis de atenção à saúde para acesso aos demais métodos  contraceptivos que não são ofertados na atenção primária (FIUZA, et al, 2015). 

Vários autores ressaltam que uma variedade de profissionais pode oferecer  métodos de planejamento familiar. Em diversos países, além do médico, enfermeiros,  auxiliares e técnicos de enfermagem, agentes de saúde, parteiras tradicionais,  educadores, membros da comunidade e usuários experientes de métodos  anticoncepcionais, habitualmente oferecem serviços de planejamento familiar. Para  tanto, é oferecida capacitação adequada, sendo ditadas regras sobre quem pode oferecer  tais métodos. Na visão dos mesmos autores, a pílula combinada e a pílula somente de  progestogênio, o preservativo masculino, os espermaticidas, os métodos comportamentais e a lactação com amenorréia (LAM) podem ser oferecidos por todos  os que forem citados; os injetáveis, por qualquer pessoa treinada na aplicação; o  diafragma, por qualquer provedor treinado para realizar exames pélvicos e medir seu  tamanho; o DIU pode ser inserido por profissionais de saúde especializados (MOURA e  SILVA, 2006).  

Embora uma ampla gama de profissionais possa atuar na informação,  aconselhamento e fornecimento dos métodos contraceptivos, observou-se na pesquisa  que as pacientes que não tinham sido consultadas por ginecologista antes de engravidar tinham mais chance de vivenciar uma gravidez não planejada. Isso reforça a necessidade de capacitação técnica dos profissionais não especialistas, que são o  primeiro contato da usuária do serviço público de saúde. A captação, fixação e  qualificação de recursos humanos, um dos pilares de qualidade dos serviços de  planejamento reprodutivo, tem sido um grande desafio para o avanço da atenção básica  e sua orientação para o modelo ESF no Brasil (BONAN, et al, 2010). 

Além disso, a maior parte das pacientes que alegaram não ter participado da atividade de planejamento familiar apresentaram gravidez não planejada. Dessa forma,  destaca-se que apesar da existência de política governamental que estabelecem diretrizes e regulamenta a implantação e implementação das ações de planejamento familiar no Brasil, há dificuldade de acesso a serviços que oferecem o programa de planejamento familiar, a má qualidade da atenção, a dificuldade de integrar ações e a oferta limitada de métodos contraceptivos. Essas inadequações na assistência podem ser confirmadas pelo conhecimento limitado dos usuários sobre os métodos contraceptivos,  uso inadequado, falta de continuidade e seguimento no manejo de métodos,  desarticulação entre as atividades educativas e clínicas e na relação interpessoal autoritária entre clientes e profissionais de saúde. Tais situações podem indicar  qualidade incipiente dos serviços de planejamento familiar (FIUZA, et al, 2015). 

O presente estudo foi também capaz de identificar alguns fatores associados à  gravidez não planejada, demonstrando que esses eventos não são inteiramente aleatórios  e estão, de alguma forma, ligados ao desejo de engravidar. As mulheres que utilizaram  camisinha masculina, que negaram ter recebido informações sobre os métodos  contraceptivos escolhido, que não tinham sido consultadas por um ginecologista antes  de engravidar, que não participaram de atividade de planejamento familiar, que já  pensam em prevenir uma próxima gestação e desejam fazê-lo por meio de laqueadura tubária foram as que apresentaram maior probabilidade de terem tido gravidez não  planejada. 

Identificou-se a maior preferência pela esterilização cirúrgica feminina como  forma de prevenir uma futura gestação, especialmente no grupo que já vivenciou uma  gravidez não intencional. Isso pode estar associado a insatisfação, insegurança,  dificuldade no uso e acesso dos métodos reversíveis, desinformação quanto à  irreversibilidade da laqueadura, falta de participação do homem brasileiro no uso de  métodos contraceptivos, comodidade do método e maior liberdade para a mulher (BELIQUE, et al, 2016).  

Conforme Belique et al, quem opta pela esterilização acredita ser esse o melhor  método tanto em eficácia quanto em pouca inocuidade à sua saúde. O próprio termo  “laqueadura”, que se trata de uma arte chinesa que traz beleza e brilho a móveis  usados, indica a crença de muitas mulheres na esterilização cirúrgica como algo  renovador e solucionador de problemas (BELIQUE, et al, 2016). Ser orientada quanto a  métodos reversíveis, menos invasivos e tão ou mais eficazes que a esterilização  cirúrgica poderia mudar a preferência de muitas dessas mulheres que aguardam na fila  de cirurgia. 

