REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202412091145
Victória Fernandes dos Santos Fiori
RESUMO
O objetivo deste estudo foi identificar produções bibliográficas sobre a participação do enfermeiro na Educação em Saúde aos adolescentes sobre gravidez e planejamento reprodutivo e os principais desafios e estratégias adotadas. Método: Levantamento bibliográfico descritivo via online, de artigos disponibilizados na íntegra e em Língua Portuguesa, que abordassem a temática no período de 2019 a 2024. A amostra contou com 16 artigos (12 pesquisas de campo e 4 revisões). Resultados e discussão: Identificou-se quatro aspectos estudados: Fatores de risco para a gravidez na adolescência; Problemas físicos e sociais; Escola e Tecnologia e O papel do enfermeiro na prevenção da gravidez na adolescência. Considerações finais: O enfermeiro tem papel fundamental na prevenção da gravidez na adolescência e deve utilizar de todas as estratégias possíveis para atingir o público alvo, tanto na utilização de ferramentas tradicionais como rodas de conversa e jogos educativos, como também as Tecnologias de Informação e Comunicação disponíveis.
Descritores: Gravidez na Adolescência, Saúde Reprodutiva, Cuidados de Enfermagem, Educação em Saúde.
INTRODUÇÃO
O Ministério da Saúde (MS) define adolescência da mesma forma que a estabelecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que caracteriza o período da vida entre 10 e 19 anos, marcada por diversas transformações vinculadas tanto à compreensão das modificações corporais e suas repercussões, como à evolução do desenvolvimento cognitivo e às modificações de socialização em busca da construção de uma identidade.1
Estima-se que a taxa mundial de gravidez na adolescência seja de 46 nascimentos por cada 1.000 meninas, enquanto as taxas de gravidez na adolescência na América Latina e no Caribe continuam sendo as segundas mais altas do mundo, girando em torno de 66,5 nascimentos por cada 1.000 meninas com idade entre 15 e 19 anos. No Brasil, em 2020, o total de nascimentos de mães adolescentes foi de 380.778, representando 14% do total de nascidos vivos, sendo assim o Brasil ocupa o 2º lugar entre países da América e Caribe em gravidez de adolescentes. São 66,5 bebês que nascem de 1.000 meninas entre 14 e 19 anos. Por hora, são 44 bebês que nascem de mães adolescentes no País, sendo que dessas 44, duas têm idade entre 10 e 14 anos.2 ,3
Segundo a OMS, a gestação na adolescência é uma condição que aumenta a prevalência de complicações tanto para a mãe (maior risco de mortalidade materna) como para o feto e, posteriormente, para o recém-nascido (anomalias graves, problemas congênitos ou traumatismos durante o parto), além da possibilidade do agravamento de problemas socioeconômicos já existentes.4
Entre as recomendações para se reduzir a gravidez na adolescência, destacam-se: a promoção de medidas e normas que proíbam o casamento infantil e as uniões precoces (antes dos 18 anos), o apoio aos programas de prevenção da gravidez baseados em evidências científicas e que envolvam vários setores e visem grupos mais vulneráveis, o aumento do uso de métodos contraceptivos, a redução das relações sexuais sob coerção, o aumento dos cuidados qualificados no pré-natal, parto e pós-parto, a inclusão dos jovens na concepção e implementação de programas de prevenção da gravidez, a criação de ambientes que permitam a igualdade de gênero e o auxílio aos adolescentes para que exerçam seus direitos sexuais e reprodutivos.2
O enfermeiro é um dos profissionais de saúde mais presentes em todas as fases de vida da pessoa, atuando em unidades básicas de saúde, escolas, ambulatórios, organizações não governamentais e hospitais, tanto na promoção, como na prevenção e reabilitação da saúde. Desta forma, pode exercer importante papel na contribuição para redução das taxas de gravidez na adolescência.
O objetivo deste estudo é identificar na literatura levantada a participação do enfermeiro na Educação em Saúde voltada aos adolescentes sobre a temática gravidez e planejamento reprodutivo, assim como os principais desafios encontrados e estratégias adotadas para sua prevenção.
MÉTODO
Para o desenvolvimento deste estudo optou-se pelo levantamento bibliográfico descritivo via online, de periódicos em Língua Portuguesa indexados na biblioteca virtual de saúde (BVS). Foram consideradas publicações que abordassem a temática ‘atuação do enfermeiro na prevenção da gravidez na adolescência’, utilizando-se como descritores: Gravidez na Adolescência, Saúde Reprodutiva, Cuidados de Enfermagem e Educação em Saúde.
A coleta de dados foi realizada entre os meses de março a maio de 2024. Foram adotados como critérios de inclusão: artigos publicados em Língua Portuguesa, no período de 2019 a 2024 que atendessem aos objetivos da pesquisa e acessibilidade por meio virtual. Como critério de exclusão adotou-se artigos não disponíveis na íntegra. Dos 16 textos selecionados, 12 foram produzidos por meio de pesquisas de campo e quatro por revisões sistemáticas.
Para análise e posterior síntese dos artigos que atenderam os critérios de inclusão foi desenvolvido um fichamento. O fichamento contempla informações sobre identificação do artigo, autores, procedência, ano e temática dos textos.
Foram identificados quatro aspectos mais estudados: 1) Fatores de risco para a gravidez na adolescência; 2) Problemas físicos e sociais; 3) Escola e Tecnologia e 4) O papel do enfermeiro na prevenção da gravidez na adolescência.
Para melhor compreensão, o Quadro I apresenta os artigos investigados segundo o título do estudo, autores, veículos, o ano e considerações temáticas.
Quadro 1 – Distribuição das publicações selecionadas nas bases de dados eletrônicos no período de 2019 a 2024.
TÍTULO | AUTORES | PERIÓDICOS | ANO | CONSIDERAÇÕES TEMÁTICAS |
Gravidez na adolescência: uso de métodos anticonceptivos e suas descontinuidades | Silva MJP, Nakagawa JTT, Silva ALR, Espinosa MM. | REME – Rev Min Enferm. | 2019 | Analisa o uso de métodos anticoncepcionais por adolescentes que engravidaram nesse período da vida. |
Efetividade de jogo educativo sobre contracepção com adolescentes escolares: estudo quase-experimental | Praxedes MLS, Queiroz MVO, Vieira RP | Online Braz J Nurs | 2019 | Analisa a efetividade de jogo educativo sobre contracepção com adolescentes escolares por meio de testes estatísticos. |
Conhecimentos de adolescentes sobre métodos contraceptivos e infecções sexualmente transmissíveis. | Vieira KJ, Barbosa NG, Monteiro JCS, Dionízio LA, Gomes-Sponholz FA | Rev baiana enferm | 2021 | Identifica os conhecimentos de adolescentes sobre práticas sexuais seguras e identifica as necessidades de informação dos adolescentes sobre infecções sexualmente transmissíveis e gravidez. |
Uso de métodos contraceptivos e reincidência gestacional em mulheres adolescentes: uma revisão sistemática. | Gutierrez ES, Salla MA, Jesus RA, Sprung LS. | Femina. | 2021 | Levantamento dos conteúdos científicos sobre o uso de métodos contraceptivos e da reincidência de gestações em mulheres adolescentes. |
Determinantes sociais da saúde relacionados à gravidez na adolescência. | Moura FS et al. | Rev. Saúde Pública Paraná (Online) | 2021 | Revisa e descreve na literatura nacional e Internacional os determinantes sociais da saúde relacionados à gravidez na adolescência. |
Impacto do planejamento familiar na vida sexual. | Albuquerque DGGP et al. | Rev. méd. Minas Gerais | 2021 | Compila as publicações científicas nacionais e internacionais acerca do impacto do planejamento familiar na prevenção da gravidez em adolescentes. |
A enfermagem na abordagem com adolescentes durante uma roda de conversa: um relato de experiência. | Ardente ACS, Makuch DMV, Marchiorato AAL, Dias, Dinalva MA | Rev. Saúde Pública Paraná (Online) | 2021 | Relata a experiência de uma roda de conversa com adolescentes do sexo feminino, em 2019. |
Prevalência de indicadores de saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes brasileiros: análise comparativa da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2015 e 2019. | Sousa MA, Menezes LL, Vieira EWR, Andrade GN, Pereira CA, Malta DC, Felisbino-Mendes MS | REME – Rev Min Enferm. | 2022 | Compara estimativas de prevalência de indicadores de saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes brasileiros que participaram das edições 2015 e 2019 da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE). |
Fatores da desigualdade social e a sua associação com a gravidez na adolescência: uma revisão integrativa | Vilar CMLN et al. | R. Saúde Públ. Paraná. | 2022 | Identifica quais fatores da desigualdade social estão associados à gravidez na adolescência. |
Conhecimento sobre métodos contraceptivos de adolescentes atendidas em Ambulatório de Ginecologia. | Piantavinha BB, Machado MS. | Femina | 2022 | Investiga o conhecimento das adolescentes atendidas em um Ambulatório de Ginecologia sobre os métodos contraceptivos. |