Diante dos resultados, os fatores de risco com maior relevância estatística foram  conjugados a fim de propor um Escore de Risco para Gestações Não Planejadas. A  partir desse escore, é possível identificar as mulheres mais vulneráveis para gravidez  não intencional de modo a concentrar esforços nessa população para evitar uma futura  gestação não programada. 

6. CONCLUSÃO 

Com este estudo, observou-se que a baixa adoção de métodos contraceptivos e  sua descontinuidade devido fatores individuais como efeitos adversos e memória  impactam diretamente na ocorrência de gestações não planejadas. 

Obteve-se um índice bastante elevado de gestações não planejadas no serviço em  relação à média nacional e global. A informação deficiente sobre contracepção, o uso de  métodos de curta duração e altamente dependentes do usuário, não participação em  atividades de planejamento reprodutivo e pouca vinculação com médico especialista na  área (ginecologista) foram identificados como risco para a vivência de uma gravidez  não intencional.  

A partir desses resultados, é possível inferir que há um déficit e/ou baixa  qualidade de ações de planejamento reprodutivo na atenção primária. Isso repercute na  falta de informação às mulheres, o que atrapalha na seleção de métodos que sejam  eficazes e compatíveis com suas características individuais e estilo de vida. Existe, ainda, uma falta de integração entre os serviços de diferentes níveis de complexidade  com inexistência ou inconsistência dos mecanismos de referência e contrarreferência.  

Algumas limitações precisam ser consideradas ao interpretar os resultados do  presente estudo. Uma delas é o corte transversal que caracteriza o desenho do trabalho, o que dificulta elaborar inferências causais entre os fatores estudados e o desfecho.  Outra é o ambiente em que foi desenvolvido (Ambulatório de Pré-Natal de Alto Risco),  que pode justificar a alta prevalência do fenômeno da gestação não planejada. É sabido  que a gestação não programada tem impacto clínico, tanto para a mãe quanto para o  bebê, considerando o surgimento de intercorrências no período gestacional com maior  frequência neste grupo, do que no grupo de gestação planejada.  

Houve, ainda, dificuldade na interpretação dos dados colhidos pelo questionário  e prontuário eletrônico, corroborando a importância de um questionário mais objetivo e  talvez validado previamente e padronização da anamnese transcrita para o prontuário  com reforço do motivo de acompanhamento no serviço de Alto Risco. 

O estudo pode ser considerado uma contribuição na identificação de fatores de  risco para reconhecimento do grupo de mulheres vulneráveis a uma gestação não  intencional. Pode-se também sinalizar as preferências de contracepção das pacientes.  Desse modo, é possível adotar medidas preventivas já no pré-natal uma vez que esse, muitas vezes, é o primeiro contato da usuária com o ginecologista. Seria interessante um estudo de seguimento (após 2 anos) para analisar se as necessidades de contracepção  mencionadas pelas mulheres foram satisfeitas. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

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5) BRASIL. Lei nº 9.263 de 1996. Regula o § 7º do art. 226 da Constituição  Federal, que trata do planejamento familiar, estabelece penalidades e dá outras  providências. Disponível  em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9263.htm. Acesso em: 26 nov.  2023. 

6) BRASIL. Lei nº 14.443 de 2022. Altera a Lei nº 9.263, de 12 de janeiro de  1996, para determinar prazo para oferecimento de métodos e técnicas  contraceptivas e disciplinar condições para esterilização no âmbito do  planejamento familiar. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2022/lei/L14443.htm . Acesso em: 28 nov. 2023. 

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1Discente do Curso de Pós-Graduação/Residência médica em Ginecologia e Obstetrícia do Hospital  Regional de Taguatinga-DF da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal – e-mail:  ingrid.egito@gmail.com
2Discente do Curso de Medicina da Escola Superior de Ciências da Saúde – DF.
3Preceptora do Curso de Pós-Graduação/Residência médica em Ginecologia e Obstetrícia do Hospital  Regional de Taguatinga-DF da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal – e-mail:  dradeborapaulo@gmail.com