Reincidência de gravidez na adolescência: fatores associados e desfechos maternos e neonatais. | Assis TSC, Martinelli KG, Gama SGN, Santos Neto ET dos. | Ciênc. Saúde Colet. (Impr.) | 2022 | Analisa os fatores socioeconômico se demográficos associados à reincidência de gravidez na adolescência, assim como verifica a associação com desfechos maternos e neonatais desfavoráveis. |
Efeito de intervenção educativa online na qualidade de vida de gestantes adolescentes. | Santiago RF, Nery IS, Andrade EM, Mendes IA, Nogueira MT, Rocha SS et al. | Acta Paul Enferm. | 2022 | Avalia o efeito de intervenção educativa online na qualidade de vida de gestantes adolescentes. |
Gravidez na adolescência: percepção dos enfermeiros sobre a assistência de enfermagem. | Araújo LG, Margotti E, Paranhos SB, Parente AT. | Enferm Foco. | 2023 | Descreve a percepção dos enfermeiros da atenção básica sobre a assistência no pré-natal direcionada às adolescentes grávidas. |
Fatores relacionados a gravidez na adolescência: perfil reprodutivo de um grupo de gestantes. | Pontes BF, Quitete JB, Castro RC, Fernandes GC, Jesus L, Teixeira RC. | R Pesq Cuid Fundam [Internet]. | 2023 | Descreve o perfil reprodutivo de mulheres adolescentes participantes de um grupo de gestantes. |
Quando a maternidade chega mais cedo: uma análise sobre os fatores subjacentes à gravidez na adolescência. | Tetéo KF de C, Hoffmann E, Bezerra M de O A. | Barbarói | 2024 | Analisa os fatores subjacentes à gravidez precoce em mães de RNs internados na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal e na Unidade de Cuidados Intermediários Canguru da Maternidade Escola Januário Cicco, em Natal, Rio Grande do Norte. |
Parturientes adolescentes em Cruzeiro do Sul, Acre, Brasil: características socioeconômicas e obstétricas. | Damasceno AAA et al. | Cien Saude Colet | 2024 | Investiga as características socioeconômicas e obstétricas de parturientes adolescentes e suas complicações sobre a saúde materna e neonatal. |
RESULTADOS E DISCUSSÃO
1) Fatores de risco para a gravidez na adolescênc
A Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) é um inquérito nacional que objetiva realizar a vigilância dos fatores de risco e proteção para a saúde dos escolares que existe desde 2009. Entre os aspectos avaliados há os indicadores da saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes, o que inclui comportamentos sexuais, contracepção e orientações sobre prevenção de gravidez, sobre o vírus da imunodeficiência adquirida (HIV) e outras infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), além do acesso gratuito à preservativos nas escolas.5 Comparando-se as estimativas de prevalência de indicadores de saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes que participaram das edições 2015 e 2019 da PeNSE, fica evidente que houve uma piora na prevalência dos comportamentos sexuais de risco, incluindo o aumento da gravidez em algumas regiões do Brasil e o aumento da iniciação sexual precoce, apesar das orientações recebidas nas escolas.6
No entanto, se há orientações sobre como se prevenir de uma gravidez não planejada na adolescência, quais seriam os motivos para tantas ocorrências? Existem componentes que conseguem caracterizar os principais fatores subjacentes à gravidez precoce, entre os quais se destacam: a fragilidade dos vínculos familiares; pobreza e desigualdade social; precariedade do acesso à educação; evasão escolar; escassez de espaços de cultura e lazer; violação dos direitos humanos; violência e coerção sexual; relações de gênero (que tendem a culpabilizar a mulher pela gravidez); baixa renda familiar; vivência do casamento precoce; cultura machista e patriarcal; falta de acesso a serviços de saúde reprodutiva adequados à idade e ao planejamento familiar.7
Entre fatores de risco para a gravidez na adolescência são citados o consumo de álcool, tabaco e outras drogas, a atividade sexual precoce e o perfil socioeconômico e demográfico. Já entre os fatores de proteção associados à gravidez nesta faixa etária evidencia-se a renda familiar mais elevada e a maior escolaridade do adolescente e também dos pais.8
Estudo realizado no interior do Estado da Bahia apontou que a maior preferência entre os adolescentes ainda é o uso do preservativo masculino e do anticoncepcional oral. Observa-se que a maioria das adolescentes possui conhecimento insuficiente/ausente sobre métodos contraceptivos e prevenção de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST), o que acaba por contribuir para o uso incorreto dos mesmos.9
O uso de Métodos Anticonceptivos (MAC) ainda é reduzido entre as adolescentes e, quando acontece, há muitas vezes a descontinuidade do uso podendo ocorrer a gravidez não planejada e, muitas vezes, indesejada. Já entre os adolescentes do sexo masculino há um conhecimento menor a respeito dos MAC, IST e sobre a prática do sexo seguro.10, 11
2) Problemas físicos e sociais
Quando uma adolescente fica grávida e decide dar à luz, muitas vezes não recebe os cuidados adequados na fase pré-natal, seja pelo reconhecimento tardio da gestação, negação da gravidez, falta de adesão ao serviço de saúde ou mesmo despreparo do profissional para lidar com a faixa etária, o que aumenta os riscos de desfechos negativos.12
No entanto, apesar de diversos autores apontarem a gravidez na adolescência como considerada de risco, o MS predetermina que algumas situações tidas como ‘de risco’ podem ser acompanhadas na atenção básica, onde se inclui as idades inferiores a 15 anos, baixa escolaridade, situação familiar insegura e não aceitação da gravidez (situações fortemente presentes na adolescência).13
No Brasil, observa-se uma piora na prevalência dos comportamentos sexuais de risco em adolescentes, incluindo o aumento da gravidez, elevando os agravos à saúde sexual e reprodutiva de jovens que, principalmente, frequentam as escolas públicas e vivem no Nordeste e Norte do País. A redução do uso de pílulas anticoncepcionais e a diminuição do uso do preservativo exacerbam ainda mais os comportamentos sexuais que colocam a saúde e a vida dos adolescentes em risco. Este cenário revela uma fragilidade de políticas e ações efetivas para esse grupo populacional.6
Mesmo após a gravidez e parto, os riscos envolvendo as adolescentes e seus filhos continuam. Entre as complicações neonatais mais prevalentes entre as puérperas adolescentes estão a prematuridade e o baixo peso ao nascer, principalmente em primíparas.14
A reincidência da gravidez na adolescência aumenta com a idade materna, sendo bem mais prevalente naquelas com idade entre 17-19 anos, cuja escolaridade é inadequada para a idade, nas que não planejaram a gravidez e as que têm o companheiro no papel de chefe da família, características que deixam claro como uma nova gestação ainda durante a adolescência relaciona-se com a falta de planejamento familiar e a propagação da pobreza no Brasil.15,16
Outro ponto a ser discutido neste contexto é o que aborda a questão social. Com um bebê para criar, a volta à escola passa a ser um desafio. De fato, a gravidez e posterior maternidade podem dificultar as adolescentes a continuarem seus estudos, sob o risco de perpetuarem o “ciclo de reprodução intergeracional da pobreza”, no entanto, reforçar esse conceito de que a gestação é o que acarreta o abandono escolar e associar esse acontecimento “à reprodução da pobreza, ao não exercício dos direitos sexuais e reprodutivos e outros fatores, como a falta de expectativas, frustração e desmotivação” é negar todas as privações e faltas de oportunidades que essas adolescentes vivenciam diariamente desde a infância, o que seria uma inverdade na tentativa de eximir o Estado de suas responsabilidades.17
A cobertura das creches no Brasil para população entre zero e três anos de idade, também é outra problemática social que interfere na volta da adolescente/mãe voltar a frequentar a escola. A maioria das adolescentes tem dificuldade de retornar aos estudos após a gestação, pois como obstáculo elas não têm com quem deixar os filhos e acabam sem a garantia do retorno à vida escolar, o que revela a ausência de políticas de apoio voltadas para a maternidade e para a educação básica infantil. Apesar de o Plano Nacional da Educação (PNE) apresentar como meta a cobertura de 50% de vagas até 2024, até 2018 a taxa de cobertura bruta foi de apenas 29,7%.7,18
3) Escola e Tecnologia
É consenso geral o importante papel que pode ser desenvolvido pelas escolas para a redução das ocorrências de gravidez na adolescência, criação de projetos de vida e prevenção de IST, mas para esse papel ser efetivo há necessidade de investimentos em políticas educacionais como, por exemplo, o incentivo às atividades educativas e o aumento no tempo de permanência do adolescente dentro da escola com agendas que podem incentivar a vontade de continuar estudando para adquirir uma profissão futura.8
“A escola pode fomentar a criação de projetos de vida, propiciar maior qualificação profissional para melhores colocações no mercado de trabalho e possibilitar a vivência de etapas necessárias ao crescimento do adolescente, como o monitoramento de comportamentos e o incentivo às atitudes mais adequadas e promissoras”. (Vilar et al, 2022)
Também é fundamental a criação de programas de educação em saúde eficientes que envolvam não só a escola, como também a família e os serviços de saúde, com intuito de adiar a gravidez e fortalecer o planejamento familiar, em especial, entre as adolescentes mais pobres e com companheiros presentes. Assim é possível valorizar o diálogo aproximando jovens e pais sobre a temática, sempre considerando as especificidades dessa faixa etária, além de oferecer o acesso a informações de qualidade, sem discriminação, preconceito e juízo de valor, evitando excesso de burocracia, promovendo a atenção integral e a garantia de direitos.6,15,19
Essas ações educativas a respeito da promoção da saúde sexual e reprodutiva no ambiente escolar devem acontecer de forma contínua e também com o objetivo de valorizar o empoderamento dos adolescentes do sexo feminino, incluindo ativamente os adolescentes do sexo masculino, visando estimular a equidade de gênero, sensibilização, reflexão e corresponsabilização de ambos os sexos na prática do sexo seguro e saudável.11
Verificou-se que a educação sexual pode ser um método eficiente para atingir os objetivos propostos, desde que dialogue com o público-alvo por meio de ferramentas inovadoras e criativas, onde o adolescente possa ter a oportunidade de falar sobre suas experiências e dúvidas com um profissional capacitado e que tenha uma escuta qualificada, preservando-se a confidencialidade das informações.20
Entre as ferramentas inovadoras e criativas destacam-se as intervenções educativas ‘online’ que podem melhorar a qualidade de vida das gestantes adolescentes, pois o instrumento disponibiliza para esse público-alvo, orientações seguras, válidas e que são essenciais para o esclarecimento de dúvidas sobre a gravidez e o puerpério. Uma das vantagens deste instrumento é a possibilidade de a gestante adolescente acessá-lo na quantidade de vezes, no horário e lugar que desejar, sem a necessidade de ir até o serviço de saúde. A utilização das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) digitais como meio de informação foi apontada por um estudo realizado em Teresina (PI) como a principal fonte para esclarecimento de dúvidas sobre a gravidez, sendo a família, vizinhos e/ou amigos o segundo maior meio de informação. Em terceiro lugar como fonte de informação formal sobre a gravidez, estiveram os profissionais de saúde.21
Mas, há também soluções igualmente criativas, porém mais simples e de baixo custo, como por exemplo, o jogo educativo “Anticoncepção na Adolescência”, desenvolvido por pesquisadores do Ceará, que se mostrou eficaz na melhoria do conhecimento da população estudada. O jogo proporcionou interesse entre os adolescentes, promovendo discussão e aumentando o conhecimento sobre diversos métodos contraceptivos, incluindo os menos divulgados entre esta população, já que os mais utilizados na faixa etária ainda são os métodos de barreira e hormonais.22
4) O papel do enfermeiro na prevenção da gravidez na adolescência
Enfermeiros sabem (baseados em evidências científicas) sobre o impacto positivo que a assistência de enfermagem gera durante o pré-natal e na formação de autonomia da adolescência. Reconhecendo os riscos e as consequências que uma gravidez na adolescência provoca, procuram conduzir os atendimentos respeitando as individualidades e peculiaridades deste público. No entanto, enfrentam suscetibilidades na formação profissional que ainda necessita de mais aperfeiçoamento na temática e também na infraestrutura física de muitos serviços de saúde que poderiam ser mais acolhedores. Somam-se a esses fatores os problemas derivados do início tardio do pré-natal, do déficit de materiais e insumos, e da dificuldade de acesso a exames laboratoriais e de imagem.14,23
É preciso aumentar a participação dos profissionais de saúde como fonte de informação para o uso correto dos métodos anticoncepcionais e legitimar a necessidade de políticas públicas sobre educação sexual para as adolescentes aumentando a consistência no uso e a eficácia dos métodos buscando a redução dos riscos da gravidez não planejada na adolescência e das IST. Escuta humanizada e acolhedora que proporcione a formação de vínculos é fundamental para garantir plano de cuidados a este público. Rodas de conversa e grupos de apoio devem ser realizadas sempre que possível.9,24,25
A promoção do acesso aos métodos de alta eficácia, principalmente dos chamados reversíveis de longa ação (LARCs – do Inglês Long-Acting Reversible Contraceptives) como Dispositivos Intra Uterino (DIU) e Implantes, como também o acompanhamento por meio de entrevista motivacional de profissionais de saúde e agentes comunitários, são estratégias capazes de reduzir a reincidência gestacional em adolescentes. Não obstante, as informações sobre a utilização de todos os métodos disponíveis devem englobar seus efeitos colaterais, a importância da utilização correta e consistente para garantir sua eficácia e as ações diante de algum problema que possa acontecer. Entretanto é fundamental que os profissionais se certifiquem de que as adolescentes compreenderam a forma correta a administração, além de auxiliar na escolha de um método que mais se aproxime de suas necessidades.10
A contracepção deve ser um processo acompanhado de perto pelos profissionais, considerando que uma primeira abordagem com a prescrição do método e informações acerca deste não é suficiente para que as adolescentes utilizem de maneira correta e consistentemente.16
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O enfermeiro tem um papel fundamental na prevenção da gravidez na adolescência. Para isso deve utilizar de todas as estratégias possíveis para atingir o público alvo, tanto na utilização de ferramentas tradicionais como rodas de conversa e jogos educativos, como também as Tecnologias de Informação e Comunicação disponíveis e muito utilizadas pelos jovens.
Informações de fontes seguras não são suficientes para mudar comportamentos. É preciso unir escola, família e profissionais de saúde para sensibilizar os adolescênte, incluindo os do sexo masculino, com o intuito de garantir saúde, direitos sexuais e de escolha e prevenindo não só gravidez indesejada, mas também IST.
Culpabilizar a fase da adolescência para a ocorrência de gravidez não planejada é isentar o Estado de falhas na saúde coletiva, não reconhecendo poucos investimentos na área e a falta de políticas públicas adequadas.
REFERÊNCIAS
- Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. Proteger e cuidar da saúde de adolescentes na atenção básica. – 2. ed. – Brasília: Ministério da Saúde, 2018.
- OPAS. Organização Panamericana de Saúde. América Latina e Caribe têm a segunda taxa mais alta de gravidez na adolescência no mundo. Disponível em: https://www.paho.org/pt/noticias/28-2-2018
- Brasil. Ministério da Educação. Gravidez na Adolescência – Por hora, nascem 44 bebês de mães adolescentes no Brasil, segundo dados do SUS. Disponível em: https://www.gov.br/ebserh/pt-br/comunicacao/noticias/por-hora-nascem-44-bebes-de-maes-adolescentes-no-brasil-segundo-dados-do-sus
- Brasil. Ministério da Saúde. Saúde dos adolescentes – Gravidez na adolescência: saiba os riscos para mães e bebês e os métodos contraceptivos disponíveis no SUS. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2023/fevereiro/gravidez-na-adolescencia-saiba-os-riscos-para-maes-e-bebes-e-os-metodos-contraceptivos-disponiveis-no-sus
- Brasil. IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). PeNSE – Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/educacao/9134-pesquisa-nacional-de-saude-do-escolar.html
- Sousa MA, Menezes LL, Vieira EWR, Andrade GN, Pereira CA, Malta DC, Felisbino-Mendes MS. Prevalência de indicadores de saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes brasileiros: análise comparativa da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2015 e 2019. REME – Rev Min Enferm. 2022. Disponível em: http://www.revenf.bvs.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-27622022000100228
- Tetéo KF de C, Hoffmann E, Bezerra M de O A. Quando a maternidade chega mais cedo: uma análise sobre os fatores subjacentes à gravidez na adolescência. Barbarói,(64),95-125. 2024. Disponível em: https://online.unisc.br/seer/index.php/barbaroi/article/view/15947
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- Silva MJP, Nakagawa JTT, Silva ALR, Espinosa MM. Gravidez na adolescência: uso de métodos anticonceptivos e suas descontinuidades. REME – Rev Min Enferm. 2019. Disponível em: https://www.revenf.bvs.br/pdf/reme/v23/1415-2762-reme-23-e1220.pdf
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